PENÉLOPE VERONESI
— O que deseja perguntar, Penélope? — A voz dele ressoou novamente, quebrando o silêncio como um eco misterioso. Aquelas palavras, carregadas de significados ocultos, envolveram-me como uma névoa intrigante. Enquanto os meus pensamentos rodopiavam em torno dessa oferta enigmática, percebi haver mais naquela pergunta do que as palavras revelavam.
— Perdão, eu não queria o deixar constrangido — a minha voz soou mais fraca do que eu pretendia
— Quem é o senhor? — a minha pergunta emergiu com um toque de desafio, um reflexo da frustração que eu estava começando a sentir.
— O seu tutor, é claro. — A resposta dele foi dada com simplicidade, mas a maneira como ele a pronunciou carregava um peso inexplicável. Era como se a verdade estivesse escondida nas entrelinhas, esperando para ser desvendada.
O silêncio voltou a pairar sobre nós, uma barreira invisível entre mim e aquele homem enigmático que agora estava mergulhado nos seus próprios pensamentos. Senti o peso da sua indiferença, uma rejeição sutil que me irritou profundamente. Uma onda de ressentimento tomou conta de mim, fazendo-me revirar os olhos em um gesto de desdém antes de recostar a minha cabeça no banco.
A ideia de dormir e escapar daquele jogo de enigmas parecia tentadora. Fechei os olhos, permitindo-me afundar em um estado de sonolência, esperando que o sono pudesse levar-me para longe daquela sensação de impotência e confusão. Enquanto a estrada se estendia à minha frente, eu apeguei-me à esperança de que, ao acordar, talvez a viagem estivesse mais perto do fim.
....
Acordei ao sentir o carro parar, posicionei-me em condições e além de notar que estamos defronte há um enorme portão de ferro forjado também notei a ausência do meu tutor.
O que particularmente degustei como algo agridoce, por um lado, a sua presença estava me sufocando, mas, ao mesmo tempo, ele era o único capaz de responder às perguntas que perambulam por minha mente.
A limusine passou pelos portões abertos e logo vi uma enorme mansão com uma fachada que misturava belamente vidros, betão de pigmento bastante escura, quase de um preto e alumínio cinza-escuro.
Pude visualizar algumas árvores enormes atrás da enorme casa, e o jardim frontal é simples, mas extremamente belo e bem cuidado, entretanto, a única espécie de flores são apenas rosas-vermelhas, e ao redor da residência há uma espécie de floresta que a protege.
Há duas mulheres na porta principal que esperam que o automóvel se aproximasse, elas estavam vestidas de um uniforme em formato de vestido, preto e com um avental, parecendo tipicamente com empregadas tradicionais, onde uma parece ser bem mais velha que a outra.
O carro parou à frente da porta e o motorista saiu do carro e falou algo com elas, a mais velha movimentou a cabeça em concordância e olhou fixamente para mim através do vidro em seguida.
O homem caminhou até mim e abriu a porta para que eu pudesse sair.
— Srta. Veronesi, deixe-me apresentar-lhe a Isadora, a governanta, e a Annie, a sua dama de companhia.
A Isadora é baixa e tem todos os seus cabelos grisalhos presos num coque baixo, os seus olhos escuros contrastam com a palidez da sua pele, mas possui um olhar acolhedor, entretanto uma expressão rígida.
Arqueei a sobrancelha confusa ao voltar a encarar o motorista.
— O Sr. D'Artagnan é que providenciou isso? — perguntei, coloquei as mãos juntas à frente do corpo e esperei uma resposta que não demorou a chegar.
Dama de companhia? Isso ainda existe?
— Sim, Srta. Veronesi — ele é simplista e caminhou até a bagagem do carro, me deixando sozinha com as mulheres.
— Imagino que esteja cansada da viagem, Srta. Veronesi — a mulher cujo é denominada por Isadora disse formalmente. — A menina Annie irá encaminhar-lhe ao quarto de modo a repousar, imagino que tenha sido uma longa viagem.
Concordei apenas com a cabeça e Annie começou a andar em direção à casa, eu segui-lhe obedientemente.
A menina caucasiana possui a mesma estatura que eu, um pouco mais magra, e ao contrário da governanta, os seus longos cabelos loiro-morango estão presos numa trança que emoldura o seu belo rosto.
Por dentro a casa é ainda mais deslumbrante, paredes em betão também pigmentado e mobílias de uma madeira cor marfim que envaidece o espaço, logo no hall de entrada há uma enorme escada também de madeira que dá acesso aos outros andares.
Eu e ela subimos ao primeiro andar e ela me levou até ao meu quarto.
