Maya— Minha querida, você não tem que... — começou a dizer sentando-se na sua cadeira do outro lado da mesa.— Nem comece, pai! — interrompi-o. — Pare de me tratar como criança. Primeiro você e mamãe tentaram me esconder a doença dela na segunda vez. Depois que venderam dois dos nossos carros e agora isso? — disse irritada, apontando para a pasta sobre a mesa. — O que mais está acontecendo? Ou você me diz... ou vou descobrir sozinha! — gritei, impondo-me.— Hipotequei a nossa casa há três meses, mas não tive nem mesmo como pagar a primeira parcela. Tive que dispensar mais da metade do quadro de funcionários no mês passado, por não ter como pagá-los. Mesmo com o novo sócio, não teríamos como bancar salário e bônus de fim de ano para toda essa gente. Se não bastasse isso, o serviço está reduzido. Mal tenho renda para pagar o plano de saúde que está cada vez mais caro e os remédios que custam uma fortuna, os quais não são disponibilizados pelo governo ou cobertos pelo plano.— Sócio? —
MayaApós muita conversa, Grace deixou-me em casa e marcamos um passeio pela cidade para o dia seguinte na parte da tarde. Ao entrar em casa, encontrei o meu pai dormindo recostado na sua poltrona velha, com a TV ligada no canal de esportes e segurando uma garrafa de cerveja vazia na mão.Bow, o seu companheiro de todas as noites, estava deitado no chão sobre o carpete felpudo aos seus pés. Peguei a garrafa da sua mão e desliguei a TV, ligando a luz da sala.— Oi, filha — disse com a voz sonolenta ao acordar com a luz acesa.— Oi, pai. Já são quase dez horas. Eu cheguei agora.— Eu fui até o hospital e você não estava. A sua avó disse que você tinha ido jantar com a Grace.— É, ela me trouxe.— Se divertiram? — perguntou levantando-se da poltrona.— Sim. Você já jantou? — perguntei preocupada.Ultimamente ele vinha cuidando de tudo, menos de si mesmo. Reparei isso quando cheguei, sem ninguém me dizer nada. Ele estava bem mais magro do que o normal.— Sim, querida. Já tomei banho e esc
Maya— Sabia que era você quando a vi na janela — disse ele parando ao lado da Carla com um sorriso reluzente no rosto.— Oi — admirei algumas mechas dos seus cabelos ficarem mais claras ao reflexo do sol.— Então é aqui que você mora três meses por ano?— Oi. Eu sou a Carla — apresentou-se ao Higor. — Ainda não tinha tido o prazer de conhecê-lo. Seja bem-vindo a vizinhança — disse com um enorme sorriso malicioso escancarado no rosto.O que essa mulher ainda faz aqui? — Sou Higor — apresentou-se a ela apertando a sua mão.— Até mais, Maya. Mande melhoras a sua mãe. — Ela afastou-se com um sorriso falso, voltando para sua casa.— Melhoras a sua mãe? Ela está doente? — Podia jurar que vi preocupação nas suas perguntas.— O que você faz aqui? — perguntei desconversando-o para evitar respondê-lo. Não era um assunto que queria conversar com ele.— Uau! Você não é muito sutil em mudar de assunto. — Sorriu sem graça. — Mas, respondendo à sua pergunta, minha tia-avó Beth mora naquela casa —
MayaAo entrar, a minha mãe dormia profundamente. Também não era para menos, eles haviam dado morfina a ela. No seu rosto, havia resquícios de uma feição de dor, o que fez o meu coração doer. Queria poder livrá-la deste sofrimento.Tirei as rosas secas que estavam no vaso de flores sobre a mesa aos pés da cama e as joguei no lixo ao lado da porta. Peguei o vaso e fui ao banheiro enchendo-o com água limpa. Ao voltar para o quarto, encontrei uma enfermeira que verificava a medicação que corria direto para as veias da minha mãe. Ela sorriu simpática e elogiou os girassóis que eu colocava na água.Deixei o vaso sobre a mesinha com todos eles virados para ela, assim quando acordasse seria a primeira coisa que veria. A enfermeira saiu e eu me sentei na poltrona ao seu lado da cama velando o seu sono. Logo o meu pai entrou e ficou de pé ao lado da sua esposa, segurando firme a sua mão, chorando em silêncio.— Vai ficar tudo bem, pai — disse levantando-me e indo até ele. — Nós vamos conseguir
