No elevador, sinto o meu peito se apertar com uma angústia sufocante que não consigo explicar. É como se algo muito ruim tivesse acontecendo nesse exato momento. Apresso os meus passos assim que as portas se abrem e entro no largo corredor do departamento de oncologia, mas quando me aproximo do quarto, vejo a minha amiga cabisbaixa e do lado de fora. Agitada, apresso ainda mais os meus passos, sentindo uma pontada desconfortável em meu peito. Angustiado, meu coração perde o seu ritmo.
— O que aconteceu, Mônica? — perguntei com um tom tão baixo, que não tenho certeza se ela me ouviu. Ela ergue a sua cabeça para mim e eu encontro os seus olhos molhados de lágrimas. — Por que você está chorando? Onde está a minha mãe? — pergunto com um desespero contido. Medo, estou afogada nesse sentimento agora.— Os médicos a levaram, Ana — responde com o mesmo tom que acabei de usar. — Eu sinto muito! Ela passou mal e eu não sabia o que fazer. — Olhei nos olhos da minha amiga. Ela tinha uma expressão assustada e logo voltou a chorar, dessa vez me envolvendo em seus braços. Senti minhas barreiras já abaladas irem ao chão e eu desabei ali mesmo. Ficamos entregues à dor e a um silêncio doloroso por alguns minutos. — As máquinas começaram a fazer um barulho estranho e de repente os médicos e enfermeiras invadiram o quarto e eles me mandaram sair do quarto. — diz agora mais calma. — E eu… juro que não sei o que aconteceu, Ana. — Mônica volta a chorar, dessa vez silenciosa e ainda em seus abraços, me deixo levar pelo pranto e pela dor.— Deus, me ajude, por favor! Deus, me ajude, por favor! — repito a oração em voz alta, como se fosse um mantra, na esperança de que tudo isso acabe logo. Eu não aguento mais tanta dor! Horas se passaram até que o Dr. Reinaldo Vilela, o médico que acompanhava a minha mãe em seus tratamentos desde o início, apareceu.— Podemos conversar em meu consultório um minuto, Ana? — O seu semblante sério demais me deixou receosa. Hesito, ainda sentada no banco ao lado da minha amiga. Doutor Vilela aparenta ter seus quarenta anos. E apesar de ter os cabelos grisalhos e curtos, que lhe dão um certo charme, ele é um homem bem conservado. Seu semblante calmo transmite muita serenidade, mas faz um contraste grande demais com a sua voz grave e firme. Ele me convida a entrar em seu consultório. Receosa, eu puxo a respiração para tomar coragem e nesse momento, Mônica segura a minha mão e sussurra que estará aqui fora me esperando. Sei o que ele tem para me falar e não sei se estou preparada para ouvir as suas palavras. Não estou preparada para sua partida, não ainda.— Não vou te deixar sozinha, amiga — repete e eu assinto. Então, impulsionada por uma força que desconheço, levanto-me do banco e o sigo em silêncio. Entramos em sua sala, que tem uma decoração moderna, alguns livros em uma estante e alguns quadros com fotos de sua família desportos sobre a sua mesa. Sinto os meus passos cada vez mais pesados, minhas pernas parecem pesar uma tonelada. Sento-me na cadeira em frente para sua mesa, para enfim ouvir o que ele tem para me dizer.— Ana, as notícias não são nada boas. A sua mãe teve outra parada cardiorrespiratória. Ela está muito fraca e temo que se ela tiver outra parada dessas, acredito que não vá resistir — diz o seu prognóstico e me lança um olhar piedoso. — Querida, eu aconselho que fique preparada, porque ela pode ir a qualquer momento. Imagino que não será nada fácil, menina, mas temos que ser realistas. — Escuto o médico falar e falar, mas não presto muita atenção em suas palavras. Meu cérebro está girando e girando sem parar e minha mente está muito distante daqui. Estou pensando no amanhã e no meu futuro sem ela. Minutos depois, saio do seu consultório arrasada, acabada, sem forças, sem esperanças e sem chão. Meu mundo está desabando mais uma vez sobre a minha cabeça.