04

Após o banho relaxante, Elisa descansou por algumas horas. Poucas, pois apesar da exaustão, seus pensamentos vagavam em um certo homem de olhos claros e cabelos negros. Ela não entendia o motivo pelo qual o tal Fernando lhe invadia a mente, a deixando tão agitada. Talvez fosse por sua beleza, isso era inegável, ele tinha os olhos mais verdes que já tinha visto em toda sua vida, eram como dois lagos em meio a uma vegetação, e se destacava em seu rosto, não tinha como esquecer.

Ela despertou depois de ouvir um som vindo do corredor, abriu os olhos devagar e rapidamente se atentou à porta do quarto. Pode ver sombras por debaixo da fresta. Sentiu por um instante um medo lhe percorrer, sentou-se na cama rapidamente e conferiu se estava bem vestida, imaginou se fosse Manuel, pensou em tantas possibilidades, e a principal era de que ele desejasse consumar o casamento. Seu corpo estremeceu de medo, e fez todas as orações possíveis que conhecia para que não fosse ele. Então, ouviu o som novamente, percebeu que parecia uma risada infantil seguida de um pedido de silêncio em um sussurro. Curiosa em saber do que se tratava, Elisa se levantou da cama lentamente, colocou os pés para fora da cama e, bem devagar, caminhou até a porta, ouviu o som quase inaudível dizendo:

— Já chega, agora vamos embora, Joana! — Elisa notou que se tratava de uma voz meiga, como de uma jovem.

Na sequência, a outra voz, bastante infantil, reverberou de forma rebelde:

— Não, eu quero ver como ela é!

Então, Elisa tocou a maçaneta e abriu a porta de repente.

Ela se deparou com duas figuras à sua frente, dois pares de olhos verdes, a mais nova teria cerca de seis anos, e a mais velha, bem... Elisa teve dúvidas, ficou confusa, pois se tratava de uma bela jovem de corpo formado e cabelos negros enfeitados de fita e laço, como se tivesse a mesma idade da pequena. Suas roupas também eram o tipo de roupa que uma criança vestia, porém em tamanho maior. Poderia afirmar que a jovem teria entre quinze e dezessete anos, mas se vestia como se tivesse doze. 

As duas se entreolharam, assustadas por terem sido pegas, e Elisa cruzou os braços, demonstrando que não havia estado satisfeita por estar sendo espiada.

A menor era mais falante, e foi logo dizendo, mesmo temerosa:

— Nos perdoe, senhorita...

A mais velha lhe deu um empurrão com os quadris, pois era bastante alta, e a interrompeu, corrigindo-a:

— Ela é uma senhora, esqueceu que se casou com o nosso irmão? — disse, olhando para a pequena e depois voltou para Elisa. Era nítido que a mais velha era bastante tímida.

Um pouco mais tranquila por notar que eram tão inocentes, Elisa decidiu pegar mais leve. Respirou fundo e descruzou os braços, as meninas ficaram visivelmente aliviadas.

A pequena ainda implorou, aflita, cruzando as mãos como se fizesse uma oração para alguma divindade.

— Por favor, não fale nada para mamãe, e nem para Francesca, elas vão nos deixar de castigo por duas semanas.

A inocência da menina tornava a situação até um pouco engraçada. Elisa sentiu vontade de rir, mas se conteve, ficou pensando que tipo de ser humano era capaz de punir uma criança tão adorável? 

A mais velha não conseguia olhar para Elisa e disse, fitando o chão:

— Joana queria muito te conhecer, e como fomos proibidas de sair do quarto até o jantar, eu a trouxe aqui escondido.

A pequena, com toda sua simpatia, deu um passo à frente e estendeu a mão.

— Eu sou  Joana.

Elisa segurou a mãozinha tão pequena e delicada da garota encantadora, pôde notar que as unhas da menina estavam bem crescidas e que havia uma boa quantidade de terra sob elas.

— Sou Elisa Al... — ela havia se esquecido de que havia se casado e que por isso não tinha mais o sobrenome de solteira. Então concluiu: — Quer dizer, Elisa Valença.

