Vittorio
BianchiCinco anos antes…
Minha vida está ligada a família Moura desde que me entendo por gente, meus pais e os pais do Hugo eram amigos e fomos criados como irmãos já que não os temos.
Embora seja cinco anos mais novo que o Hugo, temos uma ligação forte e após a morte dos nossos pais, ficamos ainda mais próximos. Ele se apaixonou pela Ava e se casaram, trazendo ao mundo a pequena Heloísa, ela é linda, não desgruda um minuto sequer de mim, hoje é seu aniversário de 15 anos e dentre tantos garotos da sua idade ela pediu que eu fosse o príncipe a dançar a valsa com ela.
Fiquei feliz por essa escolha dela, mas não imaginaria que ter aquela garota em meus braços me faria tão bem.
A música começa suavemente, e eu estendo a mão para ela. Heloísa sorri, seus olhos brilhando sob as luzes do salão. Sua mão pequena e delicada se encaixa na minha, e eu a puxo suavemente para mais perto, dando início à valsa.
Nossos passos são sincronizados, como se tivéssemos feito isso mil vezes antes. Mas há algo diferente esta noite. Algo que me faz enxergá-la de uma forma que nunca enxerguei antes. A garotinha que costumava correr atrás de mim, com tranças e joelhos ralados, agora está diante de mim como uma jovem mulher. Seu vestido azul-claro esvoaça a cada giro, e eu percebo os olhares sobre nós.
Ava sorri orgulhosa, e Hugo nos observa atentamente. Sei que ele confia em mim mais do que qualquer um, e eu nunca daria motivos para que fosse diferente. Mas, naquele momento, quando os dedos de Heloísa apertam levemente os meus e ela me olha de um jeito intenso, percebo que talvez esteja diante de um problema.
A música chega ao fim, e ela ainda não solta minha mão. Seu olhar ilumina seu rosto, como se estivesse prestes a fazer algo importante.
— Posso pedir um presente? — Sua voz soa suave, mas cheia de determinação.
Sorrio, alheio ao que virá.
— O que você quiser, princesa.
Heloísa solta minha mão, mas antes de se afastar completamente, sussurra:
— Me espere no jardim, perto da piscina.
Ela se afasta antes que eu possa responder, deixando-me com uma estranha sensação no peito. Algo me diz que deveria ir embora, fingir que não ouvi. Mas não consigo.
Minutos depois, estou lá. A brisa noturna faz as luzes da piscina dançarem, refletindo sombras sutis ao nosso redor. Heloísa chega devagar, seu vestido arrastando no chão.
— O que você quer de presente, pequena? — pergunto, tentando manter o tom leve.
Ela para na minha frente, ergue o rosto e, com uma coragem inesperada, diz:
— Quero que meu primeiro beijo seja com você.
Sinto o ar sair dos meus pulmões.
— Heloísa…
— Por favor.
Ela segura meu olhar, e eu percebo que não há hesitação ali. Apenas desejo. Apenas uma certeza que me desarma.
Sei que deveria dizer não. Sei que deveria lembrá-la da nossa diferença de idade, da forma como Hugo me mataria se soubesse disso. Mas, sem pensar, minha mão já está em sua cintura, e minha outra mão toca seu rosto.
— Você tem certeza?
Ela assente, e é tudo o que preciso.
Aproximo-me devagar, e quando nossos lábios se tocam, um choque percorre meu corpo. É um beijo suave, delicado, repleto de algo novo, algo que eu não deveria sentir.
Mas sinto.
Saio da festa desnorteado, como pude fazer isso com uma criança, é isso que ela é, uma criança. Vi ela nascer, a peguei no colo, e como fui fazer algo assim.
Chego em meu apartamento e vou até a adega, abro um vinho qualquer, não me dou o trabalho de olhar qual seja, abro e bebo direto na garrafa.
— Isso não vai funcionar, preciso de algo mais forte. — falo sozinho.
E saio em busca de uma bebida mais forte, preciso esquecer o que fiz, preciso esquecer essa noite, preciso esquecer a sensação de a ter em meus braços.
Pego as chaves do carro e saio sem pensar, sem direção. O álcool já começa a subir à cabeça, mas continuo lúcido o bastante para saber que preciso de algo mais forte, algo que me faça esquecer. Minhas mãos ainda tremem. Meu corpo inteiro ainda sente.
A cidade está viva lá fora, luzes piscando, gente rindo, vivendo, como se o mundo não tivesse parado de girar por um segundo. Mas para mim, tudo está suspenso. Tudo se resume ao que fiz. Ao que senti.
