Capítulo 1: O tesouro escondido

POV: Linnea

A luz forte atravessou a venda que cobria os meus olhos, me fazendo acordar e sentar na pequena gaiola onde cresci. Desde que fui comprara pelo mestre naquele leilão, eu desejava não despertar na manhã seguinte. O som de metal batendo me assustou. Segui o som até a lateral da gaiola, o arrastar e ranger, assim como o cheiro da ferrugem, me alertaram que a pequena porta estava sendo aberta. Me encolhi em um canto enquanto o cheiro da comida chegava ao meu nariz. 

― Coma logo, o chefe tem planos para hoje. ― O homem falou de forma ríspida, batendo a grade a trancando novamente.

Puxei a bandeja, sem saber exatamente que comida era aquela, o odor azedo forte surgiu quando remexi a comida com o talher. Já fazia tanto tempo que eu não comia algo fresco que não lembrava os sabores, ou mesmo as cores daquelas comidas. Após comer, coloquei a bandeja novamente junto as grades e me encolhi no outro canto.  

O chão começou a vibrar com os passos de várias pessoas se aproximando. Meu corpo começou a tremer involuntariamente, então cobri minha boca com as mãos, tentando conter o choro que já se formava, antecipando o que viria.

A água gelada me atingiu no rosto, depois pelas costas. Risos ecoavam enquanto meu corpo tremia e eu tentava respirar. A jaula foi aberta e fui puxada de forma brusca pelo cabelo. Contive o grito de dor, pois sabia que apenas alimentaria a fúria e o divertimento daqueles que sempre me torturavam, dia após dia. Fui puxada pelas costas e minhas roupas rasgadas. As risadas ecoaram mais alto na sala, então alguém me segurou pelo braço e puxou, me fazendo cair de joelhos no chão. A impotência em me defender, a humilhação que eu vivia todos os dias há dez anos, tudo transbordou em lágrimas silenciosas.

― Parem de brincadeiras, parecem um bando de crianças idiotas. ― Uma voz feminina se aproximou, seus saltos batiam com muita força no chão, mostrando sua confiança e poder entre as pessoas que estavam ali. ― Eca. Não acredito que vou ter que tocar nessa coisa.

― Apenas a deixe apresentável. O chefe quer exibir seus brinquedos hoje. ― O homem que falou, parecia estar mais afastado. 

Unhas afiadas seguraram meu rosto, o erguendo e virando para os lados com força, então ela me empurrou, se afastando.

― Não é horrorosa, mas e quanto a venda? Não tem nada melhor para colocar nela?

―  O chefe encomendou um artefato, vou mandar alguém buscar. Enquanto isso, faça seu trabalho. ― Vários sons de passos se afastaram, então fui puxada pelo braço e arrastada por algum tempo.

Não fazia ideia de onde estava. Mais água gelada foi jogada sobre mim, acabei me desequilibrando e caindo no chão. Nesse momento, recebi um forte impacto na barriga, me fazendo vomitar o que tinha acabado de comer.

― Coisa nojenta! ― A mulher gritou, dando outro golpe contra minha barriga, me fazendo abraçar meu corpo com dificuldades, por conta das correntes em meus pulsos. ― Quase sujou meu sapato. Sorte a sua valer tanto dinheiro, ou eu te mataria. Esfreguem ela, rápido. Sabem que o senhor Kasimir não suporta atrasos e ele quer tudo pronto antes que os convidados cheguem.

Minha pele foi esfregada com violência, meus cabelos puxados de um lado para o outro enquanto tiravam os nós. Não me lembrava da última vez que havia penteado meus cabelos. Preferiria que os tivessem cortado logo. Fui vestida com um tecido macio e suave, algo estranho para minha pele cobertas por cicatrizes, então passaram algo no meu rosto e lábios.

― Mantenha os olhos fechados, eu vou tirar a venda. ― A mulher instruiu e eu obedeci. 

O grosso tecido foi removido e algo fino foi colocado em seu lugar. Não ousei abrir os olhos e me mantive imóvel. O novo tecido foi preso atrás da minha cabeça e então houve alguns assobios, palmas e risadas.

― Está pronta, podem levá-la. Eu preciso de um banho. ― Fui puxada pelo braço e jogada novamente em uma gaiola, mas era diferente da habitual. 

Tateando ao redor, senti que o chão era macio, felpudo até. Toquei as grades, lisas e com um formato arredondado, diferente das barras gastas pela ferrugem e retangulares com as quais eu estava acostumada. Então eu tentei sentir o teto da gaiola, mas estava muito mais alto. Precisei ficar de joelhos e erguer meus braços para senti-lo. O cheiro também estava completamente diferente. Era um arma doce e enjoativo, A gaiola deu um solavanco, me derrubando sentada, então começou a se mover. Abracei meus joelhos, o medo do desconhecido, do que o mestre desejaria naquela noite, meus dons ou meu corpo. Fosse qualquer um deles, meu estômago se embrulhou na hora.

― Aí está ela! Minha Linnea! ― o mestre disse com uma estranha felicidade em sua voz.― Será o destaque da minha exibição, me tesouro mais importante. Coloquem-na sobre mesa de gelo. Vai combinar perfeitamente com a decoração. ― Mias solavancos e então um vento gelado subiu, me fazendo tremer e minha pele se arrepiar. ― Agora, o toque final, o tesouro escondido por de trás dessa linda venda. Abra os seus olhos, Linnea.

Com a ordem do mestre, mesmo apavorada com o preço a ser pago por fazê-lo, eu abri meus olhos. Porém, nada aconteceu. O mestre sorria de um lugar mais baixo de onde eu estava, o charuto com sua fumaça fedorenta no canto de sua boca. Todos no lugar olhavam na minha direção, alguns em choque, outros com um sorriso e olhares estranhos que me fizeram tremer novamente, mas não pelo frio.

― Maravilhoso! Funciona perfeitamente. Não valeria de nada exibir minha joia se ela ficasse escondida. Contacte a feiticeira que criou essa venda e lhe dê um bônus generoso. ― O mestre deu as costas rindo e foi na direção de uma enorme porta.

Homens e mulheres chegavam, um após o outro e paravam diante da minha jaula, olhando com curiosidade para mim, assim como eu olhava para eles. Nunca havia visto outras pessoas além do mestre, então fiquei empolgada com aquela oportunidade. De repente, senti algo puxando minha atenção. Um homem, cabelos negros como a própria escuridão, olhos profundos e misteriosos cuja cor se assemelhava aos seus cabelos, entrou sem dizer nenhuma palavra ao mestre. Seu rosto não expressava nenhuma emoção, seus traços forte e marcantes eram agradáveis de se observar.

Algo parecia estar me puxando na direção daquele homem, em seu terno escuro que abraçava seu corpo forte, ele se virou na minha direção. Segurei as barras da jaula, desejando me aproximar mais dele. Nossos olhares se encontraram e, pela primeira vez, senti meu coração bater com força em meu peito.

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