Um mês depois...
Luís Renato
Acordo com uma puta dor de cabeça e o mau-humor como sempre é a minha melhor companhia. Forço-me a sair da cama e resmungo enquanto caminho para o banheiro. Mais uma noite de bebedeira e de lamentações. É um inferno! Tomo um banho demorado e espero que a água fria leve para longe de mim a dor que me acompanha como uma sombra negra. Minutos depois, ponho uma roupa informal para mais um dia cheio. Preciso trabalhar, manter a minha mente ocupada. Não pensar nela me dá alguns minutos de paz. É inverno aqui no Rio e os dias se tornam mais frios e chuvosos. No carro, me dedico a ler o jornal e acompanhar as notícias do dia. Nesse momento o meu celular começa a tocar e eu o atendo revirando os olhos com impaciência.
— Bom dia, flor do dia! Como está o seu humor nesta manhã? — Marcos Albuquerque, meu sócio e melhor amigo pergunta com o seu familiar humor matinal que me irrita. Bufo em resposta. Odeio esse seu jeito alegre de ser. Porra, o homem é a felicidade em pessoa, e sinceramente, eu não vejo motivos para isso. O cara é solteiro, mora sozinho e mesmo assim está sempre de boa.— O que você quer, Marcos? — perguntei irritado.— Avisar que chegarei atrasado para nossa reunião. — Bufo outra vez. Grande novidade! Com certeza ele teve mais uma noite de sexo grupal com as vadias do seu convívio social e está acordando agora.— Sabe o quanto essa reunião é importante para a empresa, Marcos.— Relaxa, Luís, é um atraso pequeno. — Ele tenta se justificar. Olho as horas. Estou adiantado pelo menos duas horas. Essa virou a minha rotina: chego antes de todos e só saio quando não tem mais ninguém no prédio.— Não aceito desculpas, Marcos, você tem uma hora! — falo encerrando a chamada bruscamente. Às oito em ponto estou preparado para mais uma reunião, a primeira do dia. Lorena, minha nova secretária entra em minha sala com um semblante sério e trazendo consigo uma xícara de café.— Está atrasada — digo friamente e sem olhá-la nos olhos.— Desculpe, senhor Alcântara, o trânsito…— Não tem desculpas, Lorena! Saia de casa mais cedo se for preciso. Sabe o que eu penso sobre atrasos — rosno impaciente, encarando-a firmemente. Observo a garota engolir em seco e se aproximar da minha mesa com cautela.— Não vai se repetir, senhor Alcântara. Eu trouxe o seu café — diz com a voz levemente trêmula. Ela põe a xícara de porcelana na minha frente, eu a seguro em minhas mãos e bebo um pequeno gole do líquido, cuspindo-o logo em seguida, fazendo com que a minha secretária dê um passo receoso para trás. Calmamente ponho a xícara de volta na mesa, levanto da minha cadeira e em silêncio pego um guardanapo de papel. Passei-o no meu terno italiano legítimo, e só depois a encarei novamente.— Você é uma idiota! — falei baixo, porém grosseiro. — Não sabe fazer um bom café, só chega atrasada. Tem algo que consiga fazer direito? — rosno as palavras, caminhando em sua direção de uma forma lenta e ameaçadora. Seus olhos meigos logo começam a se encher de lágrimas, mas isso não me comove nem um pouco e não me impede de dá o tiro de misericórdia — Está demitida, senhorita Lorena! — rosnei rudemente.— Mas,— Procure o setor de RH e receba pelo seu trabalho de uma semana — disse lhe dando as costas, sem lhe dar a chance de defesa. Voltei para minha mesa, peguei alguns papéis e saí em seguida para a reunião.***
Depois de uma reunião demorada, encarei o Marcos que estava me encarando sério demais para o meu gosto. Reviro os olhos e jogo a caneta sobre os papéis, cruzando os dedos sobre o meu colo em seguida.— Fala. — Marcos arregala os olhos, fazendo uma cara de inocente e leva uma mão ao peito teatralmente.— Eu?— Tem mais alguém aqui? — pergunto com as sobrancelhas arqueadas. Então ele solta uma lufada de ar e se ajeita em cima da cadeira.— Ok, na quinta é o aniversário da Vitória, aquela minha amiga, você lembra? Vamos comemorar em uma boate, e ela…— Pode parar por aí! — O corto ríspido e Marcos engole o resto da sua frase. — Você sabe o que penso sobre sair com as suas amigas, Marcos e já falei, não quero uma namorada, tão pouco um romance de quinta.