Maya
— Desculpe-me. Só quis dar a você uma noite legal. Eles não vão lhe tocar, se você não quiser! — disse Penny, tentando consertar a situação, como se a sua justificativa fosse o suficiente para resolver o que ela fez.
— Você é minha melhor amiga. Como pode fazer isso comigo? Por que me trouxe até aqui? — perguntei irada.
— Desculpe-me, por favor, Maya! — implorou aos sussurros. — Não faça nenhum escândalo! — pediu olhando para os lados, procurado se eu havia chamado a atenção indesejada de alguém com a minha voz alta.
— Mas o que você é, afinal? Pensei que fosse minha amiga. Não sei se você já percebeu, mas não preciso de mais complicações na minha vida!
Coloquei a taça que tinha na mão sobre o balcão e saí andando sem saber para onde exatamente eu estava indo. Atravessei o salão esbarrando-me nas pessoas, até chegar ao corredor que me levou a uma enorme porta de madeira entreaberta. Empurrei-a e passei por ela encontrando uma linda varanda com iluminação à luz de velas. A vista dali de cima era de tirar o fôlego. Sentei-me em um sofá ao canto e me recostei fechando os olhos respirando fundo. Nem mesmo a bela vista e a brisa fresca, com cheiro de rosas e terra molhada, deixaram-me mais calma. Como a minha melhor amiga pôde ser capaz de me convidar para uma festa de prostituição? Afinal, o que ela veio fazer aqui?
— Parece que você e a sua amiga tiveram um pequeno desentendimento — disse uma voz grossa, assustando-me.
Abri os meus olhos rapidamente e sentei-me com a coluna reta, encarando o homem de cabelos grisalhos à minha frente. Apesar da idade, ele era bonito e atraente. Diria ter cinquenta anos ou mais. Vestia um terno preto sob medida e uma camisa branca com os primeiros botões do colarinho abertos, mostrando alguns pelos do peitoral, que pareciam ser macios ao toque. Ele tinha um charme incomum, que atraiu a minha atenção, levando o meu olhar direto para os seus lábios que estavam curvados em um pequeno sorriso que me deixou nervosa.
— Não é da conta de ninguém! — disse rude.
— Sim, é claro. Desculpe-me, só tentei ser amigável. Você pareceu estar perdida e chateada quando passou por mim como um vendaval vindo para cá.
— Eu não tinha noção do que é este lugar.
O seu olhar sério deixou os meus ombros tensos.
— Já estou de saída. — Levantei-me puxando a barra do vestido para baixo.
Caminhei em direção à porta, mas antes que eu pudesse passar por ela, ele segurou o meu antebraço com certa força, impedindo-me e sorriu quando o encarei assustada com a sua atitude atrevida.
— Por favor, fique. Não quero incomodar — disse e soltou a sua mão que me agarrava. — Não tem que ir embora. Muitas mulheres vêm a essas festas somente à procura de diversão.
— É, eu imagino qual seja a diversão — disse, dando-lhe um sorriso sarcástico.
— O fato da sua amiga ser uma acompanhante, não significa que você também seja.
— Acompanhante? Que palavra gentil para prostituta.
Ele riu negando com a sua cabeça.
— Assim você irá ofender a sua amiga.
— Pouco me importo. — Fui hostil, antes de deixar a varanda.
— Sou Victor White. — O seu nome ecoou por minhas costas pelo corredor.
— Tchau, sr. White — despedi-me seguindo adiante, sem olhar para trás.
Procurei pela saída, até que, com a ajuda de um garçom, a encontrei. Parada na calçada, peguei o meu celular dentro da bolsa e chamei um táxi.
— Você já vai? — perguntou um homem atrás de mim.
— Ah, Deus! Outro não! — clamei em sussurros para mim mesma, enquanto guardava o celular na bolsa.
— Você não precisa ir. Ainda está cedo.
