Ana Júlia
O tempo parece que não passa quando você está em casa sem nada para fazer. Deixo o meu celular sempre por perto, esperando alguma ligação de alguma das entrevistas que fiz no dia anterior. Confesso que estou perdendo as minhas esperanças, pois já são quase nove horas da manhã e Mônica saiu para trabalhar já faz algum tempo. Estou na sala cuidando da Isabelly, a sobrinha da Mônica. Ela é uma bebê linda e alegre, um amor de criança. Sempre tranquila e divertida. Coloquei-a em seu carrinho com o seu brinquedo preferido, um ursinho de borracha que vive colocando na boca. Enquanto ela brinca, dou mais uma olhada nos classificados do jornal de hoje. A minha insegurança, me faz pensar em bolar um plano B. Passo longos minutos procurando novas oportunidades de emprego e dessa vez, círculo apenas três opções que se encaixam no meu perfil. Mariana, a enfermeira que cuida do seu Genaro passa por mim com um leve sorriso no rosto. Ela é uma garota jovem, tem a minha idade e é muito bonita. É alta e tem o corpo cheio de curvas, de pele clara e linda. Porém, não sei se é impressão minha, mas eu a acho muito desconfiada e calada também, ou seria timidez?
— Bom dia, Mariana!—Ah! Bom dia, Ana! Eu só… só vim pegar os medicamentos. — Enquanto fala comigo, Mariana evitava o meu olhar.— Ele está bem?— Sim, eu preciso ir. — Ela tira uma caixa branca de dentro do balcão com alguns medicamentos e volta para o quarto, fechando a porta em seguida. Dou de ombros e volto a me concentrar no meu jornal.Admiro muito a Mônica. Apesar de ser muito jovem e de ter muitos compromissos, ela sempre foi muito atenciosa com os cuidados do seu pai e da sobrinha também. Trabalhar o dia inteiro trancada dentro de um escritório, como assistente de uma advogada muito importante e à noite ela ainda tem disposição para fazer uma faculdade na mesma área, sem falar nos trabalhos extras que ela traz para casa. Durante as horas de Mônica não está em casa, Belly fica no berçário, mas a noite quando a minha amiga sai para se divertir, ela fica com a Juliana, sua babá. Hoje, especialmente, estou cuidando da bebê, porque ela amanheceu febril e muito enjoada, e Juliana não pôde ficar com a menina. Como não tenho nada para fazer, ofereci-me para ajudar. De tarde, após pôr a neném para dormir, me deitei no sofá e liguei a TV para assistir algo, quando o meu celular finalmente resolveu tocar. Corri até o aparelho como se a minha vida dependesse daquilo. Visualizo a tela piscando, um número desconhecido e aperto o botão de atender, falando um tanto apreensiva.— Alô? — Boa tarde, eu gostaria de falar com a senhorita Ana Júlia Falcão. — A voz feminina pediu. Respiro fundo, com o coração acelerado.— É ela.— Ana Júlia, sou a Cassandra Xavier, do escritório Caravelas & Hotelaria. Você fez uma entrevista conosco ontem.— Sim.— Estou ligando para avisar que você passou em nossa entrevista e também que aguardamos você aqui no escritório amanhã, às oito em ponto. — Vibro por dentro. Oh! Meu Deus! Oh! Meu Deus! Oh! Meu Deus! Não acredito! Se pudesse gritar agora, faria, mas Cassandra me acharia uma louca e eu perderia o emprego que nem comecei ainda. Respiro fundo mais uma vez e falo o mais tranquila possível.— Claro, Cassandra. Amanhã, às oito estarei aí.— Não se atrase! — Ela adverte.— Não vou. Oito horas em ponto. Não vou me atrasar! — digo, totalmente confiante. Ela encerra a ligação com a frase: tenha uma boa tarde e até amanhã! e eu só consigo pensar: boa tarde? Boa tarde? Terei a melhor tarde da minha vida! Estou olhando para a tela do meu celular já tem uns bons minutos. Em meu rosto tem um sorriso enorme e bobo que não quer sair. Desperto do meu transe quando escuto Belly choramingar. Eu largo o aparelho em cima da pequena mesa e corro para o quarto.— Oi, picorruxa! — falei imitando uma voz infantil e ela me sorriu com seus olhinhos molhados e me estendeu os seus bracinhos. Tirei a neném do berço e a levei para a sala, e animada com a última notícia, abracei a pequenina e comecei a dançar como uma louca no meio da sala pequena, sem música alguma, dando boas gargalhadas com a Belly, que ria mesmo sem entender o que estava acontecendo. Parei de repente, quando a minha ficha caiu.— Ai, meu Deus! Ai, meu Deus, eu consegui! — Praticamente gritei as palavras, expressando toda a minha alegria, voltando a dançar, cantar e rir. No início da noite, Belly já está de banho tomado, bem alimentada e sonolenta. Ela está sentada no tapete da sala, perdida entre os seus brinquedos coloridos. Mas assim que a porta se abriu e Mônica passou por ela, a pequenina logo se animou e a titia coruja a pegou nos seus braços e a encheu de beijos, matando toda a saudade de um dia inteiro longe da menina.