Heloísa MouraHoje amanheceu bem mais iluminado. Juro que parecia que até o céu acordou em festa — um azul tão claro que dava até para sentir o calor de Deus sorrindo lá de cima. Ainda deitada, com os olhos fechados, respirei fundo. O coração batia mais rápido do que de costume, não de medo, mas de uma felicidade que eu nem sabia que cabia inteira dentro de mim.Hoje é o dia. O nosso dia.Abri os olhos devagar, tentando absorver cada detalhe: o cheiro de lavanda no ar, o barulho suave do vento entrando pela janela, o riso abafado de alguma das minhas madrinhas na cozinha. É tudo real. Eu vou me casar com Vittorio.Levantei devagar, sentindo o piso gelado sob os pés e agradecendo pela pausa silenciosa do mundo, como se o universo tivesse parado só um segundo para me deixar viver isso com calma. Olhei no espelho e vi uma versão de mim mesma que eu nunca tinha visto antes — com olhos brilhando de promessa, de certeza. De amor.As meninas invadiram o quarto com gritos suaves de alegria, a
Vittorio BianchiCinco anos antes…Minha vida está ligada à família Moura desde que me entendo por gente. Meus pais e os pais do Hugo eram amigos, e fomos criados como irmãos, já que nenhum de nós teve irmãos de sangue.Embora eu seja cinco anos mais novo que o Hugo, sempre tivemos uma ligação forte. Após a morte dos nossos pais, essa conexão se fortaleceu ainda mais. Ele se apaixonou por Ava, casaram-se, e trouxeram ao mundo a pequena Heloísa. Ela é linda. Desde que aprendeu a andar, vive colada a mim.Hoje é seu aniversário de 15 anos. Entre tantos garotos da sua idade, ela me pediu para ser o príncipe de sua valsa. Fiquei honrado — nunca imaginaria que, tê-la em meus braços, dançando, pudesse me abalar daquela forma.A música começa, e eu estendo a mão para ela. Heloísa sorri, seus olhos brilhando sob as luzes do salão. Sua mão pequena e delicada encontra a minha, e eu a puxo suavemente para mais perto. Começamos a dançar.Os passos fluem com naturalidade, como se já tivéssemos feit
Heloísa MouraDesde aquela noite no jardim, algo dentro de mim se partiu.Ele não me beijou. Não como eu queria. Me deu um beijo na face, com aquele toque cuidadoso de sempre, e me disse que eu era uma criança. Que ele tinha idade para ser meu pai.Mas ele não é meu pai.E aquilo doeu mais do que qualquer tapa, mais do que qualquer palavra fria poderia doer.Fiquei ali, sozinha, sentindo o peso do silêncio e do vazio. O vestido azul ainda brilhava sob a luz da piscina, mas dentro de mim, tudo estava escuro. Eu tinha criado coragem, tinha dado um passo. E ele recuou.Desde então, Vittorio tem evitado até me olhar nos olhos. Quando vem à nossa casa, mal permanece por mais de alguns minutos. Sempre tem um compromisso, um telefonema, qualquer desculpa para fugir. E a cada vez que ele faz isso, algo em mim grita.Mas eu não vou desistir.Não sou mais uma menininha de tranças e joelhos ralados. Ele precisa ver isso. Ele precisa me enxergar como eu sou agora — como mulher.No domingo, temos o
Vittorio BianchiNão entendo o que se passa na cabeça dessa garota. Sei apenas que ela está brincando com fogo — e o pior é que sou eu quem está prestes a queimar.Vejo Hugo e os demais indo para a sala enquanto os empregados retiram os pratos da mesa. Pelo canto do olho, percebo Heloísa deslizando silenciosamente pelos fundos da casa. Meu corpo reage antes da minha razão: dou um passo, depois outro, até a seguir.Desde quando ela se tornou essa mulher? Tão segura, tão certa do que quer — e tão imprudente?— Vittorio? — Ela se vira e me encontra. Me amaldiçoo por dentro. Estou aqui. De novo. Envolvido nesse laço invisível que ela insiste em puxar.— Heloísa, precisamos conversar. Você tem que esquecer o que pensa que sente por mim. Ela ergue o queixo com a audácia de quem sabe exatamente o que faz.— Não fuja, tio. Sei o que senti e sei que você sentiu também, quando me beijou, mesmo que tenha sido apenas um beijo em minha face.Engulo em seco. Minhas defesas estão caindo rápido demai
