Eu não conseguia parar de pensar na cena que tinha acabado de presenciar. Quanto mais eu lembrava, mais eu sentia meu sangue ferver. O som das risadas abafadas, o cheiro barato do perfume daquela enfermeira, a expressão irritada do Carlos, como se eu fosse a errada da história e a cara de pau dele de dizer na minha cara que eu estava ficando “velha” e que era por isso, que ele estava me traindo com uma enfermeira que mais parecia uma ninfeta.
Meu coração martelava no peito, e minha cabeça latejava. Eu precisava fazer alguma coisa. Eu precisava esquecer e por mais que Clara tivesse dito que viria me buscar, eu não queria falar com ninguém. Não agora.
E se existia um jeito infalível de esquecer uma merda de traição e uma demissão no mesmo dia, esse jeito envolvia muito, mas muito álcool, então, me levantei da droga do banco, peguei minhas chaves e dirigi para longe daquela porcaria de hospital.
Girei e girei pelas ruas da Itália até finalmente encontrar um bar que fosse desconhecido para mim, o que queria dizer que também era desconhecido pelas pessoas com quem eu convivia e principalmente… por Carlos.
Entrei no bar. Era um daqueles lugares pequenos, com luzes baixas e cheiro de cigarro misturado com bebida cara. Perfeito. Era o que eu precisava. Me sentei no balcão e pedi um whisky duplo, sem gelo. O barman me lançou um olhar curioso, mas não disse nada. Eu não queria conversa, então para mim, isso era perfeito. Eu queria beber até esquecer o nome daquele desgraçado e principalmente, que eu tinha dedicado grande parte da minha vida, a ele e a um relacionamento fracassado.
O primeiro gole queimou minha garganta, mas eu não parei. O segundo desceu mais fácil. O terceiro começou a esquentar meu corpo. E quando cheguei no quinto, já sentia aquele torpor agradável me envolver.
— Bebendo sozinha? — Uma voz masculina interrompeu meus devaneios.
Olhei para o lado e vi um homem. Não um homem qualquer. Ele era jovem, muito jovem. Talvez uns 24 ou 25 anos? Alto, ombros largos, cabelo perfeitamente penteado para trás e um sorriso de quem jurava que sabia exatamente o que estava fazendo. Um daqueles tipos que você olhava e já sabia que ele não prestava.
— E se eu estiver? O que você tem a ver com isso? — retruquei, sem paciência alguma para brincar com aquela criança que jurava que era um adultinho.
Ele riu, parecendo se divertir, e puxou a cadeira ao meu lado sem pedir permissão. Eu bufei.
— Meu nome é Aston. E o seu?
— O que te faz pensar que eu quero conversar com você, criança?
— Nada. Mas você está aqui, bebendo como se quisesse esquecer alguma coisa. E eu sou ótimo em ouvir e também… — eu senti seu olhar queimar sobre minha pele, — sou ótimo em ajudar as pessoas a esquecerem de coisas das quais não querem se lembrar.
Revirei os olhos. Era exatamente do que eu não precisava: um garotão convencido achando que podia me seduzir com duas frases bem montadas. O barman me serviu outro whisky duplo e o bonitinho não parecia disposto a desistir.
— Que original — murmurei, virando mais um gole, sem muita paciência a essa altura do campeonato.
— Sabe o que eu acho? — Ele ignorou minha ironia. — Acho que você teve um dia de merda. E também acho que já bebeu o suficiente para pelo menos considerar sair daqui comigo.
Eu ri. Não porque achei engraçado, mas porque o álcool estava fazendo efeito e a audácia dele era quase divertida.
— Quer saber? — Apoiei o cotovelo no balcão e encarei ele nos olhos. — Você tem cara de problema, criança.
— E você tem cara de quem precisa de um problema para te ajudar a se distrair.
Nossa, ele era bom. Arrogante, confiante, e completamente inconsequente. Mas depois da quinta dose de whisky, eu já tinha bebido demais para me importar. O que eu tinha a perder? Meu emprego já foi para o ralo. Meu relacionamento, também. Minha dignidade? Bom, essa estava por um fio desde o instante em que vi uma ninfeta fodendo com o meu ex-noivo em cima da mesa de mogno que eu mesma tinha comprado para ele de aniversário a 3 anos atrás.
Então eu fiz a única coisa que parecia fazer sentido naquele momento: puxei aquele garoto inconsequente pelo colarinho e beijei ele.
E para minha total surpresa… ele retribuiu.
O beijo não foi delicado, não foi romântico. Foi intenso, desesperado, cheio de desejo acumulado e raiva reprimida. As mãos dele seguraram minha cintura com firmeza, puxando-me mais para perto, enquanto minha cabeça girava—e eu não sabia se era pelo álcool ou pela forma como os lábios dele se moviam contra os meus.
