Capítulo 06

Fechei a conta da dona Sandra, me despedi com um sorriso e volte sempre e aproveitei para encerrar outras contas no local. O tempo foi passando rápido e logo o Meyer e dona Giovanna foram embora e minha mãe voltou para o expediente. Eu fui almoçar ás quatro da tarde, mas estava me sentindo muito bem por ver minha mãe parada conversando como uma adolescente empolgada.

Já eram nove e meia quando finalmente conseguimos encerrar o expediente e se despedir do último cliente, aproveitando o feche do sorriso que minha mãe deu o dia todo, pedi que ela fosse descansar que eu mesma terminaria de limpar e fecharia o restaurante. Ela relutou, mas acabou cedendo. Eu estava carregando todo o lixo até o tonel quando notei uma movimentação ao lado de fora da porta dos fundos da suposta casa noturna. Aquele beco estava movimentado pela primeira vez.  Nenhum dos lados do beco tinha saída, apenas uma grade do lado do meu restaurante que ficava sempre de cadeado e só era aberto por nós quando os garis vinham buscar o lixo.

— Jasmim. — Mario me achou do lado de fora. — Posso falar com você um minutinho?

— O que você ainda tá fazendo aqui? É hora de ir pra casa, descansar. — Falei sorrindo.

— Eu sei, eu sei. — Ele sorriu.

— O que houve? Precisa de alguma coisa? — Falei o encarando se aproximar.

— Queria conversar contigo. Esse final de semana, no sábado é minha folga. Você sabe. — Ele falou sem jeito. — Eu pensei, sei lá, se a gente não poderia fazer alguma coisa junto.

— Mario... — Falei desviando o olhar. — Não vai rolar.

— Ah Jasmim, é só uma saída. — Ele falou colocando a mão no bolso.

— Você sabe. — Falei pausando para encarar os riquinhos que haviam saído da porta do fundo. Ele. O Meyer e mais dois homens vistoriando o beco. Ele me encarou por alguns segundos.

— O que eu sei? — Mario falou se aproximando um pouco mais.

— Sabe que não vai rolar. — Falei dando um passo pra trás agora voltando minha atenção pra ele.

— Por quê? — Ele me encarou.

— Porque não, Mario. Peço desculpas mais uma vez se acabou soando algo com aquele beijo. Mas eu estava bêbada.

— Eu sei, eu sei, Jass. — Ele falou assentindo. — Eu só estou te chamando pra sair e não pra me beijar de novo. Somos amigos. — Ele falou revirando os olhos.

— Mesmo? Você só quer minha amizade? — Perguntei arqueando uma das sobrancelhas.

— Eu quero o que você quiser me oferecer. Você só está disposta a oferecer amizade, então não tenho muita escolha quando não quero te perder. — Ele deu de ombros. — Sem falar que as meninas também vão. Meu amigo vai dar uma festa, vai ser legal.

— Tá, ta. — Falei sorrindo. — Prometo que vou pensar. Agora me deixe terminar aqui e vá pra casa, não pagamos adicional ou hora extra. — Falei gesticulando pra que ele fosse embora.

— Quer ajuda? — Ele perguntou apontando pros lixos.

— Não. Desvio de função. — Falei fazendo careta.

— Besta. — Ele riu.

— Vai logo menino, vai ficar tarde e tua baixada é perigosa. — Falei.

— Tá, até amanhã. — Ele falou. Virou-se e foi embora.

Notei que os caras conversavam alguma coisa com o Meyer, eles falavam em outra língua então não dava para entender muita coisa. Apertei play em minha música e continuei jogando meu lixo fora. Como era resto de comida, eu fazia questão de sempre separar os sacos para no final da noite saber o que colocaria para os cachorros que sempre vinham buscar do outro lado da grade. Verifiquei o saco e deixei por último. Quando terminei de jogar tudo, peguei o saco me aproximando da grade.

— Psi.Psi.Psi. — Fui chamando os gatinhos daquela região e também os cachorros. Os caras que estavam conversando pararam pra me encarar por um momento e voltaram a falar algo entre si. Eles precisavam se esforçar mais para me fazer ter medo de algum ali, e o Meyer estava na roda então continuei o que estava fazendo. Logo os bichinhos foram aparecendo com seus rabinhos abanando, passei o saco pela grade e abri jogando o resto de comida no chão em dois pontos diferentes para que todos pudessem comer. Me levantei e fiquei um pouco olhando aquela cena, depois me virei para voltar pra dentro. Meyer me encarava de soslaio e eu percebi. Continuei meu caminho e logo entrei.

