Assim que estacionei o carro em frente ao prédio onde morava, soltei um longo suspiro e fechei os olhos por um momento, tentando dissipar a tensão que ainda vibrava em meu corpo. Eu odiava essa sensação, de estar… dividida.
Saí do carro e subi rapidamente até o meu apartamento, torcendo para que Isabelle já estivesse no quarto ou ocupada com outra coisa. Eu simplesmente não estava pronta para suas perguntas afiadas sobre Thomas Montserrat. Ela me conhecia bem demais. E eu… bem, eu ainda não tinha respostas para as perguntas que ela certamente faria.
Fechei a porta do quarto atrás de mim e me encostei nela, soltando a respiração que nem percebi que estava prendendo. Então, aquilo aconteceu.
O instante em que Thomas me ajudou a recolher os papéis. A forma como seus dedos roçaram nos meus quando me entregou os documentos. A maneira como sua presença era sufocante, intensa a ponto de fazer minha pele formigar, de uma forma irritantemente involuntária. Eu odiava isso.
"Ele está jogando com você, Savannah". A voz na minha cabeça soou fria e objetiva. É assim que ele age. Seduz. Confunde. Faz você baixar a guarda. E quando percebe, já está completamente envolvida.
Mordi o lábio e balancei a cabeça, tentando afastar a sensação incômoda que se agarrava a mim. Aproximei-me da janela e a abri, deixando o vento frio da noite invadir o quarto, mas não adiantava. O que eu sentia não era físico. Era psicológico. E eu odiava cada segundo disso.
Passei as mãos pelos cabelos, frustrada, enquanto minha mente trabalhava em excesso. Ele estava jogando. Claro que estava. Ele não sabia ser de outra forma. Thomas Montserrat não era um homem altruísta. Ele não ajudava ninguém por bondade. Ajudou porque queria me desconcertar e porque queria plantar uma semente de dúvida em mim. E o pior? Ele conseguiu.
Apertei os olhos com força e soltei um suspiro impaciente. Isso acaba aqui. Eu não era como as outras mulheres que ele manipulava com seu sorriso arrogante e aquele maldito olhar quase hipnotizante.
Eu estava ali para salvar a empresa. Ponto. Era isso que eu fazia. E já tinha tirado empresas da beira da falência antes. Empresas muito maiores e mais complicadas que a dele. Thomas Montserrat não ia atrapalhar meu trabalho. E se tentasse? Bem… eu não hesitaria em abandonar o barco e deixá-lo afundar sozinho. Eu não estava ali para salvá-lo. Nunca estive. E nunca estaria.
Com essa certeza renovada, fechei a janela e caminhei até a cama. Amanhã era um novo dia. E eu trataria Thomas Montserrat exatamente como ele merecia. Como um problema a ser resolvido. Ou… descartado.
O plano era simples.
Distância. Frieza. Profissionalismo.
Eu já tinha lidado com CEOs arrogantes antes. Homens poderosos que achavam que podiam comprar qualquer coisa—inclusive respeito e obediência. Thomas Montserrat não era diferente. Afinal, por que seria? Ele era a personificação da elite intocável: milionário, herdeiro, inteligente e incrivelmente perigoso no jogo corporativo. E eu era boa no que fazia.
Eu sabia como salvar empresas, como lidar com egos inflados e como impor minha presença em salas dominadas por homens que não queriam ouvir uma mulher falando sobre cálculos e estratégias melhores do que eles. Então, manter Thomas Montserrat à distância não deveria ser difícil.
Certo? Errado.
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Na manhã seguinte, entrei na Montserrat Enterprises determinada a colocar minha estratégia em prática. Eu ignorei o fato de que o ar condicionado parecia menos frio do que a sensação que eu queria projetar para ele. Minha expressão era neutra e minha postura firme. Eu estava pronta.
Mas ele também estava.
Ao entrar na sala de reuniões, onde os diretores e acionistas já estavam acomodados, minha respiração travou por um instante ao vê-lo.
Droga.
Thomas estava impecável.
O terno escuro realçava ainda mais os ombros largos e a presença dominante. Ele estava sentado na cabeceira da mesa, uma perna casualmente cruzada sobre a outra, os dedos tamborilando o tampo de madeira com tédio calculado. Os olhos azuis deslizaram lentamente até mim assim que entrei, e então, ele sorriu.