O cômodo é enorme, uma das paredes é de vidro opaco, mas não tão intenso, o que me possibilita ver a vista para as imensas árvores que englobam a bendita floresta.
A cama de casal é adornada com lençóis de linho em tons pastéis de bege, castanho e até branco, inclusive, as cortinas que cobrem a parede de vidro também são feitas de linho branco.
Possuo um enorme closet vazio e um banheiro maior ainda, uma proporção que é possivelmente duas vezes maior que todo o meu dormitório do I.T.I.
Fiquei algum tempo olhando algumas das árvores caducas e outras que ainda estão bem enfeitadas com folhas em tons de amarelo e vermelho.
— Srta. Veronesi — Annie chamou-me de repente e eu virei de imediato. — O café da manhã é servido às 08h, precisa de auxílio no banho?
— Não, obrigada, Annie — voltei o meu olhar para a direção anterior. — Quero ficar um pouco sozinha, se não se importar.
Ela não respondeu e logo ouvi apenas o barulho da porta a ser fechada.
Respirei fundo e depois de tanto tempo, de tantos anos, permiti-me finalmente chorar.
O quê o fiz ao senhor, pai?
PENÉLOPE VERONESIOs lençóis de linho, acariciados por um sutil perfume de lavanda, convidam ao toque enquanto, gradualmente, eu abria os olhos, reconectando-me ao momento presente e ao espaço que agora ocupo. A brisa fresca do ar condicionado permeia o quarto, provocando involuntários arrepios que me fazem encolher sob os lençóis em busca de aconchego, apesar de ainda estar envolta no calor do sobretudo que não tive ânimo para retirar.Neste lugar desconhecido, tento assimilar a avalanche de eventos que recentemente tumultuaram a minha vida. Hoje, o meu pai deixou-me, mergulhando-me numa tristeza profunda e abismal.Enquanto lido com essa perda que deveria ser avassaladora, mas não a sinto tanto quanto gostaria, encontro-me inexplicavelmente sob a guarda de um homem cujo nome jamais cruzou os meus ouvidos.A ironia da situação é amplificada pelo fato de que nem as autoridades, nem a austera Sra. Colleen, nem mesmo o tutor legal se deram ao trabalho de me informar sobre a existência de
PENÉLOPE VERONESISaímos do quarto e posso reparar que metade de algumas paredes também são feitas de vidro e a luz do luar invade os corredores com quase nenhuma iluminação.Descendemos a majestosa escadaria, direcionando os nossos passos rumo à sala de jantar. Com um gesto suave, Anne empurra a imponente porta de madeira, que cede como se fosse um sussurro, revelando o espaço que se desenrola à nossa frente. Um suspiro de admiração involuntariamente escapa dos meus lábios diante da grandiosidade da cena diante de mim.A luz que inunda a sala de jantar emana uma tonalidade dourada e calorosa, envolvendo o ambiente em um abraço convidativo. Desde o primeiro instante, uma sensação de conforto se instala no meu ser, como se as próprias paredes emanasse tranquilidade. Os tons terrosos dominam a decoração, uma paleta que se desdobra em castanhos, beges, caquis, marfins e areias, contribuindo para uma atmosfera natural e acolhedora.O foco de atenção repousa sobre a mesa de jantar, um móve
DespedidaE no meio dessa confusão alguém partiu sem se despedir; foi triste. Se houvesse uma despedida talvez fosse mais triste, talvez tenha sido melhor assim, uma separação como às vezes acontece em um baile de carnaval — uma pessoa se perde da outra, procura-a por um instante e depois adere a qualquer cordão. É melhor para os amantes pensar que a última vez que se encontraram se amaram muito — depois apenas aconteceu que não se encontraram mais. Eles não se despediram, a vida é que os despediu, cada um para seu lado — sem glória nem humilhação.Creio que será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa; que não será proibido confessar que às vezes se tem saudades; nem será odioso dizer que a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio, e de sossego; e um indefinível remorso; e um recôndito despeito.E que houve momentos perfeitos que passaram, mas não se perderam, porque ficaram em nossa vida; que a lembrança deles nos faz sentir maio