— E quem falou em romance aqui? Luís, as garotas só querem se divertir. Qual é, cara? Faz tempo que você não sai, que só vive trancado naquele apartamento, ou aqui na empresa. — Exasperado, levanto-me da cadeira e vou até o bar de canto, sirvo-me uma dose pequena de uísque e bebo um gole mínimo. Eles não entendem. Não tenho mais a minha vida, ela levou tudo de mim; a minha alegria, a minha vontade de viver. Sinto-me um velho que só tem duas opções na vida; o trabalho e o lar. Interagir com garotas charmosas e risonhas, que te oferecem um falso sentimento me irrita. Prefiro as profissionais, aquelas que ganham dinheiro para fazer tudo como quero e sem contestar as minhas exigências.— Tô fora, meu amigo — falo por fim e observo o meu amigo desanimar. Marcos se levanta da sua cadeira de cara fechada e segue até a saída do meu escritório.— Ela não merece tudo isso, Luís. — Ele solta essas palavras duras, abre a porta e olha para trás, encontrando o meu olhar irritado. — Sinto falta do meu amigo — diz com um tom baixo e sai, fechando a porta atrás de si. Esvazio o meu copo, sentindo o meu sangue ferver. Odeio quando falam dela, mas odeio ainda mais essas cobranças em cima de mim.Sei que às vezes parece birra de um menino que foi posto de castigo por fazer alguma travessura, mas não é! Observar a minha família feliz, conversando à mesa, assistir os seus sorrisos felizes, cada gesto carinhoso e todo aquele companheirismo. Nada disso me envolve e nem me sensibiliza. A verdade é que eu gostaria que eles me esquecessem, que fingissem que eu não existo. Porra, esses ambientes não fazem mais parte de mim. Lilian, minha irmã caçula me desperta com mais um riso à mesa, e minha mãe a acompanha devido a algo que o meu pai comentou. Não prestei atenção na conversa, porque a minha mente estava em meu escritório particular e na garrafa de uísque escocês que comprei na noite passada. Não vou mentir, estou contando os minutos para que esse jantar em família acabe logo, para eu poder finalmente me refugiar na minha escuridão e finalmente afogar a minha dor em alguns copos.— O que acha, Luís? — Lilian pergunta animada.— O quê? — indago atordoado. — Desculpe, eu não estava pr
Ana JúliaTem momentos na vida que esquecemos de dá valor as pequenas coisas ela nos oferece. Um simples sorriso, o desabrochar das flores, as gostas de chuva que molham à terra sedenta. Nada disso tem valor, até você realmente nota-las. Assim tem sido os meus dias ultimamente. Aprendi a valorizar cada segundo que o ponteiro do relógio insiste em marcar, sem ter um mínimo de dó de mim. Desculpe a minha grosseria! Então, eu penso que posso começar a contar a minha história para vocês assim; meu nome é Ana Júlia Falcão, sou uma garota simples, que mora no subúrbio. Tenho vinte anos, na verdade, quase vinte e um, pois farei aniversário daqui a três meses. Sou morena e meus cabelos são compridos, lisos e negros. Não sou muito alta, mas acho minha estatura legal, tenho um metro e sessenta e cinco de altura. Meu corpo é esguio, mas não sou cheia de curvas. Acho-me bonita e arrisco dizer que atraente também. Normalmente sou uma garota muito alegre e comunicativa e tinha todo o prazer de vive
No elevador, sinto o meu peito se apertar com uma angústia sufocante que não consigo explicar. É como se algo muito ruim tivesse acontecendo nesse exato momento. Apresso os meus passos assim que as portas se abrem e entro no largo corredor do departamento de oncologia, mas quando me aproximo do quarto, vejo a minha amiga cabisbaixa e do lado de fora. Agitada, apresso ainda mais os meus passos, sentindo uma pontada desconfortável em meu peito. Angustiado, meu coração perde o seu ritmo.— O que aconteceu, Mônica? — perguntei com um tom tão baixo, que não tenho certeza se ela me ouviu. Ela ergue a sua cabeça para mim e eu encontro os seus olhos molhados de lágrimas. — Por que você está chorando? Onde está a minha mãe? — pergunto com um desespero contido. Medo, estou afogada nesse sentimento agora.— Os médicos a levaram, Ana — responde com o mesmo tom que acabei de usar. — Eu sinto muito! Ela passou mal e eu não sabia o que fazer. — Olhei nos olhos da minha amiga. Ela tinha uma expressão
Ana JúliaÉ domingo e nós recebemos algumas visitas de dos meus amigos de faculdade. Algo que alegrou a dona Rose. Ela sempre foi próxima dos meus poucos amigos. O quarto ficou enfeitado de lindas flores e alguns balões. Suas cores chegaram a dar vida ao lugar. Durante a tarde Mônica ligou e nós tivemos uma conversa um pouco animada, mas foi em uma chamada de vídeo com a minha melhor amiga, que vi minha mãe se descontrair um pouco.— Ana? — Despertei dos meus pensamentos quando escutei o som da voz fraca me chamar. Me afastei da janela e encontrei os seus olhos cansados. São quase duas da tarde e eu penso que ela dormiu quase que o dia inteiro depois das visitas e da chamada com a Mônica.— Oi, mãe, estou aqui! — digo, forçando um sorriso.— Quero te pedir uma coisa, filha — disse puxando uma respiração pesada. — Mãe, eu prefiro que você descanse um pouco. Você precisa…— Não, Ana. Querida, eu quero te pedir uma coisa. — Forço mais um sorriso para mascarar a dor que estou sentindo ne
