"...Sim, aquilo tudo assustou-me muito, o olhar frio dele sobre meu corpo. O que há de errado com ele? Seria possível que ele havia se tornado um homem sem coração? Teria eu um destino tão triste? Meu peito aperta com este simples pensamento. Estar fadada a casar com um homem frio e sem alma como meu pai, é meu pior pesadelo. Felizmente nem todos mantiveram um olhar tão pesado e sem vida quanto o dele. Vossa majestade, o rei George, recebeu-me com aquele sorriso simples e forçado, mas que ainda assim, foi uma receptiva demonstração de hospitalidade de sua parte. Realmente espero, com esmero, que todo meu tempo na corte se resuma a momentos calmos e agradáveis, mas, algo em meu âmago me alerta, com fervor, que esta será uma fase conturbada da minha vida." — Charlotte, 04 de março de 1648.
A porta do quarto se abriu, e o som dos passos invadindo o recinto, ecoaram pelo quarto da princesa da Escócia. Seu corpo, ainda quente sob as colchas, mantinham-na em um estado de tranquilidade e conforto, ao qual ela detestaria ser privada. No entanto, suas damas pareciam pouco se importar com seus desejos. As cortinas da cama foram abertas, permitindo que a luz do dia lhe tocasse o rosto. Foi o suficiente para ela sentir-se ser arrancada de seus sonhos de imediato.
— Vossa alteza precisa se levantar.
— Vamos alteza, já passou da hora de seu desjejum — disse Effie após Nimue.
— Alteza? — Nimue toca seus ombros.
Charlotte detestava ser acordada, no entanto, um aperto em seu peito a tomou o ar, fazendo-a se levantar rapidamente. Em sua cabeça, vossa alteza recitava diversas vezes a si mesma as regras e lições de sua mãe, a rainha "Não seja preguiçosa ou descuidada, erga-se e mostre quem é você, uma princesa e futura rainha". Mary, como na maioria das vezes, estava certa. Charlotte bocejou enquanto seu corpo, ainda cansado, reluzia sob a luz que invadia pelas janelas. Effie então a cobriu com uma capa de seda em cor azul claro, antes mesmo que sua senhora se removesse das colchas amassadas.
— Traga-me o vestido preto e dourado — resmungou Charlotte ainda rouca.
— Vossa alteza deseja comer seu desjejum em seu quarto? — questiona Nimue, carregando com cuidado o vestido bordado.
— Não, vou comer no salão da corte. Effie, peça que preparem suco de laranja e mel.
— Sim, minha senhora.
A porta do quarto retornou a se abrir e logo em seguida fechou-se se retornando o silêncio. Nimue arrumava sua alteza com paciência e dedicação, os dedos deslizando pelas madeixas castanho escuro brilhantes, o cheiro de erva doce e lavanda ainda permeando os fios longos, fazia com que a dama sorrisse satisfeita. À frente da princesa um enorme espelho lhe refletia perfeitamente, mostrando que seu rosto estava mais pálido que o de costume. Ela sabia que a causa disso era o excesso de tempo em que se manteve distante do sol. Felizmente a enorme quantidade de luz natural que irrompia pelas portas e janelas dos seus aposentos lhe deixavam imensamente satisfeitas, muito melhor que o seu outro apartamento, localizado no início da ala leste do palácio.
O apartamento em que estava instalada era o seu principal, o que ficava durante todo o outono, primavera e verão, mudando-se para o apartamento na ala leste somente quando era inverno. Neste apartamento ela podia aproveitar o ar fresco, o grande espaço e a bela vista que tinha dos jardins atrás do palácio. Sentia-se mais feliz quando se sentava em frente à sua penteadeira para se arrumar, afinal, podia aproveitar os primeiros raios de sol do dia e observar os campos verdes e distantes, sem se preocupar com mais nada além daquela beleza que não havia mudado após tantos anos.
— Seus cabelos ainda permanecem com o perfume do banho antecessor a sua chegada, vossa alteza. Devo continuar com a mesma mistura?
— Sim, ela me agrada muito — respondeu após ponderar.
