Penélope admitia que foi uma jovem ingênua, cega pela beleza e galanteios de um homem, recordou Penélope com desgosto. Diego transpirava poder e sensualidade, seu toque - até o mais sutil - a arrepiava da cabeça aos pés, e seu olhar a deixara cativa. Foi educado, inteligente, o oposto dos caras de sua idade e, ao final do encontro - esquecendo seu propósito inicial - prometeu encontrá-lo dias depois.
Com o passar dos dias o encantamento deu lugar ao amor. Tola, pensou que o desejo de Diego também se transformara em um sentimento mais profundo, caindo nas malhas do destino, cujas consequências só lhe causaram – e causavam – sofrimento.
— Amor!
Sobressaltou-se ao ter a cintura envolvida pelo abraço de Lucas. Não percebendo a tensão que a dominava, ele a beijou rapidamente nos lábios e a conduziu em direção a dois homens e uma mulher.
— Venha! Quero lhe apresentar a uns amigos.
Penélope se deixou levar. Sorriu, conversou e ouviu tudo com a mente dispersa. Nada que os demais notassem. Como namorada do artista só lhe era exigido aparecer ao lado dele com um belo sorriso.
Lucas precisou conversar em particular com um possível comprador e Penélope aproveitou para procurar as amigas. Encontrou as duas em frente à pintura de uma fênix. Jéssica com um discreto conjunto de saia até os tornozelos e blusa de manga cumprida, ambos na cor branca, e Ana em um longo e apertado vestido tomara que caia azul.
— O que acham? — perguntou ao se aproximar delas.
— Escuro... — respondeu Jéssica, observando os contornos da ave em pretto e branco.
— Eu conseguiria fazer uma melhor... Pelo menos mais colorida — comentou Ana recebendo um olhar descrente das amigas. — É igual aquelas obras do Alex — continuou a amiga, torcendo com desdém os lábios pintados de vermelho, lembrando-se das esculturas do irmão mais velho. — Não entendo como aquilo pode ser considerado arte.
— E do Marcos? Nenhum comentário ferino? — Penélope questionou, observando a amiga pousar uma taça vazia na bandeja de um dos garçons e retirar outra cheia.
— Ah, querida! A obra do Marcos que me interessa está bem guardada na calça e espero vê-la hoje à noite.
Jéssica engasgou com o champanhe, imediatamente vermelha até abaixo do pescoço.
— Pensando na obra do Enrique, Jess? — Ana brincou.
— Ana!
— O quê? — Ana bebericou seu champanhe e olhou curiosa para Penélope. — E você. O que aconteceu na mansão? Além de o Diego ser um nojento com você.
Penélope suspirou. Queria tanto evitar aquela conversa, esquecer que Diogo a humilhara na frente da amiga.
— Não tenho nada a dizer.
— Ainda sente algo por ele? — Ana perguntou atenta a reação da amiga.
De tarde, após Diego ofender a mãe de Penélope, apesar de ser secretária de Penny, a governanta não a deixou falar com a amiga, justificando que era melhor dar tempo para a jovem. Agora era sua oportunidade de confirmar que o motivo do nervosismo da amiga durante toda a semana era o retorno de Diego.
— Indiferença — Penny respondeu dando de ombros.
— Tem certeza? — persistiu Ana não acreditando na apatia da amiga.
— Claro! Namoro o Lucas agora.
— Que é muito parecido com o Diego — comentou, recebendo um olhar contrariado de Jéssica.
Vendo a confusão na face da amiga, Jéssica segurou sua mão para transmitir solidariedade.
— Ele ficará por pouco tempo — recordou.
Essa era a esperança de Penélope. Que ficasse livre de Diego em poucos dias. No entanto, com a saúde debilitada, Roberto poderia pedir ao filho que ficasse por mais tempo. Talvez fosse sobre isso que conversaria com eles.
Lucas voltou a se juntar a ela naquele momento.
— Amor, desculpe-me por deixa-la sozinha.
— Ah, obrigada por me transformar em ninguém — reclamou Ana conseguindo um olhar atravessado de Lucas.
— Pelo seu tom de voz, presumo que bebeu demais.
Sem se preocupar com quem visse, Ana lhe mostrou a língua.
