- Sempre fui uma menina normal. Quer dizer, quando eu era mais nova, eu gostava de brincar de barbie. Nessas histórias de barbie, eu sempre tinha um namorado, noivo ou marido, o Ken. Ele sempre foi um gentleman. Carinhoso, amoroso, fiel. Fiel... é. Fiel... fiel de verdade – disse Melissa, deitada no divã, com os longos cabelos cor de ouro espalhados por todo ele. – A vida era fácil. Era uma eterna lua de mel. Mas tem uma hora que a história muda. A eterna lua de mel acaba. Eu tinha mil barbies. E, hora ou outra, uma delas também se casava com o Ken para ter outra eterna lua de mel, até que perdia a graça... - E você acha que isso pode ser aplicado a você? Digo, hoje em dia... – disse a psicóloga. - Não. Quer dizer, acho que talvez. Ou não? – pensou em voz alta. – Quem sabe... - Só você saberá... E você tinha quantos Ken? - Um só. - E era o mesmo Ken que se casava com todas as barbies. - Era. - Isso não foi uma pergunta de minha parte. É algo para você pensar... – a doutora respi
Aquela manhã foi um típico exemplo de que, quando dormimos, nos desligamos completamente de qualquer coisa. Nos desligamos do que somos, do que comemos e de quem comemos. Melissa sentiu seu corpo desconfortável como se estivesse com a cabeça deitada em cima de um tijolo duro e malfeito. Ao abrir os olhos claros, fitou o teto branco da sala, rebaixado, com a luz acesa. Como diabos esquecera a bendita luz acesa na hora de dormir? Pelo menos as lâmpadas de LED não geram tanto impacto na conta de luz, como naquele dia em que deixara a geladeira aberta por acidente ao sair de casa: nunca antes tivera tanto impacto no valor de uma conta de luz. A geladeira também queimou e, além da conta cara, ainda por cima tivera que comprar uma geladeira nova. Afinal... “Porque acordei na sala?” – pensou. Foi quando Melissa sentiu um peso esquisito sobre suas pernas. Assustou-se, deu um giro e praticamente pulou no chão, cravando as unhas no carpete vinho como um gato arisco. Seu chefe estava dormindo
Adam pegou a caixa das coisas de Patrick, abriu a porta e cumprimentou o amigo. - E aí, fera? – disse Kernel, mas não houve resposta do amigo. Patrick, com os olhos verdes e cabelo castanho, que estava de terno e muito bem alinhado, perdeu o controle ao ver, de passagem, o que estava acontecendo no sofá do amigo. Empurrou Kernel para o lado. Queria participar. - Está fazendo uma festinha? – disse Patrick, mas, para seu pavor, entrou na mansão e terminou visualizar o que estava vendo pela metade através da porta entreaberta, deu de cara com a cena de Kate lambendo os seios de Melissa. - Que merda é essa!? – gritou Patrick, e as duas garotas se assustaram, olhando para ele. No susto, Kate pulou para o canto oposto do sofá. Os olhos verdes de Patrick encontraram os azuis de Melissa e ela não pôde esconder um leve sorriso triunfal. - O que está acontecendo aqui? – perguntou Patrick, arfando de ira enquanto se aproximava de Melissa e olhava-a de cima, puto de ódio. Mel, por sua vez,
Melissa estava começando a ficar bastante nervosa. Seus pés num Prada batiam freneticamente no chão, seus braços estavam cruzados demonstrando impaciência e seus lábios vermelhos, franzidos. Já fazia uma semana que ela e o senhor Kernel não conversavam nada além do estritamente essencial para o andamento do trabalho na agência de publicidade. E o que estava acontecendo agora definitivamente não tinha nada a ver com a agência, mesmo que o senhor Kernel tivesse insistido que a presença de sua secretária era muito importante nessa visita ao orfanato. Era uma sexta-feira muito bonita, com o céu azul e clima ameno. O sol batia nos cabelos dourados de Melissa e os iluminava mais ainda, causando reflexos maravilhosos. Impaciente, ela girou os olhos azuis sob os óculos de sol quando mirou o Mercedes virando a esquina, dirigido pelo próprio senhor Kernel. Ele estacionou o carro em frente ao orfanato, bem em frente onde Melissa o aguardava, de pé. Apesar de toda a raiva que sentia dele, o cora
