No final da tarde, minha assistente entrou apressada na minha sala com um bilhete em mãos.— Senhorita Harper, Harry Montserrat pediu para encontrá-la hoje.Meu olhar se ergueu imediatamente do relatório à minha frente.Harry Montserrat. Era óbvio que esse pedido viria mais cedo ou mais tarde. O verdadeiro poder por trás da Montserrat Enterprises.Peguei o bilhete e li rapidamente. Era um convite formal, direto. Ele queria me ver em sua residência. A mansão dos Montserrat, que eu já conhecia. Há dois anos, fui a um evento lá. Na época, estava salvando uma empresa pertencente a um dos poucos amigos próximos de Harry. Lembrei-me bem da imponência do lugar, da arquitetura clássica, da grandiosidade que parecia existir apenas para lembrar a todos que estavam diante de um império. E, agora, aquele império estava à beira do colapso.Ajustei a postura na cadeira, sentindo algo se encaixar no fundo da minha mente. Minha contratação veio dele. Não de Thomas. De Harry Montserrat. Talvez isso ex
O carro de Thomas deslizou pela estrada como se ele soubesse exatamente para onde estava indo. Eu, por outro lado, não fazia a menor ideia.Cruzei os braços e encostei no banco, sem disfarçar a irritação.— Se isso for um sequestro, já aviso que não sou uma boa refém.Thomas soltou um suspiro e manteve os olhos fixos na estrada.— Se fosse um sequestro, você não estaria sentada tão confortável.Revirei os olhos.O silêncio entre nós ficou incômodo, quase sufocante. Eu não gostava de ser arrastada para situações sem explicação, principalmente quando envolviam um homem como Thomas.Depois de um tempo, a paisagem mudou. Saímos do centro movimentado da cidade para uma área mais afastada, onde as luzes eram mais escassas e o ambiente parecia muito mais íntimo. Quando ele finalmente parou o carro, franzi a testa. Um restaurante. Pequeno, elegante e discreto. O tipo de lugar onde pessoas ricas vinham para escapar do caos da cidade e resolver negócios longe dos olhos do público.Thomas saiu
Cruzei os braços e encarei Thomas com a firmeza de quem não aceitaria mais rodeios. Ele suspirou pesadamente, passando a mão pelos cabelos, claramente frustrado com minha insistência.— Se eu te contar, você promete que não vai abrir a boca para ninguém? — Ele finalmente cedeu, mas sua expressão deixava claro que ele odiava estar fazendo isso.— Prometo. — Minha resposta veio rápida e certeira.Thomas me estudou por alguns segundos, como se estivesse decidindo se eu era confiável ou não. Então, ele se inclinou levemente para frente, apoiando os antebraços na mesa, e disse:— Meu pai teve um caso extraconjugal anos atrás. Dessa relação nasceu um filho. Meu meio-irmão.Minha mente processou as palavras devagar.— E o que isso tem a ver com a venda da empresa?Thomas soltou uma risada amarga.— Tem tudo a ver. Esse cara é um desastre ambulante. Vive se metendo em confusão, gastando dinheiro com negócios duvidosos, e agora quer uma fatia do império Montserrat.Arqueei uma sobrancelha.— E
O silêncio entre nós parecia pesado. O carro seguia pelas ruas iluminadas, mas minha atenção não estava na paisagem pela janela. Estava nele.Eu não queria olhar. Não queria reparar. Mas fiz exatamente isso.Thomas dirigia com uma mão no volante, a outra repousando casualmente no câmbio. A luz da rua entrava pelo vidro, iluminando seu rosto em ângulos dramáticos—o maxilar forte, o traço reto do nariz, a forma distraída como ele mordia o lábio inferior. Ele fazia isso com frequência, e agora eu percebia o quanto isso era...Não.Virei o rosto, irritada comigo mesma. Ele não era atraente. Ele era um problema. Mas meu corpo não entendia isso tão bem quanto minha mente.— Você está tensa.A voz dele quebrou o silêncio, com uma diversão contida. — E você ainda está aqui. Coincidência?Thomas soltou uma risada baixa, rouca, e aquele som percorreu minha espinha como um arrepio involuntário.— Sempre com uma resposta afiada, Savannah. Mas seu tom me diz outra coisa.Ele virou a cabeça leveme
No dia seguinte, cheguei ao escritório sentindo como se tivesse sido atropelada por um caminhão. O corpo inteiro doía depois de uma noite de sono inexistente, e as olheiras denunciavam minha batalha fracassada contra a insônia. Minha mente girava sem parar, revivendo cada detalhe da conversa com Isabelle, tentando ligar os pontos sobre Damon e a confusão na Montserrat Enterprises.Caminhei pelos corredores segurando um café forte, torcendo para que me mantivesse funcional. Mas é claro que o universo não me daria uma trégua.— Savannah.Parei no meio do corredor ao ouvir a voz grave e familiar.Olhei para o lado e vi Thomas encostado na porta da sala dele, os braços cruzados e aquele olhar de quem sabia que eu tentaria evitá-lo se tivesse a chance.Suspirei fundo, preparando minha paciência antes de segui-lo para dentro da sala.Assim que fechei a porta, ele foi direto ao ponto.— Já decidiu o que vai fazer?Cruzei os braços, fitando-o sem demonstrar cansaço.— Não tenho muitas opções.
