MayaMeus pés mal pisaram no hospital para um belíssimo plantão de trinta horas, e Carson chamou por mim em sua sala. Ao abrir a porta, logo o avistei de pé do outro lado da sua mesa, mas só depois de entrar, é que vi Gutierrez ali também. Olhei para ele e depois para o nosso chefe.— Algum problema? — perguntei ao notar as feições fúnebres.— Florence está nos processando — disse Carson após um longo suspiro.— O quê? — perguntei embasbacada. — Por quê? — Olhei para Gutierrez.— Uma arritmia cardíaca já foi diagnosticada em fevereiro deste ano. E ela está alegando que eu sabia.Respirei fundo.— E você sabia? — Olhei-o com um pouco de julgamento.— Não, eu não sabia. Mas ela acha que sim, porque há seis meses, quando foi diagnosticada, eu ainda trabalhava em Chicago, no mesmo hospital onde ela tratou com a cardiologia. Porém, ninguém nunca me disse nada. Já faz mais de um ano desde a última plástica que ela realizou comigo.— Mas que merda! O que acontece agora? — perguntei para Carso
MayaEstávamos em um momento de descanso e descontração até que alguém parado na porta, segurando uma bandeja, chamou a minha atenção. Meus olhos se encontraram com os de Gutierrez. O canto do seu lábio se ergueu em um sorriso um tanto provocativo e ele caminhou na nossa direção. Olhei para o copo de café que tinha nas mãos e respirei fundo, revirando os olhos.— E aí, pessoal? — perguntou ele, sentando-se na cadeira vazia ao meu lado.Novamente o seu perfume entranhou no meu nariz.— Ainda não tivemos a chance de ser apresentados — disse um dos homens à mesa.— Sorte a sua — falei, baixinho.Senti os olhos de Gutierrez em cima de mim.— Ainda não perdoou ele por ter estacionado na sua vaga? — perguntou June.— Perdoar inconveniência é algo muito complicado. — Olhei para Augustus.Ele sorriu.— Eu não sabia que a vaga era sua.— O meu nome estava escrito nela. Não sabe ler, doutor?Alguém à mesa deixou escapar um risinho.Os olhos de Gutierrez estreitaram para mim.— Então está me tra
GusTrinta dias se passaram, e descobri algo em que Maya é muito boa: ignorar as pessoas. Nesse caso, me ignorar. Ela mal olha para mim, e quando faz, o seu olhar penetra o meu rudemente acompanhado de palavras ásperas que formam frases que, às vezes, abala a minha paciência. Ela sabe exatamente onde cutucar, e quando fazer isso. É irritante!Entrei no vestiário e, sem querer, a vi de sutiã enquanto se trocava para ir embora. Rapidamente, dei um passo para trás, escondendo-me no outro corredor, atrás dos armários. Não demorou muito e ela se foi, vi quando a sua sombra no chão passou pela porta.Saí do canto onde estava escondido e olhei na direção do seu armário. Seu celular havia ficado sobre o banco. Apanhei-o e corri atrás dela, mas Maya já havia descido no elevador. Tomei outro e continuei a tentar alcançá-la.— Gus... — chamou Anne, vindo na minha direção. — Vamos tomar uma cerveja, você vem com a gente? — Sua mão tocou meu braço sugestivamente, apertando-o de leve.— Não, obriga
GusSubi no passeio que levava à garagem e parei o mais próximo que podia da sua porta de entrada. Maya desceu rapidamente da moto e retirou depressa o capacete, entregando-me.— Obrigada. — Foi tudo o que ela disse antes de correr para dentro de casa. A chuva fina começava a engrossar.Não havia mais nada que ela pudesse dizer para mim depois daquela carona, mas eu fiquei ali, com um sentimento estranho que parecia com um vazio. Era como se eu esperasse mais sem perceber isso.Algo vibrou dentro da minha jaqueta, lembrando-me que ainda estava com o celular dela. Resolvi descer e devolvê-lo. Um médico não pode ficar sem o seu telefone. Toquei a campainha, escondendo-me sob a pequena marquise. Um homem abriu a porta. Ele devia ter uns sessenta anos, cabelos quase brancos e olhos verdes.— Por gentileza, pode chamar a Maya?Ele encarava-me com muita estranheza.— Querida... — chamou-a, sem desviar os olhos de mim.— Oi — disse uma voz suave e infantil, atraindo a minha atenção para baix
