Sei que às vezes parece birra de um menino que foi posto de castigo por fazer alguma travessura, mas não é! Observar a minha família feliz, conversando à mesa, assistir os seus sorrisos felizes, cada gesto carinhoso e todo aquele companheirismo. Nada disso me envolve e nem me sensibiliza. A verdade é que eu gostaria que eles me esquecessem, que fingissem que eu não existo. Porra, esses ambientes não fazem mais parte de mim. Lilian, minha irmã caçula me desperta com mais um riso à mesa, e minha mãe a acompanha devido a algo que o meu pai comentou. Não prestei atenção na conversa, porque a minha mente estava em meu escritório particular e na garrafa de uísque escocês que comprei na noite passada. Não vou mentir, estou contando os minutos para que esse jantar em família acabe logo, para eu poder finalmente me refugiar na minha escuridão e finalmente afogar a minha dor em alguns copos.
— O que acha, Luís? — Lilian pergunta animada.— O quê? — indago atordoado. — Desculpe, eu não estava prestando atenção — suspiro incomodado.— Estávamos falando em ir a Portugal passar um final de semana em um dos seus hotéis — dona Joana diz animada e eu assinto em concordância.— Claro. — Concordo evasivo e vejo o seu lindo sorriso ficar ainda maior — Quando quiserem ir me avisem. Peço para Marina, minha nova secretária preparar tudo para vocês. — Dona Joana volta a ficar séria e olha para o meu pai complacentemente.— Pensamos que você também poderia vir conosco, filho — diz sugestiva. Mas que droga! Resmungo internamente e levo o guardanapo de linho branco ao canto da boca e mais uma vez me sentindo incomodado, limpo a garganta e afasto o meu prato para o meio da mesa. Encaro um por um ao redor da mesa de jantar.— Desculpe, não poderei acompanhá-los, estarei ocupado com algumas — Tento pensar em algo, mas nada vem à mente. — Enfim, estarei ocupado.— Filho. — Mamãe tenta falar algo. Seu tom meigo e baixo me faz sufocar.— Preciso ir, mãe. Esqueci alguns papéis na empresa que preciso estudar essa noite. — Minto, após olhar o relógio em meu pulso e levanto da cadeira no mesmo instante. Beijo o topo de sua cabeça e o de Lilian também e para o meu pai, deixo apenas um aceno de cabeça e saio sem olhar para trás.— Não fique assim, mamãe. — Ouço Lilian dizer. Dentro do meu carro as lágrimas tomam posse de mim, assim como a raiva. Então bato com violência contra o volante. Por que você fez isso comigo? Por que estragou a minha vida dessa maneira? Por que não volta logo para mim? Eu te perdoo, esqueço de tudo, só… volte para mim!***
Ando com passos largos pelo imenso corredor da empresa. O Caravelas e Hotelaria foi a maior conquista na minha vida. Eu tinha dezessete anos quando entrei aqui pela primeira vez. O meu pai era o presidente na época. Antes tudo isso era apenas uma construtora e eu me apaixonei pela profissão assim que vi o meu pai em ação. Quando fiz vinte anos não pensei duas vezes, cursei uma faculdade de Gestão Financeira, depois Administração Empresarial e em seguida aprimorei os meus conhecimentos fazendo mais uma faculdade nos Estados Unidos. O meu MBA foi o que alavancou isso aqui, então juntei uma coisa à outra e no meu primeiro ano na presidência, construí o nosso primeiro prédio de luxo. O primeiro de uma rede de hotéis luxuosos, que nos faria ir ainda mais longe. Meu pai ficou orgulhoso, quando em dois anos já tínhamos três prédios da mesma categoria só aqui no Brasil e foi em uma dessas inaugurações que eu a conheci. Uma mulher linda, sexy para caralho, dotada de lábios grossos e suculentos, um corpo formidável e uma voz rouca que deixava qualquer um duro de tesão. Suspiro e tomo um longo gole da minha bebida. Não quero pensar nela, não posso e não devo. Eu preciso esquecê-la, mas é quase impossível. Ela é como um veneno correndo pelas minhas veias e dominando todo o meu sistema. Está presente em tudo ao meu redor. No nosso apartamento, aqui na empresa, na casa dos meus pais e dos meus amigos também. E, eis o motivo real que me mantém longe de tudo e de todos.— Bom dia, senhor Alcântara, eu sou a Helena. Sou a sua nova secretária.— Traga o meu café — pedi ignorando suas felicitações matinais e apresentações, sem ao menos olha-la.— Claro, só um instante, senhor. — A garota falou, deixando transparecer o seu receio. Segui direto para minha sala e de cara já me irritei com a quantidade de pastas azuis em cima da minha mesa. — Aqui está o seu café, senhor Alcântara. — Minha secretária disse atrás de mim. Respirei fundo e me virei para encarar a garota loira, com seus cabelos lisos e curtos, que parou abruptamente ao ver o meu olhar duro em cima dela.— Pode me explicar o que são essas pastas fazem em minha mesa? — Meu tom era baixo, porém de um frieza irrevogável. Ela olhou para a minha mesa e depois para mim, engolindo em seco.