— Bastante perigosa! — Ele disse desviando o olhar com um sorriso de canto. — Quando quiser se sentar neste jardim novamente é só bater na porta. — Ele falou.
— Ah. Ok. Não se preocupe, não vou mais invadir sua propriedade. — Falei agora o olhando de soslaio com um sorriso de canto.
— Eu também sou bastante perigoso, Senhora Jasmim... — Ele falou baixando o olhar por alguns segundos.
— Ah é mesmo? — Falei fingindo estar pensativa. — Quais seus dotes?
— Punir criminosas que invadem propriedades. Neste caso especifico, punir criminosas que invadem a minha propriedade. — Ele falou virando a cabeça e me encarando diretamente.
— Uau. — Sussurrei arqueando uma das sobrancelhas por alguns segundos. Aquilo foi um golpe. — Que medo! — Falei num tom baixo, mas audível.
Ele virou para o outro lado e riu voltando a me encarar.
— Então você gosta de tirar fotos? — Perguntou aleatoriamente.
— E você gosta de desenhar... — Não foi uma pergunta e sim uma afirmação.
— Por que você acha isso? — Ele me encarou com uma expressão enigmática no rosto.
— Os maiores artistas trazem consigo o dom do mistério. Os grandes poetas podem ser comparados com grandes filósofos. Na calada da noite eles criam suas maiores citações. Mas os grandes poetas e escritores transbordam peso pelos dedos. Quando escrevem... — Fiz uma pausa para pensar em como prosseguir. — Quando os dedos de um grande poeta tocam uma página é de uma forma pesada, seu corpo se debruça sobre a página porque sua alma mergulha sobre ela. Mas com os grandes desenhistas e pintores é diferente. Quando um desenhista ou pintor se expressa ele não pesa, ao tocar uma folha em branco é como se na verdade seus dedos flutuassem. — Suspirei. — Enfim. Ao lhe ver com o caderno na mão na janela do seu quarto, perdido em seu mundo. Ao ver a forma como seu corpo se expressa e suas mãos transbordam levemente pelo papel, julgo corretamente que você é um grande desenhista.
— Você criou essa conclusão convicta apenas por me ver uma vez com um caderno na mão? — Ele me encarou pensativo.
— Estou errada? — O encarei estreitando os olhos.
— Eu gosto de desenhar. — Ele umedeceu os lábios e desviou o olhar. Sua expressão abriu. — Não é algo que eu faça o tempo todo e não acredito que seja tão bom assim, mas, você acertou sobre o meu gosto.
Eu assenti sorrindo.
— E as fotos ficaram boas? — Ele perguntou agora apoiando as costas na parede da casa.
— Que fotos? — Perguntei confusa. Será que ele havia me flagrado tirando fotos suas?...
— A que você tirou ontem a noite completamente bêbada. — Ele disse sorrindo.
— Puta merda! Eu tirei fotos.? — Eu ri.
— Tirou. — Ele riu.
— Do que? — Perguntei.
— Do céu. — Ele falou.
— O que você estava fazendo acordado ás quatro da manhã para me ver tirando fotos do céu, completamente bêbada? — Perguntei. Senti vontade de morder minha língua por uma pergunta tão evasiva.
— Eu estava conversando com meu pai. — Ele abriu um sorriso de canto.
— Às quatro da manhã? — Perguntei arqueando uma das sobrancelhas.
— Grandes homens não dormem. É o que ele diz. — O vi suspirar. Ao vê-lo mencionar o pai dele percebi que seu corpo se retesou como se estivesse desconfortável.
— Avisa pra ele que vampiros são nativos da Europa e os Zumbis são nativos do Haiti. Então por aqui nós dormimos, e você continua sendo um grande homem quando cuida da sua saúde. — Falei fazendo uma careta pra ele.
— Vou falar. — Ele assentiu dando de ombros com uma expressão divertida no rosto.
— Ok. Eu realmente preciso ir até uma farmácia comprar um remédio para minha ressaca. — Falei fazendo menção de me levantar.
— Eu tenho remédio para dor se quiser. — Ele deu de ombros se levantando.
— Eu detesto incomodar, mas quero sim. — Falei quando nós dois já estávamos de pé.
Ele me guiou até o lado de dentro onde as duas mulheres conversavam aos risos agora sentados no sofá. Passamos direto até a cozinha e ele abriu uma das gavetas procurando pelo remédio. Retirou um comprimido da embalagem, foi até a geladeira pegou um copo com água e me ofereceu os dois. Eu peguei jogando o remédio na boca e tomando a água sem nem perguntar o que era.
— Obrigada por me poupar à caminhada até a farmácia vinte e quatro horas. — Falei dando de ombros.
— Achei que gostasse de caminhar. — Ele me encarou apoiado no balcão.