Joana sorriu, achando graça de algo.

— Sim, agora você é uma de nós.

A jovem, que até então Elisa não sabia o nome, se ergueu e se apresentou em tom delicado e baixo:

— Sou Antônia. E nos desculpe por isso, Senhora Elisa.

— Ah, tudo bem, adorei conhecer vocês. Chame-me apenas pelo nome. Então, são irmãs de Manuel?

Ambas se entreolharam com uma expressão desgostosa. E a pequena rangiu os dentes.

Em uníssono, responderam:

— Sim.

Elisa se perguntou que diabos de homem era esse Manuel que despertava sentimentos tão ruins nas pessoas, e principalmente em crianças.

— E do Fernando também! — agora Joana gritou mais animada que antes.

Quando as sílabas que compunham aquele nome soaram, Elisa não pode deixar de se sentir estranha. E também não pode deixar de notar como as meninas haviam mudado o comportamento ao se referir ao outro irmão. Joana, que é bem mais desinibida, abriu um sorriso de orelha a orelha, e Antônia, que parecia ser tão acanhada, abriu sua expressão de uma radiante de repente.

— Você já o conheceu? — Joana perguntou curiosa.

Elisa engasgou, não sabia o que dizer. Então, como se manteve em silêncio, a menina continuou a tagarelar:

— Ele é tão lindo!

Novamente, Antônia empurrou a irmã com os quadris.

— Joana, não pode falar assim com Elisa, ela é esposa de Manuel!

A pequena arrebitou o nariz sem se importar com as palavras da irmã e cruzou os braços.

— Bem que ela se casou com o irmão errado.

— Joana!

Antônia ficou chocada com as palavras da menina. E Elisa também estava surpresa, mas não conseguia se irritar de forma alguma com Joana.

Antes que aquela conversa se estendesse, foram interrompidas pela chegada de alguém. As meninas ficaram gélidas e bastante assustadas. Elisa pode notar que realmente elas eram punidas quando desobedeciam regras, o que até então era normal, mas o desespero de ambas e o medo que carregavam era além do normal. Tentou não imaginar que tipo de castigo elas eram submetidas. 

Mas percebeu o alívio imediato das meninas quando a presença de outra criada ficou explícita, ela era diferente apesar de se vestir como Francesca. A serva ficou surpresa em ver as meninas ali, e fez uma careta para ambas, que apenas abaixaram a cabeça. Ela se virou para Elisa e fez uma mesura.

— Senhora, vim buscar as meninas para  jantar, ainda bem que as vi primeiro — ela olhou de canto para as garotas. — Me perdoe, mas elas não deveriam estar aqui.

Joana foi logo dizendo:

— Senhora Mazé, eu queria muito conhecer Elisa.

Os olhinhos de Joana brilhavam e Elisa sentiu vontade de apertá-la nos braços.

— Elas a estão infortunando, senhora.— A criada afirmou para Elisa.

— Não, claro que não. Elas são uns amores.

— Céus, se a senhora Edna ou Francesca as vierem aqui, não quero imaginar que tipo de punição elas terão. — A mulher de aproximadamente quarenta anos disse, levando a mão ao rosto preocupado. Era nítido que nutria carinho pelas meninas.

Elisa respirou fundo com tanta pressão. Logo ouviram outro som de alguém se aproximando distantemente. Elisa fez sinal para que a senhora Mazé e as meninas seguissem pelo corredor sentido contrário para que não fossem vistas, e assim fizeram, saíram rapidamente. E logo Elisa fechou a porta, ainda respirando acelerado. 

Se ajeitou quando ouviu batidas na porta, não pode negar que temia ser seu então, marido. Sentia tanto pavor e medo, e refletia se seria assim sempre, se viveria neste tormento constantemente.

Passou a mão pelos cabelos e ajeitou o vestido. Quando abriu a porta, sentiu um alívio, se tratava de outra criada que viera comunicar sobre o jantar. Ela respirou mais calmamente e agradeceu, avisando que em breve se juntaria a todos. 

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo