SPENCER
O dia era uma escuridão cinzenta onde névoa pálida erguia-se sobre o cheiro de musgo e morte.
E ali onde suas narinas captavam o cheiro metálico, a umidade sob a língua se tornava cada vez mais nítida. Uma grande linha curva se intensificou uma vez que os dedos puderam sentir toda textura grossa do amontoado de fios negros como petróleo. Fora uma margarida em cada pálpebra deixando teu olhar antes de ao ávido e azul, completamente branco.
Os passos ficavam cada vez mais pesados e o nariz escorria em uma cachoeira sem sabor ou cheiros, o Viajante e sua longa capa negra foram caminhando pela estrada de terra, pelos rastros que vários caminhões de construção haviam deixado ao longo dos anos. Aquela era a parte feia da floresta, a parte desmatada pelo homem e sua ganância.
A grande cerca elétrica e os cachorros o impediam de adentrar e apesar da costumeira curiosidade, o rapaz deu de ombros. Estava perto demais. Fez um retorno confuso sobre as árvores mais antigas encontrando o branco e gelo, a putrefação lenta. Caminhou até os pés doer em, até sentir como se todo seu corpo estivesse em anestesia.
A visão ia se tornando ainda mais turva pela quantidade de água que caia sobre si e apesar de conhecer a floresta como a palma de sua mão direita, Spencer não sabia onde estava. Fechou os olhos e deixou de viajar por um instante, soltando ar pelas narinas, tentando captar uma vez mais o cheiro de lavanda. Estava tão perto.
Teve que descer a estrada íngreme e encontrar uma forma de pular o grande tronco sob o caminho, sua grande capa de inverno foi puxada violentamente para trás e no momento seguinte estava em frente a cabana.
Toc. Toc.
Tardou mais que cinco minutos bem contados para que a porta enfim se abrisse. Era uma criaturazinha corcunda que conduzia passos tão pesados, parecia frágil pela pele tão cheia de dobras e os olhos perdidos.
— Eu não quero comprar nada — e bateu a porta.
Spencer deixou sua grande mala de viagem cair sobre a parte coberta da cabana e suspirou em gripe.
— Eu não estou vendendo nada! - tinha de gritar por cima dos trovões — Eu quero falar com Estranha!
— Ela não está, agora vá embora antes que eu chame meus cães para você! — a voz da velha parecia cortante e enferrujada como uma das espadas que sua avó costumava vender na loja de antiguidades.
— Eu posso esperar aí dentro? — gritou de volta, mas a velha gritou não tantas vezes, que o rapaz sentiu uma bola gelo subindo sobre a espinha.
Sentia o tecido da calça grudado à pele, a grande quantidade de água dançando sobre o sapato e as meias e o frio era uma desgraça. Seu corpo estremecia por debaixo do lençol gelado que suas roupas haviam se transformado e apesar de tudo, não poderia partir. Sentia dor nas panturrilhas e a febre tornava-se cada vez maior dentro de si, querendo explodir. Uma onda de tosses o dominou e por um milésimo de segundos, Spencer achou que iria desmaiar.
Vez ou outra a velha abria a persiana da janela da cozinha e colocava a velha cabeça enrugada e cheia de fios brancos para fora. Se o Viajante acreditasse em bruxas más, certamente aquela seria uma delas. Ela dizia qualquer coisa em seus sussurros e ia embora, mas logo voltava a fita-lo e balbuciava qualquer coisa. Se ao menos um dos cães estivessem ali para esquentá-lo.
A chuva fora amenizando apesar dos fortes raios que insistiam em deixar grandes fleches de luz sobre seus olhos, deixando a visão antes turva, em uma confusão ainda maior. Parte de Spencer sentia o corpo amolecendo, os ombros soltando a tensão e o sono lhe dominando.
O ambiente emergia em silêncio, pequenas gotas de garoa iam transformando o chão gélido em múltiplas poças d'água e o cheiro de terra molhada voltava a crescer.
Ao oeste uma elevação sobre a água transformou-se em uma silhueta de poucas curvas, seus movimentos braçais eram tão suaves quanto o carinho de uma leve pena caindo na pele. Foi erguendo-se na água deixando o corpo mundano tão aparente. Era capaz de sentir a temperatura elevada de seu hálito quando se aproximou de si sentando sobre o colo, as mãos eram como blocos de gelo, mas não importava. Ficou próxima para lhe contar um segredo e deixou a umidade quente da língua roçar sobre a bochecha.
Então o peso se tornou grande e o hálito forte era constante. Spencer sentiu os olhos se abrindo devagarinho para encontrar a criatura imensa sobre si. Os outros cães chegaram animados e pularam sobre seu corpo molenga o fazendo gemer em dor. Tentou se levantar cambaleando, mas Earl não o deixou e com todo seu peso e patas violentas o derrubou.
— Olá, Viajante — a voz fora subindo ao ar e graças a um raio tão próximo, a silhueta feminina se transformou em um ser quase iluminado e divino. A Estranha usava sua longa capa negra e o capuz cobria sua face. Ela largou o caldeirão de carne que trazia junto a si e os cães deixaram Spencer em paz — Você parece terrivelmente atordoado.
— E estou.
Foi em uma agilidade estranha que ela o pôs de pé. A Estranha passou o braço pelo ombro do Viajante e juntos adentraram a cabana.
— Tem um grande estranho lá fora querendo te ver... E-eu o expulsei mas ele não quis ir embora.
Spencer queria retrucar em defesa, mas descobriu que não tinha forças para tau. A Estranha fora caminhando consigo até o outro cômodo. Ali tudo parecia mais quente e aconchegante.
Havia a textura macia do tecido, o chão firme de pedra batida, o apoio para as costas e a grande prateleira. Encarou ao redor onde uma escada de madeira velha e escura ficava situada, toda a temperatura era disposta por uma lareira recheada. Spencer sentia a cabeça doer pelo tormento constante, era audível, inofensivo e incômodo e como em uma provocação, a velha balançava e balançava.
Deu por si dentro de uma banheira vazia e quando o corpo começou a estremecer pela falta de vestes, a água quente fora despejada graças a uma espécie de balde de madeira. A fumaça foi crescendo ao redor transformando sua visão não muita boa, em algo tão mais turvo. Uma silhueta parou à sua frente.
— Irei vou providenciar um chá para esquentar o pulmão — e desapareceu.
A água em seu estado gasoso era crescente. O silêncio comum foi quebrado pelas gotículas de água que faziam seu caminho lento do balde até a banheira cheia, fazendo a cabeça latejar. Seus olhos mantinham-se fixos na cena e sua cabeça parecia girar, de repente o silêncio.
Ficou ali até a água esfriar e encontrou uma roupa limpa e aparentemente quente para si. Eram grandes, mas confortáveis se não fosse contar o samba-canção que insistia em escorregar para o alto do quadril a cada passo que dava.
Spencer adentrou o corredor curto e graças ao cheiro de Cidreira encontrou a sala comum e a figura conhecida a lhe fitar.O tecido que tão bem lhe cobria mantinha um tom um tanto sombrio de azul, as mangas eram longas e largas e o tecido ia até o chão. Não poderia não notar na forma com que seu emaranhado de fios havia se transformado em uma coisa desordenada, cheia de fios deslocados e os cachos já não mantinham a mesma ondulação de antes.
— Nana já foi deitar-se — disse contradizendo os olhos do rapaz — Vamos para lareira, você precisa se aquecer um pouco mais. — Ela não precisou se virar para saber que estava ali em pé a lhe fitar, segurou uma bandeja de prata pesada e quando se virou sorriu.
A Estranha se enfiou na coberta e cruzou a linha tênue que o mantinha seguro, com mãos quentes tocou seu braço e subiu ao ombro onde repousou toda atenção. Estava prestes a algo se fosse julgar seu olhar fixo e a língua molhando os lábios tão lentamente.
— Deite-se — lentamente ele foi sentindo seu corpo obedecer a mais tênue das vozes. Fora uma coisa calma, lenta e distante — Feche os olhos.
— Faye eu preciso me trocar — bradou de lugar nenhum. A voz era realmente se assemelhava a de uma bruxa.
O Viajante a fitou rolar pelo colchão, seus olhos de jabuticaba estavam postos sobre si com toda a atenção que o mundo já presenciou.
— Espere por mim.
Ela desapareceu na mesma medida em que Earl subiu ao colchão ocupando todo o espaço. Spencer tentava não contrariar uma criatura tão grande e violenta como aquela. Sacou o celular e viu os pedidos de desculpa da prima, a preocupação da avó e alguns recados relacionados a loja. Rolou o feed de um aplicativo, tirou algumas fotografias de Earl e algumas outras da sala mal iluminada, passou quatro fases difíceis em seu jogo favorito e jogou seu corpo para trás sentindo a umidade quente sobre a bochecha.
