A primeira coisa que eu senti ao acordar foi a dor de cabeça. Uma pontada latejante que parecia castigar cada canto do meu cérebro. A segunda coisa foi o peso de um braço desconhecido sobre a minha cintura.
Abri os olhos devagar, piscando contra a claridade suave que entrava pela fresta da cortina. Meu corpo inteiro estava dolorido, mas não de um jeito ruim. Um jeito que denunciava exatamente o que aconteceu na noite passada e porra, era óbvio que tinha sido bom.
E foi nesse momento que uma terceira coisa me atingiu em cheio.
— Ah, merda... — murmurei, minha voz saindo rouca.
Minha cabeça virou devagar, como se meu próprio corpo se recusasse a confirmar o que meu cérebro já sabia. Eu tinha feito uma merda sem tamanho.
O ninfeto da noite anterior, um garoto que deveria ter no máximo, 27 anos , completamente nú, dormindo ao meu lado como se não tivesse um único problema na vida.
A porra do ninfeto que eu jurei ignorar.
Respirei fundo, tentando conter o desespero que começava a subir pela minha garganta. Meu Deus. O que foi que eu fiz? Eu passei a noite com um estranho. Eu dormi com um cara que eu conheci em um bar, um pirralho com um sorriso convencido e uma confiança absurda. E pior: foi bom. Muito bom.
— Droga, Adeline...
Me xinguei mentalmente e me sentei na cama com cuidado para não acordá-lo. Mas a verdade era que Aston dormia como uma pedra. Seu peito subia e descia em uma respiração profunda e ritmada, a bagunça dos lençóis denunciando a intensidade da noite passada, e claro, tinha as minhas roupas jogadas pelo chão.
Eu não podia ficar ali. Eu sabia disso.
Levantei-me em um salto, e foi quando percebi outro detalhe importante: eu também estava completamente nua e marcada.
— Puta que pariu.
Apressei-me a pegar minhas roupas espalhadas pelo chão, vestindo-as o mais rápido que consegui. Meu vestido estava amassado, minha calcinha tinha sumido e meu cabelo estava um desastre completo. Me olhei rapidamente no espelho do quarto de hotel. Jesus Cristo. Eu parecia uma mulher que teve a melhor noite de sexo da vida.
E isso era inadmissível.
Eu precisava sair dali. Rápido.
Meu olhar caiu sobre a carteira de Aston, jogada no criado-mudo ao lado da cama. Eu não sabia por quê, mas, em um impulso, peguei alguns dólares da minha bolsa e deixei ali, ao lado do telefone.
Eu sabia que era rude sair sem me despedir, mas… eu não tinha a menor cara de pau para encarar aquele garoto. Não. Então, fiz o melhor que eu pude.
"Talvez ele precise para um táxi, ou para um café da manhã... sei lá."
Era uma tentativa patética de justificar minha fuga, uma tentativa de me fazer me sentir melhor.
Peguei meus sapatos nas mãos e caminhei na ponta dos pés até a porta, abrindo-a devagar. O corredor do hotel estava silencioso, e eu aproveitei para sair sem fazer barulho. Assim que me vi do lado de fora, soltei o ar que nem sabia que estava prendendo.
Liberdade.
Ou algo perto disso.
Eu não parei de me xingar nem por um segundo desde que saí daquele quarto.
Minha mente rodava em um looping infinito de "que merda você fez, Adeline?" enquanto eu caminhava apressada pelas ruas, tentando chamar um carro de aplicativo pelo celular.
O problema é que minha consciência não ajudava. Porque toda vez que eu fechava os olhos, flashes da noite passada surgiam como um maldito filme provocante: o jeito que Aston me puxou para cima dele, a forma como as mãos dele seguraram minhas coxas, os gemidos abafados contra a minha pele...
— Ai, que ódio!
— Falando sozinha, moça? — O motorista perguntou, me olhando pelo retrovisor assim que o carro parou na minha frente.
Eu suspirei e entrei sem pensar muito.
— Sim. E sinceramente? Não é da sua conta.
Ele deu de ombros e voltou a focar na direção, enquanto eu me afundava no banco do carro, cruzando os braços.
Eu precisava esquecer essa noite. Esquecer o que aconteceu e seguir minha vida. Era só um erro, uma distração passageira.
Nada mais.
Assim que cheguei em casa, joguei minha bolsa no sofá e me joguei junto, soltando um longo suspiro.
Meu celular vibrou na mesa de centro. Olhei para a tela, e meu estômago se revirou.
Mensagem de: Clara
"Aonde você diabos você se meteu? Você sumiu! Eu estou preocupada! Me liga AGORA!"
Revirei os olhos. Claro que ela estava surtando. Peguei o celular e disquei seu número. Ela atendeu no primeiro toque.
— SUA DESGRAÇADA! — A voz dela ecoou pelo telefone. — Onde você está?! Eu cheguei no hospital e você tinha desaparecido! Me deixou falando sozinha!
— Tive que... sair.
— Sair?! Adeline, pelo amor de Deus! O que aconteceu?
