3

David

— Não deve ser tão ruim assim. — Caio resmungou quando saímos da sala de reuniões.

— É péssimo, Caio! — retruco mal-humorado.

— Seja lá o que você deixou para trás no Brasil, acho que já está mais do que na hora de voltar e dá um jeito nessa situação, David.

— Por que acha que eu deixei algo para trás? — rebato. Ele abre a porta do seu escritório e eu paro, esperando a sua resposta.

— Por vários motivos. Você não trepa mais, não sai para dançar, beber feito um louco todos os finais de semana e tem uma m*****a foto de Yaides em sua carteira. — Surpreso com esse último comentário, arqueio as sobrancelhas e o encaro com firmeza.

— Andou mexendo nas minhas coisas? — indago entre dentes, segurando um berro no meio do corredor, para não chamar a atenção dos funcionários. Caio respira fundo e antes de me responder, ele olha para os lados.

— Não. Eu só fui pegar o seu cartão como havia me pedido uma vez. Sem querer deixei alguns documentos cair no chão e a foto dela estava no meio deles. — Bufo irritado, mas respiro fundo, levando as mãos aos bolsos da calça. — Me lembro que a última vez que fomos ao Pub, vocês ficaram juntos e depois disso sumiram por uma semana. Olha, eu sei que não tenho nada a ver com isso e que nem devia estar me metendo na sua história com ela. Eu não sei o que rolou entre vocês, mas você não devia se esconder dos seus problemas assim. — Aproximo-me mais do meu primo, o olho bem dentro dos seus olhos e rosno para ele irritado:

— Tem razão, você não tem nada a ver com isso, portanto não deveria se meter na minha vida!

— Cacete, mano, eu só quero ajudar!

— Não preciso da sua ajuda! — falo áspero e me afasto, indo direto para a minha sala.

É incrível como tudo parece que tudo resolveu vir à tona na minha vida de uma só vez. Eu não fazia ideia de que Caio sabia sobre a Yaides. Eu nunca contei para ninguém sobre nós dois, a final, era apenas um início de namoro e era cedo demais para apresentá-la a minha família. O fato é que tínhamos um plano, iríamos para a mesma faculdade, faríamos o mesmo curso, dividiríamos o mesmo dormitório e viveríamos um romance intenso e apaixonante, e se tudo desse certo, no ano seguinte ela iria conhecer a minha família e eu a sua. E no final do curso nos casaríamos.

Era perfeito.

O que deu errado?

Eu fui para o aeroporto e a esperei por algumas horas, mas Yaides não apareceu. Decidi ligar e saber o que estava acontecendo, mas ela não me atendia. Então, peguei a minha mala, pus de volta no carro e dirigi até à sua casa. A cena que vi não foi nada agradável. Minha namorada estava abraçada de uma forma íntima demais com o meu melhor amigo do colégio. Júlio a apertava em seus braços, aspirava o seu cheiro e ela estava agarrada ao seu pescoço. Fiquei parado ali na frente da sua casa olhando aquela cena bizarra, sem saber o que fazer. Os minutos que passei ali, eles não se desgrudaram e covardemente, entrei no meu carro e voltei para o aeroporto. Aquela cena me perturbou por dias, semanas, meses e anos, e cada vez que a imagem vinha a minha mente, eu me fechava, me sentia sem vida e sem a alegria de viver. Parece perturbador pensar que em apenas cinco dias de um lance que envolvia sexo e carícias tenha me afetado com tamanha força. Quando cheguei a Massachusetts troquei o meu número de celular, evitei o meu e-mail pessoal e mantive um curto contato com meus familiares... Até hoje.

— Merda! — resmungo assim que entro na minha sala, encosto-me no encosto da cadeira e encaro o teto branco do meu escritório. Caio tem toda razão. Não é fácil aceitar que ele esteja certo quanto a minha vida, mas ele está. Eu preciso voltar e preciso passar uma borracha no meu passado. Protelei esse tempo todo para não ter que vê-los casados, felizes e com uma família formada. Contudo, não posso mais fugir dessa situação. Quem sabe quando constatar essa realidade finalmente ficarei liberto para seguir a diante. Respiro fundo e jogo esses pensamentos para bem longe, e tento focar no meu trabalho.