Aos poucos foi sentindo seus olhos se fechando pesadamente, sentiu o pelo quente do animal se aninhando próximo de si, mas um súbito grito fez Spencer virar a cabeça antes de ter tempo de saltar.
O Viajante forçou-se a encarar ao redor. A noite era fria, porém luminosa com a lua cheia a brilhar em um céu negro e os ruídos dos cães não lhe agradava. O vento era um grande sussurro nervoso sobre folhas finas como papel e Earl corria em fúria.
O cão tinha matado três lebres e seu pelo cinzento mantinha mechas grossas de sangue por onde a pobre lebre fora sacudida deixando seu líquido formando tais desenhos. Não havia árvores naquela parte pedregosa, mas de algum modo as folhas amarelas estavam presentes. Aquela região era tão grande quanto qualquer coisa que Spencer havia vislumbrado na vida, tau como a cidade ou até mesmo as partes possíveis da floresta. Ali era uma floresta feita de tijolos vermelhos, uma quase muralha tão alta e pontiaguda. No alto da muralha haviam gárgulas cinzentas e bem preservadas e o uivo dos cães era alto como de lobisomem.
Recordou da manhã fria em que havia se perdido na floresta por quatro longos dias, onde teve que caçar um cervo e o matar, retirar o couro e aproveita a carne para assar e comer sem tempero algum. O gosto não era tão ruim.
O cervo em toda sua doçura o fitava em seus grandes olhos negros e redondos, o pelo acobreado em listras brancas dançaram sobre o vento e as pernas ficaram mais veloz. Spencer não se lembrava de correr tão bem.
— Ele não pode ficar na cama depois de comer um veado inteiro — o timbre suave de sua voz fora adentrando os tímpanos de Spencer calmamente o tirando de um longo e cansativo devaneio.
A Estranha era branca como uma folha de papel e suas clavículas nunca pareceram tão fundas. A leve camisola que guardava seu corpo era um tecido grosso, alvo com suas mangas longas e tão largas.
— As vezes eu tento não contrariar um animal tão pequeno como este — os outros cães já não apareciam sobre a sala comum, o que lhe deixava levemente aliviado.
A garota de longos cachos dourados-acobreados olhou a sua volta e antes de partir em direção ao colchão, acariciou os pelos cinzentos do animal que grunhiu aos toques.
Faye esteve à sua frente enrolada na outra ponta da grande manta, de pernas cruzadas e cabelo para trás, parecia encarar cada centímetro revelado de Spencer, cada dedo trêmulo, cada piscada e movimento de respiração, mas nada lhe dizia. Nunca dizia.
— Você tem mais daquele chá vermelho? — viu-se perguntando, não se lembrava de perder o controle das palavras com tanta frequência.
— Posso preparar para o jovem Viajante — Estava prestes a se levantar quando o leve som rouco e quase inaudível ecoou por toda a extensão da cabana, parecia um canto antigo, um lamento, quem sabe um feitiço. — Eu já volto.
Mas em vez de ir para cozinha sumiu em corredores ocultos.
Talvez Spencer não fosse capaz de entender a estrutura daquela residência tão pequena por fora e tão estranhamente grande quando adentrava. Faye havia entrado em um corredor a esquerda, quando o banheiro ficava a direita. Quantos cômodos eram ocultos a si? Sabia perfeitamente que deveria sentar e se aquecer, esquecer os pensamentos irrelevantes até a Estranha retornar com seu chá vermelho, mas quando foi que Spencer ouviu seu próprio conselho?
Enrolado sobre a grande manta caminhou em passos curtos ficando de frente à uma cortina de panos brancos, iguais da cozinha. Atravessou o tecido e encontrou dois corredores opostos, o primeiro era estreito o bastante e o próximo tão largo com seus enfeites de parede e mesas de canto. Deixou a manta cair sobre o chão e adentrou o corredor que mal lhe cabia o corpo de frente, alguns passos para frente e se virou, sentia o traseiro roçando sobre a parede por dentro das roupas, as mãos ficavam grudadas aos tijolos e seus passos eram desengonçados e lentos.
Virou lerdamente à direita e em seguida esquerda, dobrou o tamanho do corredor o fazendo respirar fundo e sentir o leve alívio de não ser chocado contra a parede. Estava de volta à sala comum.
— Faye?
O eco de sua voz fora adentrando seus tímpanos como leves surrurros desconfortáveis e o segundo corredor estava à sua frente. Encontrou a lanterna de seu celular e passou a caminhar outra vez.
