Capítulo 5

Maya

O despertador tocou às quatro da manhã. Levantei e segui para o banheiro. Se eu não amasse tanto a medicina, já teria abandonado essa carreira. O trabalho estava tomando todo o meu tempo com as minhas filhas. Quando foi que as coleguinhas começaram a namorar? Não faz muito tempo e elas estavam vestidas de princesas, calçando pantufas de unicórnio, usando asas enormes e chifres brilhantes na cabeça. Agora elas querem saber quando podem namorar e fofocam sobre o término dos outros.

— Se você estivesse aqui, Victor... Surtaria.

Vestida, desci para a cozinha. Na cafeteira, o café havia acabado de ficar pronto. Servi um copo térmico para a viagem e vesti o meu casaco. A porta dos fundos foi aberta e meu pai passou por ela.

— Bom dia, querida.

— Bom dia, pai. — Dei-lhe um beijo no rosto. — Já vou indo. Dê um beijo nelas por mim quando acordarem. E não deixe a Louise te enrolar com o horário. Ela não perdeu os sapatos nem o papel importante para a aula. Elas não podem perder o primeiro tempo da aula pela sétima vez no mês. Seja mais duro com elas. — Estreitei os olhos para ele.

— Eu sou o avô. Não me peça isso.

— Se a escola me ligar outra vez, é você quem irá à reunião levar um belo puxão de orelha.

Ele riu.

— Entendido.

— Tchau. — Saí pela porta dos fundos e entrei no carro.

Fiz o trajeto ouvindo o noticiário das quatro e meia no rádio. Quando cheguei no estacionamento do hospital, a Harley Davidson passou por mim indo até a última vaga no estacionamento. Aquela era a vaga mais longe da entrada. E quem ficava com ela, era eternamente chamado de "o azarado". Estacionei o carro na minha vaga e desci. Gutierrez tirou o capacete e olhou para trás, diretamente para mim. A sua cara não era das melhores. Um sorriso debochado surgiu na minha face antes que eu pudesse evitá-lo. Dando-lhe as costas, caminhei para dentro do hospital.

Após me preparar, encontrei com a minha equipe de internos e deleguei a função de cada um naquele dia. Aproximei-me do quadro de cirurgia e vi que meu nome estava em outro caso médico. Eu auxiliaria hoje em uma... em uma...

— Cirurgia Plástica? — perguntei para mim mesma. — Quem foi que colocou meu nome nesse caso? — Olhei para as pessoas que circulavam naquele andar.

— Fui eu! — A voz do Gutierrez veio da direção dos elevadores. — Será uma grande cirurgia e eu preciso dos melhores. Carson disse que você é melhor, então...

— Meu nome já estava nessa quadro ontem à noite — interrompi-o. — Tenho uma cirurgia em quatro horas com o doutor McKesson.

— Eu sei.

— Com qual autoridade me tirou dessa cirurgia? — perguntei irritada, dando um passo na sua direção.

— Com a minha de cirurgião-chefe. — Sorriu. — E quando eu pedi você ao McKesson, ele nem hesitou em me ceder. — Virou as costas, indo embora. — Você não vem? — perguntou ao parar em frente aos elevadores.

Respirando fundo e engolindo a minha vontade de pular no seu pescoço, andei até ele. Era uma cirurgia de transplante cardíaco. Há meses estava acompanhando aquele paciente. McKesson me disse que quando conseguíssemos o coração, eu seria sua auxiliar. Eu!

— Engole um pouco mais dessa sua raiva — disse baixinho, para que apenas eu pudesse ouvir. Olhei-o com a mandíbula contraída. — Hoje você é minha, dra. White! — falou com a voz mais firme e grossa. Seu olhar tentava penetrar o meu de maneira como se quisesse ler a minha mente.

As portas do elevador se abriram e nós entramos. Quando chegamos ao quarto andar, seguimos até um quarto que estava com as persianas fechadas e tinha um segurança na porta.

— Quem é o paciente? — perguntei para Gutierrez.

Ele sorriu e abriu a porta, dando-me passagem. Quando entrei no quarto, mal pude crer em quem estava vendo sentada na cama. Era Florence Waters. A queridinha do cinema nos anos noventa.

— Bom dia, Florence — ele a cumprimentou, dando a volta na cama e beijando o seu rosto com grande afinidade.

— Não sabe como estou feliz em ver você outra vez. — Selou os lábios dele, me pegando de surpresa e deixando-me desconcertada.

— Também estava com saudade. — Sentou-se na beirada da sua cama.

— Eu atravessei o país para ter as mãos desse homem em mim — disse ela, com um tom sugestivo, olhando para mim.

Forcei um sorriso.

— Muito prazer em conhecê-la, sra. Waters. Eu sou a doutora Maya White e vou auxiliar o dr. Gutierrez na sua cirurgia.

— Já disse a ela o que vamos consertar desta vez? — perguntou ela, rindo.

— Vamos fazer uma vaginoplastia. Florence vai renovar os votos com o seu marido e quer novos lábios para a lua de mel — explicou ele, sorrindo para ela.

A mulher riu contente e bateu palmas como se a cortina do teatro tivesse acabado de se fechar. Meus olhos se reviraram involuntariamente ao mesmo tempo que suspirei fundo. Apanhei o seu prontuário e avaliei rapidamente todos os exames pré-operatórios.

— Todos os exames já foram feitos e os resultados foram ótimos. Assim que der a hora, venho buscar você para a cirurgia. Mas agora, se me dão licença... — Caminhei em direção à porta.

— Já transou com ela? — perguntou Florence para Gutierrez.

— Não faz o meu tipo.

Olhei para eles, chocada com a falta de respeito. Saí do quarto e nem sequer me dei o trabalho de fechar a porta. Eu não estava crendo que fui retirada de um transplante de coração, a um mês da conclusão da residência, para ajudar a melhorar a aparência da vagina de alguém.

A raiva me consumia por dentro, deixando-me muito agitada. Segui para a cafeteria e lá estava Carson.

— Você viu o que aquele ridículo fez? — perguntei para ele.

— Quem?

— O seu cirurgião plástico!

— O que ele fez? — perguntou sério.

— Ele me tirou do caso John. Você sabe que estou desde o começo do ano acompanhando-a, e a cirurgia é hoje!

— E por que ele fez isso?

— Para me provocar.

Carson respirou fundo.

— O que o dr. McKelsson disse sobre isso?

— Ele me entregou de mãos beijadas para o Gutierrez.

— Bom... Se ele cedeu você, nada posso fazer, Maya, você sabe disso.

— Ele diz precisar de mim para reformar a vagina de alguém. Aquele medicosinho não precisa de mim para isso! — falei alto, muito irritada.

— Quem disse que não? — A voz de Gutierrez reverberou logo atrás de mim.

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