— Belly está muito bem! Você cuidou dela direitinho! — Sorri satisfeita. — Obrigada por ficar com ela hoje!— Não precisa agradecer, amiga. Você já está fazendo muito mais por mim. E ela nem me deu trabalho assim, é uma boa menina. Não é, Belly? — digo satisfeita e apertando as suas bochechas gordinhas.— Vai contar o que aconteceu ou terei que adivinhar sozinha? — Ela pergunta com humor. Eu provavelmente ainda estou com um sorriso bobo estampado no rosto.— Ligaram para mim hoje — digo deixando toda a vibração presa em meu corpo sair, aumentando o meu sorriso, se é que isso é possível.— Sério, qual das empresas? — Mônica me olha com interesse.— Caravelas & Hotelaria — Agora ela arregala os olhos e abre a boca em surpresa.— Ana você conseguiu! — Ela quase grita as palavras, e o seu sorriso se amplia assim como o meu.— Sim, tenho que estar lá amanhã, às oito da manhã em ponto. Cassandra deixou bem claro que não pode haver atrasos.— Ana, você sabe o que isso significa, não é? — pergunta ficando séria. — Dizem que não é nada fácil conseguir uma vaga nessa rede de hotelaria, e você conseguiu!— Eu sei! — Contive uma explosão de alegria. — Acredito que finalmente algo começou a dar certo para mim! — falo entusiasmada.— Você é uma guerreira, minha amiga. Você dará muito orgulho à sua mãe de onde ela estiver e vencerá, porque você merece isso da vida. — Suas palavras me emocionam.— Obrigada, amiga, por tudo! Por estar comigo, por me apoiar, por não me deixar desistir nunca. Eu te amo muito, minha irmã!— Também te amo muito! Mas tudo isso que conquistou é mérito seu e não meu. — fala com um sorriso iluminando seu rosto e coloca Belly em seu carrinho. — Temos que comemorar! — Mônica fala batendo palmas e dando pulinhos no meio da sala. Belly solta algumas risadinhas, batendo palminhas, pensando ser um
— Merda, isso está um caos! — xinguei irritado quando o telefone voltou a tocar no meio de mais uma leitura de relatórios. Respirei fundo. Preciso resolver a questão da minha secretária logo, ou enlouquecerei aqui. Parei tudo que tinha para fazer e peguei alguns currículos das entrevistas dentro da minha gaveta. Li atentamente um por um, mas foi o último currículo que me chamou a atenção. CURRÍCULO VITAINOME: Ana Júlia Falcão.IDADE: 20 anos.ESCOLARIDADE: Segundo período de medicina e curso completo de inglês.EXPERIÊNCIA: Sem experiências.OBSERVAÇÃO: Aberta a novas experiências. — Interessante! — disse baixinho. — Jovem, boa aparência, inexperiente, essa parte me preocupa. Tive que demitir algumas mulheres com bastante experiência no cargo. Será que ela conseguiria dar conta? Olho a foto no topo do currículo e me deixo levar. Ela é bonita! Uma morena e tanto! Olhos castanhos e meigos, cabelos negros, lábios cheios. Simplesmente linda! Bufei, esfregando as mãos no rosto. No que v
Ana JúliaO despertador tocou às seis da manhã em ponto, mas eu já estou acordada há mais de meia hora e deitada na cama com a mente distante, perdida em pensamentos. Tive uma noite agitada, pensando no meu primeiro dia de trabalho. Como será trabalhar no Caravelas? Como será o meu chefe? Na verdade, estou mesmo é com medo de pôr tudo a perder. Nunca trabalhei na minha vida, não porque não precisasse, mas a minha mãe queria que eu me dedicasse inteiramente aos meus estudos. Ela queria que eu me formasse e que eu fosse alguém na vida. Por isso era a única que trabalhava em casa e se empenhava para que eu nunca abandonasse os meus estudos. Após separar uma roupa, a deixo em cima da cama e tomo um banho relaxante. A água morna consegue me acalmar sempre que fico tensa ou ansiosa. Sem pressa, lavo os meus cabelos, o meu corpo e saio enrolada numa toalha. Olho para as minhas roupas sobre a cama e fico indecisa no que vestir para o primeiro dia. Acabo optando por uma saia-lápis azul-marinho