— Este? — Demonstrou o colar de safiras amarelas em cascata prateada.
— Perfeito. Ponha-me o bracelete que ganhei de minha mãe.
Nimue tinha olhos pequenos e cabelos encaracolados e de um loiro médio que caiam sobre seus ombros com graça. Ela sempre era muito vaidosa e cuidadosa e por isso era a que sempre arrumava Charlotte pela manhã. Depois de colocar os adornos e roupa, ela passava-lhe a maquiagem e essências florais para que ficasse perfumada e com o frescor da primavera em sua pele.
Terminado a arrumação, Charlotte e sua dama saíram em direção ao salão da corte na ala central do palácio, onde faria seu desjejum. Para isso ambas cruzaram salões, pavilhões e corredores extensos que ligavam uma ala à outra. Os passos lentos de Nimue, fizeram-na ficar alguns poucos metros atrás de Charlotte, que guiava o caminho com serenidade. Ela conhecia aqueles corredores, permaneceram os mesmos desde sua última visita aos 16 anos de idade, quando viera passar os dias do Natal ao lado da família real inglesa. As mesmas tapeçarias e quadros adornando os corredores, extensos e grandiosos, do palácio de Hinxstone. Tudo fazia com que ela se sentisse pequena, mas seu encantamento permanecia igual. Os nobres e servos com quem cruzava pareciam encantados consigo, era quase impossível não notar os olhares grudados a si. Os cochichos despreocupados eram completamente ignorados pela princesa escocesa, que mantinha os passos moderados em direção ao salão.
— Sua alteza a princesa Charlotte da Escócia — exclamou.
O silêncio tomou conta do local quando notaram a figura da morena, parada sob o arco da porta. Effie, que já estava no salão havia minutos, permanecia de pé ao lado de uma mesa repleta de doces, pães, frutas e bebidas, rodeada por almofadas grossas e largas, de seda e linho, com o bordado chamativo. Charlotte caminhou em direção à serva, ignorando os olhares penetrantes dos nobres que a cercava. Suspirou. Sentou-se após encarar a almofada como se avaliasse a melhor posição para se acomodar.
— Aqui alteza, pequenas tortas de morango com creme e suco de laranja e mel.
— Obrigada, Effie — O sorriso doce e singelo de Charlotte se estendeu à Nimue — Sente-se, por favor, comam comigo. Vocês são minhas amigas afinal de contas.
— Obrigada alteza. Como foi sua noite de sono? — questiona Nimue agarrando um pedaço de pão de frutas.
— Muito agradável, finalmente uma cama de verdade. Não suportava mais as acomodações da viajem.
— Tão pouco eu. Minha cama parecia nuvem, dormi como um urso — Sorriu Effie bebericando do suco de pêssego.
— Hoje pretendo passar o dia descansando nos terrenos. O clima está deveras agradável para se passar presa ao palácio — disse Charlotte com um sorriso entusiasmado.
Seu corpo parecia tão relaxado quando sua expressão. Os nobres a encaravam incessantemente, mas ela pouco se importava em ser observada. Um dos nobres se ergue e caminha até elas cautelosamente. Effie que estava à frente de sua senhora, observou a aproximação e lançou um olhar indagador ao homem de meia-idade, que encarava Charlotte pelas costas. O homem desviou o sorriso misterioso para Effie, mantendo o silêncio por segundos, até ser notado pela princesa.
— Perdão se as incomodo, vossa alteza. Sou Herbert Scott Callow, Conde Waldegrave. Soube de sua chegada pela tarde de ontem e quis vir dar as boas-vindas e dizer que fico honrado em ter sua presença em nossa corte, é uma honra conhecê-la. Espero que faça uma longa estadia e que eu possa ter a oportunidade de lhe convidar para um passeio... claro, se assim desejar.
— Agradeço a gentileza, adorarei conhecer o senhor em um momento oportuno, Conde Waldegrave.
— Por oportuno, sua alteza quer dizer, não tão cedo — A voz grossa e imponente irrompe a calmaria.
