Capítulo 4

Mamãe sabe?

Rebecca acordou e ainda estava em voo. Estava meio zonza e ficou quieta, observando Antony e Maurício resolvendo umas coisas que ela não fazia ideia do que eram. Ela percebeu que logo também teria que estar envolvida nos assuntos da família, mas como faria aquilo?

Começou a ficar com medo, e quando está com medo, ela começa a mexer as mãos. Maurício e Antony já tinham percebido que ela havia acordado, mas continuaram suas tarefas. Então, Maurício percebeu as mãos dela. Ela apertava os dedos, ele sabia o que era. Foram anos convivendo juntos, então ele a conhecia muito bem, além de que Antony, quando era criança, fazia o mesmo. Fechou o notebook, levantou-se e foi até ela.

— Que foi, querida? — perguntou com muita doçura.

— Tô com medo, tio. — E riu. — Eu sempre te chamei de tio e acabou que era mesmo. — O sorriso se desfez e o medo voltou.

— Sim, sou seu tio. Mas se não se sente confortável com isso, tudo bem, sei que é muita coisa para digerir. Só quero que saiba que você vai ter sempre o meu carinho. Logo vai estar cercada de tios e vai me esquecer. — Ele disse num tom de ciúme.

— Acha mesmo isso? Deixa de ser bobo! — Respirou fundo e então soltou o que estava lhe preocupando. — E se ele não gostar de mim? E se eu não aprender, não for útil?

— Só em existir você é útil, pare de pensar bobagem. Olha pro seu irmão, lembra de como ele ficou bobão quando te conheceu? O cérebro do garoto praticamente derreteu quando te viu, ele te amou assim que te viu, seu pai te amou assim que soube de você, e eu te amei assim que sorriu. Então pare de pensar bobagem. Tem gente neste momento arrumando a casa pra te receber, gente enchendo o saco ligando pra saber do que você gosta. Você foi amada por sua mãe, e não é porque ela se foi que isso irá acabar.

— Poxa, tio, não sabia que podia ser tão fofo. — Ela disse sorrindo, querendo deixar o clima mais leve.— Vocês planejaram tudo para chegar até mim, algo foi mentira?

— Nada foi mentira. Era pra gente ter dado nome diferente, mas o bobão ali esqueceu. Tudo que falamos sobre a infância do Tony é verdade. Então fique tranquila com isso. Giovanni está ansioso pela nossa chegada, mas avisou que estava chovendo muito, então vamos ficar num hotel. — Disse e levantou-se, voltando para o seu lugar.

Já fazia bastante tempo que estavam no voo, e ela já estava cansada daquilo.

— Tony, já que vamos ficar num hotel, será que posso ficar com você? — Perguntou ela, demonstrando medo.

— Já pensamos nisso, vamos todos ficar juntos. Suíte americana. Becca, desculpa, mas não posso te dar atenção agora, vai ver um filme, vai.

Bom, já que não tinha jeito, ela fez o que ele sugeriu. Mas logo a ansiedade voltou.

Os dois perceberam que ela estava inquieta, mas ignoraram, e isso a deixava ainda mais chateada.

Tentou dormir, assistir a um filme, ouvir música, e nada estava ajudando. Levantou-se, pegou uma garrafa de vinho, encheu a taça e começou a beber. Antony levantou-se e tomou a garrafa.

— Seu pai não gosta de exageros. — Falou ele bem sério, agora sim parecia um irmão mais velho. — Já estamos perto, está chovendo, vamos ter que ficar no hotel mesmo para depois seguirmos para casa.

— Fica muito longe? — Perguntou curiosa.

— Nossa casa? Um pouco, bastante na verdade. Mas vai gostar, garanto. O caso é que Sr. Giovanni está um pouco enrolado no momento e não nos quer por perto. Olha, não é porque ele é o chefe que ele é ruim. Nosso pai é meio bruto, mas ele cuida bem da família. Quando chegar no hotel, vou preparar seu banho, você precisa relaxar. — Guardou os documentos que estava revisando enquanto falava com Rebecca, sentou-se novamente de frente para ela e a olhou.

