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Parte 4...

Elena

As horas passaram lentamente, o clima na confeitaria oscilando entre a tranquilidade habitual e uma tensão subjacente que eu não conseguia afastar.

Quando chegou perto das cinco, comecei a preparar a encomenda do homem, embalando os doces com todo o cuidado.

Vicky me ajudou, mas eu podia ver que ela estava inquieta, seus olhos constantemente indo em direção à porta.

— Você acha que ele... Pode ser alguém perigoso? - ela perguntou de repente, sua voz baixa, quase como se estivesse com medo de que alguém pudesse ouvir.

Eu pausei, refletindo por um momento.

— Não sei, Vicky. Ele me pareceu estranho, mas isso não significa que ele seja perigoso. Vamos apenas entregar a encomenda e depois podemos ir para casa. Nós estamos com os nervos à flor da pele.

Ela assentiu, mas o medo em seus olhos não desapareceu.

Vicky sempre foi a mais medrosa de nós duas. Eu também sou, mas como sou um pouco mais solta, eu acabo fazendo as coisas com medo mesmo.

Quando o sino da porta soou novamente às cinco em ponto, eu me virei para ver o homem entrando na loja mais uma vez.

Desta vez, ele estava acompanhado por dois outros homens, ambos igualmente imponentes. Minha apreensão aumentou, mas tentei me manter calma. Eu não posso ficar com medo de todo homem que aparecer aqui com uma cara estranha.

— Aqui está sua encomenda, senhor - eu disse, tentando não olhar para os outros homens que estavam ao lado.

Ele se aproximou do balcão, com o mesmo sorriso enigmático nos lábios.

— Excelente, senhorita. Muito obrigado! - ele disse, pegando o pacote com uma mão e deslizando uma nota generosa pelo balcão com a outra. — E, por favor, considerem isso um bônus pelo ótimo trabalho.

Eu peguei o dinheiro, agradecendo com um sorriso forçado. Ele olhou para Vicky uma última vez antes de sair, seus olhos se demorando nela de um jeito que fez meu estômago revirar.

Assim que eles saíram, o ar na confeitaria pareceu mais leve, mas o desconforto persistia.

— Ele estava nos testando, Elena, só pode ser - Vicky disse, a voz trêmula. — Eu tenho certeza disso.

— Não sei, Vicky, mas precisamos ser cuidadosas - eu respondi, fechando a porta atrás deles. — A última coisa que queremos é atrair a atenção de gente perigosa.

Ela assentiu e nós nos olhamos, compartilhando o mesmo medo silencioso. A confeitaria estava vazia agora, e o som da chuva leve começando novamente lá fora parecia anunciar que algo mais estava por vir.

** ** **

Depois que limpamos e fechamos a confeitaria, trocamos de roupa para voltar para casa. O céu ainda estava cinzento, escuro, mas a chuva agora era só uma garoinha.

— Vamos logo, Elena - Vicky disse, pegando a chave para trancar a porta da frente — Eu quero voltar para o trailer antes que a chuva volte mais forte.

Enquanto atravessávamos a rua, protegidas por nossos casacos comprados em um brechó, ouvimos um som alto, um rugido na verdade.

Olhamos na direção e entendi que era o motor de um carro que quebrava o som monótono da garoa. Era um carro possante, não sei qual é, porque não conheço marcas de carro, mas dá pra perceber que é carro de gente rica.

— Cuidado, Vicky! - eu gritei com urgência, mas o som do motor era mais alto.

Antes que Vicky pudesse desviar, o carro fez uma curva brusca, o asfalto úmido fazendo com que ele derrapasse ligeiramente. Quando o carro atravessou uma grande poça de água, fez um barulho alto e lançou uma onda gelada e suja em cima da gente.

A água fria e contaminada nos acertou em cheio, deixando os nossos casacos encharcados e as nossas pernas cobertas de respingos viscosos. Me deu raiva.

Vicky soltou um grito agudo e deu um pulo por instinto, para trás. O corpo dela tremia.

Eu também tentei me livrar do impacto, mas a água suja já estava por cima de mim e fedia, me dando uma sensação desconfortável e de nojo também.

O carro parou de modo brusco, os pneus escorregando e fazendo um barulho fino da borracha contra o asfalto. Os faróis já estavam acesos e iluminavam a cena.

O motorista abriu a porta. Vi sair de dentro um homem alto, robusto, que nos encarou com um semblante sério e carrancudo. Acho que ele ficou com raiva que nós atrapalhamos sua correria pela avenida.

Mesmo estando um pouco escuro, eu notei os olhos dele. Eram azuis, gélidos e penetrantes. Senti a mão de Vicky no meu braço.

