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— Sou Cassandra, me acompanhe, por favor! — pede educadamente. Respiro fundo algumas vezes enquanto a sigo por um corredor comprido. Cassandra me leva uma sala de reuniões. Lá dentro encontro mais quatro moças sentadas ao redor de uma mesa enorme e retangular. Elas são muito bonitas e carregam algumas pastas nas mãos, parecem ter experiência para o trabalho oferecido. Minutos depois começam a nos chamar, uma por vez. A medida que elas vão saindo da sala, eu vou ficando nervosa. Queria muito ter uma oportunidade nesta empresa. Ela parece ser muito promissora. São quase quatro da tarde quando finalmente me chamam. Sou a última a fazer a entrevista, já que fui a última a chegar na empresa. Entro em uma sala enorme e muito bem decorada com um estilo totalmente masculino. No centro da sala há uma mesa com tampo de vidro preto e um homem usando um terno caro e elegante da mesma cor. Enquanto entro na sala, observo o seu porte. Ele parece ser muito alto, apesar de estar sentado e curvado sobre alguns papéis em sua mesa. Tem o rosto quadrado e seus cabelos têm tons avermelhados. Marcos Albuquerque faz um sinal sutil com a mão para que eu me sente na cadeira a frente da sua mesa, sem ao menos olhar em meus olhos. Inspiro profundamente e sinto as minhas mãos suarem de tão nervosa que estou. Ando em direção à mesa e me acomodo na cadeira como me pediu e dou graças aos céus por não estar me olhando.

— Olá, Ana Júlia! — Ele diz. A sua voz grossa parece um estrondoso trovão. — Meu nome é Luís Renato Alcântara. Fiquei confusa. Será que estou na entrevista errada? Lembro-me claramente que a minha entrevista era com o doutor Marcos Albuquerque. Luís Renato finalmente ergue sua cabeça e penso que percebeu a minha confusão, pois logo esclarece. — O doutor Marcos Albuquerque não pôde comparecer a essa entrevista, então estou resolvendo isso para ele — diz ainda com voz firme.

— Ah! — É só o que consigo dizer, sentindo-me um pouco sem graça. Não sei o porquê, mas por saber que ele fará a minha entrevista e não o tal do Marcos Albuquerque, me deixou ainda mais nervosa.

— Podemos começar? — inquire, mexendo nos papéis, mas sem tirar o seu olhar firme de cima de mim. Assenti. Seus olhos castanhos de um tom claro quase como o mel me prenderam por alguns instantes, deixando-me um pouco fora de foco.

— Claro, quando quiser! — Forço-me a falar o mais natural possível.

— Ótimo! Qual o seu grau de escolaridade, Ana Júlia?

— Eu fazia faculdade de Medicina. Na verdade, eu estava no meu segundo período. Mas tive que fechar o meu curso esses dias por motivos pessoais e financeiros — disse orgulhosa por conseguir manter a minha voz firme.

— Medicina? — Doutor Luís Renato me lançou um olhar especulativo. Ele parecia surpreso. — Interessante! E acredita que vai se adaptar ao ramo de hotelaria? — Continua. Ele se encosta em sua cadeira e seu olhar parece me analisar.

— Então, senhor Alcântara. — Ajeito-me na cadeira, sentindo-me um pouco incomodada — Eu realmente preciso desse emprego. Sou jovem e aprendo muito rápido e estou aberta a novas experiências. — Boa, Ana! — Vibrei por dentro. O homem me encarou passível por alguns segundos, sem dizer uma palavra e isso me incomodo um pouco.

— Boa resposta! — disse um tanto ríspido. O que há de errado com esse cara? Parece que quanto mais acerto, mais ele se irrita! Perguntei internamente, tentando não demostrar o meu incomodo. O observei atenta ele abrir uma gaveta em sua mesa e ele pegou algumas folhas de papel em branco e uma caneta, depois os estendeu em minha direção. — Escreva o que eu ditar, senhorita — pediu formalmente. Me ajeitei na cadeira e debrucei-me levemente sobre sua mesa e segurei a caneta, aguardando que ele começasse a falar. Nesse momento ele começou a ditar em uma velocidade considerável e paciente, uma carta de pelo menos vinte linhas. Enquanto ditava, ele andava de um lado para o outro da sala, com suas mãos nos bolsos da calça. Depois recuou da minha cadeira, onde estou, se inclina um pouco e pegou o papel sobre a mesa. O simples gesto faz o meu coração acelerar, deixando-me atordoada. Ele observou em silêncio a minha letra por um tempo e sem dizer nada volta a sentar-se em sua cadeira. Doutor Luís fez algumas anotações em outro papel e o arquivou junto ao meu currículo. Eu apenas o observei atenta, esperando que ele dissesse algo que me ajudasse a perceber se me saí bem ou não na m*****a entrevista.

