ALGUNS DIAS DEPOIS
Há alguns dias ela vinha esperando uma ligação ou um e-mail que lhe desse uma boa notícia. Não que não estivesse feliz da forma como estava. Para ser sincera, sair de Vilamares seria extremamente doloroso, mas era parte da vida real despedir-se e recomeçar. Além do mais, precisava de um emprego. Não poderia mais ficar gastando dinheiro de forma desmedida, principalmente sendo jovem e tendo força para trabalhar. E ela queria trabalhar. Queria fazer algo útil com seu tempo.
Bem, na verdade, ela estava fazendo. Enquanto passava tardes deliciosas na pousada com Anne, passeando por Vilamares e as noites fazendo amor com Marcos, continuava escrevendo seu livro. Tudo estava indo tão bem, que ela tinha a previsão de termina
QUINZE DIAS DEPOIS — Se eu tivesse apostado... — Karen comentou para Anne, enquanto esta via televisão. A mais velha estava escrevendo seu livro quando uma mensagem acusou um novo e-mail, e ela foi correndo ver ao perceber que o remetente era Sérgio. — O que foi? — Anne virou-se para ela, desviando a atenção da TV. — Sérgio e Patrícia vão se casar. Estão me chamando para madrinha. — Que legal! — A menina levantou-se e colocou-se atrás da irmã, na mesa de jantar, para ver o que eles diziam.
Era a quinta vez que ele olhava o relógio, isso nos últimos dez minutos. — Ela não está atrasada? — Sérgio perguntou, nervoso como... Bem, como um noivo no altar, esperando a noiva chegar. Exatamente o que ele era. — Claro que está. Noivas se atrasam. É a regra, — Não sei quem foi que inventou esta regra estúpida... — Marcos comentou, e recebeu um olhar de aprovação de Sérgio. Depois, virou-se para Karen: — Quando nós nos casarmos, quero que chegue no horário, pois não quero ficar assim tão nervoso.&
Ela tinha medo da escuridão. Todas as vezes que olhava pela janela e percebia que, lentamente, as estrelas começavam a dançar sobre o manto negro da noite, e que o breu lançava seu fascínio e seus mistérios sobre o mundo, ela sabia que os gritos, a violência e as longas horas de terror começariam. Mas a verdade era que estava começando a aprender a ser egoísta. As sessões de espancamento que sua mãe sofria não a abalavam tanto quanto as batidas em sua porta durante a madrugada. Sabia que tudo dependia simplesmente de si mesma, de sua escolha. Se fosse uma boa menina, ninguém além dela sairia machucado. Se fizesse tudo que lhe era mandado, sua mãe e sua irmã estariam a salvo. E ela sentia o peso daquela r
Seis Anos Depois - Janeiro Amália Gonçalves amava o verão. Sua pousada, Refúgio, estava sempre pronta para receber a estação mais esperada por uma cidade praiana. O jardim do lugar despontava como se tivesse hibernado por anos e anos, e como se ainda fosse primavera. As rosas ainda tomavam suas formas, os girassóis procuravam os primeiros raios de luz e tudo estava colorido e vivo. A pousada tornava-se cada dia mais linda, e Amália se orgulhava dela como se fosse um filho. Tanto que simplesmente não conseguia deixá-la. Quando a criara, assim que o marido faleceu, deixando-a com o coração partido e uma situação financeira
Enquanto observava a moça descer as escadas, pensava que fora ousada demais em sua primeira aproximação. Queria apenas verificar se ela podia vê-la assim como a irmã, mas não imaginara ter sucesso em sua tentativa. Por sorte encontrara aquela delicada fitinha de seda para poder ter o que falar ou seria uma situação constrangedora. Mas não era isso que importava, o que realmente ocupava sua mente naquele momento era a constatação de que fora vista. Aquilo lhe assustava e a deixava excitada ao mesmo tempo. Não haveria mais uma eternidade de solidão nem de silêncio, sua estranha existência teria um significado a partir daquele momento. Porém, para tentar ajudar aquelas duas almas sofridas, precisava descobrir mais sobre elas. E
Um raio cortou o ar, um trovão entoou sua canção assustadora e a tempestade se formou em poucos minutos. Anne não gostava de tempestades, e Karen sabia disso. Sabia que quando ela era pequena, sempre corria para seu quarto todas as vezes que havia a promessa de um temporal, ou quando o clarão de um relâmpago clareava a noite. Ela acreditava que era o anúncio da chegada de monstros ou fantasmas, e embora Karen sempre tivesse lhe ensinado que essas coisas não existiam, ela ainda procurava a proteção da irmã mais velha. Porém, daquela vez foi diferente. Claro que já fazia muito tempo desde a última noite que passaram juntas, e Karen lamentava que logo a primeira já estivesse sendo coroada por uma chuva bem forte, porém, acreditava que velhos hábitos nunca desapareciam. Uma vez com medo de tempesta
Ele andava de um lado para o outro, ansioso como sempre. Não estava buscando uma pousada com ares acolhedores, mas fora o melhor que encontrou. Ao menos estava longe o suficiente de todas as terríveis lembranças... esperava apenas que não lhe fizessem muitas perguntas, especialmente aquelas que não estava disposto a responder. Além de perguntas, ele também odiava surpresas. Odiava não saber o que o esperava, odiava ser surpreendido, mas fora exatamente o que acontecera quando a porta daquele lugar foi aberta. Não esperava ser recebido, àquela hora, em uma noite tão fria, por uma mulher tão jovem. E, céus, como ela era bonita! Tinha uma expressão assustada, vulnerável e inocente, em um rosto angelical e delicado. Parecia uma daquelas mulheres de filmes antigos que sua mãe gostava de assistir quando el
Ele só podia estar ficando louco. Louco! Estava ali naquela cidade para se curar, para reunir os pedaços de seu coração partido e colá-lo outra vez. Já era sua segunda parada naquela estranha e solitária road trip[1] de férias, e esperava não levar muito mais tempo para resolver aquele problema. A mamata não poderia durar para sempre. Sendo assim, não conseguia compreender por que se preocupara com a garota, muito menos com a irmã. Elas não eram problema seu. Não eram sua responsabilidade. A única pessoa de quem deveria ter cuidado, protegido, traíra sua confiança e estava agora no fundo do poço. Passara a sentir-se um pouco solitário nos últimos meses, mas talvez fosse melhor assim. Quanto