Vittorio Bianchi
Não sei o que se passa na cabeça dessa garota, só sei que ela está a brincar com fogo, vejo meus amigos indo para sala enquanto os empregados estão retirando a mesa, e pelo canto do olho vejo a Heloisa indo em direção aos fundos da casa. Minhas pernas tomam vida própria seguindo-a, desde quando ela se tornou essa menina-mulher, tão cheia de si? — Vittorio? — Ela me vê e me xingo por dentro, pois estou me tornando um idiota olhando-a assim. — Heloise, você precisa esquecer o que aconteceu entre nós. Não faz sentido... — Não fuja, tio, sei o que você sentiu o mesmo que eu, quando me beijou. — Heloisa, isso foi um erro. Um grande erro. — Minha voz sai firme, mas por dentro estou em ruínas. Ela avança um passo, me encurralando contra meus próprios princípios. Seus olhos brilham de teimosia e algo mais perigoso — uma convicção que me assusta. — Se foi um erro, por que está tão abalado? — Sua voz é um sussurro desafiador, e eu quase amaldiçoo o efeito que isso tem sobre mim. Respiro fundo, tentando encontrar a força que me falta. — Porque eu tenho idade suficiente para ser seu pai! — Disparo, esperando que isso a faça recuar, que enxergue a lógica, que perceba o absurdo que está insistindo em criar entre nós. Ela sorri de lado, aquele sorriso que sempre teve quando queria desafiar as regras, e isso me tira o equilíbrio. — Mas não é. — Sua voz sai firme, e antes que eu possa me afastar, ela encurta ainda mais a distância entre nós. — Vittorio, para de se esconder atrás dessas desculpas. O que aconteceu entre nós, foi real. Você sentiu. Eu senti. — Ela toca meu braço, um toque leve, mas que me queima como ferro em brasa. Seguro seu pulso, afastando-a, não com brutalidade, mas com a firmeza necessária para que entenda. — Isso não pode continuar, Heloisa. Não pode. Eu sou seu tio, pelo menos em consideração, e não vou permitir que confunda essa fase da sua vida com algo que nunca deveria ter acontecido. Seus olhos escurecem, e vejo sua mandíbula se contrair. Ela não gosta de ser tratada como uma criança, mas é isso que precisa entender. Isso precisa parar agora. — Você pode dizer o que quiser, mas eu sei a verdade. Você está fugindo porque sente tanto quanto eu. — Sua voz vacila por um segundo, e eu vejo a dor que ela tenta esconder. Isso me destrói. Não posso deixar que continue. Preciso cortar isso pela raiz antes que seja tarde demais, antes que eu mesmo me perca completamente. — Esqueça, Heloisa. Se afaste de mim. — Minhas palavras saem duras, frias, e vejo seus olhos se encherem de mágoa. Mas preciso ser cruel. É a única forma de protegê-la. E de me proteger também. Viro-me antes que possa ver qualquer outra emoção em seu rosto. Antes que minha própria determinação vacile. Porque se eu ficar mais um segundo ali, sei que não terei forças para manter essa barreira erguida. Assim que me afasto, pego o celular do bolso e disco um número que não ligava há tempos. Meu coração b**e acelerado, não pelo telefonema, mas pelo que estou deixando para trás. — Pronto? — A voz rouca do outro lado atende. — Vou para a Itália. Vou cuidar do vinhedo pessoalmente. — Minha decisão está tomada, e dizê-la em voz alta parece torná-la mais real. — Quando? — A surpresa na voz do outro lado é evidente. — O mais rápido possível. Organize tudo. — Desligo antes que possa mudar de ideia. Entro na sala, tentando manter a expressão neutra. Meus amigos continuam ali, rindo, conversando. — Finalmente voltou! — Hugo ergue um copo de uísque, sorrindo. — O que tanto fazia lá fora? Ignoro o tom insinuante e caminho até o bar no canto da sala. Preciso de uma bebida antes de falar. Sirvo um copo de uísque e dou um gole