Mordi o lábio, hesitante. Eu deveria contar? Era vergonhoso demais admitir que, depois de ser traída e largar meu emprego, eu simplesmente transei com um estranho.
— Eu... fui beber.
— Eu imaginei — ela bufou. — E?
— E... conheci um cara.
O silêncio do outro lado foi imediato.
— NÃO ACREDITO! — Ela gritou. — VOCÊ TRANSOU COM UM DESCONHECIDO?!
— Clara, pelo amor de Deus, abaixa a voz!
— Eu não acredito nisso! Quem é ele? Como ele é? Foi bom? VOCÊ ESTÁ BEM?!
Passei a mão pelo rosto, exausta.
— Sim, estou bem. Não sei por que fiz isso, mas já acabou. Não vou vê-lo de novo.
— Tem certeza?
— Claro. Foi só um lance de uma noite regada a álcool, francamente… não tenho idade pra perder tempo com ficante de bar.
— Hum... — Clara fez um barulho duvidoso. — Você já viu filme romântico o suficiente para saber que não é assim que as coisas funcionam.
— Minha vida não é um filme, Clara.
— Você diz isso agora...
Bufei.
— Vou desligar. Preciso dormir.
— Ok, ok. Mas se ele aparecer de novo, me liga. Quero todos os detalhes! E mesmo que ele não apareça, não fica sozinha. Sabe que eu te amo, me liga se precisar de mim.
Rolei os olhos e suspirei, — Eu sei amiga, pode deixar… eu ligo, mas agora… eu preciso descansar. Minha cabeça está me matando.
Ela bufou.
— Está bem. Descansa, bebe bastante água, eu te amo, Addy.
Sorri, um sorriso meio torto, mas o primeiro que era verdadeiro desde que me demiti e tive meu coração feito em pedaços.
— Eu também te amo.
Murmurei e sem pensar muito, desliguei.
Eu nasci um Beaumont e como tal, não estava acostumado a nada que não fosse, excelência. Mesmo assim, tinha dias que o sobrenome da família pesava e era por isso que aquele bar, existia. No começo era só uma brincadeira de adolescente. Um lugar para beber e relaxar, longe dos paparazzis ou do controle do meu pai. Mas agora? Depois de assumir a empresa da família e me tornar o responsável por tudo, era difícil manter aquele lugar funcionando.— Vai mesmo fechar? — Henry me perguntou com aquela expressão de incredulidade que deixava claro: ele considerava isso um completo absurdo. — Estou pensando. Nós dois sabemos que eu não vou ter tempo de vir aqui.— E? — Ele sorriu, — eu vou. Bufei.A ideia de manter o bar não era ruim, mas… um bar vinculado a família Beaumont? Era plausível quando o dono era o filho da família, um playboy irresponsável. Só que agora… com o meu pai morto, meu tio doente e a empresa no meu colo? O tempo de playboy tinha ido de ralo e eu tinha que me tornar o rost
Eu deveria estar presa.Não por assassinato – ainda – mas porque claramente era crime federal estar lidando com uma ressaca dessas e ainda precisar fingir que era um ser humano funcional.O que me levava à pergunta do dia: por que caralhos eu achei que beber até esquecer meu próprio nome era uma boa ideia?Suspirei, sentada no sofá da minha sala, afundada em um moletom velho que cheirava a café e desespero. Meu laptop estava aberto na mesa de centro, com uma tela em branco que me encarava de volta. O cursor piscava, como se estivesse julgando minhas escolhas de vida.Atualizar meu currículo. Esse era o plano.Porque se minha vida virou um desastre, eu pelo menos podia ser uma desempregada com um currículo impecável — que era algo que eu claramente tinha, afinal… além de ter trabalhado em um dos melhores hospitais, eu ainda consegui me tornar cirurgiã chefe daquele lugar (não que isso fosse algo tão surpreendente, já que Carlos, claramente não conseguia lidar com os meus cirurgiões).Ma
O bar estava vazio àquela hora da manhã. As luzes fracas iluminavam o balcão, refletindo nos copos que ainda estavam espalhados por ali, como lembranças da noite passada. Mas eu não estava pensando na noite passada. Eu estava pensando nela.Adeline Moretti.Meu maxilar travou ao lembrar do jeito como ela simplesmente sumiu, como se eu não fosse nada além de um passatempo para ela. O dinheiro que ela deixou para trás ainda queimava no meu bolso, um lembrete do descarte descarado. Eu queria jogá-lo fora, rasgá-lo, mas uma parte de mim sabia que aquele insulto precisava ser devolvido. Pessoalmente, ou pelo menos era a desculpa que eu vinha usando para me convencer de que eu não era só um maníaco, completamente obcecado pela mulher com quem dormiu na noite anterior.— Henry! — chamei, minha paciência se desfazendo em pedaços enquanto o desgraçado ria.Meu melhor amigo e gerente do bar apareceu no escritório, segurando uma pasta com algumas contas. Ele me olhou com aquela expressão de quem