Paro no primeiro bar que encontro. É um lugar escuro, discreto, exatamente o que preciso. Envie-me no balcão e peço um uísque duplo. O barman me olha por um instante, como se avaliasse se eu mereço aquele copo ou não, mas não diz nada. Apenas sirva.
Levo o copo à minha boca e bebo tudo de uma vez, sentindo o líquido queimado na garganta. Quero que queime mais. Quero que eu me destrua por dentro do jeito que me sinto destruído por fora.
— Outro.
Ele obedece sem questionar, e eu repito o processo. O calor se espalha pelo meu corpo, mas não é suficiente. Não pode ser suficiente.
Meus pensamentos voltam para ela. Para os olhos assustados que me olham de volta. Para a forma como seu corpo se moldou ao meu, ainda tão inocente, ainda tão intocado pelo mundo.
Deus, o que eu fiz?
Eu deveria ir embora. Sumir. Desaparecer antes que isso seja pior. Mas como posso fugir de algo que já está cravado em mim? E não há bebida no mundo que possa apagar isso. Preciso pensar com clareza, a Heloisa é apenas uma criança, poderia muito bem falar que não, ignorar e ir embora, mas porque fiquei? Quero arrancar essa noite da minha memória.
Agarro o copo com força, olhando para o fundo do líquido âmbar como se ele tivesse uma resposta. Como se ele pudesse me dizer que tudo não passou de um erro bobo, de um momento de fraqueza, e que amanhã será como se nunca tivesse acontecido.
Mas aconteceu.
Heloisa Moura Não sei como tudo começou, o que sei é que um belo dia acordei e comecei a olhar Vittorio Bianchi de uma forma diferente, ele para mim não era mais o tio Vittorio, era o homem com quem eu queria dar meu primeiro beijo.E daí que ele é mais velho.E daí que ele é amigo do meu pai.E daí que ele me vê como uma criança. Só quero um beijo, isso não é pedir demais.Minha mãe entra no meu quarto sem bater, como de costume, segurando um vestido longo de um azul profundo, quase real.— Feliz aniversário, minha princesa! — Ela sorri, os olhos brilhando com orgulho.Retribuo o sorriso, tentando conter minha ansiedade. Hoje é o meu dia, e de todos os presentes, apenas um me importa. Vittorio.Minha mãe me ajuda a vestir o vestido, ajeita meus cabelos em um penteado sofisticado e aplica uma maquiagem leve, realçando minha juventude. Durante todo o processo, minha mente está longe, imaginando o momento em que ele chegará. O momento em que dançaremos juntos.Quando desço para o salã
Vittorio BianchiNão sei o que se passa na cabeça dessa garota, só sei que ela está a brincar com fogo, vejo meus amigos indo para sala enquanto os empregados estão retirando a mesa, e pelo canto do olho vejo a Heloisa indo em direção aos fundos da casa.Minhas pernas tomam vida própria seguindo-a, desde quando ela se tornou essa menina-mulher, tão cheia de si?— Vittorio? — Ela me vê e me xingo por dentro, pois estou me tornando um idiota olhando-a assim.— Heloise, você precisa esquecer o que aconteceu entre nós. Não faz sentido...— Não fuja, tio, sei o que você sentiu o mesmo que eu, quando me beijou.— Heloisa, isso foi um erro. Um grande erro. — Minha voz sai firme, mas por dentro estou em ruínas.Ela avança um passo, me encurralando contra meus próprios princípios. Seus olhos brilham de teimosia e algo mais perigoso — uma convicção que me assusta.— Se foi um erro, por que está tão abalado? — Sua voz é um sussurro desafiador, e eu quase amaldiçoo o efeito que isso tem sobre mi
Vittorio BianchiNos tempos atuais...Eu não passava um único dia sem lembrar dela. Ainda assim, tentava me distrair a cada noite com uma mulher diferente, buscando, de todas as formas, arrancar aquela menina dos meus pensamentos. Já havia procurado por ela em todas as redes sociais, mas era como um fantasma, sem qualquer rastro digital.Meus devaneios foram interrompidos pelo toque do celular. Ao olhar para o visor, vi o nome de Hugo brilhar na tela.— Hugo, a que devo a honra dessa ligação? — disse, com ironia, pois fazia meses que não falava com ele.— Estou te ligando para fazer um convite — respondeu ele. — A Heloisa conseguiu terminar o curso de sommelier e passou com mérito, sendo a primeira da turma. Estou muito orgulhoso da minha menina.Ao ouvir o nome dela, senti todo o meu corpo reagir de maneira estranha. Um aperto no peito, um frio cortante na espinha, um desejo incontrolável de saber mais.— Desculpe, meu amigo, mas não poderei ir. A colheita das uvas está começando e e