— Não quando parece que meu corpo foi atropelado por um trator. — Falei resmungando.
— Que tipo de bebida causa isso? — Ele arqueou uma das sobrancelhas.
— Ham... Gin misturado com vodka, misturado com refrigerante e energético. Acho que foi só isso. — Falei tentando me lembrar de tudo que bebi ontem à noite.
— Uau. — Ele sorriu. — Bastante perigosa.
—Ah, bêbada principalmente! — Eu ri.
— Eu vi. — Ele falou piscando. Senti meu coração parar de bater por alguns segundos.
— Será que essas duas vão parar por agora? — Falei encarando as duas mulheres na sala e me apoiando no balcão ao lado dele.
— Nicht! — Ele me encarou. — Não. Não acho.
— É. Então essa é a minha deixa para me retirar sorrateiramente. Preciso deitar um pouco. — Falei.
— Ok. — Ele assentiu. — Bom descanso! Melhoras.
— Obrigada. Obrigada pela companhia. — Falei sorrindo. Meu celular vibrou, eu me virei para o lado discretamente e tirei do peito – meu esconderijo – para ver o que era. Abaixei por um momento para responder a mensagem de Mario perguntando se estava tudo bem, pois eu não tinha avisado e nem falado nada desde ontem. Eu respondi que sim e desliguei o celular agora deixando-o em minha mão mesmo.
— Schmetterling? — Ele falou virando a cabeça para olhar para a minha nuca. Eu o encarei. — Uma borboleta?
— Ah sim. — Passei a mão pela nuca sem jeito. Tê-lo olhando para aquele lugar em especifico fez o meu corpo se arrepiar.
—Tem significado? — Ele perguntou cruzando os braços. — Perdoe-me se eu estiver sendo invasivo de alguma forma.
— Ah não, não está. — Falei tirando a mão. — E sim, tem significado: Metamorfose. A borboleta é um inseto de ciclos. Assim como somos durante nossa vida. É com o que me identifico. — Me apoiei em um dos meus pés... — Primeiro seu processo como lagarta aonde ela tem uma visão limitada do que é a vida e do que o futuro lhe reserva. Então vem o processo do casulo onde ela precisa enfrentar seu momento de escuridão consigo mesma para então se tornar o que almeja e alcançar a vida numa visão ilimitada. E por fim ela se torna uma borboleta, com uma visão ampla do infinito de possibilidades que a vida oferece e disposta a bater asas e voar em suas novas aventuras. A borboleta é intensa porque sabe que a vida dura pouco e tudo é feito de momentos, por isso ela está sempre voando pelos melhores ares. Mas em algum momento você a verá parada, porque mesmo tendo um mundo pela frente e tão pouco tempo para aproveitar, ela precisa repousar um pouco no lugar seguro. — Falei pensativa sem notar o sorriso que se formou em meus lábios. — Eu não sei em que processo da metamorfose eu estou agora. Às vezes sinto que ainda sou a lagarta com uma visão limitada daquilo que o futuro me reserva, às vezes me sinto presa em meu casulo lutando com minha própria escuridão sobre quem devo ser e o que devo fazer. Mas a minha mais convicta certeza sobre tudo na vida, é que quando me tornar uma borboleta, eu não terei medo de bater as asas e voar. Você entende? — O encarei.
— Entendo. Eu entendo. — Ele sussurrou olhando no fundo dos meus olhos.
Ficamos nos encarando por alguns segundos e em seus olhos eu podia ver que aquilo fazia sentido pra ele, talvez até demais porque eu estava presenciando um Meyer completamente focado em lutar contra seus conflitos internos. Seu olhar era intenso e eu não conseguia desviar dele. Ele deu um passo para frente ficando mais próximo de mim, abriu a boca para falar algo, mas logo fechou. O ar ao nosso redor estava tenso, eu queria que ele se aproximasse mais ao mesmo tempo em que queria correr dali. Sua expressão se fechou. Como se tudo que eu havia visto de sentimento houvesse sumido, como numa grande peça de teatro onde as cortinas de seu ser se fecharam para mim. Ele deu um passo para trás e desviou o olhar quebrando o momento que havíamos formado ali. Nosso momento. Nossa atmosfera. Minha fanfic de cinco segundos e um beijo. Bastou uma virada para frente pra ver que minha mãe ainda estava conversando com a Giovanna na sala.
— Bom, eu estou indo. — Falei gesticulando com a mão para a porta de saída.
— Ok. — Ele assentiu. — Obrigado.
— Eu quem agradeço. — Sorri. E antes que eu pudesse derreter em seus braços, me obriguei a virar e sair dali o mais rápido possível.