— É, mas eu quero! — respondi rude, virando-me para trás.
Fiquei um pouco surpresa e envergonhada ao ver o homem que destratei. Era Evan Johnnes, o rapaz que conheci há pouco e senti-me atraída. Bom... no momento não estava mais tão atraída assim, depois de descobrir o que era aquele lugar.
— Você é bem arisca — disse aproximando com um sorriso no canto dos lábios. — Adoraria ter a chance de domar você. — Tocou o meu rosto com os seus dedos, alisando-os na minha pele.
Dei um passo para trás, distanciando-me dele e do seu olhar desconfortante. O táxi estacionou próximo ao meio-fio e eu lhe dei as costas caminhando até o carro.
— Até mais, Valentina — escutei-o dizer antes que eu entrasse no táxi.
Ao chegar à fraternidade, o silêncio inundou os meus ouvidos e a escuridão segou-me. Tirei os saltos para evitar fazer barulho, liguei a lanterna do celular e subi a escada na ponta dos pés, indo direto para o quarto. Depois de um banho e de vestir um pijama confortável, caí na cama, entregando-me ao sono sem demora. Acordei pela manhã com os chamados da Penny de pé ao meu lado.
— Temos que conversar! — disse ela arrancando o edredom de cima de mim.
Virei para a parede, lhe dando as costas e a ignorando.
— Maya, é sério! — exclamou alto.
— O que foi? — perguntei zangada por estar sendo acordada tão cedo.
— Eu preciso conversar com você — disse com a voz embargada.
— Que horas são, hein? — murmurei sentando-me na cama.
— São sete horas.
— Fala sério. Não dá para conversar depois das nove da manhã? — perguntei mal-humorada.
— Não! Eu quero falar agora — disse como uma criança emburrada, cruzando os braços à frente do peito.
— Por que me levou para aquele lugar, Penny? Me levou para uma casa de prostituição!
— Olha só... eu não queria magoar você. Achei que seria uma noite divertida e que fosse gostar da festa.
— Jura que você pensou isso?
— Era só uma festa, Maya. Eu juro! Uma festa onde mulheres conhecem homens mais velhos e experientes. Homens maduros que dizem logo o que querem e não ficam a iludindo como moleques para depois te magoar — disse sentando-se à beirada da sua cama, ficando de frente para mim. — Você estar lá, não quer dizer que tenha que fazer alguma coisa com alguém ou que seja uma garota de programa. Entende?
— Diz isso, mas se tivesse acontecido algo entre mim e um daqueles homens, ele certamente teria me pagado no final da noite. Isso ainda é prostituição para mim. Entende? — perguntei sarcástica e levantei-me. — Foi isso que aconteceu no final da sua noite? — Dirigi-me ao banheiro.
— Não me julgue! Nem todas de nós tivemos pais a vida toda para nos ajudar.
Parei na porta do banheiro e olhei para ela sem entender o que queria dizer.
