Adeus, Samantha
A música na jukebox ainda tocava, mas bem baixo para não incomodar os vizinhos. Os três estavam limpando o restaurante. Rebecca já tinha limpado as mesas e estava agora passando o mop, quase terminando para ir ajudar os outros dois que estavam na cozinha. Rebecca estava doida para ir para a cozinha; aqueles dois estavam muito quietos, a fofoca deveria ser das boas, pensava ela. Mas na cozinha não estava rolando conversa alguma, apenas uma troca de olhares, cheia de lágrimas de felicidade, um pouco por conta da noite que foi maravilhosa e um pouco pela conversa que eles tinham tido no bar. Estavam planejando como contar para Rebecca, não poderia ser um segredo, não mais. Rebecca entrou na cozinha soltando um suspiro. — Terminei lá fora, gente, que noite! — Disse ela com aquele sorriso maravilhoso no rosto. — Bora! Deixem de segredinho e contem o que está rolando. — Disse cutucando Antony, que lavava a louça, enquanto Samantha enxugava e fazia pilhas. Ela os conhecia bem e sabia que tinha alguma coisa rolando. — Pelo amor de Deus, não diga que vocês estão juntos? — Disse ela num misto de nojo e medo. — Ele não daria conta disso tudo. — Disse Samantha, piscando para Antony e rindo. Estendeu um pano que estava no ombro e Rebecca começou a secar os pratos. — Gente, é sério, não me façam vomitar. — Rebecca realmente estava enojada só de imaginar. — Menina, te acalma. Nós não estamos transando, credo! — Disse Samantha, tentando acalmar a filha. — Eu e Tony pensamos em almoçarmos juntos para falarmos sobre o restaurante, só isso. Quero que tudo dê certo e, para isso, precisamos controlar tudo o que acontece aqui. Enquanto eles estavam na cozinha arrumando, limpando e conversando, lá fora estacionava um carro preto. Dele desceram quatro homens e entraram no restaurante. Nesse momento, Samantha estava saindo da cozinha cheia de pratos na mão e se deparou com os homens. Um deles apontou a arma para ela. No susto, ela derrubou tudo o que carregava, assustando os dois que ainda estavam na cozinha, fazendo com que eles corressem até ela. — Calma, calma, calma. — disse o homem, ainda apontando a arma para Samantha. — Por favor, por favor, leve tudo, mas não machuque minha mãe. Temos dinheiro no caixa, todo o dinheiro da noite está lá! — Disse Rebecca, tremendo, chorando, morrendo de medo. Antony estava ali ao seu lado, olhando para eles com a cara séria, segurando-a para que não avançasse mais. Ele não demonstrava medo, não demonstrava nada, apenas estava ali com Rebecca. — Achou mesmo, Antony Catalano, que eu não iria achar essa vagabunda? Achou que eu não iria descobrir com você na cola dela feito um cachorrinho? — Cuspiu no chão ao dizer isso. Era italiano, cabelo cacheado, feição forte, tinha uma pinta no rosto, musculoso; dava para ver que não era boa coisa. — Victor Milani, você e aqueles porcos que chama de família já deveriam saber que com os Catalano e sua família não se deve mexer. — Disse Antony, ainda sem emoção alguma. Atrás apareceu Maurício. Ele ergueu os braços e apontou as armas para os dois que estavam mais próximos da porta. Victor, apesar de olhar para Antony, continuava com a arma apontada para o peito de Samantha, que permanecia parada com as mãos erguidas. — Vocês não deviam estar aqui. — Disse Maurício, com os olhos fervendo de raiva. — Eu estou pronto para acabar com isso. — Disse Victor. — Eu também. — Disse Antony. Lá fora chegaram mais três carros. Então começaram os tiros. Na mesma hora, Antony se jogou em cima de Rebecca, protegendo-a e tirando uma arma da bota que usava, participando do tiroteio. O que começou dentro do restaurante se estendeu até a rua. Depois de um tempo, houve um curto silêncio, e em seguida ouviu-se cantada de pneus e alguns homens gritando. — Anda, anda, anda! Não os deixe fugir! E então a rua estava silenciosa. E então um grito ecoou, fazendo com que cada pessoa que morava ali se arrepiasse. — Mãe! Mãe! Não, meu Deus, não! — Rebecca chorava em cima da mãe morta, deitada na poça do próprio sangue. Maurício e Antony entraram ofegantes no restaurante e viram Rebecca deitada em cima da mãe. A jovem estava desesperada, abraçava a mãe e chorava descontroladamente. Antony se aproximou e a abraçou. Ele também