Em algum momento, acabamos encostados em uma parede escura do bar, longe dos olhares curiosos. As mãos dele exploravam minhas costas, e as minhas seguravam os cabelos dele com força. Eu não sabia mais onde terminava o gosto do whisky e começava o gosto dele.
— Você beija bem para alguém que parecia tão resistente — ele murmurou contra minha boca, com aquele sorriso convencido.
— Cala a boca e continua — resmunguei, puxando-o para mais um beijo, meu ar parecia faltar a essa altura e eu vi ele sorrir antes de destrancar uma porta e me puxar com ele, parecia um quarto, talvez uma sala, quem sabe?
Eu não sabia o que diabos estava fazendo. Mas, eu não queria me importar, não dessa vez, não hoje.
Eu não me lembrava da última vez que tinha sentido aquele tipo de liberdade, aquela sensação de não precisar pensar em nada além do presente. Carlos estava longe, o hospital estava longe, e ali, naquela bolha de álcool e adrenalina, nada mais importava.
Havia uma boca quente descendo pelo meu pescoço, mãos fortes segurando meus quadris e eu sabia bem onde aquilo ia parar, — eu só não sabia, que aquela noite, aquela sensação e aquele par de olhos que não pareciam desfocar dos meus, mudariam completamente o meu futuro, meu mundo inteiro e tudo que eu considerava como certo até o presente momento.
O gosto do whisky ainda queimava na minha língua quando aquele garoto me empurrou contra a parede do pequeno quarto dos fundos do bar. O lugar era apertado, cheirava a madeira velha e álcool derramado, mas eu não estava me importando nem um pouco. Minha cabeça girava, e eu não sabia se era por causa do álcool ou da forma como as mãos dele deslizavam pelo meu corpo com tanta facilidade, como se já soubesse exatamente onde tocar.— Está com pressa? — provoquei, arfando, sentindo as mãos dele descerem pelas minhas coxas, puxando minha saia para cima.— Você não? — Ele sorriu, aquele maldito sorriso convencido que me fez querer socá-lo e beijá-lo ao mesmo tempo.Eu ri, mas o som virou um suspiro entrecortado quando ele segurou minha cintura e me ergueu. Em um segundo, minhas costas estavam pressionadas contra a porta e minhas pernas estavam enroscadas na cintura dele. A urgência nos nossos movimentos fazia tudo parecer ainda mais insano. Minha cabeça gritava que era loucura, mas meu corpo
A primeira coisa que eu senti ao acordar foi a dor de cabeça. Uma pontada latejante que parecia castigar cada canto do meu cérebro. A segunda coisa foi o peso de um braço desconhecido sobre a minha cintura.Abri os olhos devagar, piscando contra a claridade suave que entrava pela fresta da cortina. Meu corpo inteiro estava dolorido, mas não de um jeito ruim. Um jeito que denunciava exatamente o que aconteceu na noite passada e porra, era óbvio que tinha sido bom.E foi nesse momento que uma terceira coisa me atingiu em cheio.— Ah, merda... — murmurei, minha voz saindo rouca.Minha cabeça virou devagar, como se meu próprio corpo se recusasse a confirmar o que meu cérebro já sabia. Eu tinha feito uma merda sem tamanho.O ninfeto da noite anterior, um garoto que deveria ter no máximo, 27 anos , completamente nú, dormindo ao meu lado como se não tivesse um único problema na vida.A porra do ninfeto que eu jurei ignorar.Respirei fundo, tentando conter o desespero que começava a subir pel
Eu nasci um Beaumont e como tal, não estava acostumado a nada que não fosse, excelência. Mesmo assim, tinha dias que o sobrenome da família pesava e era por isso que aquele bar, existia. No começo era só uma brincadeira de adolescente. Um lugar para beber e relaxar, longe dos paparazzis ou do controle do meu pai. Mas agora? Depois de assumir a empresa da família e me tornar o responsável por tudo, era difícil manter aquele lugar funcionando.— Vai mesmo fechar? — Henry me perguntou com aquela expressão de incredulidade que deixava claro: ele considerava isso um completo absurdo. — Estou pensando. Nós dois sabemos que eu não vou ter tempo de vir aqui.— E? — Ele sorriu, — eu vou. Bufei.A ideia de manter o bar não era ruim, mas… um bar vinculado a família Beaumont? Era plausível quando o dono era o filho da família, um playboy irresponsável. Só que agora… com o meu pai morto, meu tio doente e a empresa no meu colo? O tempo de playboy tinha ido de ralo e eu tinha que me tornar o rost