— O que será de mim agora? — pergunto para mim mesma. — Eu me sinto tão sozinha sem você aqui comigo, mãe. Por favor, não me deixe! — peço, encostando-me em uma parede, sentindo minhas pernas fraquejarem, até que caio de joelhos no chão, entregando-me mais uma vez à dor e às lágrimas que já não controlo mais. Sinto braços carinhosos me abraçarem. Mônica está ao meu lado como havia me prometido e chora junto comigo. Não havia necessidade de dizer-lhe mais nada, ela já entendera o que estava acontecendo.— O que eu farei agora, amiga? — perguntei soluçando em seus braços. — Eu não sei o que fazer com essa dor aqui dentro do meu peito. Se ela me deixar, eu não saberei viver.— Querida, eu sinto muito, mas você precisa ser forte agora. Por você e por ela também. Ana, a sua mãe precisa descansar, ela já não aguenta mais. Lutou o que tinha para lutar, mas tenha uma certeza na vida, ela não irá em paz se você ficar assim. — Suas palavras penetraram com suavidade em meus ouvidos. Ela tem razão, mas meu coração é egoísta demais para deixá-la ir.— Deus, me ajude, por favor! Deus, me ajude, por favor! Deus, me ajude, por favor! — Repito a prece que fiz minutos atrás. —Mãe me ajude a suportar essa dor que é a sua partida — sussurrei um último pedido de socorro para a minha mãe, na esperança de que ela realizasse esse último desejo. — Eu te amo tanto! — digo soluçando. Mônica afaga as minhas costas, ainda abraçada a mim no chão e eu me deixo levar pelas boas lembranças.— Mamãe, mamãe, cheguei! Cadê você, mamãe?— Aqui na cozinha, querida! — Escuto a voz de mamãe e corro direto para o cômodo, mas surpreendida por uma mesa linda, toda colorida, com bolo, doces e muitos salgadinhos, e na parede tem um arco de balões coloridos. Assusto-me ao ouvir um grito coletivo de SURPRESAAAAA! e abro um enorme sorriso ao ver que todos lembraram do meu aniversário de sete anos. Todos estavam lá: Mônica, seus pais, sua irmã e minha mãe linda!— Vocês lembraram! — falo dando pulinhos animados e batendo palminhas arrancando algumas risadas dos nossos amigos. Recebo o abraço e os parabéns de todos em seguida e dou muitos beijos na minha mãe. Pois, eu sei que foi ela quem preparou tudo isso para mim. — Obrigada, mamãe! Eu te amo muito, sabia disso?— Também te amo muito, muito, muito e muito, meu amor! — Sorrio com a lembrança e penso que terei muitas assim para sempre lembrar dela.— Obrigada por tudo, mãe! — sussurro para mim mesma. Decido que ficarei perto dela até o último instante e farei o que ela mais gosta: lerei, cantar e contar as boas lembranças que tenho dela, até que chegue o momento de sua partida. Algumas horas depois ela já estava estabilizada e eu pude voltar para o quarto. Minha mãe dormia serena em seu leito, até parecia um anjo. Chego perto da cama com cuidado e seguro sua mão. Sinto o seu toque gélido e quase sem vida. Ao lado da cama, um aparelho a ajuda a respirar e um outro, monitora os seus batimentos cardíacos. Acomodo-me na cadeira ao lado da cama, sem soltar a sua mão.— Oi, mãe, lembra quando… — Começo a contar algumas das nossas lembranças felizes. Rose não esboça nenhuma reação, mas mesmo assim eu continuo. A noite passa e o dia chega de uma forma que eu nem percebo. Não consegui dormir. Fiquei quietinha, velando o seu sono e curtindo a sua presença enquanto eu podia. O dia se arrastou sofregamente, mamãe acordou algumas vezes, mas logo ela voltava a dormir. A noite seguinte seguiu tranquila e para a minha felicidade, Rose dormiu sem nenhum problema. Em algum momento da madrugada ela acordou e me pediu um pouco de água. Com cuidado a ajudei a tomar alguns goles e logo ela dormiu outra vez. Nessa mesma noite cantei a sua música preferida e nem percebi quando adormeci sentada com a cabeça apoiada no colchão, perto da sua mão.Ana JúliaÉ domingo e nós recebemos algumas visitas de dos meus amigos de faculdade. Algo que alegrou a dona Rose. Ela sempre foi próxima dos meus poucos amigos. O quarto ficou enfeitado de lindas flores e alguns balões. Suas cores chegaram a dar vida ao lugar. Durante a tarde Mônica ligou e nós tivemos uma conversa um pouco animada, mas foi em uma chamada de vídeo com a minha melhor amiga, que vi minha mãe se descontrair um pouco.