— Ana? — fala com uma voz rouca.— Acabou, amiga, ela se foi — digo em um fio de voz.— Estou indo para aí, Ana. Só preciso falar com a Mariana e com a Juliana pra olharem Isabelly e o papai. Chego no hospital em meia hora.— Tá! — digo e encerro a ligação. — Encosto minha cabeça na parede e observo o corredor quase vazio, se não fosse por alguns médicos e enfermeiras passando por ele. A quietude desse lugar me leva aos meus últimos minutos ao lado da pessoa que eu mais amava nesse mundo e as lágrimas voltam, dessa vez, silenciosas. Minutos depois sinto o meu corpo ser puxado e logo sou abraçada pela minha amiga. Eu me agarro a esse gesto como se ele fosse o meu bote salva-vidas.— Sinto muito, amiga! — sussurra. — Sei que não está sendo fácil para você se despedir assim. Mas acredite, querida, ela precisava descansar. — Eu apenas assinto com a cabeça. Mônica se afasta um pouco e me olha nos olhos, ajeitando algumas mechas dos meus cabelos atrás da minha orelha e volta a falar. — Fare
Memórias...— Mãe? — A chamo sem saber aonde exatamente estou. Um barulho me faz olhar para frente, para a imensa escuridão e uma pequena luz surge no final dela. — É você? Mãe para com isso, vem cá. Estou morrendo de saudades de você. — Caminho no meio da escuridão, em busca da pequena luz. Sinto o meu corpo estremecer, tenho medo, mas não paro. — Mãe? Mãe?...Abro os olhos abruptamente encontrando o quarto semiescuro, se não fosse pela lua cheia a brilhar através da janela de vidro transparente. Sento-me no colchão a procura dela, mas logo a minha ficha cai e eu sinto uma vontade incontrolável de chorar, mas respiro fundo e decido tomar um banho para tentar me acalmar. Sigo para o pequeno banheiro, deixo a minha roupa cair no cesto de roupas sujas, ligo o chuveiro e entro debaixo da água morna que cai imediatamente molhando o meu corpo e isso vai me relaxando pouco a pouco. Fecho os meus olhos e molho os meus cabelos. A sensação do calor da água em meu corpo é maravilhosa, mas ela
Luís Renato— Bando de gente incompetente! — esbravejo enquanto caminho de volta para a minha sala, sobre os olhares atentos e curiosos dos meus funcionários. Dou de ombros. Eu simplesmente odeio pessoas que não têm pontualidade e nem compromisso com o seu trabalho. Odeio ainda mais quando não conseguem fazer as suas tarefas direito. Não deve ser tão difícil fazer as coisas do jeito que eu peço. — Está cada vez mais difícil encontrar uma secretária pontual e competente — resmungo para o meu sócio. Essa já é a quarta que dispenso em menos de quinze dias, que saco! Penso ainda mais irritado. — Tive que demitir mais uma secretária hoje, acredita? Depois do terceiro dia chegando com pelo menos meia hora de atraso. E hoje o seu descaso com o trabalho foi a gota d'água — digo parando de frente para a minha mesa e encaro o Marcos sentado na minha cadeira.— Ih! Dia difícil hoje, mano? — Se levanta fazendo uma cara sacana e segura um sorriso sínico. Acredite, às vezes tenho vontade de esmurra
— Sou Cassandra, me acompanhe, por favor! — pede educadamente. Respiro fundo algumas vezes enquanto a sigo por um corredor comprido. Cassandra me leva uma sala de reuniões. Lá dentro encontro mais quatro moças sentadas ao redor de uma mesa enorme e retangular. Elas são muito bonitas e carregam algumas pastas nas mãos, parecem ter experiência para o trabalho oferecido. Minutos depois começam a nos chamar, uma por vez. A medida que elas vão saindo da sala, eu vou ficando nervosa. Queria muito ter uma oportunidade nesta empresa. Ela parece ser muito promissora. São quase quatro da tarde quando finalmente me chamam. Sou a última a fazer a entrevista, já que fui a última a chegar na empresa. Entro em uma sala enorme e muito bem decorada com um estilo totalmente masculino. No centro da sala há uma mesa com tampo de vidro preto e um homem usando um terno caro e elegante da mesma cor. Enquanto entro na sala, observo o seu porte. Ele parece ser muito alto, apesar de estar sentado e curvado sob