Maldito fosse aquele sorriso.
Ele era a definição de um Don Juan—se Don Juan tivesse a arrogância de um rei que soubesse que ninguém jamais ousaria destroná-lo. Mas eu não era qualquer um. Eu era a única pessoa naquela sala que não precisava dele.
Então apenas endireitei os ombros e continuei andando, sentando-me à mesa com um aceno breve para os outros diretores.
— Senhores, vamos começar. — Minha voz soou controlada. Segura. Indiferente.
Thomas não disse nada, mas eu sentia o olhar dele queimando minha pele.
A reunião transcorreu de maneira fluida. Apresentei os primeiros planos de reestruturação, mostrei estatísticas e estratégias para aumentar a liquidez da empresa e recuperar a confiança do mercado.
Tudo estava saindo perfeitamente.
Até ele abrir a boca.
— Interessante. — Thomas inclinou-se para frente, os dedos entrelaçados sob o queixo. — Mas me diga, Harper, você realmente acredita que esse plano pode dar certo? Tenho minhas dúvidas.
O silêncio na sala foi instantâneo. Alguns diretores trocaram olhares desconfortáveis. Ele estava me desafiando, mas eu não vacilei.
Virei-me lentamente para encará-lo e inclinei a cabeça, fingindo ponderar.
— Eu acredito que sua empresa precisa de um plano sólido para não afundar de vez. Agora, se você é capaz de fazer isso sem mim, Sr. Thomas… — Abri um pequeno sorriso. Cruel. Calculado. — Então por que estou aqui?
O canto da boca dele se curvou levemente.
— Boa pergunta. — Ele murmurou, os olhos presos aos meus.
— A resposta é simples. — Inclinei-me um pouco para frente, deixando meu tom mais baixo, mas ainda firme. Letal. — Os acionistas e diretores não confiam na sua capacidade de reverter isso sozinho.
Eu vi quando a diversão nos olhos dele se intensificou. Ele não ficou irritado. Pelo contrário, ele gostou do meu ataque.
Filho da mãe.
— Então, basicamente, você está dizendo que minha incompetência é a razão para a sua presença aqui.
— Exatamente.
Mais um silêncio na sala. Os diretores pareciam não saber se deviam intervir ou apenas assistir o espetáculo.
Thomas me olhou por um longo instante, depois riu baixinho.
Riu.
E aquilo fez alguma coisa girar no meu estômago. Ótimo. Agora ele achava graça.
— Interessante, Savannah. Você fala como se tivesse tudo sob controle.
— Porque eu tenho.
Seu olhar caiu sobre minha boca por um breve segundo antes de voltar para os meus olhos.
Eu fingi que não reparei.
Ele ergueu uma sobrancelha.
— Veremos.
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A reunião terminou, e enquanto os diretores se dispersavam, eu continuei organizando algumas anotações, tentando ignorar o fato de que Thomas ainda estava ali. Ele não saiu. Não disse nada. Apenas me observava, recostado contra a mesa, os braços cruzados, esperando.
Respirei fundo e fingi não notar.
Eu sou imune a ele.
Sou imune a ele.
Sou imune…
Droga.
Peguei minhas coisas e caminhei em direção à porta, mas, no momento em que passei por ele, Thomas se moveu.
Se inclinou levemente, perto o bastante para que sua voz soasse baixa e carregada de algo que fez cada fibra do meu corpo se retesar.
— Você fala bem, Savannah. Mas eu me pergunto… — Ele fez uma pausa sutil, o suficiente para criar um maldito suspense. — Você realmente acredita em tudo isso que está dizendo?
Fiz a pior coisa que poderia fazer. O encarei, e aquilo foi um erro. Porque os olhos dele estavam perigosamente próximos, analisando cada traço da minha expressão como se procurasse algo que eu não queria que ele encontrasse.
Mas então eu me lembrei de quem ele era. E de quem eu era.
Abri um pequeno sorriso.
— O que importa não é o que eu acredito, Thomas. É o que os acionistas acreditam.
Ele piscou devagar, o sorriso crescendo.
— Toque certeiro, Harper.
Meu sobrenome na voz dele.
Maldito fosse.
Passei por ele sem olhar para trás. Eu não ia cair no truque dele. Eu não ia ceder.
Só que, enquanto eu saía da sala, meu coração batia rápido demais.
