MayaDevidamente arrumada, ajudei Penny a ondular os seus cabelos e finalizar a sua maquiagem. Enquanto calçava as minhas sandálias, sentada à beirada da cama, ela olhou pela janela e avisou que o carro já havia chegado.— Bem pontual — disse olhando as horas no meu celular.A caminho da festa, acomodada no assento traseiro da limusine, convenci-me de que a noite seria para estar com pessoas diferentes de Mark, beber, dançar e, principalmente, me divertir.— Parece nervosa — disse Penny.— Um pouco — confessei.— Não tem motivo estar nervosa. Você está linda e com certeza vai chamar a atenção de todos — disse sorrindo confiante.— Não sei o que o Victor espera de mim com tudo isso.— Tudo isso o quê? O vestido? A limusine?Assenti.— Relaxa! Ele é um homem simpático e respeitoso. É claro que ele espera que você ao menos o acompanhe esta noite, mas tenho certeza de que ele lhe tratará muito bem. E não é porque você estará lá, ou com ele, que os outros vão pensar ou dizer que você é uma
MayaDepois de mais uma taça de champanhe e uma hora de conversa boba com Victor, eu conseguia me sentir mais à vontade no ambiente da festa. Ele me contou histórias engraçadas da adolescência e da sua primeira viagem fora do país sozinho, sempre um assunto se emendando ao outro.Penny reapareceu com outro homem, que eu não fazia a menor ideia de quem era. Ele engajou em uma conversa de negócios com Victor, fazendo com que eu e ela ficássemos de lado.— Lola, vamos ao banheiro? — chamei-a no intuito de nos livrar daquele tédio e do assunto que não entendíamos nada.— Vamos — concordou levantando-se.— Então, o que houve com o Rick? — perguntei a caminho ao banheiro.— Ele teve que ir — disse ela nada contente, retorcendo o bico para o lado.— Por quê? O que houve?— Eu não sei, ele não me disse nada e eu também não perguntei.— É assim que funciona? — perguntei curiosa.— É! A vida dele não é da minha conta, do mesmo jeito que a minha não é da dele — explicou ao entrarmos no banheiro.
MayaNa manhã seguinte, acordei animada arrumando as minhas coisas para voltar para casa e rever os meus pais. Quando subi de volta para o quarto, depois do café da manhã, havia uma mensagem no meu celular de um número desconhecido.Bom dia, linda Valentina.Agradeço, mais uma vez, pela ótima companhia que me fez na noite passada.E, novamente, você estava deslumbrante.Victor09:20 a.m.Bom dia, Victor. Eu que lhe agradeço.Foi uma ótima noite.Valentina09:34 a.m.Por um momento pensei em dizer o meu nome a ele, mas ainda não. Aquele não era o momento certo para deixá-lo mais próximo a quem era de verdade.Jante comigo esta noite?Posso fazer uma ótima reserva em um bom restaurante.Victor09:35 a.m.Desculpe-me, mas não posso.Fica para outra oportunidade.Valentina09:36 a.m.É uma pena que você já tenha algo de mais interessante para esta noite.Victor09:36 a.m.Não é isso.Estou indo para casa, em Tulsa.Valentina09:37 a.m.Quando volta?Não me deixe esperando por você.