Poderia sentir o leve cheiro de musgo sobre as madeiras centenárias, o chão úmido das chuvas e o tapete cinza em poeira, o corredor era largo o bastante. Spencer espiou uma velha moldura de bronze com duas mulheres pintadas em tinta óleo, encontrou um candelabro dourado e uma porta.
A maçaneta era quente ao toque e o cheiro de musgo era tênue. Um grande tapete de pelo de urso era notável ao toque de seus pés nus, as velas negras como a madrugada enchiam as paredes de madeira deixando uma luminosidade sugestiva ao ar e a grande cama redonda em seus tecidos grossos de lã rosa formavam uma leve curva.
— Faye?
Caminhou mais um pouco até estar perto o suficiente, encontrou um cálice dourado em pedras vermelhas como rubi cheia de água e a leve curva entre os lençóis se moveu subitamente.
Spencer pôde sentir as unhas fincando sobre a carne apertando-o com suas garras afiadas, deixando o líquido vermelho escorrer. Tudo ficou branco.
— Marien organiza as prateleiras com copos de cristal suéco a direita e os alemães sempre a esquerda. Todos os dias eu limpo os lustres centenários e algumas vezes faço anotações para os turistas. Os turistas ingleses gostam de comprar artefatos raros, como a velha espada — sua voz fora ecoando longe, como se não saísse de si — Durante as madrugadas, eu costumo acordar na floresta repleta de folhas secas, encontro lebres assustadas e alguns cães selvagens, eu não gosto de vê-las deitadas sobre as folhas de verão... Elas pedem minha ajuda antes de...
— O que você está fazendo? — a voz fora crescendo por cima de tudo. Sentiu as mãos quentes sobre si e a dor crescente sobre o braço. Ouviu uma outra voz balbuciar e então um hálito quente sobre si — Spencer? Spence! Acorda! — E um tapa.
Seus olhos se abriram vagamente e Faye estava sentada sobre si com os olhos negros parecendo jabuticabas maduras. Seu corpo estava mole e o cheiro fresco de sangue o incomodou. Spencer suspirou e ouviu o barulho de língua sobre o quarto, virou-se levemente e encarou a velha bruxa lambendo os dedos de sangue.
HENRY.Os longos fios avermelhados pareciam uma longa e bem produzida pintura emoldurada perfeitamente sobre a tela caucasiana e levemente rosada que sempre parecia-lhe doente. O nariz fino e sem projeção no torso estava sempre avermelhado e as bochechas nem precisavam de maquiagem.— Definitivamente esse é meu melhor look para casamento — disse ao entrar no carro.Henry captou o momento em que o tecido fino e rendado se movimentou sobre o corpo feminino, a forma com que o casaco preto e tão pesado caia aos ombros e as botas eram tão longas e brilhosas.Mas aquele não era casamento onde roupas sociais eram aceitáveis, sendo assim, Henry viu-se vestindo a velha jaqueta de couro de seu pai, um jeans levemente destruído no joelho e coturnos. Sentia-se fantasiado até demais.A grande e gótica decoração do jardim estava razoável ape
A maioria dos pássaros de pequeno porte não sobreviviam à passagem de ano naquela região. Os pequenos eram sempre vistos sob o solo úmido pelas fortes chuvas, gelados e sem vida. Os pequenos olhos ficavam abertos, porém vazios e as asas que antes o arremessaram a tantos lugares jazia encolhida sob o corpo em leve putrefação. As flores começavam a surgir na parte menos montanhosa da floresta, mas ainda sim a maior parte da floresta era um amontoado de branco gélido e marrom. As chuvas não tinham parado totalmente e apesar de todos os malditos casacos, Hanna sentia-se pronta para congelar. — Porque a floresta? — limpou um amontoado de lama das botas de serviço em um suspiro — Porque nunca em uma linda casa no centro? — Parece que ninguém vê graça em cadáveres apodrecendo em casas. MAGNUSAs folhas em putrefação formavam um grande tapete natural mostrando um caminho não cruzado por pés humanos havia tanto. Magnus sentia o odor de musgo, a umidade da terra deixava um cheiro tênue no ar e a vontade de correr pela floresta era tão grande.Mesmo distante era possível ouvir as vozes agudas sobre o mundo, o nome comum sendo proferido tantas vezes. Durante toda a busca, ninguém conseguiu ouvir sequer uma menção de esperança. Foram três dias completos de pesquisa onde grupos grandes se revezavam pela grande floresta gritando o nome comum.Magnus sentia os pés em leve dor pelo esforço da caminhada e vez ou outra, sentia a necessidade de sentar e descansar. Mas não tardou mais que um próximo dia para as buscas se tornarem mais escassas. As pessoas não se moviam como antes, o nome comum se tornava mais escasso à cada hora e a polícia menos pacientCAPÍTULO SEIS
