Cecília
A luz branca florescente daquela sala me cegava, eu conseguia sentir cada gota de suor escorrendo pela minha testa. A dor era dilacerante, meus sentidos já não respondiam, minha respiração era controlada pela enfermeira que segurava firme a minha mão. Ela falava alguma coisa pra mim, mas eu não conseguia ouvir. Juntei toda a força que restava dentro de mim até que por fim escutei aquele sonzinho que tanto esperava há nove meses. O chorinho do meu bebê invadiu meus ouvidos e eu pude enfim respirar aliviada.
O médico trouxe aquele bebezinho lindo até mim, minhas lagrimas rolavam incansavelmente enquanto eu beijava e acariciava sua cabecinha com todo cuidado do mundo. Aquela princesinha agora era a minha única família, minha vida e todo o meu amor. Eu a olhava como se quisesse decorar cada centímetro daquele serzinho em minha mente. O médico sorriu pra nós e pegou-a do meu colo dizendo que precisava levá-la para alguns exames iniciais de rotina, mas que em breve a veria novamente para amamentá-la pela primeira vez. Me dei ao luxo de finalmente descansar e não sei por quanto tempo dormi, mas quando acordei, parecia que aquilo tudo tinha sido um sonho e o que eu viveria em seguida seria o pior dos pesadelos.
Uma enfermeira estava parada ao lado da minha cama, e parecia aflita esperando que eu acordasse. Quando a olhei, sua expressão era de um pesar insuportável e eu sabia que a notícia não era boa. Só consegui proferir algumas miseras palavras.
— Cadê a minha filha? — meus olhos já marejados esperavam pela pior das notícias.
— Cecília, por favor, fique calma. Você acabou de sair de um parto normal, precisa descansar. - Ela tentou segurar minha mão, mas eu a empurrei.
— Eu quero a minha filha! — minha voz começava a sair como um grito. — Cadê ela? Cadê a minha menina? — minha respiração já não saia normalmente e meu coração parecia estar sendo esmagado por um trator que logo sairia pela boca.
— Um rapaz… — ela só conseguiu dizer isso pois em um sobressalto levantei da cama cambaleando aos prantos com a voz embargada. A pobre enfermeira já chorava junto comigo tentando me segurar em pé. — Cecília, por favor. Fique calma, os seguranças já estão atrás dele. Ele não pode ter ido longe.
Eu agora já me encontrava de joelhos no chão, com a enfermeira agachada ao meu lado me consolando. E com as mãos no rosto tentando insignificantemente segurar todo choro e dor que saia de mim naquele momento, eu sacudia a cabeça em negativa. Já sabia quem era o homem que ela mencionara e só consegui olhar pra mulher do meu lado em um pedido de súplica que entendeu e começou a explicar.
— Ele entrou aqui muito emocionado e nervoso, dizendo o seu nome, falando que era o pai da Giovanna, então deixamos ele ir vê-la na maternidade e os deixamos à vontade. Quando demos por nós, eles não estavam mais lá. — Ela levou uma das mãos no meu rosto secando algumas lagrimas e me apoiando para levantar, mas eu não queria. Eu só queria morrer. Minha cabeça girava com um milhão de teorias macabras do que aquele cara seria capaz de fazer com a minha Gio.
Ele não podia ter feito isso. Ele tinha me prometido, tínhamos um acordo. Eu não precisava dele pra criar minha filha, eu ia tê-la e sair da cidade e nunca mais nos veríamos. Por que ele fez isso? Por que?
Com minhas ultimas forças me coloquei de pé, ignorando qualquer dor pós parto, afinal, nenhuma superaria aquela que sentia agora no meu coração. E respirando profundamente sequei as últimas lagrimas remanescentes, olhei para a enfermeira com a cabeça erguida determinada a encontrar minha filha ou mataria aquele demônio que tinha nome, sobrenome e endereço que por sinal, eu conhecia muito bem. Leonardo Almeida não sairia vivo e eu garantiria aquilo até o meu último suspiro.
Fernando Eram as primeiras horas da manhã de um sábado, por que raios aquele telefone não parava de tocar? A noite anterior tinha sido difícil demais pra nós e eu tinha dormido poucas horas, só queria o calor do meu cobertor e o escuro do meu quarto. Mais um toque estridente soou e dando-me por vencido tirei o edredom que me aquecia de cima de mim, coloquei os pés no chão gelado e desci para atender o bendito telefone. — Alô? — minha voz ainda estava rouca de sono e eu pigarreei, esperando a resposta. Do outro lado da linha a voz doce de uma senhorinha invadiu meus ouvidos me fazendo despertar instantaneamente. - Oi dona Leda, alguma novidade boa pra gente? — Oi querido, tenho ótimas notícias sim! Vocês podem me
Cecília Três meses se passaram desde o pior dia da minha vida e eu sequer recebi qualquer notícia, qualquer informação, novidade ou uma mínima suspeita da polícia. Parecia que nada estava sendo feito, e eu acreditava firmemente naquilo. Até porque o maior suspeito no caso era ninguém menos que praticamente, o “chefe” da cidade, então eu mesma precisava fazer alguma coisa ou nada se resolveria. Ficar parada ali me afundando na depressão que me consumia desde então, não me levaria a absolutamente nada. Muito menos à minha filha. — CECI! — minha amiga Bianca gritou me tirando daqueles pensamentos que me atormentavam 24h por dia. — Caramba mulher, estou te chamando a horas! — ela completou enquanto adentrava a cozinha, onde eu estava lavando a louça.
