Capítulo 09

JASMIM:

Acordei já eram quase meio dia com minha mãe batendo na porta do meu quarto.

— Hum... — Resmunguei colocando a cabeça debaixo do travesseiro. Eu estava com uma enxaqueca infeliz.

— Jasmim! — Minha mãe bateu mais uma vez.

— Hummm... — Respondi agora tirando o travesseiro e me virando de barriga pra cima.

— Posso entrar? — Ela perguntou do outro lado da porta.

— Pode mãe, pode. — Falei visivelmente de mal humor.

Ela entrou, sentou na cama com um sorrisinho e me encarou.

— Mãe... — Resmunguei.

— Você precisa levantar. — Minha mãe falou com um sorrisinho.

— Por quê? Hoje é domingo! — Falei colocando o travesseiro no rosto novamente.

— Por isso mesmo. Vamos almoçar com a Giovanna. — Ela falou agora tirando a almofada do meu rosto.

— NÃO. Não mesmo. — Abri os olhos e a encarei. Virei-me para o outro lado.

— Filha. — Minha mãe falou. Ela estava prestes a fazer cena e eu sabia disso. — Você vai fazer desfeita pra mulher que te carregou no colo? — Dona Marília, uma chantagista nata.

— Mãe, eu estou de ressaca. — Falei abrindo os olhos novamente com dificuldade e colocando a mão no rosto. — Pode ir.

— Não mesmo. Se você não for eu não vou. — Minha mãe falou cruzando os braços e fazendo biquinho. — Mas eu não saio pra almoçar na casa de uma amiga há tanto tempo.

— Isso mesmo mãe, sua amiga, vá e jogue conversa fora numa tarde de domingo. — Falei sorrindo e voltando a fechar os olhos.

— Mas você é minha melhor amiga, meu doce. Quero um programa de domingo com minhas duas amigas. — Minha mãe abriu um sorriso pra mim. Aff. Ela sabia qual era o meu ponto fraco.

— Mãe, o Meyer estará lá também. Sinta-se á vontade para fazer novos amigos. — Falei revirando os olhos.

— Ele não vai estar lá. Tem algo pra resolver hoje. Na casa noturna que estão abrindo lá ao lado do nosso restaurante. Meyer Haus acredita? — Ela falou agora animada.

— Mãe... — Bufei. — Estou de ressaca.

— Vamos meu amor, por favor... Você sabe que eu nunca te peço nada e sempre respeito suas ressacas. É aqui na frente, você pode almoçar e vir embora se quiser. — Ela deu de ombros agora tirando algumas mexas de cabelo do meu rosto.

Sentei-me na cama sabendo que ela tinha vencido aquela guerra. Realmente dona Marília nunca me pedia nada e ela quase nunca saía de casa para qualquer coisa que não fosse trabalho e rotina. Eu não a deixaria frustrada nisso e estava feliz que ela estivesse empolgada. E o Meyer não estaria lá então não me veria de ressaca. Dei de ombros.

— Tá, dona Marília, ta. — Bufei novamente.

— Adiante, o almoço é às uma da tarde e já é meio dia. — Ele se levantou empolgada e saiu quarto a fora.

Eu ri com aquela empolgação. Já falei que o sorriso de minha mãe é o mais lindo do mundo? Eu tinha um segundo em mente. NÃO. PUTA MERDA. NÃO MESMO JASMIM. Suspirei me levantando da cama, não sem antes imaginar o sorriso de um certo vizinho novo. Ás uma em ponto estávamos nós atravessando a rua para a casa da dona Giovanna. Minha mãe estava com uma travessa de salada de maionese e eu com um vinho. Tocamos a companhia e em menos de cinco minutos a dona Giovanna abriu a porta com um sorriso largo em seu rosto.

— Entrem, entrem. — Ela falou dando espaço para que pudéssemos entrar. — Você está lindíssima, Jasmim. — Ela falou me dando um beijo de cada lado do rosto e abraçando minha mãe. Eu havia colocado um vestido de alça branco com flores lilás, ele era rodadinho com cinco palmos acima do joelho e um decote em v, prendi meu cabelo em um coque e passei um batom nude. Como era aqui na frente coloquei apenas uma sandália mesmo.

A casa era finíssima, mas achei meio sem vida para alguém que está morando no Brasil. Logo quando entramos demos de cara com a sala, pintada em cor nude, quem pinta a sala de cor nude? A parede central era marrom com uma enorme TV pendurada, e um sofá espaçoso de frente para a TV, uma mesinha de vidro pairava no centro com algumas revistas, e no canto da sala havia uma enorme estante de vidro. Seguimos para a sala de jantar onde uma mesa de seis cadeiras jazia no centro, a sala de jantar era toda de vidro dando vista para a cozinha chique e o quintal dos fundos. O quintal dos fundos. Eu amava aquele quintal. O quintal tinha uma enorme quaresmeira em um dos seus cantos, e um lindo jardim forma uma cerca separando o quintal da outra casa. A grama é bem verdinha. Minha câmera pode afirmar!

