3. DOUTOR KLAUS HENSEL

Berlim, Alemanha

Acordo sentindo um braço magro sobre meu peito, olho para o lado e vejo uma loira nua. Não consigo enxergar o seu rosto, coberto por seus fios dourados. Minha cabeça está pesada e dói. Estou arruinado, meu corpo inteiro está dolorido. Olho ao redor e percebo que estou em um quarto que com certeza não é de hotel, porque tem um pôster do ator Chris Hemsworth colado na parede. A maioria das minhas colegas de trabalho e algumas amigas dizem que me pareço com esse ator. O pôster que tem mais de um metro de comprimento e em cima da cômoda rosa. Rosa? Mas que porra, será que eu transei com uma criança?

Aos poucos as lembranças vão surgindo. Fui jantar com meu pai e meu irmão, e quando disse que amanhã irei para o Brasil, acabamos nos desentendendo. Meu pai como sempre foi contra, dizendo que eu adoro ficar no meio de gentinha, de país pobre, e que ele não sabe como ainda não peguei uma grave doença com essa mania de viajar por esses lugares. Se ele soubesse qual a minha verdadeira intenção em terras brasileiras, iria surtar. Esse convite do Adam para fazer parte de sua equipe para orientar os novos médicos veio em boa hora, não aguento mais ficar convivendo com a arrogância do meu pai, Anton.

Ele nunca entendeu por que eu sou fascinado por medicina. Diferente do meu pai, não vejo como uma profissão rentável, mesmo que eu ganhe muito bem, principalmente por realizar cirurgias reparadoras. Ganhei muito dinheiro com celebridades que me procuram para reparar cirurgias plásticas malsucedidas. Tenho orgulho de ser reconhecido profissionalmente, com apenas trinta anos cheguei a um nível profissional que muitos com mais anos de carreira do que eu, ainda não chegaram. Vivo dentro do hospital desde minha adolescência, estudei e me dediquei para não ser apenas mais um, e sim o melhor.

Adam e eu formávamos uma boa dupla, ele era meu companheiro nos trabalhos voluntários. Depois que voltamos do Haiti, ele foi para o Brasil, se encantou e não voltou mais. Minha vontade foi de ir com ele, mas eu tinha uma agenda de mais de um ano para cumprir. Amanhã pegarei o primeiro voo para o Brasil e nada vai me impedir.

Meu pai, mais uma vez, ameaçou me deserdar, o que deixa Joseph feliz. Meu irmão só pensa em dinheiro, já fez até planos para quando nosso pai morrer. O senhor Anton não deixa fazer mudanças no hospital, tentei várias vezes implantar coisas para o melhor funcionamento do lugar, bem como projetos sociais, mas Anton vetou todas as sugestões. Ele faz o mesmo com Joseph, sendo que meu irmão quer mudanças que visam uma forma dele ganhar mais dinheiro.

Apesar de amar o dia-a-dia no hospital, o que gosto mesmo é do trabalho em campo. Gosto de ajudar pessoas, foi por isso que quis ser médico, para ver a alegria no rosto de quem precisa. Depois de uma calorosa discussão com meu pai, fui para meu antigo quarto em sua casa. Sobre o criado-mudo, encontrei um porta-retratos com uma foto minha e da minha mãe. Peguei-o em minhas mãos, fiquei observando e, quando me dei conta, as lágrimas molhavam meu rosto. Sinto muito a sua falta e algo dentro de mim se quebra quando as lembranças incertas do dia da sua morte vagueiam em meus pensamentos. Ela era doce, uma mulher capaz de tirar a roupa do próprio corpo para ajudar o próximo. Sempre senti muito orgulho de ser filho de uma ginecologista que, com amor, trouxe muitas crianças ao mundo.

Seu corpo no chão da sala, inerte e com sinais de agressão, se mistura com outras lembranças que me fazem mal. Apesar de não saber ao certo do que se trata, aquele fatídico dia em que sua vida foi tirada, de mim e de todos que a amavam, traz coisas ruins que tenho guardadas dentro de mim. É como se uma porta fosse aberta, e, quando olho para dentro dela, só vejo escuridão. Algo me incomoda nesta neblina que oculta o verdadeiro motivo desse sentimento ruim dentro de mim.

Saí atormentado da casa do meu pai e fui afogar as mágoas em um bar. Não costumo beber, mas eu precisava tirar aquela angústia do peito. Meu pai mais uma vez me humilhou com suas duras palavras, e minha mãe não está aqui para ser meu refúgio. Levanto da cama e começo a catar minhas roupas espalhadas pelo quarto. Mas que merda? Essa loira me abordou no balcão do bar! A lembrança vem como um flash.

— Você é muito gostoso. O que eu preciso fazer para transar de novo com você, Chris?

Ela me chamou de Chris? Essa maluca está pensando que sou o tal do ator do seu pôster? Que porra que eu fiz? Nunca gostei de mulher atirada, mas, também, pelo o que eu lembro não conseguia nem ficar de pé direito noite passada. Será que eu usei camisinha?

— Puta que pariu.

Começo a procurar pelo quarto e a encontro jogada no chão, ao lado da cama, na direção em que a loira está deitada. Menos mal, mesmo bêbado fui responsável. Lembro que a loira safada pegou no meu pau, que ficou animado, e me trouxe a esse lugar que parece ser sua casa. Visto minha roupa e espero um pouco para ver se ela acorda, não vou ser indelicado de ir embora sem falar com a mulher. Meu irmão diz que isso é coisa de mulherzinha, eu chamo de respeito.

Essa mulher deve ser maluca, trouxe um desconhecido para sua casa. Se eu fosse um bandido, psicopata ou estuprador? Essa porra pensou só com a boceta ou ela realmente achou que eu fosse a porra desse ator?

— Bom dia, gato.

— Bom dia. Estou de saída, estava esperando você acordar.

— Além de gato, é gentil — diz, sorrindo um pouco sem jeito.

— Sabe me dizer como viemos parar aqui? Eu quero saber do meu carro.

— Está estacionado em frente à minha porta. Estamos na minha casa, você não tinha condições de dirigir. Eu também não, mas estava melhor do que você. — Ela sorri. — Então eu vim dirigindo. A chave está na mesinha perto da porta.

— Obrigado.

— Obrigada você, pelos orgasmos. Você é muito quente, queria repetir. Se bêbado me fez gozar duas vezes, fico imaginando sóbrio.

— Sinto muito, mas eu não costumo agir assim, beber além da conta e transar com uma mulher que eu nem sei o nome. De qualquer forma, amanhã estarei viajando e não sei se volto. — Agradeço novamente e dou um beijo na testa dela antes de sair.

Alguma coisa me diz que minha vida nunca mais será a mesma depois que eu colocar meus pés em solo brasileiro.

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