longo. O álcool queima na garganta. — Preciso falar com vocês. — Minha voz sai firme, e os olhares ao meu redor se voltam para mim. Hugo franze o cenho. — O que foi? Seguro o copo com mais força, como se ele pudesse me dar estabilidade. — Vou voltar para a Itália. O silêncio preenche o ambiente por alguns segundos. Hugo é o primeiro a reagir. — Como assim, voltar? Você sempre disse que não queria ficar preso ao vinhedo. — Mudei de ideia. — Minha resposta é curta. Não posso dizer a verdade. Hugo me encara, e sei que ele me conhece bem o suficiente para perceber que há algo errado. — Isso é repentino demais, Vittorio. Aconteceu alguma coisa? Desvio o olhar e termino o uísque de uma vez. Não posso contar. Não posso sequer mencionar o nome dela. — Apenas achei que está na hora. O vinhedo precisa de alguém presente, e como sou o dono, resolvi voltar e tomar conta pessoalmente. Ava soltou uma risada curta. — Desde quando você se preocupa com isso? — Desde agora. — Minha voz sai mais ríspida do que pretendia. Hugo me observa em silêncio por um momento, depois se levanta, cruzando os braços. — Você nunca foi de fugir, Vittorio. Seja lá do que for. Meu maxilar se contrai, e por um segundo, penso em admitir que ele está certo. Que estou fugindo. Que cada parte do meu corpo grita para correr, porque ficar aqui significa enfrentar algo que não posso ter. Mas eu apenas respiro fundo e coloco o copo vazio no balcão. — Eu não estou fugindo. Estou tomando uma decisão. Hugo aperta os lábios, claramente desconfiado, mas não insiste. — Quando pretende ir? — O mais rápido possível. Talvez dentro de alguns dias. Hugo solta um suspiro pesado, passando a mão pelos cabelos. — Bom… Se é isso que quer, só posso desejar sorte. — Obrigado. Mas sei que ele ainda não acredita em mim. E mesmo assim não sei se essa fuga será suficiente para apagar Heloísa da minha mente. A conversa continua por mais alguns minutos, mas minha mente já não está ali. Hugo ainda me observa de forma desconfiado, mas mesmo assim, ele aceita minha decisão sem questionar muito. — Quando tiver tudo certo, me avise. Quero ver você antes de viajar. — Hugo diz, apertando meu ombro. Apenas aceno. Não sei se quero despedidas. Quanto antes eu partir, melhor. Já era noite, então decidi ir embora Quando saio para o jardim, lembro do momento que tive com Heloísa… o beijo… Tudo se repete como um filme que não consigo desligar. E então, a vejo, ela está perto da piscina, sozinha. Ela parece estar perdida em seus pensamentos, mas quando percebe minha presença, se vira imediatamente. Seus olhos se fixam nos meus, e por um segundo, penso em simplesmente seguir meu caminho. Mas é impossível. — Então é verdade. — Sua voz é baixa, mas cheia de emoção. Fecho os olhos por um instante antes de encará-la novamente. — Você não deveria estar aqui, Heloísa. Ela dá um passo à frente, e então fico imóvel. — Você está fugindo de mim. Respiro fundo, tentando manter a compostura. — Estou indo cuidar do meu negócio,Isso não tem nada a ver com você. Seu olhar triste se faz presente, e um sorriso forçado se faz presente em seus lábios. — Vittorio… — Ela sussurra meu nome, e o som é quase um golpe. — Não minta para mim. Você sabe que o que aconteceu entre nós, foi real, não fuja titio. — E é exatamente por isso que estou indo embora. — Minha voz sai mais dura do que eu pretendia. Ela ri, mas é um riso amargo. — Você realmente acha que a distância vai mudar alguma coisa? Não respondo. Porque, no fundo, sei que não vai. Mas preciso tentar. — Heloísa, você tem uma vida inteira pela frente. Vai esquecer isso. Ela balança a cabeça. — E você? Engulo em seco. — Eu preciso esquecer. Ela me encara