MayaA caminho, recebi uma mensagem do Victor com a foto da linda vista que se tinha do restaurante para o lago. A pouca luz elétrica do restaurante e as velas acesas sobre as mesas tornavam o ambiente romântico, aconchegante e encantador. Ao chegar, a recepcionista levou-me até à mesa onde ele estava. Ao me ver aproximar, Victor se levantou e sorriu para mim com o seu ar galanteador.— Você está simplesmente linda — disse beijando-me no canto da minha boca.— Obrigada. Você também está muito bonito. — Ele abriu mais o seu sorriso ao ouvir o elogio.Victor puxou a cadeira à frente da sua, para que me sentasse.— Bela escolha do lugar. É tranquilo.— Exatamente por isso eu gosto tanto daqui. A tranquilidade me atrai.— Espero que não se importe, mas tomei a liberdade de pedir um bom vinho chileno tinto e suave. Acertei? — perguntou servindo duas taças com o vinho posto sobre a mesa.— Sim — respondi com um sorriso tímido.— Ótimo! Um brinde a este jantar e a bela noite que nos acompanh
MayaAssim que o carro parou à frente da emergência, eu paguei pela corrida e saí deixando o troco para trás. Entrei às pressas no hospital tomando o elevador para o quarto andar.Quando as portas de abriram, saí para o corredor avistando o meu pai de longe andando desorientado de um lado para o outro na porta do quarto. O médico e tia Jenna tentavam conversar e acalmá-lo, mas era em vão.— Pai! — chamei-o ao me aproximar e ele jogou-se nos meus braços abraçando-me forte. — O que houve? — perguntei com desespero segurando o meu choro.— Maya, querida... — disse tia Jenna vindo até mim.— Onde está a minha mãe? — perguntei-lhe, sentindo uma lágrima escapar.— Na UTI. Ela passou mal outra vez e os resultados dos últimos exames saíram.— O câncer está se espalhando, filha — disse o meu pai soltando-me do seu abraço.— O quê? Como assim se espalhando? — perguntei nervosa ao médico.— Ela precisa de uma cirurgia, mas infelizmente está muito fraca para arriscarmos — explicou o médico. — Par
MayaPeguei um táxi e fui para casa. Com a cabeça cheia em mil pensamentos, passei a noite em claro virando de um lado para o outro na cama. Quando amanheceu, levantei-me e desci para preparar o café da manhã. Estava tirando a última panqueca no fogo quando a porta da frente foi aberta e o meu pai passou por ela.— Bom dia — desejou sentando-se à mesa da cozinha.— Bom dia, pai. Como a mamãe está? — perguntei temendo que a resposta fosse: “piorando”.— Ela acordou e a levaram para o quarto esta manhã.— Você a viu?— Sim, por meia hora.— Tudo vai ficar bem — disse sentando-me na cadeira à sua frente. — Vou voltar para Houston e tentar um empréstimo.— Acha que consegue? — perguntou encarando-me com um olhar triste.— Sim. Vou fazer o possível — disse com firmeza.Após comer panquecas e ovos com bacon, ele subiu para seu quarto na expectativa de conseguir dormir um pouco. Coloquei as louças sujas na lavadora e fui para o hospital no carro do meu pai. O médico permitiu somente um acomp
MayaO meu pai me levou para o aeroporto e o caminho foi feito em um silêncio confortável. Chegando lá, ele ajudou-me a despachar as malas e me acompanhou até o portão de embarque. Nós nos despedimos com um longo abraço, que, por um segundo, me fez querer desistir e ficar.— Quando você for visitar a mamãe, lembre-se de dizer a ela que precisei ir, mas que volto logo.— Tudo bem, querida. Boa viagem — desejou e deu-me um beijo no rosto.Quando cheguei em Houston, já era quase meio-dia. Penny correu para fora da casa quando viu o táxi estacionar a frente. Ela mal esperou que eu descesse do carro e deu-me um abraço. Pegamos as minhas malas e entramos subindo direto para o quarto.— Então... a que horas é a festa? — perguntei sentando-me na minha cama.— Às dez horas. Você é uma sortuda. O cara que te arrumei é um gato. Advogado, trinta e poucos anos... — disse sorrindo. — Todas que já ficaram com ele, dizem que ele paga muito bem.— Quanto acha que eu consigo esta noite?— Eu não sei, i