— Príncipe Henry, que agradável sua inesperada presença — diz Charlotte desviando o olhar do conde que se afasta desconcertado.
— Vim com intenção de cumprimentar minha querida noiva em seu desjejum, espero não estar a incomodando. — Ele sorri com ironia.
— Suas palavras soam como se realmente houvesse preocupação em você, isso me surpreende. — Charlotte desvia o olhar por um instante, com um leve suspirar.
As servas se levantaram e Effie desviou seu olhar encantado de Henry para despedir-se de sua senhora, antes que saísse do salão ao lado de Nimue, que por sua vez, parecia deveras incomodada com a atitude do príncipe. Henry ignorou as damas de companhia e sentou-se à frente de Charlotte sem qualquer preocupação, com tamanha naturalidade que seria mais que adequado dizer que ambos nutriam intimidade e amor um pelo outro.
— Espero que tenha tido uma boa noite de descanso. Suas acomodações a agradam? Posso providenciar algo se assim desejar.
— Não, obrigada pelo cuidado, tudo tem me agradado até agora. — Ela encarou seus olhos com intensidade.
— Meu pai deseja que te convide a um passeio ao entardecer, entretanto, acredito que esta deva ser uma escolha sua, então diga-me quando desejar um tempo. — Seu sorriso era doce, no entanto, ela sentiu amargor em sua boca.
— Obrigada, pedirei que chamem por você quando eu quiser um passeio a cavalo.
— Você ainda cavalga? Pensei que havia desistido desde o último natal. — Um sorriso provocador surge dos lábios de Henry.
— A equitação ainda é algo que pratico regularmente, não é uma queda trivial que me fará desistir. — Charlotte esconde seu incomodo por trás da xícara decorada.
— Fico feliz por você, não deixar que os fracassos do passado a dominem é uma qualidade que aprecio em você, Charlie.
Charlotte recusou-se a respondê-lo. Não se surpreendia com as provocações de Henry, mas confessava não estar esperando tal atitude logo pela manhã. Havia tempo que não se falavam e começava a se questionar o quanto ele havia mudado, ou, a que ponto da vida ele deixou de se importar com a etiqueta básica das regras sociais que todo monarca aprende logo quando nasce. Talvez não fosse mais o Henry ao qual se lembrava.
— Desde que tinha seis anos continuo a ser provocada por você. Pergunto-me se ainda é um hobby seu me tirar do sério. — Comeu uvas enquanto o encarava.
— Acontece que é divertido ver seu rosto ficar vermelho sempre que a irrito. O que posso fazer se você fica linda desta forma?
Charlotte sentiu suas bochechas corarem, ao mesmo passo em que tossiu desconcertada. Bebericou um pouco do suco, antes de encará-lo com frieza.
— Sempre me surpreendendo de alguma forma. Vejo que os comentários sobre você afinal de contas era verídico. Um verdadeiro galanteador! — diz Charlotte, com tom de desapontamento na voz.
— Que bom que te encanto, minha adorada noiva. Continuarei a te cortejar mais tarde, por agora devo retornar a meus deveres. Tenha um bom desjejum.
Ele sorri antes de se levantar. Curva seu rosto e sai do recinto sem interrupções dos nobres, que observavam os dois incessantemente. Charlotte, ainda entorpecida, encara os ladrilhos de pedra da parede distante, enquanto bebe do suco. Secou os lábios com o lenço e levantou-se poucos segundos depois, serenamente como se não houvesse pressa. Estava absorta em seus pensamentos enquanto caminhava pelo salão. Talvez fosse impressão sua e Henry estivesse apenas seguindo as ordens do pai, ainda assim, seu cumprimento repentino a deixou desconfortável, mesmo que mexida por seu charme. Não parecia o mesmo Henry com o qual implicava e era ignorada quando corriam pelos corredores da corte. Henry nunca a cortejou ou demonstrou afeto, preferia por vezes se perder nos beijos com alguma nobre magricela e abusada pelos corredores. Por diversas vezes, Charlotte, relembrou os desconfortos que passava ao ser encarada e provocada pelas jovens que passavam pelos braços de seu noivo. Sempre detestou este habito em Henry, mas nunca se opôs, já que cedo ou tarde estaria distante o suficiente para não ter de lidar com isso. Porém, agora rezava para que o príncipe tenha acumulado sabedoria o suficiente, para não lhe causar novos aborrecimentos.
