Capítulo I - Parte 2

Charlotte caminhou até o pavilhão aberto, acompanhada por Effie e Nimue, mas ambas pararam antes que Charlotte cruzasse o arco de pedra que ligava o corredor ao pátio.

— Deixem-me a sós. Esperem por mim aqui.

— Sim vossa alteza — Ambas se dirigiram ao outro canto do corredor.

Livre de suas damas, Charlotte caminhou pelo gramado, indo em direção da silhueta ereta e rígida de seu amigo. Parece sério disse mentalmente. Diminuiu os passos e suspirou enquanto fitava seus ombros.

— Algo o incomoda e pelo que posso imaginar é sério. Vamos, me diga o que há com você...

— Por algum acaso adquiriu a habilidade de ler mentes?

— Algo como isso... Tenho lido pensamentos alheios por toda a manhã, é realmente fascinante.

— Engraçadinha! — disse ele sem qualquer tom de humor.

— Vamos Charles, me diga o que há com você, está me deixando ansiosa — Afirma seriamente.

— ...Recebi uma carta de vossa majestade a rainha Mary. O rei piorou no dia em que saímos de Edimburgo e...

— O que? — Seu sorriso some dos lábios.

— Ele não estava passando bem e mesmo com a sangria os médicos não conseguiram bons resultados — Sua voz engasgou logo ao fim da frase.

— Meu pai está bem? Ele está, certo? — Charlotte cerrou o punho, sentindo como se uma barra de ferro quente perfurasse sua garganta.

Charles a encarou em silêncio por longos segundos. Charlotte ouvira a confirmação de seus medos ecoarem claramente daquele longo silencio, mas sua mente recusou-se a crer nas absurdas suposições que passavam por sua cabeça. Charles sentia receio, afinal, para ela, ele era apenas seu pai e ele sabia que aquilo a destruiria por dentro. Ele engoliu em seco e sentiu cada centímetro de seu corpo tremer diante do inevitável.

— Diga de uma vez!

— Vossa majestade, o rei Thomas, faleceu no dia seguinte a nossa partida. Agora vossa alteza a rainha-mãe Mary é a regente da Escócia ao lado do seu irmão bastardo, James Stuart.

Charlotte tropeçou em seus próprios passos enquanto se afastava de Charles, a expressão de choque e uma tremedeira evidente preocupavam Charles, que tentava alcançá-la na intenção de acalmá-la. Sem êxito. Charlotte deixou-se cair e ficou sentada sobre a grama sem qualquer sinal de vida em seus olhos. "É mentira, com certeza eles se enganaram, não é verdade!" repetia para si mesma incessantemente. Sentia raiva de Charles por inventar uma mentira tão grave e torturá-la. Como ele podia? Ele sabia o quanto ela amava o pai, o quanto era apegada a ele e que essa notícia acabaria com ela. Perder a chance de dizer-lhe adeus, não poder estar ao seu lado e dizer-lhe uma última vez o quanto o amava. Por que ele fez isso?

— Afaste-se de mim, por favor!

— Charlotte, me escuta, entendo que esteja apavorada, mas você precisa se recompor, todos estão a observando. — Charles estendeu os braços, oferecendo-lhe apoio.

— EU DISSE PARA SE AFASTAR DE MIM! — Ela empurrou seu corpo com ignorância — Saia daqui! Não me importo que me vejam, me deixe sozinha! — O grito histérico foi ouvido por todos os servos e nobres que passavam.

— Certo. Sinto muito Charlie, eu realmente sinto muito. Você sabe que estou a seu lado, quando estiver mais calma virei até você... Tome a carta de sua mãe... Sinto muito.

Charles colocou a carta sobre seus punhos cerrados e se afastou.

Tampouco se anunciou à princesa da morte de seu pai e todos os nobres do salão da corte já começavam a fofocar sobre o assunto. Um auxiliar de jardineiro que cortava pequenas folhas dos arbustos próximos do pátio central, ouviu a conversa entre a jovem monarca e o nobre, assim como os servos que passaram longos minutos observando-a transtornada no gramado, até ser retirada com a ajuda de suas damas. A fofoca se espalhou, mas ao invés de causar comoção, trouxe mais e mais interesse sobre o único assunto ao qual a corte se interessava; Poder. Todos passaram a comentar sobre quando seria a coroação da futura rainha da Escócia e quando seria o dia em que ela por fim se casaria com o príncipe.

Uma lady da corte, filha do marquês de Bristol, acompanhada de sua dama, foi de encontro à rainha Caterina que se encontrava na antecâmara de seu apartamento com o rei, na ala sul do palácio. Caminhou pelo extenso corredor, cruzou alguns salões, mas por fim, alcançou o salão do Éden, de onde a porta larga para a antecâmara se encontrava fechada. À entrada, um guarda abre a caminho para a jovem moça que já conhecia bem cada pequeno espaço daquele cômodo.

— Lady Brandon, a que devo sua presença? — questiona Caterina sem quaisquer emoção.

— Trago notícias à vossa majestade. — Harriet para poucos metros à frente da porta, esperando reações da rainha.

— Vá em frente.

Caterina que estava sentada no sofá, correndo os olhos pelas folhas amareladas de seu livro, aguardou a jovem lady se sentar no sofá a sua frente, antes de fechar a brochura e entregá-la à sua dama de companhia.

— Vamos menina, não me aborreças com esse suspense.

— Sua alteza, princesa Charlotte, acaba de se tornar rainha. Seu pai, o rei Thomas, morreu há poucos dias. Todos souberam agora, graças ao mensageiro real, ele trouxe cartas para a princesa e o rei. — A empolgação na voz da garota não passou desapercebido pelos ouvidos da rainha.

— E onde está a princesa neste momento? — Caterina ajusta a postura, suspirando profundamente, enquanto encara a garota com calmaria.

— Ouvi dos servos que a princesa, digo, a rainha Charlotte, estava caída no jardim do pavilhão aberto, aos prantos, completamente transtornada.

— Então ela se prestou à tal vexame? Bom. Que seja, vá e preste suas condolências à nova rainha, trate de ser gentil com ela, afinal, ela será a sua futura governante. Pode ir.

Ela sacode a ponta dos dedos, enxotando a jovem do recinto. Em seguida, sua dama à acompanha até a saída, retornando após fechar as portas. Caterina deu as costas e começou a fitar o recinto vazio a sua frente. Um sorriso sutil delineando seus lábios. Repousou as mãos juntas sobre a saia de seu vestido e continuou a fitar o nada como se presenciasse uma cena cativante.

— Então agora ela é rainha? Bom, veremos quanto tempo demorará até que George comece a preparar o casamento... Bess, sugiro que comece a polir minhas tiaras, teremos eventos interessantes pela frente.

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