Nos sentamos para almoçar com minha mãe e a Giovanna numa conversa completamente empolgada. O almoço servido foi feito pela mesma...

— Apresento a vocês o Kasespatzle. — Ela falou sorridente ao sentarmos a mesa. — No português claro macarrão rústico ao queijo com cebola crocante. E que vai casar muito bem com a sua maravilhosa salada de maionese.

— Ahhh que lindo! — Minha mãe falou encarando o prato.

— Isso porque você ainda não experimentou o sabor. — Ela falou empolgada. — Vamos nos servir, vocês já são da casa. — Ela riu.

— Verdade. — Minha mãe falou rindo. — Lembra quando a gente marcava esses almoços de domingo para não ficarmos sozinhas durante as viagens de Pedro e Heiko? — Minha mãe falou saudosa.

— Sim. Era acalentador! As vizinhas daqui... — Ela me encarou como se fosse fazer uma fofoca. — Eram todas bruxas. — As duas riram. — Não tínhamos aproximação com nenhuma, éramos só nós duas lidando com as fofoqueiras do bairro. Todas julgavam porque nossos maridos viviam viajando.

— Sim. Lembra da Zuleide? — Minha mãe falou retornando ao passado.

— Sim! Se mudou? — Giovanna falou após terminar de colocar o seu prato.

— Há anos. O marido foi embora com outra e ela se mudou por vergonha. Lembra que ela falava que o Pedro era homem de várias porque na profissão dele era uma mulher a cada esquina? —Minha mãe fez muxoxo.

— Pagou a língua. — Giovanna falou rindo.

Eu coloquei meu prato me deleitando com as duas adolescentes fofoqueiras a minha frente. Começaram a conversar sobre suas épocas como se estivessem me confidenciando suas vidas e rapidinho eu me senti satisfeita por ter ido. Almocei com direito a flashback de uma vida feliz que só conhecia como reflexo. Eu sabia muito de minha mãe, mas havia muito ali que eu também não sabia. Quando percebi que elas estavam num mundo só delas e eu já não existia mais, me retirei sorrateiramente indo para o quintal dos fundos. Coloquei meus fones de ouvido e me sentei um pouco na grama lembrando-se dos momentos em que eu podia fazer isso porque não havia ninguém ali. Eu estava admirando a quaresmeira quando ele se aproximou se sentando ao meu lado.

— Uma hora dessas, você realmente vai me matar de susto. — Falei retirando um dos fones. Ali estava o sorriso quase invisível. Sua expressão estava fechada, seus cabelos estavam molhados. Ou ele estava soado de algum exercício ou tinha acabado de tomar um banho. — Não sabia que estava em casa.

— Eu acabei de chegar. — Ele assentiu também olhando para a quaresmeira.

— Entendi. — O encarei de soslaio.

— Como foi o almoço? — Ele perguntou.

— Animado. — Falei fechando os olhos ao sentir uma enxaqueca terrível. Tinha que me lembrar de ir até a farmácia comprar um remédio pra dor.

— Você está bem? — Ele me encarou.

— Ressaca. — Falei voltando a abrir os olhos.

Wie? — Ele perguntou. Eu arqueei uma das sobrancelhas o encarando. — Como... Como? Não sei o que é... — Ele explicou.

— Ah. É o pós bebedeira. — Expliquei. — Você bebe demais e parece que foi espancado no outro dia.

— Ah, entendi. Então você realmente estava bêbada. Ontem. — Ele disse assentindo mais para si mesmo.

— Você viu. — Desviei o olhar.

— Vi. — Ele riu. — Que bom que conseguiu entrar. — Um riso rouco e gostoso. CARAMBA.

— É. Eu esqueci as chaves no quarto. E detesto acordar minha mãe de madrugada.

— Entendi. — Ele assentiu. — Por que está aqui fora sozinha?

— Ham... Vai parecer meio criminoso... — Falei sorrindo. — Mas quando a casa estava vazia eu costumava vir para cá. Ficava aqui sentada admirando essa vista linda e tirando algumas fotos.

— Então você freqüentava esta casa? — Ele me encarou.

— É. Eu meio que abria a porta com um grampinho. — Confessei. — Como nunca morou ninguém aqui desde que me conheço por gente, imaginei que os donos tivessem morrido. Então eu costumava sonhar que essa casa era minha e fugia pra cá quando queria ficar sozinha. Esse quintal me acalma.

wie heimlich... — Ele resmungou. Desisti de tentar entender. — Criminosa. — Ironizou.

— Completamente perigosa, Senhor Meyer. — Debochei.

— Mesmo? — Ele estreitou os olhos de encontro aos meus.

— Veja o que posso fazer com um simples grampo! Eu abro portas e invado propriedades. — Sussurrei. Ele riu. Meu ar. Meu ar foi embora.

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