chorava, não acreditava no que havia acontecido. — Tony, eu os vi chegar da janela e chamei os outros imediatamente, mas um conseguiu fugir. Não vamos descansar até pegá-lo. — Disse Maurício, ainda de pé, mais atrás. — Tio, chama a ambulância, ela não pode morrer, ela não pode. — Disse Antony, desesperado. — Já chamei, mas, filho, ela se foi. Os vizinhos começaram a aparecer, alguns ao telefone chamando a ambulância, a polícia; outros foram entrando. Ali já não estava apenas uma jovem órfã aos prantos, ali havia uma vizinhança que perdeu uma das mulheres mais felizes dali. Não demorou muito para chegarem as viaturas e a ambulância. Pegaram Samantha e a levaram para o hospital, atrás estavam Antony e Rebecca. Maurício ficou no local com a polícia. No hospital, Rebecca recebeu a confirmação da morte da mãe. Paralisou, veio um frio na espinha, as forças se acabaram e foi ao chão, apenas chorava e soluçava. Não conseguia falar, pensar, não conseguia respirar. Estava tendo uma crise. Antony apenas segurava a amiga, não podia se deixar levar pelas emoções, tinha que cuidar dela. Uma enfermeira deu uma medicação com a promessa de melhora, o que não demorou. Sentada ao lado do amigo, com a cabeça apoiada no ombro dele, foi se acalmando. Soltou um suspiro e começou: — Tony, como vou fazer isso sozinha? Não tenho dinheiro, gastamos tudo com o restaurante. — Becca, você não está só, estou aqui por você. Vamos te ajudar. — Disse ele, abraçando-a e acariciando sua cabeça. — Vamos? Antony, eu não posso arrastar você e seu pai para todos os meus problemas. — Rebecca, meu pai me mandou aqui para isso, para ficar com você, para não te deixar só. Não se preocupe, vamos dar um enterro para ela. Quero que escolha tudo, quero que seja como você deseja, e não se preocupe com o preço de nada. Ele abraçou a amiga, que estava aos prantos. Tinha algumas coisas que deixaram Rebecca confusa, mas como pensar em algo que não seja sua mãe morta? Nos dias seguintes, Rebecca teve Antony e Maurício ao lado. Eles a ajudaram em tudo, até na hora de dormir. Ela estava morrendo de medo e ficava na casa deles, até dormindo na mesma cama que seu amigo. A jovem alegre que vivia com um sorriso lindo no rosto agora não existia mais. Olheiras surgiram, não comia direito, para dormir tinha que estar medicada, e isso deixava todos preocupados. O dia do enterro chegou, mas ela paralisou e não conseguia se mexer. Antony a colocou sentada na cama, abaixou e olhou bem nos olhos dela. Olhava-a cheio de doçura, segurou e beijou suas mãos. Rebecca nunca tinha visto aquele olhar. Conhecia muito aquele rapaz, mas aquele olhar de compaixão nunca tinha visto. — Becca, eu sei que é difícil. Já enterrei alguém muito importante para mim também. Sei que está tudo confuso, sei o vazio que está sentindo. Mas eu prometi à sua mãe, eu prometi à Samantha que nunca deixaria você. É meu dever ficar ao lado da minha irmã. Você não está sozinha, sempre estarei aqui. Mas precisa levantar e dar o descanso dela para poder começar sua nova fase. — Eu não consigo me mexer. — Falou chorando, mas não tinha mais emoção, ela só chorava. — Eu vou te ajudar. Ao dizer isso, ele se levantou e a levantou junto. Levou-a ao banheiro, tirou suas roupas e deu banho, vestiu-a com um vestido preto que era da sua mãe, penteou os cabelos, fez um coque alto e ajeitou com uns prendedores, passou rímel e batom vermelho. Era óbvio que ele não queria que ela estivesse desarrumada, até porque a própria Samantha vivia dizendo não querer gente feia em seu enterro. Isso sempre tirava sorrisos deles, pois ela sempre listava o que queria, o que não queria e como era para a filha estar. Aquilo era um adeus, era o adeus a Samantha, sua vizinha que tanto amou, mãe de sua melhor amiga, mãe da sua irmã. Então ele seguiu o que ela falou. Antony e Maurício ficaram com Rebecca o tempo todo. Carregaram o caixão, seguraram sua mão, choraram. Todos foram embora e eles ainda ficaram ali por um tempo antes de decidirem ir para casa. Rebecca não chorava, não falava, só estava ali e, mesmo assim, parecia não estar. O carro estacionou; estavam na frente do restaurante. Ela desceu e entrou lá, Antony a seguiu. Maurício, que estava dirigindo o carro, não entrou no restaurante