Fernando Os últimos meses tinham sido insuportáveis sem ela. Eu estava quase desistindo de tudo se não fosse por minha filha e Leda, que aliás, se tornara essencial nas nossas vidas. Se não fosse Leda, eu não sei de onde teria achado forças após a partida de Paty. Minha esposa, falecera de modo quase que natural, sua saúde, segundo o médico estava estável, mas por alguma razão, naquela última semana havia piorado três vezes mais. Havia aproximadamente um ano agora que ela partira, e gosto de pensar que ela não sofrera tanto quanto em vida com aquela doença maldita que já à perseguia por anos. A luta diária agora era pra me reerguer, pois eu tinha certeza que Paty estaria muito triste me vendo destruído assim. Minha filha chegara em nossas vidas e convivera com a mãe apenas por pouquíssimo tempo, mas eu tinha a impressão de que ela sentia sua falta tanto quanto eu, ou até mais, já que Paty, mesmo que um pouco ma
CecíliaHá alguns meses eu cheguei aqui na casa dos meus pais e diferente do que pensei, fui muito bem recebida, sem muitas perguntas ou julgamentos, como eles faziam quando eu namorava aquele traste. Ah se eu pudesse voltar no tempo e dar ouvidos aos meus pais... Não, senão eu não teria tido a minha Gio, e o meu amor por ela, superava qualquer adversidade de qualquer momento da minha vida.E por falar nela, desde o primeiro momento que eu coloquei meus pés aqui, não parei de ligar para orfanatos locais e até das cidades mais à frente, porém não alcancei nem sequer um fio de sucesso. Na maioria dos locais, eles não podiam dar tais informações e nas outras, quando eu finalmente aprendi a implorar e fiz minha narrativa rotineira, eles não tinham dados nem sequer similares ao da minha menininha.Eu realmente n&atil
Cecília Subi os poucos lances de escada, ainda respirando mais ofegante por conta do peso da mala, abri a porta de casa e entrei, ainda em choque por tudo que acabara de acontecer. Minhas pernas estavam bambas e eu não saberia dizer se pelo susto do quase atropelamento, se por correr todo aquele trajeto ou se por ter visto aquela criança. Apoiei minhas costas na porta que havia fechado e me deixei escorregar, sentando no chão com as mãos tapando o rosto, tentando conter o choro. Eu sabia que nunca superaria aquela situação, mas não sabia que ficaria tão atordoada apenas por ver um serzinho tão pequeno como aquele. Ela devia ter mais ou menos a idade da minha Gio agora e acho que foi isso, o que mais me abalou. Senti meu celular vibrar no bolso da calça e peguei pra ver a mensagem da minha amiga. Percebi que a que eu tinha enviado, estava totalmente distorcida, provavelmente por conta do susto, eu devo ter apert
FernandoHavia muito a ser feito, afinal, começar do zero não era mesmo fácil. Tinha levado Aurora comigo para a clínica que consegui naquele mesmo centro comercial que mostrei a Leda no fatídico dia da decisão final. As creches locais não tinham mais vagas naquele ano, então precisaria arrumar alguma babá o quanto antes para ficar com minha princesinha, pois a inauguração já estava atrasada.Abriríamos em dois dias e eu precisava planejar a finalização do local logo. O espaço não era enorme, mas era ótimo para o meu propósito. Daria pra abrigar em média 20 animais por vez. Queria poder além de tratar os animais domesticados, tratar igualmente e voluntariamente os animais de rua, então as obras para a criação de canis e gatis limpos e modernos para o confor
Cecília Acordei mais decidida que nunca a sair pra buscar emprego, afinal aqueles aplicativos não estavam dando retorno algum desde antes de ir para a casa dos meus pais até. O destino realmente não estava feliz comigo, pregando uma peça atrás da outra, desandando a minha vida sem limites há um ano, não duvidaria se em mais isso, ele não me derrubaria. Como toda manhã, nada tinha mudado, eu sempre acordava mais cedo do que Bia mesmo ela já estando atrasada, então arrumei a mesa e fiquei imaginando como havia sido esse tempo que não estive ali, ela provavelmente nem comia direito, aposto. Ouvi ela saindo do seu quarto que ficava no meio do comprido corredor que ligava a sala ao banheiro e me inclinei para frente sob a bancada da nossa cozinha americana pra implicar com ela. — Deu formiga na cama é senhorita? — ela olhou pra trás debochando, enquanto caminhava pro banheiro escovando os cabelos. — Não, eu tenho que
Fernando Cheguei cedo na clínica aquele dia, por duas razões muito nobres. Primeiro, tinha uma paciente à minha espera, com filhotinhos recém nascidos e segundo porque minha salvadora estava em casa para cuidar da minha pequena, me dando a chance de me dedicar mais àquela nova fase. Por ainda ser pequeno e pouco conhecido por ali, não via necessidade de ter uma recepcionista ainda e caso precisasse de plantão, eu procuraria algum estagiário para fazer um freelance. Conseguiria facilmente me virar sozinho por hora e assim, ter menos gastos. Não que isso fosse algum problema, mas eu prezava pelo futuro da minha princesinha dali pra frente e só queria deixar o melhor pra ela. Portanto, após verificar minha paciente especial e seus filhotinhos, sentei no balcão da recepção com meu notebook pra mais uma nova busca de babás, afinal Leda não poderia ficar muito além do final da semana. Já estava me dando por vencido e telefonando para