— Claro, a Cassandra me pediu para deixar os relatórios com os pedidos de compras de alguns materiais, para construção do novo prédio em sua mesa. — Ela sorriu e fez uma expressão de satisfação em seguida. Provavelmente julgou que acertou comigo. Pois é, ela não acertou. — Seu café, senhor — insistiu. Segurei uma explosão e segurei a xícara, a levando a boca e, caralho! Não é tão difícil assim fazer a porra de um café forte e quente, certo?— Tira a porra dessas pastas de cima da minha mesa — rosnei carrancudo — E traga outro café, esse está horrível! — disse entre dentes. Seu sorriso de boa menina desapareceu imediatamente. A garota pegou a xícara da minha mão com suas mãos trêmulas, e assentiu lentamente para mim.— Sim, senhor, me desculpe, senhor! — disse indo até a minha mesa com passos rápidos, pegou as pastas e passou por mim de cabeça baixa.— E, Helena? — A chamei antes que chegasse a porta. Ela ergueu um olhar tímido para mim — Não erre outra vez, porque não haverá outra chance para você — sibilei friamente. — Ela empalideceu e assentiu, saindo da minha sala em seguida.Quando a porta se fechou, caminhei até uma das janelas da sala e olhei para as ruas lá embaixo. O Rio de Janeiro é mesmo um lugar lindo! Pensei com admiração. Pena que agora o meu mundo não tem mais cor. Suspiro de modo audível e vou para a minha mesa e tento me concentrar no meu trabalho, onde me abstenho de tudo que me faz mal.Ana JúliaTem momentos na vida que esquecemos de dá valor as pequenas coisas ela nos oferece. Um simples sorriso, o desabrochar das flores, as gostas de chuva que molham à terra sedenta. Nada disso tem valor, até você realmente nota-las. Assim tem sido os meus dias ultimamente. Aprendi a valorizar cada segundo que o ponteiro do relógio insiste em marcar, sem ter um mínimo de dó de mim. Desculpe a minha grosseria! Então, eu penso que posso começar a contar a minha história para vocês assim; meu nome é Ana Júlia Falcão, sou uma garota simples, que mora no subúrbio. Tenho vinte anos, na verdade, quase vinte e um, pois farei aniversário daqui a três meses. Sou morena e meus cabelos são compridos, lisos e negros. Não sou muito alta, mas acho minha estatura legal, tenho um metro e sessenta e cinco de altura. Meu corpo é esguio, mas não sou cheia de curvas. Acho-me bonita e arrisco dizer que atraente também. Normalmente sou uma garota muito alegre e comunicativa e tinha todo o prazer de vive
No elevador, sinto o meu peito se apertar com uma angústia sufocante que não consigo explicar. É como se algo muito ruim tivesse acontecendo nesse exato momento. Apresso os meus passos assim que as portas se abrem e entro no largo corredor do departamento de oncologia, mas quando me aproximo do quarto, vejo a minha amiga cabisbaixa e do lado de fora. Agitada, apresso ainda mais os meus passos, sentindo uma pontada desconfortável em meu peito. Angustiado, meu coração perde o seu ritmo.— O que aconteceu, Mônica? — perguntei com um tom tão baixo, que não tenho certeza se ela me ouviu. Ela ergue a sua cabeça para mim e eu encontro os seus olhos molhados de lágrimas. — Por que você está chorando? Onde está a minha mãe? — pergunto com um desespero contido. Medo, estou afogada nesse sentimento agora.— Os médicos a levaram, Ana — responde com o mesmo tom que acabei de usar. — Eu sinto muito! Ela passou mal e eu não sabia o que fazer. — Olhei nos olhos da minha amiga. Ela tinha uma expressão
Ana JúliaÉ domingo e nós recebemos algumas visitas de dos meus amigos de faculdade. Algo que alegrou a dona Rose. Ela sempre foi próxima dos meus poucos amigos. O quarto ficou enfeitado de lindas flores e alguns balões. Suas cores chegaram a dar vida ao lugar. Durante a tarde Mônica ligou e nós tivemos uma conversa um pouco animada, mas foi em uma chamada de vídeo com a minha melhor amiga, que vi minha mãe se descontrair um pouco.— Ana? — Despertei dos meus pensamentos quando escutei o som da voz fraca me chamar. Me afastei da janela e encontrei os seus olhos cansados. São quase duas da tarde e eu penso que ela dormiu quase que o dia inteiro depois das visitas e da chamada com a Mônica.— Oi, mãe, estou aqui! — digo, forçando um sorriso.— Quero te pedir uma coisa, filha — disse puxando uma respiração pesada. — Mãe, eu prefiro que você descanse um pouco. Você precisa…— Não, Ana. Querida, eu quero te pedir uma coisa. — Forço mais um sorriso para mascarar a dor que estou sentindo ne