Maya— Um brinde a doutora White! — disse McKesson, erguendo a sua cerveja. Brindamos em comemoração a mim. Eu finalmente estava no Staff e posso dizer que sou cardiologista. Ao meu redor, na mesa do bar, estava alguns colegas de trabalho; médicos, enfermeiras e o cara mais gentil da limpeza, o Tony.Estava tão feliz, mas sentia que não estava compartilhando essa alegria de forma devida. Ou, ao menos, com quem eu gostaria. Não há um dia, um momento, que eu não penso: E se Victor estivesse aqui?Como estaríamos comemorando esse momento? Ele teria feito o jantar, talvez. Ou, quem sabe, teríamos saído para comer no melhor lugar da cidade. A melancolia começou a me preencher. Dei um gole na cerveja — engolindo a saudade imensa —, passei as mãos nos cabelos jogando-os para trás e respirei fundo, numa tentativa de levantar o meu astral.O meu celular vibrou sobre a mesa. Era o meu pai quem ligava. Eu havia pedido que levasse as meninas para passar o fim de semana com ele. E assim fez.Apanh
MayaComeçamos a conversar entusiasmadas e felizes de finalmente estarmos reunidas. Sasha já não morava nos Estados Unidos há cinco anos. Agora, casada com um escocês e vivendo a felicidade que merece, vive quase em um conto de fadas na Escócia com o marido e seus dois filhos. Kim mora em Nova Iorque com Jack, que conquistou uma grande carreira como detetive na polícia. Depois de anos lutando pelo primeiro bebê e algumas perdas, Joaquim estava a caminho. Já Penny, era a que mais morava próxima de mim, mas, ainda assim, nossas vidas não nos permitiam estar sempre juntas. Mãe solo de duas crianças, sendo uma delas autista, não é uma tarefa fácil, mas ela estava conseguindo fazer isso muito bem.— A Grace não vem? — perguntou Sasha, indo em direção à cozinha. Nós a seguimos até lá.— Não. Ela lamentou e mandou um vinho branco como pedido de desculpas. As coisas estão agitadas em Washington com as eleições.— Vote Adan Bremner — disse Sasha, em um tom humorado, erguendo o punho fechado pa
MayaSexta-feira e eu ainda me encontrava pensativa sobre o baile. Eu queria ir ao mesmo tempo que desejava me esconder sob os cobertores durante toda a noite. A porta de trás do carro foi aberta, e Louise e Mary entraram, discutindo. Ultimamente estavam brigando mais do que o normal. Às vezes, é preciso intervir. Outra hora, apenas deixo que se entendam sozinhas. Começava a sentir falta de quando elas andavam de mãos dadas e sempre arrumavam o cabelo uma da outra.— Mãe! Diz para ela parar! — pediu Louise aos berros.— Eu não peguei a porcaria do seu lápis de cor! — Mary berrou de volta.— Okay, meninas! Já chega! — falei alto, virando-me para trás.Elas se calaram e olharam-me assustadas. Raramente levanto o tom de voz.— Primeiramente, porcaria é uma palavra feia. Sem sorvete por uma semana!— Mas, mamãe...— Estou falando, Mary. Você precisa se calar quando eu estiver falando.Ela se encolheu no banco.— Segundamente, por que estão brigando?— Mary pegou o meu lápis de cor vermelh
MayaNa entrada, um homem e uma mulher nos recepcionavam. Entreguei para ele meu convite e entrei. Logo no hall, encarei a quantidade absurda de pessoas naquele lugar que se cumprimentavam. Minhas mãos apertaram a pequena bolsa que eu segurava e meus pés deram um passo para trás, fazendo com que meu corpo colidisse contra o de outra pessoa.— Me desculpe — pedi, sem olhá-la, virando-me depressa para sair dali.Mas antes que eu pudesse alcançar a porta, uma mão agarrou meu braço firmemente, fazendo-me assustar.— Você veio! — disse Aurora, com entusiasmo.— Feliz aniversário. — Forcei um sorriso e abracei-a rapidamente.Ela agradeceu.— Estava tentando escapar? — Um pequeno sorriso marcava o cantinho dos seus lábios pintados de rosa.— Não?! — disse incerta, fazendo-a rir.— Confesso que tive um pouco de medo de que você nem viesse. Vem. Ferdinando está logo ali. Não vou deixá-la ir embora.Ela enlaçou o braço no meu e nós caminhamos em direção ao seu marido, que conversava com outras