— Bom dia, Ana! — Ele diz de costas para mim. — Antes de tudo, eu quero o meu café. Espero que tenham colocado você a par de tudo na sua função.— Sim, senhor — digo sem esperar que continue. — O seu café já está na sua mesa, senhor. Extra forte, puro e bem quente, como o senhor gosta — digo acompanhando-o até a sua sala.— Ótimo! — diz num tom firme e seco. — Sente-se. — ordenou contornando a sua mesa. — O que temos para hoje, Ana? — Eu me acomodo na cadeira de frente para a sua mesa e enquanto mexo no tablet, ele leva a xícara a boca.— O senhor tem duas reuniões, uma com o senhor Bartolomeu Dias, do marketing e outra com alguns acionistas. Em seguida tem mais uma reunião com o advogado. Um almoço com a senhora Joana Alcântara, além de uma videoconferência e três inspeções nos hotéis do litoral.— Certo. Eu preciso que você me acompanhe na reunião com Bartolomeu, Ana. E que faça algumas anotações para mim. Quanto ao almoço com a minha mãe, cancele! As inspeções dos hotéis tomam muit
Algumas horas antes…Luís RenatoEram cinco da manhã, o sol ainda estava fraco lá fora. Não conseguia mais dormir, sentia-me ansioso e inquieto. Pulei da minha cama e fui direto para o banheiro. Fiz minha higiene pessoal, tomei um banho rápido e coloquei uma roupa para fazer a minha corrida matinal. Como sempre, eu corri alguns quarteirões, chegando no calçadão e encontrei Guilherme Albuquerque se preparando para iniciar a sua corrida matinal. Gui, como o chamamos, é o irmão mais novo de Marcos Albuquerque. Ele é advogado e tem um escritório bem requisitado no centro da cidade, a G & G Advogados. As siglas fazem jus a uma sociedade dele com a esposa Gisele Albuquerque, que começou quando ainda nem sonhavam em estar casados. Hoje, eles têm uma filhinha linda, de apenas dois anos, a Amanda, que é minha afilhada e a minha alegria também. Amo aquela gorduchinha!— E aí, cara, como você está? — perguntou assim que me viu. — Sabia exatamente a que estava se referindo. Gui queria falar sobre
— Bom dia, senhor Luís! Podemos conferir a sua agenda do dia? — Fechei minha cara ao ouvir o som doce da sua voz. Sem falar que me irrita saber que esse som consegue rasurar a escuridão dentro de mim e isso me deixa com medo, acuado.— Bom dia! Primeiro, preciso do meu café. — Lhe respondi da maneira mais profissional e o tom mais seco possível. Mas a sua resposta profissional me fez parar no meio da minha sala e eu encarei a xícara descansando sobre o pires. Um café quente, forte e puro, como eu gosto. Um ponto para você, senhorita Ana Júlia! Pontualidade, dois pontos. Talvez você tenha algum futuro por aqui… por enquanto. Repassamos toda a agenda do dia, e não sei o porquê, mas acabei por levá-la comigo à reunião com Bartolomeu e às inspeções dos hotéis do litoral, algo totalmente desnecessário, já que os próprios gerentes resolvem tudo isso sozinhos. Quando terminamos enfim as inspeções, almoçamos em um dos restaurantes do hotel. Como um cavalheiro, puxei uma cadeira para que ela s
Ana Júlia Falcão.Secretária do Doutor L. R. Alcântara.Assunto: Aviso.Ela me pediu para avisá-lo que só retornará ao Brasil na terça, pois precisam de mais um dia para resolver os problemas do novo hotel....Ansioso por conversar com ela, mesmo que o assunto seja trabalho, começo a digitar apressadamente:Luís Renato Alcântara.CEO da Caravelas e Hotelaria.Boa noite, senhorita Ana! Posso fazer uma pergunta?...Ana Júlia Falcão.Secretária do Doutor L. R. Alcântara.Sim....Luís Renato Alcântara.CEO da Caravelas e Hotelaria.Por que ela mesmo não me ligou avisando?... Ana Júlia Falcão.Secretária do Doutor L. R. Alcântara.Ela disse que tentou várias vezes, mas não conseguiu, senhor. Espero que o senhor não tenha se chateado!...Luís Renato Alcântara.CEO da Caravelas e Hotelaria.Não estou chateado, Ana, é só curiosidade mesmo. Acredito que ela tentou, quando eu estava jantando com meus pais....Ana Júlia Falcão.Secretária do Doutor L. R. Alcântara.Certo! Então, é isso!
Termino o meu café e saio da cozinha, subo as escadas e vou para o meu quarto. No banheiro, vou direto para o balcão da pia e encaro o meu rosto. A barba está cheia, e o cabelo desalinhado. Pego a máquina na gaveta e começo a fazer o design da minha barba. Ao terminar, vou para o box de vidro temperado e ligo o chuveiro. Tomo uma ducha rápida. Vou para o closet e escolho uma bermuda leve e branca, e uma camiseta azul-escuro, sandálias de dedo e os meus óculos de estilo aviador. Observo o visual no espelho de corpo inteiro e passo as pontas dos dedos em meus cabelos, alinhando os fios. Puxo a respiração, observando o homem ansioso, louco para sair da sua jaula.Definitivamente, não sei o que estou fazendo.Minutos depois, desço as escadas e noto que Marta não está mais na cozinha. Saio de casa e vou direto para o elevador. Mesmo parado na caixa de aço, as pontas dos meus dedos tamborilando na palma da mão e a perna inquieta dizem o quão nervoso estou com esse almoço. Abro o primeiro bo