Empurrei o prato para longe, sem fome alguma. Thomas ainda me olhava como se estivesse esperando uma resposta, mas eu não ia dar o gostinho.— Se estamos do mesmo lado, então pare de me testar — soltei, cruzando os braços.Ele riu. — Eu não te testo, Savannah. Eu provoco. Tem uma diferença.Revirei os olhos e me levantei.— Seja lá o que for, só me deixe trabalhar.Thomas inclinou a cabeça para o lado, analisando cada mínimo detalhe da minha expressão.— Você está irritada.— E de quem é a culpa?Ele se levantou também, parando ao meu lado. Muito perto.— Sua.Eu pisquei.— Minha?— Você se irrita porque se importa demais. Se não se importasse, não teria vindo até minha casa com aquele relatório, não teria questionado tanto, não estaria aqui agora, conversando comigo quando já poderia ter ido embora.Me afastei um passo, sentindo o calor do corpo dele perto demais.— Eu me importo com o meu trabalho, Thomas.— Tem certeza?Ele ergueu uma sobrancelha, o olhar penetrante, como se tenta
Eu nunca conheci outra vida além dessa. Ainda criança fui treinado para assumir os negócios da família, para seguir um caminho que nunca escolhi, mas que foi imposto a mim como se estivesse gravado em meu DNA. Meu pai fez questão de moldar cada aspecto do meu futuro, como se minha existência tivesse um único propósito: manter o império Montserrat intacto. E agora, ele mesmo queria se desfazer da empresa. Como se fosse descartável. Como se todo o esforço, cada sacrifício que fiz, não valesse nada. Eu nunca tive uma infância normal. Nunca fui um adolescente comum. Enquanto outros garotos se preocupavam com festas e garotas , eu já estava aprendendo sobre balanços financeiros, fusões e aquisições. Tive que ser diferente, focado. Tive que suportar as pressões, provar que era digno do legado Montserrat. E agora, tudo isso podia acabar porque meu pai teve uma aventura e gerou um filho bastardo. Damon. Um inútil que acredita que o mundo lhe deve alguma coisa. Cresceu sem nenhuma respons
Eu sabia que Savannah faria perguntas. Ela sempre fazia. Enquanto caminhava pelo galpão, analisando cada detalhe, eu percebia que sua mente trabalhava a mil por hora, processando tudo o que via. Seus olhos dançavam entre os monitores, os relatórios sobre as mesas, as conversas entre os funcionários. — Como você manteve isso em segredo? — ela perguntou, sem tirar os olhos de um gráfico detalhado na tela à sua frente. — Não foi fácil — admiti, parando ao lado dela. — Mas meu pai não presta atenção nos detalhes do que fazemos fora da sede. Ele confia que eu sei o que estou fazendo, então nunca questionou. Ela virou o rosto para me encarar, os lábios pressionados em uma linha fina. — E você sabe o que está fazendo? Soltei um riso baixo. — Nunca soube tanto. Ela não sorriu. — Isso ainda não me explica tudo. Por que esconder? Por que não apresentar esse projeto diretamente para ele? Cruzei os braços e suspirei, escolhendo as palavras com cuidado. — Porque não se trata