por um longo tempo, como se procurasse algo em meu rosto. E então, finalmente, suspira. — Você pode ir, Vittorio. Pode fugir para o outro lado do mundo. Mas não pode fugir do que sente. Fique sabendo que um dia iremos nos encontrar novamente. Me viro antes que ela possa ver a verdade em meus olhos. Antes que minha determinação fosse embora. Preciso ir, antes que seja tarde demais.Vittorio BianchiNos tempos atuais...Eu não passava um único dia sem lembrar dela. Ainda assim, tentava me distrair a cada noite com uma mulher diferente, buscando, de todas as formas, arrancar aquela menina dos meus pensamentos. Já havia procurado por ela em todas as redes sociais, mas era como um fantasma, sem qualquer rastro digital.Meus devaneios foram interrompidos pelo toque do celular. Ao olhar para o visor, vi o nome de Hugo brilhar na tela.— Hugo, a que devo a honra dessa ligação? — disse, com ironia, pois fazia meses que não falava com ele.— Estou te ligando para fazer um convite — respondeu ele. — A Heloisa conseguiu terminar o curso de sommelier e passou com mérito, sendo a primeira da turma. Estou muito orgulhoso da minha menina.Ao ouvir o nome dela, senti todo o meu corpo reagir de maneira estranha. Um aperto no peito, um frio cortante na espinha, um desejo incontrolável de saber mais.— Desculpe, meu amigo, mas não poderei ir. A colheita das uvas está começando e e
Vittorio BianchiFico olhando para o vazio, como ele pode falar algo assim e agir nesta naturalidade, não posso ficar no mesmo ambiente que a Heloisa, não sei como ela está, hoje já é uma mulher, só de lembrar daquele beijo em seu aniversário meu membro dá sinais.Como vou permanecer debaixo do mesmo teto que ela e não pirar de vez?Eu passo as mãos pelos cabelos, tentando afastar os pensamentos que insistem em me assombrar. Hugo saiu do quarto como se tivesse soltado uma bomba e simplesmente seguido em frente, sem se importar com o estrago que deixou para trás. Mas o pior ainda está por vir.Não preciso esperar muito. A porta se abre novamente, e então, ela entra.Heloisa. Mais linda do que eu lembrava, tento me ajeitar na cama para que minha ereção não fique visível.Meu peito aperta ao vê-la depois de tantos anos. A garota que peguei no colo cresceu, se transformou em uma mulher que não deveria estar neste quarto, não me olhando assim, com aqueles olhos grandes e curiosos que parec
Heloisa Moura Assumir a vinícola não era um problema para mim. Eu entendia de safras, fermentação e a delicadeza do envelhecimento de um bom vinho. O que realmente tornava essa experiência um desafio era outra coisa.Ou melhor, outra pessoa, Vittorio.Desde que vim para a Itália, ele se manteve à distância, como se minha presença o incomodasse mais do que as próprias dores do acidente. Mas eu sabia que, por trás daquela frieza, havia algo mais.— Ele já tomou os remédios? — perguntei a Matteo, que é um filho de um dos funcionários mais antigos do Vittorio, enquanto verificava a colheita das uvas.— Tomou, sim, mas com muito custo — ele riu. — Ele não gosta de admitir que precisa de ajuda.Revirei os olhos, já esperando aquela resposta.— Vou falar com ele. Obrigada, Matteo.Saí do campo e caminhei até a casa principal. Vittorio estava em repouso forçado, mas sabia que ele odiava essa situação.Bati na porta e entrei sem esperar resposta. Ele estava sentado na beira da cama, com a cam