Ao chegar a minha casa, subi diretamente ao meu quarto e me joguei na cama. O que havia acontecido? Como ele conseguia causar essa sensação de formigamento por todo meu corpo? Eu estava excitada por um simples olhar, por uma aproximação. Uau!!! Respirei fundo mil vezes tentando dissipar a adrenalina que aquele pequeno momento havia me causado. Bendito Meyer. Bendito Meyer. Bendito Meyer. Como? Eu estava a ponto de surtar. Suspirei. Não. Eu havia acabado de o conhecer, ele só havia sido gentil, não foi um flerte e eu não tinha tempo para isso. Logo a faculdade começaria e eu não teria vida. Se eu queria o futuro que tanto sonhei, precisaria focar completamente. RESTAURANTE E FACULDADE. Só me resta tempo pra isso. Duas semanas. Duas semanas e eu nem teria tempo para olhar na cara do Meyer de tão exausta.
Essa era uma mentira absurda.
Eram nove da noite quando começamos a fechar o restaurante. Eu fiquei para fechar tudo e quando estava jogando o lixo no tonel dos fundos vi a movimentação da casa noturna ao lado. Ele estava em pé ao lado de fora, apoiado na porta com um terno importado de luxo com um cigarro na mão direita e um copo de uísque na mão esquerda. Estava sozinho. A cabeça encostada na parede virada para a lua, olhos fechados... Ele respirava fundo, respiração pesada. Sem me notar ele deu uma tragada em seu cigarro, e abriu a boca soltando a fumaça logo em seguida. Ele estava extremamente sexy naquela posição. Por um momento eu me perguntei se aquilo era uma miragem e desejei estar com minha câmera. Mas sentindo que estava sendo observado ele abriu os olhos e me encarou. Eu me virei no reflexo e continuei jogando meu lixo fora. Notei quando ele se aproximou e encostou-se à parede ao lado do tonel me encarando descaradamente agora enquanto continuava bebendo do seu uísque e fumando do seu cigarro. Eu parei
Não dava para ver, mas ele falou alguma coisa, se afastou do carro e andou em minha direção. Meu coração pareceu parar, como sempre que ele estava por perto. Não era possível. O que ele estava fazendo? Um dos seguranças ficou ao lado do carro, enquanto três de seus seguranças o seguiu. Ele estava igualmente impecável como mais cedo. Ele chegou a uma distância considerável a quatro passos e eu pude sentir o rosto dos meus amigos queimando em cima de mim pela fofoca.— O que faz aqui? — Ele balançou a cabeça como se não acreditasse e colocou as mãos no bolso. Eu queria me enfiar num buraco, ou embaixo de suas roupas.— Esperando na fila como todo mundo para conhecer a nova casa noturna. — Cruzei os braços e levantei o queixo. Ele estava se achando demais.— Eu lhe avisei mais cedo. — Ele desviou o olhar ignorando os olhares próximos sobre nós.— Não houve resposta concreta. Então eu vim tirar minhas próprias conclusões. — Dei de ombros.Ele bufou, passou as mãos pelos cabelos e me encar
O tempo passou sem que percebêssemos, e logo a casa noturna animou mais quando começou a tocar musicas brasileiras mixadas como DJ Pedro Sampaio! Era uma da manhã quando começou a tocar aquecimento do Pedro Sampaio. Eu não gosto do funk, mas alguns me deixam animadíssima principalmente quando tem álcool no meio. Tudo no ambiente era voltado para lhe fazer extasiar. As batidas pensadas para bombear em seu corpo. Eu amei aquele lugar com todas as minhas forças, e pela primeira vez eu dancei numa festa com minhas amigas me sentindo completamente segura e sem receio do assedio, porque eu sabia que nenhum cara seria capaz de encarar a cara do segurança de escolta no lounge. Sem falar que o Meyer estava de olho e o fato de eu ter entrado com o dono, estar no lounge dele, eu sabia que era dele porque tinha o nome MEYER estampado, acredito que fazia os caras nem pensarem em encostar. Eu perdi as contas do quanto rebolei e me requebrei até não senti mais meus pés sobre as botas. Às três da man
— Ok. — Falei assentindo. —Vou indo então. — Suspirei.— Ok. A gente se vê por ai, Jasmim. — Ele falou colocando as mãos no bolso.— Puta que pariu. — Falei sentindo meu corpo formigar ao ouvi-lo falar meu nome.— Que? — Ele me encarou. Não sabia se sua expressão era confusa ou divertida.— Quando você fala meu nome. — Suspirei. — Você não tem idéia da puta sensação que me causa, Meyer. — Eu nem percebi que estava falando aquilo em voz alta.— Ah é? — Ele estreitou ainda mais os olhos.— Puta merda. — Falei agora passando a mão nos cabelos que haviam se soltado desde o inicio da trajetória, eu deveria estar parecendo uma leoa. — Boa noite. — Fiz uma careta.— Boa noite, Jasmim. — Ele sorriu enfatizando a última frase.Eu me aproximei automaticamente, foi como um imã me atraindo. Nossos rostos ficaram próximos demais, seus lábios a centímetros do meu.— Não se provoca uma garota bêbada, Meyer. — Enfatizei seu nome.— Por quê? — Ele sussurrou encarando meus lábios. Eu podia sentir o des