como eles estavam fazendo, apenas seguiu para a casa dela. — Olha isso, olha como está o restaurante da minha mãe. Isso era o sonho dela, Tony. E ela começou a chorar. O lugar que antes era aconchegante e cheio de alegria estava com um cheiro ruim, tudo revirado, sujo, quebrado, imundo. No chão estava a poça onde sua mãe estava deitada há uns dias. — Becca, preciso que confie em mim. Vamos embora. — Já estou indo para casa. — Não, vamos embora desse país, vamos para a Itália. Meu pai nos espera.Conte nossa história Os dois saíram juntos do restaurante e seguiram para casa. Os vizinhos estavam lá, já sabendo que eles iriam embora. Abraçaram e beijaram a jovem, dizendo que seria melhor mesmo não ficar ali, que era para mandar notícias, que tudo ia ficar bem e, se quisesse voltar, eles estariam ali. Realmente eram ótimos vizinhos e, aos poucos, foram embora. Rebecca subiu para seu quarto, onde Maurício estava fazendo suas malas.— Peraí, vocês estão falando sério sobre irmos embora? Eu não posso ir para um lugar que não conheço, Maurício. — Puxou a mala que estava em cima da cama para perto de si. — Rebecca, você não pode ficar aqui, é perigoso. Já perdemos a Samantha, e o planejado não era esse. Era para vocês irem juntas para casa, então, antes que algo mais dê errado, nós vamos embora. O jatinho já está pronto. — Puxou a mala de volta e começou a arrumar novamente. Ela ficou ali parada, sem entender. Antony entrou no quarto, catou tudo o que conseguiu numa braçada só e jo
Mamãe sabe?Rebecca acordou e ainda estava em voo. Estava meio zonza e ficou quieta, observando Antony e Maurício resolvendo umas coisas que ela não fazia ideia do que eram. Ela percebeu que logo também teria que estar envolvida nos assuntos da família, mas como faria aquilo?Começou a ficar com medo, e quando está com medo, ela começa a mexer as mãos. Maurício e Antony já tinham percebido que ela havia acordado, mas continuaram suas tarefas. Então, Maurício percebeu as mãos dela. Ela apertava os dedos, ele sabia o que era. Foram anos convivendo juntos, então ele a conhecia muito bem, além de que Antony, quando era criança, fazia o mesmo. Fechou o notebook, levantou-se e foi até ela.— Que foi, querida? — perguntou com muita doçura.— Tô com medo, tio. — E riu. — Eu sempre te chamei de tio e acabou que era mesmo. — O sorriso se desfez e o medo voltou.— Sim, sou seu tio. Mas se não se sente confortável com isso, tudo bem, sei que é muita coisa para digerir. Só quero que saiba que você
Início da VingançaRebecca foi a primeira a acordar, se arrumou e ficou esperando os outros acordarem. Não demorou muito e todos estavam alimentados e pegando a estrada. Dessa vez, mandaram um motorista; Maurício foi na frente e os irmãos atrás. Pareciam crianças, apontando para tudo, rindo e conversando. Rebecca adorou a paisagem; na verdade, ela adorou tudo o que estava vendo e achou tudo lindo.Demorou, mas chegaram. A casa ficava muito afastada da cidade e era enorme. Tinha um portão alto de ferro e, atrás dele, um caminho com árvores de cada lado. No final do caminho, havia uma fonte de mármore branco e, atrás, estava a mansão. Havia cinco degraus até a entrada de mármore branco, duas colunas também de mármore branco, dois jarros de plantas grandes e a porta ficava entre os jarros, uma enorme porta de madeira escura. As janelas eram da mesma madeira da porta, as paredes eram de pedra e algumas janelas tinham uma pequena varanda com plantas suspensas. O jardim ao redor de onde est
O JantarRebecca acordou de um sono pesado no final da tarde com Antony chamando-a. Já eram 17:00 horas, e ela precisava se arrumar para o jantar. Giovanni havia organizado um jantar com toda a família, inclusive a família "de negócios". Ele queria apresentar a filha e começar a planejar os próximos passos.— Becca, você tem que levantar para se arrumar — disse Antony quando ela abriu os olhos.— O quê? Para quê? — disse Rebecca, ainda zonza.— O jantar que papai organizou. Todo mundo vai estar lá. Seu quarto está cheio de presentes — disse ele, olhando para o canto repleto de pacotes. — Acho que você pode usar algo novo hoje — sugeriu, mexendo nos presentes.— Tem muita coisa aqui. Nunca recebi tantos presentes — falou, levantando-se devagar.— Venha abrir. Tô curioso — disse ele, sorrindo.Ela se aproximou, e começaram a abrir os presentes. Aos poucos, ela foi se animando. Havia de tudo: livros, perfumes, roupas, maquiagem, flores e até uma chave, embora ela não soubesse se era de c