— A família é muito grande?

— Um pouco. Temos três tios, uma tia, todos casados. Tio Lorenzo tem três filhos, tio Marco dois, casal, e tia Emília duas meninas, e tio Maurício também tem um casal. Ah, quase esqueci, você terá um segurança, não vai sair de casa sem permissão ou sozinha.

— Tudo bem, eu não quero dar trabalho.

— Entenda que estamos sendo ameaçados e não queremos perder ninguém, é preciso ter cuidado e confiar na família.

— Tony... — pausou, respirou fundo e continuou. — Mamãe morreu sem saber que não estou só. Ela morria de medo de me deixar sozinha.

— Ela sabia, contei tudo a ela.

— Mamãe sabia? Mas ela sempre soube de vocês? E não me disse nada, por quê?

— Eu contei a ela no dia da inauguração. Contei quando fomos ao bar sem você. Íamos te contar, falamos disso.

— Não! Vocês disseram que íamos conversar sobre o restaurante. — Parou e olhou para ele, que a olhava fixamente de volta com um sorriso no rosto. — Vocês iam me contar…

— Sim, e foi a única vez que mentimos.

— Como ela reagiu? Ela parecia estar tão bem.

— Ela meio que já sabia.

— Como assim?

— Bom, lembra que eu falei que ele pensou em desistir da família? Então ele estava meio fora de si, não estava muito bem, e quando foi embora, falou pra sua mãe que era filho de mafioso e que tinha que voltar pra casa.

— E ela acreditou? — Disse ela, incrédula.

— Não, né? — E riram. — Ela achou que ele estava inventando histórias para sumir, então concordou com ele prontamente.

— Então aquele discurso, ela sabia, que eu não estava mais só, isso me deixa mais tranquila.

— A ideia era trazer vocês duas para ficar com a gente, infelizmente os Milani estavam um passo à frente. Rebecca, não vamos descansar até pegarmos o que fugiu e principalmente não vamos descansar enquanto não acabarmos com todos eles.

Após pousarem, foram direto para o hotel, estava chovendo muito, seria perigoso sair dirigindo naquelas condições.

Como prometido, Antony preparou o banho de Rebecca. Quando ela saiu do banho de pijama e roupão, havia bastante comida para eles. Sentaram juntos na mesa, conversaram sobre alguns membros da família, sobre os negócios, como era o pai, e as horas voaram sem que percebessem. O primeiro a se levantar foi Maurício, disse que estava velho e precisava dormir, o que fez os dois rirem. Não demorou muito e Rebecca foi deitar, enquanto Antony foi tomar banho. Quando retornou, Rebecca estava olhando para o teto, perdida em pensamentos. Ele sabia que era muita coisa, mas também sabia que ela daria conta, só estava cansada, logo estaria adaptada à vida nova. Sentou-se na cama dela, o que a fez olhar para ele. Ela sorriu.

— É muita coisa. Um dia você é apenas meu vizinho, meu melhor amigo com o pai esquisito e minha mãe estava viva. Só fiz piscar e agora estou sem mãe, seu pai é meu tio, meu pai é mafioso e você é meu irmão. É tudo uma loucura, mas só em saber que você é mesmo meu irmão me enche de alegria. Nunca me dei tão bem com alguém. Você me traz paz, mesmo com tudo o que está acontecendo. — Falou, segurando a mão do irmão.

— Você preencheu um vazio. Papai é muito ocupado, você sabe, e nem sempre podia ficar comigo. Quando te vi, eu não queria mais desgrudar, não estava mais só. Amo você. — Abraçou-a.

— Também te amo. — Saiu do abraço e olhou bem nos olhos dele. — Mamãe sabia.

— Sim, mamãe sabia. — Sorriu com doçura.

— Confio em você. — Sorriu de volta.

Antony deitou em sua cama e olhou para o teto como a irmã estava fazendo. Seguiram em silêncio até pegarem no sono.

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