Maya— Você está trabalhando há dois anos e já está cansada e desgastada. Imagina quem trabalha desde os doze anos — disse com os olhos cheios de lágrimas.— Não é o seu caso. Acredito que possa ser o de algumas garotas, mas não o seu. Os seus pais cuidam de você, Penny!— Não. Não cuidam, Maya. Eu nem mesmo sei onde eles estão — disse em meio ao choro que começava.— O quê? Você disse que...— Eu sei o que disse — interrompeu-me. — Mas não é verdade. Os meus pais não estão na Suíça. O meu pai foi preso por matar um homem quando eu tinha nove anos. Ele pegou vinte anos de prisão. Eu morava em um trailer com a minha mãe em Indiana. Ela é uma alcoólatra com um namorado por noite e nunca se importou comigo. Mal durava um dia em um emprego, então como poderia cuidar de mim? — Lágrimas escorriam abundantemente por seu rosto.— Penny... — chamei-a aproximando-me em passos lentos.Eu pude ver a dor e angústia no seu rosto. O meu coração se apertou, fazendo-me sentir culpada por seu choro. Ab
Maya— O que eu faço? — perguntei a Penny.— Espera ele se virar para o outro lado e... corra! — Penny se levantou arrastando-me pelo braço até ao banheiro feminino e trancou a porta depois de entramos.— Não posso passar o resto da minha noite de trabalho trancada em um banheiro por causa de um louco! — disse nervosa.— Talvez, quando ele não achar você, vá embora. — Forçou um sorriso e uma calma inexistente.— Que droga! — exclamei dando um forte tapa em uma das portas dos sanitários. — Roger já não está muito satisfeito comigo, desde a última confusão do Mark. Se ele me pegar aqui no banheiro, eu... — Uma forte batida na porta interrompeu-me, nos assustando.— Quem é? — perguntou Penny.— Maya! — gritou Roger lá de fora.Penny abriu a porta vagarosamente e Roger estava parado depois dela, de braços cruzados e com uma feição nítida de descontentamento.— Oi — disse Penny para ele.— Dê um jeito naquilo. — Roger apontou para o final do corredor. — Que não aconteça mais uma briga nest
Maya— Maya! — Ouvi o som irritante da voz do Mark gritar por mim, enquanto eu caminhava pela calçada de volta para a fraternidade.— O que você quer? — perguntei alto e rude. — Já não conseguiu o que tanto queria? Eu não tenho mais o emprego!— Desculpe-me, por favor! — implorou acompanhando-me lentamente com o carro, próximo ao meio-fio.— Desaparece, Mark! — mandei rude.— Deixa eu levar você para o campus. Já está bem tarde e é perigoso.— Vai à merda! — gritei parando na calçada e o encarando. — Deixe-me em paz! Segue a sua vida e deixa eu seguir a minha! — Mark parou o carro e desceu batendo a porta com força.— Perdoa-me. Eu imploro! Por que você é tão dura comigo? Será que dá para você me desculpar?— Não! Não dá, Mark. Você é um cretino egoísta. Eu precisava daquele emprego e você melhor do que ninguém sabe disso. Você tem conhecimento do que está acontecendo na minha vida. Por que insiste em me causar problemas? Eu avisei e pedi inúmeras vezes para ficar longe de mim, para m
MayaVesti e observei-o no meu corpo pelo reflexo no espelho. Por um segundo, pensei que talvez ele pudesse valer mil e quatrocentos dólares. Ele me deixou surpresa e boquiaberta. Era lindo e perfeito! Nunca havia vestido algo tão belo e luxuoso antes. Calcei o par de sandálias que estavam no provador, e quando Penny me chamou impaciente pela segunda vez, saí a vendo sorrir admirada.— Uau! — expressou ela boquiaberta. — Você está...— Linda! — Uma voz grossa a interrompeu terminando a sua frase.— Victor! Oi, como vai? — cumprimentou Penny.Olhei para o lado um tanto surpresa em vê-lo ali. Ele encarava-me com um olhar faminto e um pequeno sorrisinho enigmático no rosto.— Senhor White — disse ao cumprimentá-lo.— Olá, Valentina — disse com o seu sorriso largo. — Vocês estão maravilhosas. Vão à festa esta noite?— Sim, eu vou — respondeu Penny.— E você? — perguntou ele voltando a sua atenção para mim.— Não — respondi sentindo-me desconcertada.— É uma pena. — Ele aproximou-se. — Fic