Vittorio Bianchi Heloísa saiu do banheiro sem olhar para trás, e eu fiquei parado ali, com a toalha enrolada na cintura, sentindo o corpo inteiro tenso.Ela me desafiava de uma forma que nenhuma outra mulher já tinha feito. Não era com palavras afiadas ou provocações vazias, mas com a verdade crua do que sentia.Ela me queria, e droga, eu também a queria.Encostei as mãos na pia, fitando meu reflexo no espelho. O corte na testa, as olheiras fundas, a expressão exausta… Eu parecia um homem à beira do colapso.E talvez estivesse.Passei a toalha nos cabelos molhados e saí do banheiro. Vesti uma calça de moletom com dificuldade, meu corpo inteiro protestando contra qualquer movimento. Mas a dor física não era nada comparada à outra.Eu deveria me afastar.Mas, quando desci para tomar um pouco de água na cozinha, dei de cara com ela na sala de estar, analisando alguns papéis da vinícola. Seu cabelo estava preso em um coque bagunçado, uma taça de vinho de lado, caneta entre os dedos enqua
Heloisa Moura O ar da vinícola era sempre carregado com aquele aroma adocicado de uvas maduras e madeira envelhecida. Eu já tinha me acostumado com isso, assim como tinha me acostumado com Vittorio e sua mania insuportável de me afastar sempre que as coisas ficavam intensas.Mas hoje... hoje eu estava cansada desse jogo.Me sentei na varanda com alguns relatórios da safra e logo Matteo apareceu. Ele era do tipo que conversava fácil, cheio de histórias sobre o cultivo, o processo de vinificação entre outros. E eu gostava de ouvir.E, claro, eu sentia o olhar de Vittorio queimando em mim a cada risada que escapava dos meus lábios.— Então, vocês fazem a colheita sempre de madrugada? — perguntei, interessada.Matteo sorriu, se encostando no batente da varanda.— Sim. O frescor preserva melhor o sabor das uvas. — Ele fez uma pausa e me olhou com curiosidade. — Você tem jeito de quem gostaria de ver de perto.— Eu adoraria — respondi, sincera.Foi quando senti a presença de Vittorio ante
Vittorio BianchiCinco anos antes…Minha vida está ligada a família Moura desde que me entendo por gente, meus pais e os pais do Hugo eram amigos e fomos criados como irmãos já que não os temos. Embora seja cinco anos mais novo que o Hugo, temos uma ligação forte e após a morte dos nossos pais, ficamos ainda mais próximos. Ele se apaixonou pela Ava e se casaram, trazendo ao mundo a pequena Heloísa, ela é linda, não desgruda um minuto sequer de mim, hoje é seu aniversário de 15 anos e dentre tantos garotos da sua idade ela pediu que eu fosse o príncipe a dançar a valsa com ela. Fiquei feliz por essa escolha dela, mas não imaginaria que ter aquela garota em meus braços me faria tão bem.A música começa suavemente, e eu estendo a mão para ela. Heloísa sorri, seus olhos brilhando sob as luzes do salão. Sua mão pequena e delicada se encaixa na minha, e eu a puxo suavemente para mais perto, dando início à valsa.Nossos passos são sincronizados, como se tivéssemos feito isso mil vezes ant
Heloisa Moura Não sei como tudo começou, o que sei é que um belo dia acordei e comecei a olhar Vittorio Bianchi de uma forma diferente, ele para mim não era mais o tio Vittorio, era o homem com quem eu queria dar meu primeiro beijo.E daí que ele é mais velho.E daí que ele é amigo do meu pai.E daí que ele me vê como uma criança. Só quero um beijo, isso não é pedir demais.Minha mãe entra no meu quarto sem bater, como de costume, segurando um vestido longo de um azul profundo, quase real.— Feliz aniversário, minha princesa! — Ela sorri, os olhos brilhando com orgulho.Retribuo o sorriso, tentando conter minha ansiedade. Hoje é o meu dia, e de todos os presentes, apenas um me importa. Vittorio.Minha mãe me ajuda a vestir o vestido, ajeita meus cabelos em um penteado sofisticado e aplica uma maquiagem leve, realçando minha juventude. Durante todo o processo, minha mente está longe, imaginando o momento em que ele chegará. O momento em que dançaremos juntos.Quando desço para o salã