Era difícil acreditar naquilo. Os pensamentos de Melissa estavam presos no que acabara de se revelar para ela sobre o passado do senhor Kernel. Melissa estava cuidando das crianças no jogo como se estivesse no piloto automático: fazia fila indiana com as crianças e conferia toda hora se alguma não estava perdida. Tudo acontecia no automático. Comprou pipocas, doces e refrigerantes para todos, automaticamente. Ela não conseguia parar de pensar no momento em que pegou a ficha de cadastro do senhor Kernel no orfanato. A loira não conseguia acreditar que ele tinha sido uma criança que morou em um orfanato. O que era incrível, pois uma criança órfã, quando cresce, geralmente não tem tanto sucesso quanto o senhor Kernel tinha. Tanto dinheiro quanto o senhor Kernel tinha. Era algo exemplar. Possivelmente todas aquelas crianças sabiam daquele segredo que Melissa havia acabado de descobrir e o admiravam. E elas sabiam daquilo muito mais profundamente do que Melissa, que nem conseguia se imagin
Algo dentro de Melissa começou a queimar por entre suas pernas e ela ficou com muito tesão olhando Kernel vestido tão casualmente com aquele uniforme de time de basquete. Era bem diferente vê-lo fora de um terno, por isso ficou atraída e sentiu a mesma coisa quando ele saiu do carro naquela manhã, porém a loira não se permitiu aproveitar aquela visão por estar tão cega pelo ódio. Não se permitia sentar na arquibancada do estádio e apenas observar aquele homem que lhe tirava o ar quando se aproximava. Não se permitia sentar naquela cadeira e ocupar seu espaço na vida dele. Melissa simplesmente não conseguia mais respirar direito quando estava próxima do senhor Kernel, sua presença arrancava tudo que ela tinha, tudo que ela era e ela simplesmente esquecia qualquer coisa, ficava nervosa, não sabia onde enfiar as mãos, não sabia se colocar perante ele. Não sabia nem como poderia olhar para aqueles olhos novamente. Seus olhares, que estavam conectados por aquele breve momento, desconectara
Era um final de semana e Melissa estava cozinhando em seu apartamento. Com os cabelos loiros presos para cima e uma roupa leve e descontraída, descalça, a secretária escutava uma música contagiante, I Follow Rivers The Magician Remix, e dançava enquanto escolhia os ingredientes da refeição. Abria a geladeira, olhava nas gavetas, girava uma colher de pau por entre os dedos, picava e salteava os vegetais na frigideira. As memórias do dia divertido de ontem com as crianças no jogo de basquete e no restaurante traziam aos lábios de Melissa um certo sorriso e à sua essência um certo vigor. Apoiados por sobre o balcão, uma garrafa de vinho tinto encorpado e uma taça Bordeaux regavam o momento de felicidade de Mel. Enquanto dançava e cozinhava, lembrava dos acontecimentos de ontem. Convencidos por Amanda, de repente, estavam Melissa e o senhor Kernel dentro de uma piscina de bolinhas enorme, junto com várias crianças pulando em cima deles. Fora engraçado. Toda hora Kernel jogava bolinhas mul
Melissa percebeu que tinha aberto um presente que não era para ela. Desesperada, fechou com força o estojo do colar e tentou consertar a embalagem de papel branco, porém o selo de cera que a lacrava já havia sido rompido. Suas mãos trêmulas encontraram o cartão de visita do embaixador da Cartier com intuito de ligar para ele e solicitar uma nova embalagem com um selo novo quando virou-se para pegar o telefone e trombou com o senhor Kernel, que havia entrado na recepção de repente. Assustada, esbarrou na sacola de presente e empurrou o estojo do colar, que caiu desembalado no chão. Ela olhou desesperada para Kernel e engoliu em seco. Ele ergueu apenas uma sobrancelha. - Melissa, o que aconteceu com o presente da minha esposa? – ele olhou para os lados. – Ela esteve aqui? - N-não senhor Kernel – respondeu Melissa, de supetão –, eu abri achando que era para mim. Já estou ligando para a empresa fazer uma embalagem nova. Por incrível que pareça, Kernel ficou com o rosto corado. Não era c