Contendo a vontade de rir do comportamento da amiga, Penélope garantiu ao namorado:
— Não se preocupe comigo, compreendo a importância dessa exposição para você.
— Não tanto quanto você amor — disse beijando a mão da namorada.
Caso não estivesse preocupada com o que aconteceria na manhã seguinte, Penélope apreciaria o gesto, porém, naquele momento, só conseguiu esbouçar um pequeno sorriso.
— E o Marcos? Onde ele se escondeu? — quis saber Ana chamando a atenção de Lucas para os outros artistas, também expostos na galeria. — Desde que chegamos, ele sumiu.
— Também não o vi. Nem o Alex — Lucas confessou envolvendo a cintura de Penélope em um abraço apertado. — Devem estar discutindo sobre arte em algum canto — supôs dando de ombros.
Ana bufou, a massa de ar movendo a franja loira que deixara caída sobre do lado direito da face.
— Entediada, senhorita Vieira?
Penélope observou a amiga respirar fundo, colocar o maior – e mais forçado – sorriso na face antes de virar-se para seu maior desafeto, Robson Gomes, primo de Marcos e sócio da galeria.
— Prazer em revê-lo também, senhor Gomes.
Ele sorriu minimamente.
— Posso ver em seus olhos que não tem tanto prazer assim.
— Ah, perdoe esses pequenos diamantes por transparecerem o que não deveriam.
— Diamantes? Assemelham-se mais a safiras.
— Mas não são — Ana retrucou deixando de lado o entusiasmo fingido. — Viu o Marcos?
— Está discutindo o conceito de arte com o Alex.
Penélope achou a resposta muito padronizada com o que Lucas dissera. No entanto, era de conhecimento geral que as discussões dos amigos artistas eram frequentes, prolongadas e os fazia esquecer o que os rodeava, e no fim nunca entravam em um consenso.
— Onde estão?
Ele demorou a responder, parecendo em dúvida, ou, o mais provável na opinião de Penélope, testando o limite da paciência de Ana. Os dois viviam duelando com palavras e gestos.
— Aproveite a exposição — ele respondeu desviando o olhar para uma das telas de Lucas. — Daqui a pouco eles aparecem.
— Não quero daqui a pouco. Fale logo!
— Ana! — Penélope colocou a mão no ombro da amiga. — Robson tem razão. Sabe como aqueles dois são quando discutem.
Ana empinou o nariz e se distanciou com passos pesados.
— Ana é muito petulante — reclamou Lucas.
— Ela só se chateou por Marcos ter a abandonado aqui — defendeu Penélope, ciente que o namorado evitava criticar o outro na frente de Robson.
— A entendo — Robson comentou ainda observando Ana se afastando deles. — Meu primo anda disperso com o que é prioridade desde que compramos a galeria.
Penélope achou impressionante que Robson, que sempre trocava farpas com Ana, justificasse o comportamento dela e reprovasse o do primo. Talvez ele não a odiasse como sua amiga imaginava.
O restante da noite foi exaustivo. Apesar de só ter que sorrir, cumprimentar e interagir, não conseguia prestar atenção no que lhe diziam. Ser namorada de um artista não a tornara expert no assunto, mas as pessoas achavam que era obrigada a ouvir sobre traços, texturas, luminosidade com a mesma capacidade de compreensão de Lucas. Fingir admirar o conhecimento delas não estava fácil.Quando Marcos e Alex apareceram, Ana acabou em uma discussão acalorada com o namorado e Penélope não hesitou em largar uma senhora, admiradora de Lucas, falando sozinha para ajudá-la. Robson também foi apartar o casal, conduzindo-os para fora da galeria. Ana estava tão irritada que aceitou a carona oferecida pelo Gomes, e Penélope aproveitou para ir junto.— Amor, ainda tenho algumas coisas a resolver.— Pode ficar.— Queria levá-la para a minha casa depois da exposição. Faz dias que não ficamos sozinhos — Lucas reclamou envolvendo-a em um abraço, que só piorara o humor da Teixeira por atrasar sua partida.