— “Idiot” - ele fez um gesto com a mão, batendo na cabeça — “Sunteti proast?”

Eu olhei para Vicky e ela estava como eu, sem entender nada do que ele tinha dito.

— O que ele disse? - ela perguntou.

— E eu sei lá... - dei de ombros — Mas eu acho que ele está com raiva.

— O que disse? - Vicky gritou para ele.

— Que vocês são idiotas! - ele respondeu de imediato, com um tom agressivo.

— Era só que faltava! - ela colocou as mãos na cintura — Você é louco? - deu um passo para trás de mim.

— Olhem por onde andam! - ele rosnou.

— E você ande como gente! - eu devolvi, minha voz cheia de indignação — Olha só a merda que você fez?

Ele avançou em nossa direção, com raiva em cada passo. Me afastei e acabei pisando no pé de Vicky, atrás de mim.

Os olhos dele se fixaram nos meus e eu fiquei com medo que fosse me bater. O homem parecia mais um gorila de tão largo e alto que era. Isso é bem intimidador.

Antes que a gente corresse ou o homem nos pegasse, um outro carro parou logo atrás e um homem desceu. Esse era diferente. Tinha um porte mais elegante e até que era bonito, mas não o olhei bem porque estava ligada no outro, pensando em correr se ele desse outro passo.

— O que está acontecendo aqui? - ele olhou de modo frio para o gorila e depois para nós. Sua voz estava calma. Eu não.

O primeiro homem pareceu hesitar um pouco, avaliando a situação.

— Estas duas aí estavam no meu caminho - ele informou ao outro como se fosse ele a vítima — Me atrapalharam!

O homem olhou para a gente, avaliando a informação, os olhos estreitos. Sem dizer uma palavra, ele se aproximou e fez um sinal com a mão para que o gorila entrasse no carro de novo.

Acho que ele deveria ser o chefe ou algo assim porque o gigante obedeceu de modo relutante e bateu a porta.

— Pronto! Vocês podem seguir - ele disse, olhando para nós com desprezo — E tenham mais cuidado na próxima vez.

Eu nem pude responder. Ele entrou no carro e saiu, desaparecendo na esquina. Olhei para Vicky que estava com uma cara de perturbada.

— Você está bem? - passei o braço pelos ombros dela para lhe dar conforto.

— Sim, estou... Só um pouco assustada - respondeu com a voz trêmula — Que diabos foi isso? - ela fez uma careta — Que homem horroroso era aquele? Ele quase me atropelou.

— É... Ainda bem que não - olhei para minhas pernas — Mas nos deu um banho de água suja... Filho da puta!

** ** **

Descemos do ônibus e caminhamos rápido para casa. Depois de ontem, decidimos que não vamos sair para vender as flores hoje.

Quando nos aproximamos do acampamento, senti um calafrio percorrer minha espinha, mas não foi de frio. Eu sentia que tinha algo de errado e pelo olhar de Vicky, ela também.

O caminho até nosso trailer até parecia mais longo dessa vez. E o silêncio estava esquisito. Não era tão tarde para todos estarem dormindo. Senti uma coisa apertando meu peito.

Quando nós finalmente nos aproximamos do trailer, que chamamos de casa, porque é nosso único canto, eu senti que meu coração deu uma parada por um instante.

A porta do trailer estava aberta, pendendo das dobradiças e uma sensação de pavor se espalhou por mim como um veneno.

— Elena... O que aconteceu aqui, meu Deus? - Vicky murmurou com a voz tremendo e os olhos arregalados, em um misto de medo e descrença — Jesus, amado...

Eu dei um passo para a frente, de modo hesitante, sentindo minhas pernas tremerem pelo peso da adrenalina. Tudo dentro de mim gritava para correr, para sair dali o mais rápido possível, mas eu sabia que nós não tínhamos outro lugar para ir. O trailer é tudo que nós temos.

— Fique atrás de mim - eu murmurei, tentando soar mais corajosa do que eu realmente sou, só pra não assustá-la mais.

Eu empurrei a porta devagar e o som baixo da madeira rangendo era quase insuportável na quietude da noite.

A primeira coisa que eu vi foi o nosso pequeno e velho sofá, virado com as almofadas rasgadas espalhadas pelo piso. Nossa pequena mesa de jantar estava de lado, com as cadeiras quebradas e jogadas pelos cantos.

Os armários da cozinha estavam abertos, escancarados, com os pratos e copos estilhaçados, cobrindo o chão de madeira. Até parecia que um furacão tinha passado por ali.

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