— Ana? — Despertei dos meus pensamentos quando escutei o som da voz fraca me chamar. Me afastei da janela e encontrei os seus olhos cansados. São quase duas da tarde e eu penso que ela dormiu quase que o dia inteiro depois das visitas e da chamada com a Mônica.— Oi, mãe, estou aqui! — digo, forçando um sorriso.— Quero te pedir uma coisa, filha — disse puxando uma respiração pesada. — Mãe, eu prefiro que você descanse um pouco. Você precisa…— Não, Ana. Querida, eu quero te pedir uma coisa. — Forço mais um sorriso para mascarar a dor que estou sentindo ne
— Ana? — fala com uma voz rouca.— Acabou, amiga, ela se foi — digo em um fio de voz.— Estou indo para aí, Ana. Só preciso falar com a Mariana e com a Juliana pra olharem Isabelly e o papai. Chego no hospital em meia hora.— Tá! — digo e encerro a ligação. — Encosto minha cabeça na parede e observo o corredor quase vazio, se não fosse por alguns médicos e enfermeiras passando por ele. A quietude desse lugar me leva aos meus últimos minutos ao lado da pessoa que eu mais amava nesse mundo e as lágrimas voltam, dessa vez, silenciosas. Minutos depois sinto o meu corpo ser puxado e logo sou abraçada pela minha amiga. Eu me agarro a esse gesto como se ele fosse o meu bote salva-vidas.— Sinto muito, amiga! — sussurra. — Sei que não está sendo fácil para você se despedir assim. Mas acredite, querida, ela precisava descansar. — Eu apenas assinto com a cabeça. Mônica se afasta um pouco e me olha nos olhos, ajeitando algumas mechas dos meus cabelos atrás da minha orelha e volta a falar. — Fare
Memórias...— Mãe? — A chamo sem saber aonde exatamente estou. Um barulho me faz olhar para frente, para a imensa escuridão e uma pequena luz surge no final dela. — É você? Mãe para com isso, vem cá. Estou morrendo de saudades de você. — Caminho no meio da escuridão, em busca da pequena luz. Sinto o meu corpo estremecer, tenho medo, mas não paro. — Mãe? Mãe?...Abro os olhos abruptamente encontrando o quarto semiescuro, se não fosse pela lua cheia a brilhar através da janela de vidro transparente. Sento-me no colchão a procura dela, mas logo a minha ficha cai e eu sinto uma vontade incontrolável de chorar, mas respiro fundo e decido tomar um banho para tentar me acalmar. Sigo para o pequeno banheiro, deixo a minha roupa cair no cesto de roupas sujas, ligo o chuveiro e entro debaixo da água morna que cai imediatamente molhando o meu corpo e isso vai me relaxando pouco a pouco. Fecho os meus olhos e molho os meus cabelos. A sensação do calor da água em meu corpo é maravilhosa, mas ela
Luís Renato— Bando de gente incompetente! — esbravejo enquanto caminho de volta para a minha sala, sobre os olhares atentos e curiosos dos meus funcionários. Dou de ombros. Eu simplesmente odeio pessoas que não têm pontualidade e nem compromisso com o seu trabalho. Odeio ainda mais quando não conseguem fazer as suas tarefas direito. Não deve ser tão difícil fazer as coisas do jeito que eu peço. — Está cada vez mais difícil encontrar uma secretária pontual e competente — resmungo para o meu sócio. Essa já é a quarta que dispenso em menos de quinze dias, que saco! Penso ainda mais irritado. — Tive que demitir mais uma secretária hoje, acredita? Depois do terceiro dia chegando com pelo menos meia hora de atraso. E hoje o seu descaso com o trabalho foi a gota d'água — digo parando de frente para a minha mesa e encaro o Marcos sentado na minha cadeira.— Ih! Dia difícil hoje, mano? — Se levanta fazendo uma cara sacana e segura um sorriso sínico. Acredite, às vezes tenho vontade de esmurra