Vittorio BianchiFico olhando para o vazio, como ele pode falar algo assim e agir nesta naturalidade, não posso ficar no mesmo ambiente que a Heloisa, não sei como ela está, hoje já é uma mulher, só de lembrar daquele beijo em seu aniversário meu membro dá sinais.Como vou permanecer debaixo do mesmo teto que ela e não pirar de vez?Eu passo as mãos pelos cabelos, tentando afastar os pensamentos que insistem em me assombrar. Hugo saiu do quarto como se tivesse soltado uma bomba e simplesmente seguido em frente, sem se importar com o estrago que deixou para trás. Mas o pior ainda está por vir.Não preciso esperar muito. A porta se abre novamente, e então, ela entra.Heloisa. Mais linda do que eu lembrava, tento me ajeitar na cama para que minha ereção não fique visível.Meu peito aperta ao vê-la depois de tantos anos. A garota que peguei no colo cresceu, se transformou em uma mulher que não deveria estar neste quarto, não me olhando assim, com aqueles olhos grandes e curiosos que parec
Heloisa Moura Assumir a vinícola não era um problema para mim. Eu entendia de safras, fermentação e a delicadeza do envelhecimento de um bom vinho. O que realmente tornava essa experiência um desafio era outra coisa.Ou melhor, outra pessoa, Vittorio.Desde que vim para a Itália, ele se manteve à distância, como se minha presença o incomodasse mais do que as próprias dores do acidente. Mas eu sabia que, por trás daquela frieza, havia algo mais.— Ele já tomou os remédios? — perguntei a Matteo, que é um filho de um dos funcionários mais antigos do Vittorio, enquanto verificava a colheita das uvas.— Tomou, sim, mas com muito custo — ele riu. — Ele não gosta de admitir que precisa de ajuda.Revirei os olhos, já esperando aquela resposta.— Vou falar com ele. Obrigada, Matteo.Saí do campo e caminhei até a casa principal. Vittorio estava em repouso forçado, mas sabia que ele odiava essa situação.Bati na porta e entrei sem esperar resposta. Ele estava sentado na beira da cama, com a cam
Vittorio Bianchi Heloísa saiu do banheiro sem olhar para trás, e eu fiquei parado ali, com a toalha enrolada na cintura, sentindo o corpo inteiro tenso.Ela me desafiava de uma forma que nenhuma outra mulher já tinha feito. Não era com palavras afiadas ou provocações vazias, mas com a verdade crua do que sentia.Ela me queria, e droga, eu também a queria.Encostei as mãos na pia, fitando meu reflexo no espelho. O corte na testa, as olheiras fundas, a expressão exausta… Eu parecia um homem à beira do colapso.E talvez estivesse.Passei a toalha nos cabelos molhados e saí do banheiro. Vesti uma calça de moletom com dificuldade, meu corpo inteiro protestando contra qualquer movimento. Mas a dor física não era nada comparada à outra.Eu deveria me afastar.Mas, quando desci para tomar um pouco de água na cozinha, dei de cara com ela na sala de estar, analisando alguns papéis da vinícola. Seu cabelo estava preso em um coque bagunçado, uma taça de vinho de lado, caneta entre os dedos enqua
Heloisa Moura O ar da vinícola era sempre carregado com aquele aroma adocicado de uvas maduras e madeira envelhecida. Eu já tinha me acostumado com isso, assim como tinha me acostumado com Vittorio e sua mania insuportável de me afastar sempre que as coisas ficavam intensas.Mas hoje... hoje eu estava cansada desse jogo.Me sentei na varanda com alguns relatórios da safra e logo Matteo apareceu. Ele era do tipo que conversava fácil, cheio de histórias sobre o cultivo, o processo de vinificação entre outros. E eu gostava de ouvir.E, claro, eu sentia o olhar de Vittorio queimando em mim a cada risada que escapava dos meus lábios.— Então, vocês fazem a colheita sempre de madrugada? — perguntei, interessada.Matteo sorriu, se encostando no batente da varanda.— Sim. O frescor preserva melhor o sabor das uvas. — Ele fez uma pausa e me olhou com curiosidade. — Você tem jeito de quem gostaria de ver de perto.— Eu adoraria — respondi, sincera.Foi quando senti a presença de Vittorio ante