***

— Senhor Lacerda, a senhorita Backer está aqui. — Minha secretária avisa pelo telefone.

— Pode mandá-la entrar, Judith — peço no meu melhor modo profissional e encerro a ligação.

Patrícia Backer é a proprietária de um laboratório farmacêutico que já não sabe o que fazer para a empresa avançar no concorrido mercado de medicamentos. Prestes a abrir falência, ela me procurou a dois dias e hoje vamos ver as condições da sua empresa, antes de fecharmos negócio. A porta da minha sala se abre minutos depois e uma linda mulher, usando um vestido preto e simples, de alças largas e colado ao seu corpo. Observo atentamente seu andar firme misturado a sua delicadeza feminina, e a uma pasta executiva em sua mão direita, além de uma bolsa grande de couro pendurada em seu ombro. Os poucos passos da porta até a minha mesa são semelhantes a de uma modelo em uma passarela, sobre os saltos altos demais e só quando se aproxima, ela abre um sorriso estritamente profissional, me estendendo a sua mão.

— Boa tarde, senhor Lacerda!

— Boa tarde, senhorita Backer! Sente-se, por favor! — respondo formalmente, apontando a cadeira para a mulher e ela se acomoda, cruzando as suas pernas. Não pude evitar de perceber o tecido do vestido se encolher um pouco, revelando mais um pouco de sua coxa. Um tanto constrangido, ergo os meus olhos e encontro os seus me encarando com um brilho indecifrável.

Incomodado, limpo a minha garganta e me inclino sobre o tampo da mesa, seguro uma caneta dourada entre os meus dedos e vou direto ao assunto.

— O que tem aí para mim? — A garota descruza as pernas e se inclina um pouco para frente, revelando um pouco dos seios fartos no decote quadrado do vestido. Ela põe a pasta em cima da minha mesa e a abre, tirando de lá alguns papéis.

— Trouxe o balanço de pelo menos seis meses da minha empresa para você. Não acha melhor irmos para o sofá para analisarmos os documentos? Acredito que vamos demorar algumas horas fazendo isso e seria mais confortável, não acha? — Ela sugere e morde levemente o lábio inferior. Reviro os olhos internamente e me pergunto que há de errado com essas mulheres? Cacete, elas não podem ver um par de calças que já querem cair em cima? Puxo uma respiração profunda, mas de uma forma bem discreta e ajeito a minha gravata, fitando a mulher do outro lado da mesa. Em silêncio e de cara dura, estendo a minha mão, para que ela me entregue os documentos e depois de olhá-los rapidamente, depois, volto o meu olhar para ela.

— Não será necessário, senhorita Backer.

— Me chame apenas de Patrícia — pede, me interrompendo e abre um sorriso ainda maior que o primeiro. Pigarreio mais uma vez incomodado com a sua atitude e continuo.

— Como estava dizendo, não será necessário à sua presença nessa análise. Eu mesmo terei todo o cuidado em analisar e contabilizar os números de cada página, e assim que tiver uma resposta, pedirei a minha secretária que entre em contato com a senhorita. — O sorriso da mulher vai sumindo aos poucos e ela se mexe em cima da cadeira.

— Tem certeza? Eu fiz um curso básico de contabilidade e posso ajudá-lo...

— Eu tenho certeza. — A corto e ela engole em seco. De repente o seu rosto começa a corar e agora parece meio sem graça.

— Claro. — Patrícia se levanta da cadeira e ajeita sua bolsa em seu ombro. — Ficarei esperando o seu contato. — Cordialmente, me levanto da cadeira e lhe estendo minha mão, porém, ela apenas a olha e me dá as costas, saindo da sala em seguida. Encho os pulmões de ar.

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