MayaDevidamente arrumada, ajudei Penny a ondular os seus cabelos e finalizar a sua maquiagem. Enquanto calçava as minhas sandálias, sentada à beirada da cama, ela olhou pela janela e avisou que o carro já havia chegado.— Bem pontual — disse olhando as horas no meu celular.A caminho da festa, acomodada no assento traseiro da limusine, convenci-me de que a noite seria para estar com pessoas diferentes de Mark, beber, dançar e, principalmente, me divertir.— Parece nervosa — disse Penny.— Um pouco — confessei.— Não tem motivo estar nervosa. Você está linda e com certeza vai chamar a atenção de todos — disse sorrindo confiante.— Não sei o que o Victor espera de mim com tudo isso.— Tudo isso o quê? O vestido? A limusine?Assenti.— Relaxa! Ele é um homem simpático e respeitoso. É claro que ele espera que você ao menos o acompanhe esta noite, mas tenho certeza de que ele lhe tratará muito bem. E não é porque você estará lá, ou com ele, que os outros vão pensar ou dizer que você é uma
MayaDepois de mais uma taça de champanhe e uma hora de conversa boba com Victor, eu conseguia me sentir mais à vontade no ambiente da festa. Ele me contou histórias engraçadas da adolescência e da sua primeira viagem fora do país sozinho, sempre um assunto se emendando ao outro.Penny reapareceu com outro homem, que eu não fazia a menor ideia de quem era. Ele engajou em uma conversa de negócios com Victor, fazendo com que eu e ela ficássemos de lado.— Lola, vamos ao banheiro? — chamei-a no intuito de nos livrar daquele tédio e do assunto que não entendíamos nada.— Vamos — concordou levantando-se.— Então, o que houve com o Rick? — perguntei a caminho ao banheiro.— Ele teve que ir — disse ela nada contente, retorcendo o bico para o lado.— Por quê? O que houve?— Eu não sei, ele não me disse nada e eu também não perguntei.— É assim que funciona? — perguntei curiosa.— É! A vida dele não é da minha conta, do mesmo jeito que a minha não é da dele — explicou ao entrarmos no banheiro.
MayaNa manhã seguinte, acordei animada arrumando as minhas coisas para voltar para casa e rever os meus pais. Quando subi de volta para o quarto, depois do café da manhã, havia uma mensagem no meu celular de um número desconhecido.Bom dia, linda Valentina.Agradeço, mais uma vez, pela ótima companhia que me fez na noite passada.E, novamente, você estava deslumbrante.Victor09:20 a.m.Bom dia, Victor. Eu que lhe agradeço.Foi uma ótima noite.Valentina09:34 a.m.Por um momento pensei em dizer o meu nome a ele, mas ainda não. Aquele não era o momento certo para deixá-lo mais próximo a quem era de verdade.Jante comigo esta noite?Posso fazer uma ótima reserva em um bom restaurante.Victor09:35 a.m.Desculpe-me, mas não posso.Fica para outra oportunidade.Valentina09:36 a.m.É uma pena que você já tenha algo de mais interessante para esta noite.Victor09:36 a.m.Não é isso.Estou indo para casa, em Tulsa.Valentina09:37 a.m.Quando volta?Não me deixe esperando por você.
MayaNo dia seguinte, ele bateu na porta dizendo que já passava das oito da manhã. Depois de me arrumar, desci para o café e saímos juntos para o hospital. Quando as portas do elevador se abriram no quarto andar, senti um enorme frio se instalar no meu estômago. Caminhamos pacientemente pelo corredor movimentado até o quarto. O meu pai abriu a porta e avistei a minha mãe deitada na cama. Aproximei-me dela e a observei dormir com tranquilidade.A sua cabeça, sem nem um fio de cabelo, estava coberta por um lenço que lhe dei quando descobrimos o câncer de mama. Ela estava pálida e bem mais magra que a última vez que a vi. Senti-me tão culpada por estar longe de casa naquele momento tão delicado e doloroso das nossas vidas.Sem perceber, uma lágrima quente e solitária escorreu por meu rosto sem nenhum aviso. Segurei a sua mão magra, notando que a sua pele estava marcada por hematomas de uma cor amarelada misturada com algumas pequenas manchinhas roxas. Eram marcas que denunciavam onde a s