A Reunião Quando Rebecca saiu da cama, já passava das 13h. A governanta a acordara, e assim que Rebecca abriu os olhos, a mulher escancarou as cortinas, deixando a luz inundar o quarto. Rebecca, irritada, se cobriu até a cabeça e tentou se acomodar novamente na cama.— Não, não, não, pode levantar! — ordenou a governanta, puxando o lençol sem cerimônia.— Pelo amor de Deus! — exclamou Rebecca, com os cabelos desgrenhados.— Você está péssima! — comentou a mulher de maneira natural, entregando a Rebecca uma caneca de café bem forte. — Tome, isso vai te ajudar.— Obrigada. Humm, tá gostoso — murmurou Rebecca, tomando um gole.— Então, o que vai fazer hoje? — perguntou a governanta.— Eu não faço ideia. O que faz uma filha de mafioso? — Rebecca respondeu, com um sorriso irônico.— Casa, tem filhos e anda por aí bem bonita — disse a governanta, empurrando Rebecca para fora da cama.— Nem pense nisso! — retrucou Rebecca, sentando-se à mesa que havia em seu quarto, e atacando as torradas q
Os CatalanoIr à cabana estava deixando todos animados. Fazia muito tempo que Giovanni não se empolgava ou tirava um tempinho para sair de casa e fazer algo diferente. Antony estava adorando a ideia de passar um tempo com a família, agora que estava completa.Iam todos à cabana: o pai, a irmã, os tios, Lourenço, Marco e Maurício. Fazia anos que isso não acontecia, os irmãos reunidos. Claro, eles falariam de trabalho, e muito, mas mesmo assim daria para aproveitar.De todos os tios, Antony era mais próximo de Maurício. Na mesma época em que a mãe de Antony estava grávida dele, a esposa de Maurício também estava, mas, infelizmente, a gravidez foi interrompida. Isso foi muito triste para todos e abalou profundamente Maurício. Após esse acontecimento, Maurício e a esposa foram passar um tempo com Giovanni, e acabaram se apegando ao menino.Maurício ama Antony como se fosse seu próprio filho, criaram uma conexão forte e bonita. Giovanni é muito grato por isso, pois, ao assumir os negócios
A CabanaDias se passaram até que todos fossem à cabana, localizada bem distante de casa. Quando Rebecca avistou a construção, não conseguiu conter o pensamento: “Uau!”. Para os Catalano, era um lugar simples, mas a simplicidade era apenas aparente.A cabana era enorme, com dois andares. Toda feita de madeira, tinha uma rede na entrada e, no segundo andar, uma pequena varanda com duas espreguiçadeiras. O interior também era de madeira, mas ao contrário do que Rebecca imaginava, não havia móveis antigos ou um estilo retrô. O ambiente era surpreendentemente moderno: a sala possuía um sofá espaçoso, tapetes cobertos de almofadas, e uma lareira. A cozinha americana tinha uma mesa para seis pessoas, e uma porta de vidro revelava o quintal mais lindo que Rebecca já havia visto.No quintal, havia uma fogueira cercada por cadeiras de madeira, e um caminho de pedras que descia até um rio, onde um barco e um pequeno píer completavam a paisagem. No segundo andar, havia três quartos: dois de casa
Em volta da fogueiraMaurício, Marco e Antony chegaram à noite, após resolverem algumas questões relacionadas aos ataques que a família sofreu. Eles tiveram que organizar o enterro e decidir o futuro da filha de Ricco, que havia sobrevivido. Felizmente, era uma menininha de apenas três anos, então não se lembraria de nada.Ao entrarem em casa, perceberam que estava tudo muito quieto. Verificaram os quartos e, ao constatarem que estava tudo em ordem, desceram. Viram que havia comida separada no balcão e a fogueira estava acesa. Eles avivaram o fogo e começaram a arrumar as coisas do lado de fora.Estavam famintos, então sentaram-se e começaram a preparar as salsichas na fogueira. A noite estava fria, e a fogueira os mantinha aquecidos.Após um breve descanso, Rebecca acordou. Ela estava de pijama, então colocou um roupão e calçou as pantufas, querendo ficar o mais aquecida possível. Olhou pela janela e viu a movimentação em torno da fogueira. Olhou para o lado e viu Matteo deitado, dor