JASMIM— Bom dia, mãe. — Falei com uma dor de cabeça insuportável ao chegar à cozinha.— Bom dia. Sua cara está maravilhosa. — Ela disse escondendo um sorriso.— Está. — Eu ri.— Chegou que horas? — Ela perguntou enquanto coava o café.— Cinco. — Revirei os olhos me sentando-se à mesa e fungando.— Durma um pouco mais, eu seguro as pontas no restaurante. — Ela falou agora passando manteiga em algumas torradas.— Não vai ser possível porque eu dei folga aos nossos funcionários e terei que trabalhar por três. — Falei ao lembrar-me da mensagem que enviei para mim mesma antes de dormir e vi a poucos estantes. Uma forma de lembrar-se das minhas ações mais importantes quando estou bêbada.— Como? — Minha mãe parou e me encarar.— Cinco da manhã, mãe. Todos nós saímos às cinco. Sei que foi irresponsabilidade e que como funcionários, deveríamos termos saído mais cedo. Culpa minha. Não vai acontecer novamente. Mas provavelmente eles chegaram as seis em casa, não dormiriam em duas horas. Não qu
Finalmente as aulas da minha faculdade começaram e como eu já imaginava, minha vida social foi completamente extinta. Eu estava apaixonada por cada pedacinho do meu novo universo. Duas semanas depois minha rotina se resumia há:Trabalhar no restaurante das oito às cinco da tarde.Ir para a faculdade as seis e só chegar em casa as onze.Aos finais de semana eu fazia todas as tarefas que tinha da faculdade.E eu sei que vocês estão se perguntando sobre o Meyer, eu não tinha tempo para vê-lo, senti que ele se fechou depois do dia em que nos beijamos no beco. Não sei porquê, trocávamos olhares algumas vezes e nada mais. Não posso dizer que entendo, agora ele estava realmente sempre muito ocupado. Eu não sei se ele só estava realmente afim de uma diversão e pronto, mas não me importava. Não vou dizer que não penso no seu beijo e não sinto vontade de ter seus lábios nos meus novamente, ultimamente não são só os lábios, mas preciso realmente focar nos meus sonhos. Agora ele está sempre com o
MEYERDurante três semanas eu me preocupei em ocupar minha cabeça com os negócios, eu não parava de pensar nela desde a última vez em que nos beijamos. Mas eu estava sendo sincero quando disse que não podia, eu não podia dar voz a esse sentimento e colocar tudo que vínhamos conquistando a perder. Eu não podia ter ponto fraco, e soube que ela seria o meu desde a primeira vez em que nos beijamos. Não posso. Não é o correto a se fazer em meu mundo! Ela não aceitaria me conhecer, ela não ficaria do meu lado sabendo de tudo. Então logo me obriguei a se afastar, a me ocupar com as apresentações finais aos consumidores. Nossa inauguração havia sido um sucesso e pelo tempo de três semanas fechei com as maiores casas noturnas em São Paulo para que meu produto fosse distribuído, fechei com grandes empresários. A Meyer Haus não era para pequenos traficantes, não era para pequenos donos de morros. A Meyer Haus era para grandes empresários, era para quem estava no topo e comandava os pequenos dono
Por um momento esqueci que ele estava naquela casa, o pai dele havia se ajuntado a nós na conversa e ele parecia ser legal, embora seu olhar demonstrasse um homem de negócios ambicioso. Eu podia ver o Meyer ali. O homem que só era capaz de sorrir para uma mulher em sua vida. O homem que tinha muralhas por dentro, que era feito de aço, menos quando estava ao lado de sua esposa. Peguei-me pensando se um dia eu poderia ser essa mulher para o Meyer. Afastei os pensamentos quando senti vontade de ir ao banheiro.— Poderia me dizer onde fica o banheiro? — Falei próxima a dona Giovanna.— No andar de cima querida, segunda porta. — Ela falou apontando.Eu sabia onde ficava muito bem, mas não iria a deixar saber que eu freqüentava a sua casa quando ela não morava aqui. Levantei-me e segui escadaria acima. Fui ao banheiro, e terminando lavei meu rosto para expulsar um pouco a tontura causada pelo vinho em excesso. Já estava na hora de ir pra casa e arrastar minha mãe junto. Olhei no relógio do