— Sou Cassandra, me acompanhe, por favor! — pede educadamente. Respiro fundo algumas vezes enquanto a sigo por um corredor comprido. Cassandra me leva uma sala de reuniões. Lá dentro encontro mais quatro moças sentadas ao redor de uma mesa enorme e retangular. Elas são muito bonitas e carregam algumas pastas nas mãos, parecem ter experiência para o trabalho oferecido. Minutos depois começam a nos chamar, uma por vez. A medida que elas vão saindo da sala, eu vou ficando nervosa. Queria muito ter uma oportunidade nesta empresa. Ela parece ser muito promissora. São quase quatro da tarde quando finalmente me chamam. Sou a última a fazer a entrevista, já que fui a última a chegar na empresa. Entro em uma sala enorme e muito bem decorada com um estilo totalmente masculino. No centro da sala há uma mesa com tampo de vidro preto e um homem usando um terno caro e elegante da mesma cor. Enquanto entro na sala, observo o seu porte. Ele parece ser muito alto, apesar de estar sentado e curvado sob
Ana JúliaO tempo parece que não passa quando você está em casa sem nada para fazer. Deixo o meu celular sempre por perto, esperando alguma ligação de alguma das entrevistas que fiz no dia anterior. Confesso que estou perdendo as minhas esperanças, pois já são quase nove horas da manhã e Mônica saiu para trabalhar já faz algum tempo. Estou na sala cuidando da Isabelly, a sobrinha da Mônica. Ela é uma bebê linda e alegre, um amor de criança. Sempre tranquila e divertida. Coloquei-a em seu carrinho com o seu brinquedo preferido, um ursinho de borracha que vive colocando na boca. Enquanto ela brinca, dou mais uma olhada nos classificados do jornal de hoje. A minha insegurança, me faz pensar em bolar um plano B. Passo longos minutos procurando novas oportunidades de emprego e dessa vez, círculo apenas três opções que se encaixam no meu perfil. Mariana, a enfermeira que cuida do seu Genaro passa por mim com um leve sorriso no rosto. Ela é uma garota jovem, tem a minha idade e é muito boni
— Sim, tenho que estar lá amanhã, às oito da manhã em ponto. Cassandra deixou bem claro que não pode haver atrasos.— Ana, você sabe o que isso significa, não é? — pergunta ficando séria. — Dizem que não é nada fácil conseguir uma vaga nessa rede de hotelaria, e você conseguiu!— Eu sei! — Contive uma explosão de alegria. — Acredito que finalmente algo começou a dar certo para mim! — falo entusiasmada.— Você é uma guerreira, minha amiga. Você dará muito orgulho à sua mãe de onde ela estiver e vencerá, porque você merece isso da vida. — Suas palavras me emocionam.— Obrigada, amiga, por tudo! Por estar comigo, por me apoiar, por não me deixar desistir nunca. Eu te amo muito, minha irmã!— Também te amo muito! Mas tudo isso que conquistou é mérito seu e não meu. — fala com um sorriso iluminando seu rosto e coloca Belly em seu carrinho. — Temos que comemorar! — Mônica fala batendo palmas e dando pulinhos no meio da sala. Belly solta algumas risadinhas, batendo palminhas, pensando ser um
— Merda, isso está um caos! — xinguei irritado quando o telefone voltou a tocar no meio de mais uma leitura de relatórios. Respirei fundo. Preciso resolver a questão da minha secretária logo, ou enlouquecerei aqui. Parei tudo que tinha para fazer e peguei alguns currículos das entrevistas dentro da minha gaveta. Li atentamente um por um, mas foi o último currículo que me chamou a atenção. CURRÍCULO VITAINOME: Ana Júlia Falcão.IDADE: 20 anos.ESCOLARIDADE: Segundo período de medicina e curso completo de inglês.EXPERIÊNCIA: Sem experiências.OBSERVAÇÃO: Aberta a novas experiências. — Interessante! — disse baixinho. — Jovem, boa aparência, inexperiente, essa parte me preocupa. Tive que demitir algumas mulheres com bastante experiência no cargo. Será que ela conseguiria dar conta? Olho a foto no topo do currículo e me deixo levar. Ela é bonita! Uma morena e tanto! Olhos castanhos e meigos, cabelos negros, lábios cheios. Simplesmente linda! Bufei, esfregando as mãos no rosto. No que v