MayaNo dia seguinte, ele bateu na porta dizendo que já passava das oito da manhã. Depois de me arrumar, desci para o café e saímos juntos para o hospital. Quando as portas do elevador se abriram no quarto andar, senti um enorme frio se instalar no meu estômago. Caminhamos pacientemente pelo corredor movimentado até o quarto. O meu pai abriu a porta e avistei a minha mãe deitada na cama. Aproximei-me dela e a observei dormir com tranquilidade.A sua cabeça, sem nem um fio de cabelo, estava coberta por um lenço que lhe dei quando descobrimos o câncer de mama. Ela estava pálida e bem mais magra que a última vez que a vi. Senti-me tão culpada por estar longe de casa naquele momento tão delicado e doloroso das nossas vidas.Sem perceber, uma lágrima quente e solitária escorreu por meu rosto sem nenhum aviso. Segurei a sua mão magra, notando que a sua pele estava marcada por hematomas de uma cor amarelada misturada com algumas pequenas manchinhas roxas. Eram marcas que denunciavam onde a s
Maya— Minha querida, você não tem que... — começou a dizer sentando-se na sua cadeira do outro lado da mesa.— Nem comece, pai! — interrompi-o. — Pare de me tratar como criança. Primeiro você e mamãe tentaram me esconder a doença dela na segunda vez. Depois que venderam dois dos nossos carros e agora isso? — disse irritada, apontando para a pasta sobre a mesa. — O que mais está acontecendo? Ou você me diz... ou vou descobrir sozinha! — gritei, impondo-me.— Hipotequei a nossa casa há três meses, mas não tive nem mesmo como pagar a primeira parcela. Tive que dispensar mais da metade do quadro de funcionários no mês passado, por não ter como pagá-los. Mesmo com o novo sócio, não teríamos como bancar salário e bônus de fim de ano para toda essa gente. Se não bastasse isso, o serviço está reduzido. Mal tenho renda para pagar o plano de saúde que está cada vez mais caro e os remédios que custam uma fortuna, os quais não são disponibilizados pelo governo ou cobertos pelo plano.— Sócio? —
MayaApós muita conversa, Grace deixou-me em casa e marcamos um passeio pela cidade para o dia seguinte na parte da tarde. Ao entrar em casa, encontrei o meu pai dormindo recostado na sua poltrona velha, com a TV ligada no canal de esportes e segurando uma garrafa de cerveja vazia na mão.Bow, o seu companheiro de todas as noites, estava deitado no chão sobre o carpete felpudo aos seus pés. Peguei a garrafa da sua mão e desliguei a TV, ligando a luz da sala.— Oi, filha — disse com a voz sonolenta ao acordar com a luz acesa.— Oi, pai. Já são quase dez horas. Eu cheguei agora.— Eu fui até o hospital e você não estava. A sua avó disse que você tinha ido jantar com a Grace.— É, ela me trouxe.— Se divertiram? — perguntou levantando-se da poltrona.— Sim. Você já jantou? — perguntei preocupada.Ultimamente ele vinha cuidando de tudo, menos de si mesmo. Reparei isso quando cheguei, sem ninguém me dizer nada. Ele estava bem mais magro do que o normal.— Sim, querida. Já tomei banho e esc
Maya— Sabia que era você quando a vi na janela — disse ele parando ao lado da Carla com um sorriso reluzente no rosto.— Oi — admirei algumas mechas dos seus cabelos ficarem mais claras ao reflexo do sol.— Então é aqui que você mora três meses por ano?— Oi. Eu sou a Carla — apresentou-se ao Higor. — Ainda não tinha tido o prazer de conhecê-lo. Seja bem-vindo a vizinhança — disse com um enorme sorriso malicioso escancarado no rosto.O que essa mulher ainda faz aqui? — Sou Higor — apresentou-se a ela apertando a sua mão.— Até mais, Maya. Mande melhoras a sua mãe. — Ela afastou-se com um sorriso falso, voltando para sua casa.— Melhoras a sua mãe? Ela está doente? — Podia jurar que vi preocupação nas suas perguntas.— O que você faz aqui? — perguntei desconversando-o para evitar respondê-lo. Não era um assunto que queria conversar com ele.— Uau! Você não é muito sutil em mudar de assunto. — Sorriu sem graça. — Mas, respondendo à sua pergunta, minha tia-avó Beth mora naquela casa —
MayaAo entrar, a minha mãe dormia profundamente. Também não era para menos, eles haviam dado morfina a ela. No seu rosto, havia resquícios de uma feição de dor, o que fez o meu coração doer. Queria poder livrá-la deste sofrimento.Tirei as rosas secas que estavam no vaso de flores sobre a mesa aos pés da cama e as joguei no lixo ao lado da porta. Peguei o vaso e fui ao banheiro enchendo-o com água limpa. Ao voltar para o quarto, encontrei uma enfermeira que verificava a medicação que corria direto para as veias da minha mãe. Ela sorriu simpática e elogiou os girassóis que eu colocava na água.Deixei o vaso sobre a mesinha com todos eles virados para ela, assim quando acordasse seria a primeira coisa que veria. A enfermeira saiu e eu me sentei na poltrona ao seu lado da cama velando o seu sono. Logo o meu pai entrou e ficou de pé ao lado da sua esposa, segurando firme a sua mão, chorando em silêncio.— Vai ficar tudo bem, pai — disse levantando-me e indo até ele. — Nós vamos conseguir