Cruzou a porta a direita, entrando na sala do trono onde nobres em grupos espalhados conversavam em tranquilidade. Charlotte manteve o sorriso curto em seus lábios enquanto caminhava em direção ao rei George, que estava entretido em uma conversa com um dos nobres de sua corte. "Como envelheceu" pensou, ao encarar as feições cansadas do rei. Lembrava-se de seus cabelos ainda completamente negros desde sua última visita, o sorriso vivaz ainda claro em sua memória, fazia Charlotte lamentar. "Talvez esteja doente? Ou os dias não estejam sendo fáceis?" os pensamentos lhe encheram a cabeça. Fato era que sua idade já estava deveras aparente, não só para ela, como para todos da corte, que o rodeavam esperando obter os últimos benefícios de sua majestade bater as botas.
— Vossa majestade, teve um bom descanso? Parece feliz, se me permite a observação — disse ela, erguendo-se da reverência.
— Princesa Charlotte, que bom finalmente vê-la. Este é o Duque de Cumberland... Duque, esta é a Princesa Charlotte da Escócia, como já deve saber.
— Fico honrado em conhecê-la, vossa alteza. — Ele lhe faz uma breve reverência.
— Posso dizer o mesmo, duque. Espero não estar interrompendo uma conversa importante, estava ansiosa para cumprimentar vossa majestade, considerando quão cansativa foi minha chegada, não tive tempo de fazer cumprimentos adequados, peço desculpas por isso.
— Para que tantas formalidades? Acredito que nos conheçamos a tempo suficiente para ignorar estes protocolos. Tenho-a como uma filha, sabe disso. — Seu sorriso contagia Charlotte.
— É encantador quão educada é vossa alteza. — O duque encara Charlotte da barra do vestido à tiara.
— Realmente é, não é mesmo, duque? Verdadeiramente fui abençoado por Deus com uma futura nora tão esplêndida.
Charlotte pôde apenas sorrir falsamente com a demonstração exagerada de afeto partindo do rei. Sabia que, no fundo este amor era pela França e Escócia, as únicas qualidades que ele podia enxergar nela. Charlotte se questionava se era sábio se aliar a um rei tão ganancioso. Quão vulnerável ficaria perante a um rei tão ambicioso e calculista?
— Vossa majestade me lisonjeia. Como retribuição a tamanho afeto trouxe-lhe um pequeno presente, espero realmente que goste — Encarou uma de suas servas, do outro lado do salão, que saiu em silêncio, retornando em seguida com uma grande caixa em mãos.
Effie se aproximou, estendendo o presente à Charlotte. A princesa abriu o embrulho e dele removeu uma grande capa feita com os mais finos e ricos tecidos franceses, adornado com uma gola grossa de pelos de urso.
— Produzido na Escócia com os melhores tecidos da França e com o pelo de urso ao qual meu pai caçou no último outono. Espero que o agrade — disse antes que a serva levasse a caixa aberta até o George.
— Realmente uma peça impressionante. Vossa majestade é abençoada, tendo uma futura nora tão atenciosa — expressa o duque com os olhos vidrados na peça.
— Sim, um belo presente. Seu pai sempre me surpreendeu como um ótimo caçador. Fico lisonjeado em receber algo tão precioso de sua parte — Ele devolveu a peça à caixa ordenando que seu criado o levasse — Aliás, como anda a saúde de seu pai? Não tive mais notícias desde a última carta no mês passado.
— Continua com a saúde frágil, no entanto, minha mãe como regente tem mantido os problemas distantes de sua vista, além de ser uma ótima governante. Isto tem feito bem a meu pai — O sorriso forçado em seus lábios denotava a preocupação reprimida ao lembrar da situação do pai.