— Ana? — fala com uma voz rouca.— Acabou, amiga, ela se foi — digo em um fio de voz.— Estou indo para aí, Ana. Só preciso falar com a Mariana e com a Juliana pra olharem Isabelly e o papai. Chego no hospital em meia hora.— Tá! — digo e encerro a ligação. — Encosto minha cabeça na parede e observo o corredor quase vazio, se não fosse por alguns médicos e enfermeiras passando por ele. A quietude desse lugar me leva aos meus últimos minutos ao lado da pessoa que eu mais amava nesse mundo e as lágrimas voltam, dessa vez, silenciosas. Minutos depois sinto o meu corpo ser puxado e logo sou abraçada pela minha amiga. Eu me agarro a esse gesto como se ele fosse o meu bote salva-vidas.— Sinto muito, amiga! — sussurra. — Sei que não está sendo fácil para você se despedir assim. Mas acredite, querida, ela precisava descansar. — Eu apenas assinto com a cabeça. Mônica se afasta um pouco e me olha nos olhos, ajeitando algumas mechas dos meus cabelos atrás da minha orelha e volta a falar. — Fare
Memórias...— Mãe? — A chamo sem saber aonde exatamente estou. Um barulho me faz olhar para frente, para a imensa escuridão e uma pequena luz surge no final dela. — É você? Mãe para com isso, vem cá. Estou morrendo de saudades de você. — Caminho no meio da escuridão, em busca da pequena luz. Sinto o meu corpo estremecer, tenho medo, mas não paro. — Mãe? Mãe?...Abro os olhos abruptamente encontrando o quarto semiescuro, se não fosse pela lua cheia a brilhar através da janela de vidro transparente. Sento-me no colchão a procura dela, mas logo a minha ficha cai e eu sinto uma vontade incontrolável de chorar, mas respiro fundo e decido tomar um banho para tentar me acalmar. Sigo para o pequeno banheiro, deixo a minha roupa cair no cesto de roupas sujas, ligo o chuveiro e entro debaixo da água morna que cai imediatamente molhando o meu corpo e isso vai me relaxando pouco a pouco. Fecho os meus olhos e molho os meus cabelos. A sensação do calor da água em meu corpo é maravilhosa, mas ela
Luís Renato— Bando de gente incompetente! — esbravejo enquanto caminho de volta para a minha sala, sobre os olhares atentos e curiosos dos meus funcionários. Dou de ombros. Eu simplesmente odeio pessoas que não têm pontualidade e nem compromisso com o seu trabalho. Odeio ainda mais quando não conseguem fazer as suas tarefas direito. Não deve ser tão difícil fazer as coisas do jeito que eu peço. — Está cada vez mais difícil encontrar uma secretária pontual e competente — resmungo para o meu sócio. Essa já é a quarta que dispenso em menos de quinze dias, que saco! Penso ainda mais irritado. — Tive que demitir mais uma secretária hoje, acredita? Depois do terceiro dia chegando com pelo menos meia hora de atraso. E hoje o seu descaso com o trabalho foi a gota d'água — digo parando de frente para a minha mesa e encaro o Marcos sentado na minha cadeira.— Ih! Dia difícil hoje, mano? — Se levanta fazendo uma cara sacana e segura um sorriso sínico. Acredite, às vezes tenho vontade de esmurra
— Sou Cassandra, me acompanhe, por favor! — pede educadamente. Respiro fundo algumas vezes enquanto a sigo por um corredor comprido. Cassandra me leva uma sala de reuniões. Lá dentro encontro mais quatro moças sentadas ao redor de uma mesa enorme e retangular. Elas são muito bonitas e carregam algumas pastas nas mãos, parecem ter experiência para o trabalho oferecido. Minutos depois começam a nos chamar, uma por vez. A medida que elas vão saindo da sala, eu vou ficando nervosa. Queria muito ter uma oportunidade nesta empresa. Ela parece ser muito promissora. São quase quatro da tarde quando finalmente me chamam. Sou a última a fazer a entrevista, já que fui a última a chegar na empresa. Entro em uma sala enorme e muito bem decorada com um estilo totalmente masculino. No centro da sala há uma mesa com tampo de vidro preto e um homem usando um terno caro e elegante da mesma cor. Enquanto entro na sala, observo o seu porte. Ele parece ser muito alto, apesar de estar sentado e curvado sob
Ana JúliaO tempo parece que não passa quando você está em casa sem nada para fazer. Deixo o meu celular sempre por perto, esperando alguma ligação de alguma das entrevistas que fiz no dia anterior. Confesso que estou perdendo as minhas esperanças, pois já são quase nove horas da manhã e Mônica saiu para trabalhar já faz algum tempo. Estou na sala cuidando da Isabelly, a sobrinha da Mônica. Ela é uma bebê linda e alegre, um amor de criança. Sempre tranquila e divertida. Coloquei-a em seu carrinho com o seu brinquedo preferido, um ursinho de borracha que vive colocando na boca. Enquanto ela brinca, dou mais uma olhada nos classificados do jornal de hoje. A minha insegurança, me faz pensar em bolar um plano B. Passo longos minutos procurando novas oportunidades de emprego e dessa vez, círculo apenas três opções que se encaixam no meu perfil. Mariana, a enfermeira que cuida do seu Genaro passa por mim com um leve sorriso no rosto. Ela é uma garota jovem, tem a minha idade e é muito boni