E pela primeira vez, uma pequena parte de mim se perguntava se eu estava mentindo para mim mesma.
Droga, droga, droga...
O primeiro passo para salvar a Montserrat Enterprises era simples: cortar os excessos e recuperar a liquidez. A empresa estava sangrando dinheiro. Os números eram uma bagunça, e os gastos desnecessários eram tão evidentes que até uma criança de dez anos conseguiria enxergá-los.Cancelei contratos inúteis.Revisitei fornecedores.Realinhei investimentos.Em menos de duas semanas, a estrutura financeira da empresa já estava visivelmente mais sólida. E, claro, Thomas Montserrat odiava isso. Ele não gostava de ser contrariado, menos ainda de ser ignorado. E eu estava ignorando. Fazia questão de agir como se ele fosse só mais um CEO desesperado tentando provar que ainda tinha as rédeas da própria empresa.Mas a verdade era uma só: se eu não estivesse ali, ele já teria perdido tudo. E o engraçado? Mesmo com o pai dele no encalço, cobrando resultado, ele ainda tentava atrapalhar.✧ » ◇ « ✧ » ✦ « ✧ » ◇ « ✧— Você cortou o contrato com a Luxor Tech sem me consultar.A voz de Thomas soou atrás
Entro em casa exausta, mas determinada a não pensar mais em Thomas Montserrat até, pelo menos, amanhã. Só que o universo parece ter outros planos. Isabelle está na sala, sentada no sofá, pintando as unhas do pé com uma paciência que eu nunca tive para essas coisas. Ela ergue os olhos quando me vê, com um sorrisinho no canto dos lábios.— Até que enfim apareceu, né? Já estava achando que a Montserrat Enterprises tinha te sequestrado.Reviro os olhos, mas acabo soltando um meio sorriso. Faz dias que evito Isabelle, não porque não quero vê-la, mas porque sei que suas perguntas viriam como uma metralhadora e, sinceramente, eu não tenho muitas respostas. Mas hoje… hoje, depois daquela reunião infernal, me vejo precisando cavar mais a fundo a vida de Thomas.Largo minha bolsa e me sento ao lado dela, observando-a passar o pincel com perfeição sobre a unha.— Como estão as coisas? — Isabelle pergunta, sem levantar o olhar, mas sei que está atenta a cada detalhe da minha expressão.— Ocupada.
Na manhã seguinte, entro na Montserrat Enterprises pronta para colocar meu plano em prática. Thomas pode até achar que está no controle, mas eu sei exatamente o que estou fazendo. A primeira coisa que faço é reunir os diretores e líderes de equipe para implementar as medidas emergenciais. Algumas mudanças vão ser drásticas, mas necessárias. Cortes de gastos desnecessário em outros departamentos que Thomas não quis mudanças, reestruturação de setores improdutivos e uma nova estratégia de marketing para recuperar a confiança do mercado.Thomas está presente, claro, recostado em sua cadeira com os braços cruzados e aquela expressão de tédio quase ensaiado — como se tivesse algo melhor para fazer.— Isso parece ambicioso, Harper — ele comenta, com a voz carregada de ironia. — Não está com medo de morder mais do que pode mastigar?Cruzo os braços e encaro diretamente nos olhos dele.— Se eu tivesse medo, Sr. Montserrat, não estaria aqui.Um sorriso lento se forma em seus lábios. Ele gosta
Chego em casa remusgando, jogando as chaves na mesa do corredor com mais força do que o necessário. Idiota. Arrogante. Pretensioso. Como alguém pode ser tão difícil? Tudo o que eu queria era que ele reconhecesse o óbvio: eu estou fazendo o que ele não conseguiu. Eu estou salvando a empresa que ele estava deixando afundar. E ainda está.Mas não, Thomas Montserrat preferiu dar de ombros e me provocar como se isso fosse um jogo. Bem, se é um jogo, ele vai perder.— Você está bem?A voz de Isabelle vem da cozinha. Respiro fundo, tentando esconder minha irritação antes de entrar, mas falho miseravelmente.Ela está sentada no balcão, tomando seu chá com a calma de quem não tem ideia da frustração que estou sentindo.— Thomas é um idiota — solto, sem rodeios.Isabelle ergue uma sobrancelha e dá um gole generoso do seu chá.— Isso não é novidade. Mas o que ele fez dessa vez?Jogo minha bolsa em cima da mesa e puxo uma cadeira.— Ele se recusa a admitir que eu estou superando ele. Que estou fa