SPENCERAs luzes ora azuladas ora avermelhadas deixava sua visão levemente confusa, como se o festival fosse uma tortura sem fim. O grande espetáculo estava prestes a começar. Era possível ouví-los cantando e batendo palmas, mas estava distante demais para entender.Tambores, fleches de celulares, vozes unidas a uma única canção, antiga demais para ser compreendida pelos mais novos, mas mesmo assim, com papéis em mãos, tentavam acompanhar.— Você sabe que língua é essa? — indagou observando o papel que havia ganho de uma senhora gentil — Nossa, parece de outro mundo. Olha só!Mas a letra da canção não era mais importante que a falta de dançarinos. A melodia era lenta apesar dos tambores serem anima
RITAHavia algo triste na forma com que seu corpo fora deixado a beira do lago. Talvez o tecido branco de sua camisola de verão que estava submerso deixando uma doce transparência passar por suas pernas e quadris, os mostrando tão ossudos e pálidos, como se o líquido rubro não fosse mais parte de si. Era uma figura tristonha pousando seu cansaço sobre um velho tronco grosso e putrefo, escuro pela liquefação. Talvez fosse o emaranhado de fios negros que cobriam parte de sua face vazia de expressões, talvez Rita visse tristeza em cada parte daquela cena.Dale retirara o corpo após uma análise minuciosa e parcial, captara cada evidência e se pudesse, teria pego também o tronco e toda a água do lago para analisar. Rita fizera toda a inspeção do lugar, analisara cada centímetro quadrado e mesmo assim ainda sentia como se esque
HENRY.A Lua surgira à cena como um longo lembrete de horário excessivo. Com não mais que uma centena de arquivos e fotos espalhados por toda a sala de análise, organizadas por ordem cronológica e em algumas vezes por semelhança, Henry sentia exausto e inútil.Passara metade de uma noite deitado sobre um gramado gelado, sonhando sonhos de Lua, bebendo da mais tênue lembrança inventada para no fim não ter nada.— Eu vou matar você enquanto dorme — ela havia lhe dito tão irritada e mesmo assim, passara toda a noite consigo, estudando até adormecer no divã. Henry pegara sua manta de estudo para cobri-la.Juntou todas as peças necessárias para um estudo maior e sem qualquer tipo de autorização, as enfiou em uma pasta e guardou em sua bolsa. Henry teve que recolher tudo sozinho, organizar como deveria ser organizado e limpar a sala, sentir o cheiro de limpeza emerg
CATHERINE.Estava revestida em um grande manto branco e macio. Seus dedos acariciaram o pelo macio sentindo cada fio até chegar a grande e dura pata negra como ferradura. Havia um leve peso sobre a cabeça da pequena e por mais que tentasse se livrar da máscara, estava grudada à si. Um grande bode branco como leite e seus chifres eram pontiagudos,os olhos estavam fechados.Sentiu os dedos apertando a carne macia de um braço magricela e repleto de pelos e quando seus olhos se abriram encontrou Wilkoskia lhe fitar.— Sonho ruim? — perguntou em sua gentileza. Ela assentiu e com um leve movimento nada sutil tentou sentar — Tudo bem, venha cá.Ritaera uma pessoa gentil apesar de seu devaneio constante. Não eram raras as vezes em que a policial adormecia apoiada sobre o sofá.— Você se lembra um pouco mais hoje do que onte
SPENCERA maioria deles fazem a passagem durante o início do ano. Era sabido que a temperatura não era suportável à mentes e corpos tão frágeis. Quando estão morrendo todas as janelas são abertas para que as almas pecaminosas possam enfim passear, mas algumas delas ficavam perdidas e por não conhecer nenhum outro cenário além de camas brancas e repletas de morte, ficavam ali.Mas não era raras as vezes em que pássaros vagueavam pelas janelas, adentrava o cômodo branco e por ali criavam vida. Era como se celebrassem a morte com vida. Os pássaros eram quietinhos quando ali estavam.Spencer sentiu os dedos de sua avó lhe apertando tão bem, um belo lembrete que estava tão vivo hoje quanto ontem e um pouco menos que amanhã.— Vou lhes dar um momento — a enfermeira lhe disse tão calma. O som de s