Flores. Eu dei flores a ela e não sei exatamente o que diabos eu esperava com isso, mas com certeza não era ver um buquê de rosas vermelhas espalhadas pelo asfalto, especialmente amassadas no meio da calçada — junto a marcas de pneu de carro —, como eu mesmo pude presenciar.Eu tinha ficado ali embaixo, esperando pela chance de subir e resolver as coisas com ela, — uma esperança vaga, mas existente, — só que Adeline não parecia disposta a facilitar a minha vida.Adeline.Suspirei, encostando o ombro na parede do meu escritório depois de voltar para o trabalho. Aquela mulher tinha o dom de transformar tudo numa novela mexicana de quinta categoria. Drama por cima de drama, como se eu fosse algum vilão de filme barato.Só que eu já sabia que isso iria acontecer. Ela ia recusar as flores, ia xingar, ia bater o pé e dizer que não voltava nunca mais. Mas no fundo, ela sabia. No fundo, eu sabia.Ela ia voltar.Ela tinha que voltar.Peguei o celular e encarei a tela, sem desbloquear. O número
Eu estava sendo assombrada.Não por fantasmas, não por espíritos vingativos, nem por nenhuma alma penada.Eu estava sendo assombrada por entregas inesperadas de Carlos Ricci.E — Deus que me perdoe — se eu tivesse um lança-chamas, eu já teria dado um jeito nesse problema.— De novo? — resmunguei, encarando a campainha tocando pela terceira vez naquela manhã.Arrastei os pés até a porta, já me preparando mentalmente para qualquer nova aberração que aparecesse. Respirei fundo e abri, pronta para xingar qualquer infeliz que estivesse lá.O entregador, um rapaz de expressão cansada e camisa amassada, olhou para mim segurando outra m*****a caixa.— Mais uma entrega para a senhorita Adeline Moretti.Fechei os olhos.Eu não precisava perguntar. Eu já sabia.Carlos Ricci.O homem que aparentemente não entendia sinais, nem mesmo quando esses sinais envolviam eu jogar um buquê de rosas da varanda e ignorar cada uma de suas mensagens ou tentativas de falar comigo.— O que é dessa vez? — perguntei
Eu deveria parar.Sério.Se alguém me visse agora, acharia que eu era um psicopata completo.Porque, sinceramente, ficar olhando o perfil do LinkedIn de Adeline Moretti por mais de três minutos sem piscar definitivamente não era um comportamento normal.Fechei o notebook com força e esfreguei o rosto.— Isso tá indo longe demais.Mas antes que meu cérebro absorvesse essa informação, minha mão já estava abrindo o computador de novo .Só pra verificar uma última vez .Só pra ter certeza de que ela ainda não tinha aceitado nenhuma proposta nova .E lá estava. "Disponível para novas oportunidades."Eu deveria estar preocupado com o fato de que eu sabia essa frase de cor .Mas eu não tinha tempo para crises existenciais agora.Eu ainda era o CEO do Grupo Beaumont, mesmo que há pouco tempo, por conta da morte do meu pai, e tinha um bando de velhos chatos esperando para dizer pela milésima vez que eu não sabia o que estava fazendo.Ótimo.Exatamente o tipo de entretenimento que eu preciso pa
O interfone tocou pela quarta vez naquela manhã.Eu estava no meio de um café que finalmente não tinha gosto de ressentimento quando o som irritante interrompeu minha paz.Respirei fundo. Talvez, só talvez, fosse alguma coisa normal. Tipo um erro de correspondência. Ou um entregador na casa errada. Ou…— Entrega para a senhorita Adeline Moretti.Soltei um suspiro lento.O entregador já sabia. A voz dele tinha aquele tom de quem estava preparado para levar patadas, porque claramente eu já era uma lenda nos corredores das entregas indesejadas.— Por acaso essa entrega vem de um certo Carlos Ricci?O silêncio no outro lado da linha foi resposta suficiente.Apoiei a testa na palma da mão e tentei contar até dez antes de responder.Não adiantou.— Volte para a central e diga a eles para avisarem esse babaca que eu não quero mais nada dele.— Senhora, eu só faço entregas…— Ótimo. Então entregue esse recado.Soltei e simplesmente, desliguei. Eu sabia que o coitado do entregador não tinha cu
O barulho do relógio na parede estava me irritando depois da minha tentativa de manipular Adeline por meio do meu irmão, — falhou, — e claro que nada disso melhorava, quando o velhote do Louis, não saia do meu pé.Tic. Tac. Tic. Tac. Como uma maldita contagem regressiva para o inferno.Meus dedos tamborilavam contra a mesa de mogno do meu escritório, a perna inquieta batendo no chão enquanto minha paciência se esgotava. Eu já sabia que essa conversa viria, já sabia que Nicolas Louis ia querer ter um tête-à-tête comigo depois de tudo que aconteceu. Mas o fato de saber não tornava nada mais fácil.Eu tinha controlado os boatos! Eu tinha feito de tudo para aquele velho maldito não descobrir que eu estava enrolando a filha dele e fodendo com a médica que trouxe renome pro hospital.Adeline era uma fase, claro e no fim, Amanda era com quem eu pretendia me casar, — mas nem Nicolas e nem Adeline, precisavam saber disso.— O doutor Nicolas está esperando o senhor — Ana, minha secretária, me d