Passei os dias seguintes fugindo de Thomas como se minha vida dependesse disso. Se tínhamos uma reunião, eu era objetiva. Dizia exatamente o necessário, sem rodeios, sem pausas desnecessárias. Nada de discussões longas. Nada de provocações. Eu terminava de falar e saía da sala antes de todo mundo.Se ele me chamava? Eu fingia que não ouvia. Se não dava para fingir, eu inventava uma desculpa qualquer.Se ele cruzava meu caminho no corredor, eu desviava, mudava a rota, entrava em outra sala. Parecia um jogo, mas eu sabia que não podia me deixar envolver. Só que, quanto mais eu fugia, mais ele aparecia na minha mente. Como se fugir dele fisicamente não impedisse a força gravitacional que ele exercia sobre mim.Era irritante. Quase sufocante. E eu tinha certeza absoluta de que ele estava percebendo.Cada vez que eu evitava seu olhar, cada vez que saía apressada de um ambiente onde ele estava, eu sentia aqueles olhos em mim. Observando. Esperando. E Thomas não era o tipo de homem que gosta
No final da tarde, minha assistente entrou apressada na minha sala com um bilhete em mãos.— Senhorita Harper, Harry Montserrat pediu para encontrá-la hoje.Meu olhar se ergueu imediatamente do relatório à minha frente.Harry Montserrat. Era óbvio que esse pedido viria mais cedo ou mais tarde. O verdadeiro poder por trás da Montserrat Enterprises.Peguei o bilhete e li rapidamente. Era um convite formal, direto. Ele queria me ver em sua residência. A mansão dos Montserrat, que eu já conhecia. Há dois anos, fui a um evento lá. Na época, estava salvando uma empresa pertencente a um dos poucos amigos próximos de Harry. Lembrei-me bem da imponência do lugar, da arquitetura clássica, da grandiosidade que parecia existir apenas para lembrar a todos que estavam diante de um império. E, agora, aquele império estava à beira do colapso.Ajustei a postura na cadeira, sentindo algo se encaixar no fundo da minha mente. Minha contratação veio dele. Não de Thomas. De Harry Montserrat. Talvez isso ex
O carro de Thomas deslizou pela estrada como se ele soubesse exatamente para onde estava indo. Eu, por outro lado, não fazia a menor ideia.Cruzei os braços e encostei no banco, sem disfarçar a irritação.— Se isso for um sequestro, já aviso que não sou uma boa refém.Thomas soltou um suspiro e manteve os olhos fixos na estrada.— Se fosse um sequestro, você não estaria sentada tão confortável.Revirei os olhos.O silêncio entre nós ficou incômodo, quase sufocante. Eu não gostava de ser arrastada para situações sem explicação, principalmente quando envolviam um homem como Thomas.Depois de um tempo, a paisagem mudou. Saímos do centro movimentado da cidade para uma área mais afastada, onde as luzes eram mais escassas e o ambiente parecia muito mais íntimo. Quando ele finalmente parou o carro, franzi a testa. Um restaurante. Pequeno, elegante e discreto. O tipo de lugar onde pessoas ricas vinham para escapar do caos da cidade e resolver negócios longe dos olhos do público.Thomas saiu
O ar dentro da sala de reuniões era pesado, como se até as paredes estivessem cientes da tensão. Meus passos soavam altos sobre o chão de mármore enquanto eu caminhava, mantendo a postura impecável, como uma mulher que não se intimida facilmente.Savannah Harper, consultora de grandes empresas. Uma mulher que sabia exatamente como fazer negócios e, mais importante, como lidar com homens como ele. Homens que acreditavam que o mundo se curvava diante do seu poder.Thomas Montserrat, CEO da Montserrat Enterprises, herdeiro de um império bilionário. Ele não era apenas um homem de negócios. Ele era um ícone. E por mais que eu tivesse ouvido falar dele, nada me preparou para encontrá-lo frente a frente.Ele estava parado ao lado da janela panorâmica, observando a cidade com a frieza de alguém que a possui.Quando ele se virou e nossos olhares se encontraram, o impacto foi imediato. Aquele olhar penetrante, desnudava tudo sem dizer uma palavra. Ele me analisava como se fosse uma equação que