— Rezo a Deus que sua recuperação seja breve, ele sempre foi um rei que admiro, não só como monarca, mas como amigo de longa data.
— Desejo a mais breve recuperação de vossa majestade, o rei da Escócia — diz o duque.
— Agradeço a preocupação. Meu pai é um homem forte e não vai se deixar abater por tal infelicidade. — Ela tentou transparecer confiança, mantendo um sorriso firme nos lábios.
— Alteza, o duque de Montrose acaba de chamá-la. Ele a espera no pátio central — Nimue sussurra.
— Se me permitem. Vossa majestade, duque — Curvou levemente a cabeça antes de se retirar.
Charlotte saiu da sala do trono em passos moderados. "Sempre em momentos bem oportunos" sorriu com o pensamento. Todavia, ela não pode conter o pensamento... afinal, o que ele tanto queria para chama-la quando mal haviam chegado?
Charlotte caminhou até o pavilhão aberto, acompanhada por Effie e Nimue, mas ambas pararam antes que Charlotte cruzasse o arco de pedra que ligava o corredor ao pátio. — Deixem-me a sós. Esperem por mim aqui. — Sim vossa alteza — Ambas se dirigiram ao outro canto do corredor. Livre de suas damas, Charlotte caminhou pelo gramado, indo em direção da silhueta ereta e rígida de seu amigo.Parece sériodisse mentalmente. Diminuiu os passos e suspirou enquanto fitava seus ombros. — Algo o incomoda e pelo que posso imaginar é sério. Vamos, me diga o que há com você... — Por algum acaso adquiriu a habilidade de ler mentes?
"Peço que me perdoe por me despedir de tal forma minha filha, nunca fui um pai muito carinhoso e hoje vejo que esse é um dos meus maiores arrependimentos. Eu devia ter lhe abraçado mais, lhe beijado mais vezes depois de ler uma história para você dormir, dito que lhe amava todos os dias. Eu falhei, como marido e como pai, por isso peço que me perdoe. Sei que tal mensagem não deveria ser dita em uma carta como esta, no entanto, o tempo não me permitiu ter a chance de ver seu rosto pela última vez. Rezo que um dia me absolva por todos os meus erros, tais atos que fiz num momento de falho julgamento. Apesar de tudo, você minha filha, se tornou uma grande mulher e sei que se tornará uma grande e poderosa monarca, lamento que, no entanto, eu não esteja presente para vê-la neste dia. Seja sábia, paciente e gentil! Lembre-se que o seu dever é para com o povo, não para consigo mesma! Seja imparcial, paciente e justa, o seu povo só pode contar
Simon parecia ter caminhado por toda a Inglaterra. Seus olhos totalmente inchados e sua postura relaxada deixavam seu semblante cansado totalmente deplorável. Observou a porta velha de madeira, enquanto batia com dificuldade. — Vamos Robbie, eu voltei! Senhora Jones, obrigada por cuidar dele! — Simon, ainda sentindo seu corpo mais pesado que o normal encara a porta se abrir enquanto ele fala. — Simon, você a encontrou? — Os olhos castanhos de Robbie pareciam mais melancólicos do que no dia anterior, quando foi deixado pelo irmão mais velho. — Não Robbie, sinto muito, mas logo vamos encontrá-la, certo? Eu te prometo! — Tudo bem. — Robbie sorri sem emoção. Quando retornam para cas
Na manhã seguinte, Simon estava deveras incomodado com aquele diário. Havia passado desde o amanhecer lendo e relendo seus trechos, organizando informações em sua cabeça e decorando maneiras de falar. Ele havia se convencido de que, cedo ou tarde, ele teria de voltar às farsas para sobreviver. Simon começara com estes trabalhos de farsante desde a morte dos pais, há dois anos, quando ficou sem dinheiro e sem meios de sustentar seus irmãos. Seu amigo, Jared, que havia crescido a seu lado, o convenceu de que esta poderia ser uma maneira simples de conseguir dinheiro suficiente para comprar comida para os irmãos, sem ter que abandonar a única casa que eles tinham em toda Londres. Simon, mesmo incomodado com a ideia da mentira, entendeu que nada era simples e que seria aquilo, ou se matar de trabalhar na lavoura ou lojas para ganhar o dinheiro suficiente para comprar apenas um pedaço de pão. Ele não podia deixar seu irmão morrer. Aprendeu a l