Vittorio BianchiAtualmente...Não havia um só dia em que Heloisa não invadisse meus pensamentos. Por mais que eu me esforçasse para esquecê-la, as noites tornavam-se refúgios de tentativas vazias — encontros sem sentido, rostos esquecíveis, momentos que não deixavam marcas. Nenhuma delas era ela. Nenhuma apagava o gosto do beijo proibido, nem o peso da culpa que carregava.Vasculhei redes sociais em vão. Nenhuma pista, nenhuma foto. Era como se tivesse evaporado do mundo digital, tornando-se apenas uma lembrança persistente.O toque do celular interrompeu minha tormenta. Era Hugo.— Hugo, isso é uma surpresa — atendi, tentando soar casual. — A que devo a honra?— Vim te fazer um convite — disse ele, animado. — Heloisa terminou o curso de sommelier e foi a primeira da turma. Estou muito orgulhoso da minha menina.O nome dela caiu como um raio no meio da tarde calma. Meu peito apertou, a respiração falhou por um segundo.— Meus parabéns a ela — respondi, forçando neutralidade. — Mas não
Vittorio BianchiFico olhando para o vazio, como ele pode falar algo assim e agir nesta naturalidade, não posso ficar no mesmo ambiente que a Heloisa, não sei como ela está, hoje já é uma mulher, só de lembrar daquele beijo em seu aniversário meu membro dá sinais.Como vou permanecer debaixo do mesmo teto que ela e não pirar de vez?Eu passo as mãos pelos cabelos, tentando afastar os pensamentos que insistem em me assombrar. Hugo saiu do quarto como se tivesse soltado uma bomba e simplesmente seguido em frente, sem se importar com o estrago que deixou para trás. Mas o pior ainda está por vir.Não preciso esperar muito. A porta se abre novamente, e então, ela entra.Heloisa. Mais linda do que eu lembrava, tento me ajeitar na cama para que minha ereção não fique visível.Meu peito aperta ao vê-la depois de tantos anos. A garota que peguei no colo cresceu, se transformou em uma mulher que não deveria estar neste quarto, não me olhando assim, com aqueles olhos grandes e curiosos que parec
Heloisa Moura Assumir a vinícola não era um problema para mim. Eu entendia de safras, fermentação e a delicadeza do envelhecimento de um bom vinho. O que realmente tornava essa experiência um desafio era outra coisa.Ou melhor, outra pessoa, Vittorio.Desde que vim para a Itália, ele se manteve à distância, como se minha presença o incomodasse mais do que as próprias dores do acidente. Mas eu sabia que, por trás daquela frieza, havia algo mais.— Ele já tomou os remédios? — perguntei a Matteo, que é um filho de um dos funcionários mais antigos do Vittorio, enquanto verificava a colheita das uvas.— Tomou, sim, mas com muito custo — ele riu. — Ele não gosta de admitir que precisa de ajuda.Revirei os olhos, já esperando aquela resposta.— Vou falar com ele. Obrigada, Matteo.Saí do campo e caminhei até a casa principal. Vittorio estava em repouso forçado, mas sabia que ele odiava essa situação.Bati na porta e entrei sem esperar resposta. Ele estava sentado na beira da cama, com a cam
Vittorio Bianchi Heloísa saiu do banheiro sem olhar para trás, e eu fiquei parado ali, com a toalha enrolada na cintura, sentindo o corpo inteiro tenso.Ela me desafiava de uma forma que nenhuma outra mulher já tinha feito. Não era com palavras afiadas ou provocações vazias, mas com a verdade crua do que sentia.Ela me queria, e droga, eu também a queria.Encostei as mãos na pia, fitando meu reflexo no espelho. O corte na testa, as olheiras fundas, a expressão exausta… Eu parecia um homem à beira do colapso.E talvez estivesse.Passei a toalha nos cabelos molhados e saí do banheiro. Vesti uma calça de moletom com dificuldade, meu corpo inteiro protestando contra qualquer movimento. Mas a dor física não era nada comparada à outra.Eu deveria me afastar.Mas, quando desci para tomar um pouco de água na cozinha, dei de cara com ela na sala de estar, analisando alguns papéis da vinícola. Seu cabelo estava preso em um coque bagunçado, uma taça de vinho de lado, caneta entre os dedos enqua