Eu deveria estar presa.Não por assassinato – ainda – mas porque claramente era crime federal estar lidando com uma ressaca dessas e ainda precisar fingir que era um ser humano funcional.O que me levava à pergunta do dia: por que caralhos eu achei que beber até esquecer meu próprio nome era uma boa ideia?Suspirei, sentada no sofá da minha sala, afundada em um moletom velho que cheirava a café e desespero. Meu laptop estava aberto na mesa de centro, com uma tela em branco que me encarava de volta. O cursor piscava, como se estivesse julgando minhas escolhas de vida.Atualizar meu currículo. Esse era o plano.Porque se minha vida virou um desastre, eu pelo menos podia ser uma desempregada com um currículo impecável — que era algo que eu claramente tinha, afinal… além de ter trabalhado em um dos melhores hospitais, eu ainda consegui me tornar cirurgiã chefe daquele lugar (não que isso fosse algo tão surpreendente, já que Carlos, claramente não conseguia lidar com os meus cirurgiões).Ma
O bar estava vazio àquela hora da manhã. As luzes fracas iluminavam o balcão, refletindo nos copos que ainda estavam espalhados por ali, como lembranças da noite passada. Mas eu não estava pensando na noite passada. Eu estava pensando nela.Adeline Moretti.Meu maxilar travou ao lembrar do jeito como ela simplesmente sumiu, como se eu não fosse nada além de um passatempo para ela. O dinheiro que ela deixou para trás ainda queimava no meu bolso, um lembrete do descarte descarado. Eu queria jogá-lo fora, rasgá-lo, mas uma parte de mim sabia que aquele insulto precisava ser devolvido. Pessoalmente, ou pelo menos era a desculpa que eu vinha usando para me convencer de que eu não era só um maníaco, completamente obcecado pela mulher com quem dormiu na noite anterior.— Henry! — chamei, minha paciência se desfazendo em pedaços enquanto o desgraçado ria.Meu melhor amigo e gerente do bar apareceu no escritório, segurando uma pasta com algumas contas. Ele me olhou com aquela expressão de quem
Flores. Eu dei flores a ela e não sei exatamente o que diabos eu esperava com isso, mas com certeza não era ver um buquê de rosas vermelhas espalhadas pelo asfalto, especialmente amassadas no meio da calçada — junto a marcas de pneu de carro —, como eu mesmo pude presenciar.Eu tinha ficado ali embaixo, esperando pela chance de subir e resolver as coisas com ela, — uma esperança vaga, mas existente, — só que Adeline não parecia disposta a facilitar a minha vida.Adeline.Suspirei, encostando o ombro na parede do meu escritório depois de voltar para o trabalho. Aquela mulher tinha o dom de transformar tudo numa novela mexicana de quinta categoria. Drama por cima de drama, como se eu fosse algum vilão de filme barato.Só que eu já sabia que isso iria acontecer. Ela ia recusar as flores, ia xingar, ia bater o pé e dizer que não voltava nunca mais. Mas no fundo, ela sabia. No fundo, eu sabia.Ela ia voltar.Ela tinha que voltar.Peguei o celular e encarei a tela, sem desbloquear. O número
Eu estava sendo assombrada.Não por fantasmas, não por espíritos vingativos, nem por nenhuma alma penada.Eu estava sendo assombrada por entregas inesperadas de Carlos Ricci.E — Deus que me perdoe — se eu tivesse um lança-chamas, eu já teria dado um jeito nesse problema.— De novo? — resmunguei, encarando a campainha tocando pela terceira vez naquela manhã.Arrastei os pés até a porta, já me preparando mentalmente para qualquer nova aberração que aparecesse. Respirei fundo e abri, pronta para xingar qualquer infeliz que estivesse lá.O entregador, um rapaz de expressão cansada e camisa amassada, olhou para mim segurando outra m*****a caixa.— Mais uma entrega para a senhorita Adeline Moretti.Fechei os olhos.Eu não precisava perguntar. Eu já sabia.Carlos Ricci.O homem que aparentemente não entendia sinais, nem mesmo quando esses sinais envolviam eu jogar um buquê de rosas da varanda e ignorar cada uma de suas mensagens ou tentativas de falar comigo.— O que é dessa vez? — perguntei
Eu deveria parar.Sério.Se alguém me visse agora, acharia que eu era um psicopata completo.Porque, sinceramente, ficar olhando o perfil do LinkedIn de Adeline Moretti por mais de três minutos sem piscar definitivamente não era um comportamento normal.Fechei o notebook com força e esfreguei o rosto.— Isso tá indo longe demais.Mas antes que meu cérebro absorvesse essa informação, minha mão já estava abrindo o computador de novo .Só pra verificar uma última vez .Só pra ter certeza de que ela ainda não tinha aceitado nenhuma proposta nova .E lá estava. "Disponível para novas oportunidades."Eu deveria estar preocupado com o fato de que eu sabia essa frase de cor .Mas eu não tinha tempo para crises existenciais agora.Eu ainda era o CEO do Grupo Beaumont, mesmo que há pouco tempo, por conta da morte do meu pai, e tinha um bando de velhos chatos esperando para dizer pela milésima vez que eu não sabia o que estava fazendo.Ótimo.Exatamente o tipo de entretenimento que eu preciso pa