Fechei o restaurante e aumentei meu fone de ouvido no máximo ao som de Hit do Ano – Jorge & Mateus – e segui meu caminho imaginando meu filme de romance. Estava tão entretida que nem vi quando um carro preto parou diante de mim. Eu já estava analisando minhas possibilidades de fuga quando vi o vidro de trás abaixar me revelando alguém conhecido.

— Quer uma carona? — Meyer falou me encarando quando parei retirando um dos fones.

— Você quase me matou de susto. — Falei. — Sabe que são apenas dez minutos, né? — Falei.

— Sei. Mas dez minutos pra quem trabalhou duro o dia todo pode ser muito. — Ele deu de ombros.

— Obrigada pela iniciativa. Mas eu gosto de caminhar, ajuda a pensar na vida. — Eu disse sorrindo.

— Entendi. Posso andar com você? — Ele perguntou me encarando.

— Sério? — Falei arqueando uma das sobrancelhas.

— Sério. — Ele disse agora abrindo a porta do carro.

— Tudo bem. — Dei de ombros.

Lass mich wissen, dass ich einem Jasmim folge. — Ele falou para o motorista.

A porta do carona se abriu e um segurança desceu do carro. Ele suspirou.

Es ist nicht erforderlich. — Ele falou na direção do segurança.

wisse, dass ich verpflichtet bin, dich zu begleiten. — O segurança respondeu o encarando. Eu daria tudo para entender a conversa.

Zehn Schritte entfernt. Privatsphäre. — Meyer falou apontando para o chão. — Ok. Vamos. — Ele falou me encarando.

— Ok. — Falei.

— O que você está escutando? — Ele apontou para o meu fone.

— Ah. Quer escutar? — Tirei do bolso o outro fone e o ofereci.

— Obrigado. — Ele aceitou e colocou no ouvido.

Para o meu azar eu estava escutando Arranhão de Henrique Juliano. Ele colocou as mãos nos bolsos e seguimos andando calados. Na verdade, ELE seguiu calado porque é impossível ouvir essa musica e não cantar.

Alguns momentos eu o flagrei me olhando de canto com um sorrisinho quase imperceptível, aquilo me fez sorrir. Quando chegamos em frente á minha casa ele retirou o fone que estava usando e me entregou.

— Bom, muito obrigada por me acompanhar até aqui. — Falei pegando o fone em sua mão.

— Eu quem agradeço pela companhia. — Ele falou olhando agora além de mim e voltando a me encarar. — Raramente consigo fazer algo que não seja dentro daquele carro.

— Hum, sempre que quiser pode me usar como desculpa. — Eu sorri. — Para caminhar, claro. — Falei desviando o olhar. Me usar? Oi?

— Ok então. — Ele sorriu. Um sorriso gentil. Educado. Atraente. MEU DEUS. — Mach's gut!

— Vou acabar fazendo aula de alemão uma hora dessas. — Resmunguei brincando.

— A gente se vê. — Ele riu, um riso rouco e gostoso de ouvir. Assenti. Ele se virou pronto para atravessar a rua. — Seria uma boa idéia, se precisar de um professor... — Ele se virou novamente sorrindo e voltou a caminhar para sua casa.

Levei alguns segundos para me recompor e entrei em casa. UAU. UAU. UAU. Eu precisava respirar, ele havia levado todo ar dos meus pulmões com aquele último sorriso.

— Demorou! — Dona Marília gritou da cozinha. — Eu já estava ficando preocupada.

— A senhora e seus dramas. — Revirei os olhos como se ela pudesse me ver.

— Estava conversando com o Meyer? — Minha mãe falou agora aparecendo em meu campo de visão.

— Quantos olhos a Senhora têm? — Eu falei não conseguindo esconder o sorriso.

— Hum. Eu conheço essa cara. — Minha mãe abriu um sorriso mais largo que o meu! — Lindo ele né? Gentil, educado. Um príncipe perfeito. — Ela cantarolou a última frase.

— Não, dona Marília. Não comece! — Falei agora indo diretamente para o meu quarto.

— Eu estou mentindo? — Ela parou na porta do meu quarto e perguntou. — Vai dizer que você também não notou essa beleza gringa na casa vizinha? Tão perto! E aqueles olhos que carregam um oceano inteiro de perfeição? — Ela falou a última frase dramaticamente

Aquilo me fez rir, eu amava o jeito como minha mãe me tratava, ela era sempre minha melhor amiga. Talvez a distância nos fizesse se reconhecermos mais como amigas do que como mãe e filha.

— Não, não vi. — Gritei indo para o banheiro. Sorri quando finalmente fechei a porta ficando comigo mesma. QUE BELEZA GRINGA. QUE OLHOS. PUTA MERDA!

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