"...Ele é diferente do que esperava. Quando o conheci, naquela manhã, pude perceber que ele não me olhava com cuidado, ele quase despiu-me com os olhos, nunca me senti tão invadida com o olhar de alguém... Nem pelo de Henry. Talvez seja apenas um devaneio meu, ou uma sensação longa e aguda de solida que me faz sentir atraída por todos. Por que fiquei tão mexida com o olhar daquele homem? Mas por que me importar? Por que é tão errado que eu me sinta bem e queira ser desejada e olhada daquela forma? Porque somente Henry tem o direito de me humilhar e me fazer sentir horrível, beijando cada moça que cruza seu caminho e bem na minha frente! Apenas por que sou uma mulher? Nem mesmo o título de rainha me garante liberdade?... Pai, sinto-me frustrada."— Charlotte, março de 1648. Henry adentrou o salão de guerra, após dispensar os guardas que ladeavam a porta. O salão de guerra e
Henry deixou a sala poucos minutos após a saída do pai. Seu destino seguinte: encontrar-se com Jacob Somerset. Sabia que provavelmente o encontraria em algum canto do palácio bebendo ou com alguma mulher. Somerset deleitava de seu tempo sozinho, o que geravam fofocas de que ele era uma pessoa estranha, que não gostava das mulheres e que era uma pessoa perigosa. No fim das contas, os boatos provaram-se verdadeiros, exceto pelo não gostar de mulheres, pelo contrário, gostava tanto de mulheres, quanto de homens. Era um sir, ou senhor como é mais frequentemente usado, desta forma, Jacob Somerset é um nobre, mas seu título tão baixo não o faz tem tamanho prestígio para que os nobres o respeitem, além do mais, suas riquezas são quase nulas, tendo somente poucas propriedades a qual se intitular dono. Seu único poder provem do título de amigo do príncipe e seu cão de caça. Por tal motivo, é plausível julgar-se que Sir Jacob não era uma pessoa com
Charlotte sabia que momentos como aquele eram raros, principalmente na corte inglesa, portanto aproveitava. Não poupou risadas ou gritos, enquanto seu cavalo corria desenfreado e alegre pelos campos ensolarados e vazios. Observou Charles metros atrás de si, com um sorriso emburrado delineando os lábios e olhos, tão castanhos e brilhantes, semicerrados. A mechas de seu cabelo castanho escuro decaindo sobre os olhos, totalmente bagunçados, após vários galopes nada gentis de seu cavalo. — Vá com calma, quer matar meu cavalo de cansaço?! — exclamou o homem. — Talvez devesse mudar de montaria, vejo que seu belo cavalo não serve nem para um singelo passeio! — Charlotte ri, berrando por cima do ombro. — Ora, mas quem será que está convencida? Ele está apenas indisposto, seu cavalo que é ab
Quando por fim chegaram ao quarto, Simon e Robert foram deixados a sós pelos guardas que saíram assim que acomodaram seus pertences no aposento. A pedido de Simon, Robert dormiria com ele, o que deixou o menino feliz, já que detestava a ideia de se afastar do irmão. Robert havia mudado muito depois da morte dos pais; não dormia sozinho, temia sempre que fosse deixado, o que se ampliou após o desaparecimento da irmã. Simon era o mais velho e desde muito jovem ajudava os pais a cuidar dos irmãos, forçando-o a trabalhar desde seus onze anos. Ele não reclamava. Simon sabia que fazia o certo e faria mais, se significasse trazer alegria a seus pais. No entanto, a repentina doença que os assolou trouxe ao rapaz uma carga de responsabilidade maior do que ele poderia suportar. Seu trabalho já não era o suficiente para ajudar os pais, que aos poucos foram ficando debilitados. Simon chegou a se privar de fome, para que não faltasse o pedaço de pão d