— Obrigado por vir, senhorita Falcão! — disse simplesmente. — Cassandra a acompanhará até a saída. Qualquer coisa, entraremos em contato com você. Tenha uma boa tarde! — falou sem me olhar, organizando os papéis que estavam em sua mesa em uma pasta à parte.

É só isso, acabou?

— Obrigada pela oportunidade, senhor Alcântara! — digo com ama tranquilidade que no momento eu não tenho, pois, a minha vontade é de gritar com ele. Levanto-me da cadeira e vou em direção à porta de saída. Encontro Cassandra assim que abro a porta. Ela me lança um sorriso doce, que retribuo e por fim eu a acompanho, mas antes de sair, me atrevo a dizer.

— Tenha uma boa tarde, senhor Alcântara! — Ele apenas assente, ainda de olho nos malditos papéis. 

Mal-educado!

A entrevista terminou perto das cinco horas da tarde e não sei por quê, mas acredito que dessa vez dará certo. Por algum motivo me sinto tranquila. A final respondi todas as perguntas da entrevista sem hesitar e isso causa uma boa impressão, certo? Também digitei e escrevi textos de forma rápida e precisa. Ainda tinha mais uma oportunidade circulada nos classificados do jornal, mas com certeza não dará tempo para mais uma entrevista de emprego. Agora só me resta torcer para que algumas das que fiz dê tudo.

Pego um ônibus para ir para casa e me sento no último banco que surpreendemente estava vazio para o horário de pico. Em algum momento da viagem me peguei pensando no doutor Luís Renato Alcântara. O cara é uma espécie de deus grego. Muito lindo mesmo! É ruivo, alto e mesmo usando um terno, dava para perceber que ele é forte. Talvez até pratique algum tipo de exercício físico ou um esporte. Seus olhos castanhos muito claros refletiam um brilho triste. Eu senti isso em sua voz também. Deus do céu! A sua voz grave é de derreter qualquer mulher desavisada! Um espetáculo de homem! Pego-me rindo dos meus pensamentos audaciosos e suspirei em meio às minhas especulações mentais. Droga!

O que há de errado com você, é melhor colocar a sua cabeça no lugar e pensar em trabalho, dona Ana Júlia Falcão! No momento é só disso que você precisa, trabalho!

Chego em casa perto quando já está escuro. Entro e vou direto para o quarto, me livro dos saltos que estão me matando, depois de um dia inteiro andando atrás de trabalho. Entro no banheiro e me livro das minhas roupas e as ponho no cesto para lavar. E quando sinto a água fria e deliciosa molhar o meu corpo, imediatamente me sinto relaxar. Caramba! Um banho mais do que merecido! Quando termino, me dedico a secar-me e ponho uma roupa mais leve. Olho-me no espelho do quarto e não gosto do que vejo: meu rosto está abatido e cansado e tenho olheiras ao redor dos meus olhos. Respiro fundo e saio do quarto, vou para a cozinha e preparo um jantar prático e rápido para esperar a minha amiga chegar do seu trabalho e enquanto estou preparando tudo, pego-me pensando na entrevista de hoje à tarde. Apesar de o bonitão ser arrogante e mal-educado, eu preciso daquele emprego e se for preciso, farei vista grossa para o seu mau-humor gratuito, afinal, o importante é resolver a minha vida e quem sabe futuramente voltar ao meu curso. Ergo a minha cabeça no exato momento em que a Mônica entra em casa. A observo jogar as chaves e sua bolsa em cima do sofá e ela força um sorriso para mim.

— Cansada? — pergunto.

— Acabada, amiga! Tomo um banho e volto rapidinho para saber como se saiu nas entrevistas — avisa. Espero que tome o seu banho, porém o jantar fora rápido e uma conversa curta, pois logo ela estava mergulhada nos trabalhos que trouxe para casa.

Após deixar a cozinha arrumada, fui para o quarto e peguei um bom livro para tentar me distrair um pouco. Sim, eu amo ler romances onde o badboy vira o inesperado mocinho romântico e faz de tudo para conquistar a garota simples e meiga da história. Empolgada com a leitura, não senti a hora passar. Já era tarde quando me forcei a parar a leitura e tentei dormir. Não é nada fácil dormir quando se está sem sono e com a cabeça cheia de coisas para se pensar. Saio da cama e vou até à cozinha, bebo um pouco d’água, depois volto para o quarto e só então, depois de rolar na cama por um longo tempo, adormeço e sonho mais uma vez com a minha mãe.

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