Penélope encontrava-se em um momento de tranquilidade ímpar, dedicando-se a pentear com serenidade os fios sedosos e extensos do seu cabelo diante do espelho ornamentado que adornava o canto do quarto. Enquanto a fina escova deslizava harmoniosamente através das mechas escuras, entre cada onda desfeita dos cachos, a melodia de uma canção, previamente sintonizada no rádio, escapava dos seus lábios em um sussurro suave, como uma prece melódica ao cosmos.O ambiente que a envolvia era a majestosa mansão que havia se tornado o seu refúgio há quatorze dias. No entanto, apesar do tempo transcorrido, mistérios pairavam no ar, como névoa matinal que teima em dissipar-se sob a luz do sol.Perguntas, inúmeras e inquietantes, permeavam a sua mente relativamente à natureza exata da sua tutoria naquela mansão e ao elo indecifrável que Coniffer, seu pai, compartilhava com o enigmático Sr. D'Artagnan, seu tutor.No entanto, reconhecia que uma transformação gradual havia se operado na sua relação com
Subitamente, os olhos de tonalidade esverdeada encontraram os dela, fixando-se por um instante prolongado, enquanto ele permanecia na mesma posição, mãos encaixadas nos bolsos da calça e corpo girado na sua direção. Aqueles segundos, que pareceram se estender em um limiar entre o tempo, estabeleceram uma conexão silenciosa antes que ele finalmente rompesse o silêncio.— Boa noite, Sr. D'Artagnan — ela cumprimentou, a sua voz soando um tanto trêmula, apesar da tentativa de ser firme.— Boa noite, Penélope — a resposta dele veio, carregando uma gravidade quase metálica. A voz era um reflexo da aura estranha que sempre parecia envolvê-lo. — O que você está fazendo acordada a essa hora?A pergunta dele ecoou no corredor silencioso, fazendo com que ela abaixasse os olhos, a coloração avelã do seu olhar fixando-se nos próprios pés enquanto a suas mãos inquietas se esfregavam. A culpa de ser pega vagando pela mansão durante a madrugada a invadiu, trazendo uma sensação de desconforto.— Sr. D
PÉNELOPE VERONESI— Penélope! — o Sr. Parker gritou e bateu com a régua contra a mesa, me fazendo rapidamente olhar para si.O seu rosto não aparentava bom humor, e não o culpo, não tenho estado realmente atenta a sua aula.Uma sombra de descontentamento pairava sobre o rosto do professor. E quem poderia culpá-lo? A verdade é que não tenho prestado a devida atenção às suas aulas, e isso é algo que posso admitir sem reservas. No entanto, como poderia ser diferente? A minha mente teimosa insiste em reviver os eventos daquela madrugada, minando constantemente qualquer tentativa de foco.Os lábios do meu tutor roçando na minha pele e os seus dedos pressionando a minha cintura..., o episódio foi o mais indecente e errado que eu já vivenciei em toda a minha vida, e mesmo assim, ainda assim o meu corpo clama por... Não!As minhas bochechas devem ter adquirido uma coloração rubra, a sensação incômoda aquecendo a minha pele era quase tangível, como se as minhas emoções internas tivessem vazado
PENÉLOPE VERONESIO relógio marca oito da noite, sinalizando um horário para eu descer as escadas para jantar com o Sr. D'Artagnan. À medida que a noite se instala, lançando os seus suaves tons escuros por toda a propriedade, sinto uma mistura de expectativa e apreensão sobre a nossa iminente conversa no jantar.Repito a cena da aula do Sr. Parker na minha mente, a minha distração que atraiu a sua repreensão. Talvez seja isso que o Sr. D'Artagnan queira discutir. Não posso deixar de me perguntar se devo preparar-me para a palestra iminente, talvez até mesmo pedir desculpas pela minha desatenção. Parece apenas prudente estar pronto para quaisquer perguntas sobre o meu comportamento distraído."Vou simplesmente pedir desculpas", tranquilizo-me, uma centelha determinada acendendo-se dentro de mim. "E se ele questionar para onde os meus pensamentos vagaram, darei a mesma explicação que dei a Annie."Preciso esforçar-me para parecer convincente.O meu olhar se volta para o espelho ornament
— Sr. Ezra, meu senhor... não posso dizer que estou surpreso por estar aqui, mas devo-lhe um profundo pedido de desculpa por cogitar que eu poderia ter um pouco mais de tempo, porque eu sabia que mais cedo ou mais tarde o senhor me acharia — Coniffer disse suavemente ao passo que virava a poltrona de couro para poder o observar.O seu olhar estava melancólico e o sorriso forçado que delineava o rosto do homem só o deixava mais sem vida.— Mas também não vou pedir misericórdia, senhor — continuou a falar enquanto servia uísque em um copo para depois girar o líquido como se isso fosse retardar o tempo. — Sei bem dos meus pecados.— Onde está a garota? — Ezra perguntou sem rodeios, apontava a arma na mira da cabeça do homem à sua frente.— Penélope, ela chama-se Penélope, esse nome, na mitologia grega, foi símbolo da mulher fiel e virtuosa, que tecia de dia e à noite e desmanchava o que havia feito para não ser obrigada a trair o marido, foi Cibele que a deu — o olhar perdido estava na b