Penélope viu o momento exato em que a surpresa deu lugar à indignação, instantes antes de Diego lançar um olhar feroz em sua direção. De queixo erguido, Penélope cruzou os braços e sustentou o olhar. Nunca mais abaixaria a cabeça sendo inocente.O choque atravessou o corpo de Diego e o olhar incrédulo, movendo-se do pai para Penélope, gradativamente tornou-se opaco de raiva e ressentimento.— A proximidade da morte o deixou louco? — proferiu entredentes, encarando o pai com fúria. — É a ideia mais estúpida que ouvi. Nunca casarei com uma Teixeira.Tensa e cansada de ser tratada como um objeto sem vontades pelos dois homens, Penélope moveu-se para a porta.— Concordo com seu filho. Devo colocar-me em meu devido lugar, que não é como esposa de um Freitas. — Agarrando a maçaneta com raiva completou com a voz fragilizada: — Mereço alguém melhor.Sem se despedi saiu. Precisava se distanciar deles e da mágoa que a declaração de Diego despertava.A atitude e o princípio de choro, nos olhos e
Com a atenção fixa nas três amigas, Enrique atravessou a cafeteria Dulce, batizada assim por causa do nome da proprietária, mãe de Jéssica, sem olhar para as outras pessoas presentes.— Bom dia, Jessy!Alheio a reação que causava na jovem, Enrique a estreitou em um abraço empolgado, antes de se voltar para as demais com um largo sorriso, cumprimentando Ana e Penélope da mesma forma empolgada.Como cliente assíduo, Enrique acostumara-se a ver as três conversando e com o tempo tornou-se parte do grupo. Gostava das três, embora seus sentimentos para com Jéssica estivessem longe de ser só de amizade.— Ouvi que o Diego chegou ontem — disse Enrique ocupando sem cerimônia a cadeira vazia na mesa ainda ocupada por Ana e Penélope.— Chegou...Enrique a observou com interesse, mas não disse nada por perceber a palidez da amiga. Imaginava que o reencontro não foi agradável.Penélope lançou um olhar apressado para o relógio na parede da cafeteria.— Tenho que ir trabalhar. — Levantou, agarrando
Diferente dos Freitas, os Mendez tinham construído a moradia na cidade, em uma parte com subida, de forma que se destacava das construções ao redor. O fato era que, enquanto Roberto prezava a privacidade, impondo distância dos populares; Leonardo Mendez, pai de Enrique, preferia se misturar à população de Cezário. Tal atitude lhe garantiu o posto de prefeito da pequena cidade.As diferenças entre os sócios também era perceptível em seus gostos. Apesar de a casa ser tão grande quanto as dos Freitas, o lar dos Mendez não era opulenta por dentro e nem fria, constatou Diego ao pisar novamente na casa do amigo.Antes de o pai manda-lo estudar fora do país, Diego passava mais tempo na casa do amigo, do que na própria, por causa daquela sensação de aconchego. Mostrando que nada mudara no lar dos Mendez, Erika, mãe de Enrique, recepcionou ambos com abraços apertados e lanches antes de deixa-los sozinhos na sala de estar.Aproveitando o lanche, mesmo após ter tomado um café da manhã fortificad
O dia de Penélope foi agitado. Reuniu-se com o encarregado das máquinas; passou horas acalmando um cliente irado com o atraso de uma entrega; e destrinchou uma pilha de documentos. Foi com alívio que encerrou o trabalho para buscar Samuel na escola.De mãos dadas com Samuel, caminhando em direção à mansão, ouvia distraída o irmão narrar tudo o que aconteceu no dia dele, enquanto imaginava quanto tempo mais teria a frente da fábrica. Agora que Diego retornara a cidade, e até visitara a fábrica, era óbvio que em breve a dispensaria. Era hora de procurar um novo emprego e uma casa. Ficar na mesma que Diego não era uma opção.Olhou para Samuel, que continuava tagarelando, e imaginou como prepará-lo para a mudança de casa e de estilo de vida. Não havia maneira de manter o padrão da mansão Freitas quando fossem somente os dois... Somente os três. Sorriu ao se corrigir.— O vovô vai ficar feliz com as minhas notas. Vamos assistir vingadores para comemorar.Os filmes de super-heróis era a pai
O coração de Penélope disparou ao ouvir o apelido na mesma entonação doce que ele utilizava quando estavam juntos. As íris cor de avelã se fixaram nas pre.tas vendo, pela primeira vez desde seu retorno, o seu Diego. Algo se remexeu em seu âmago e Penélope sentiu os olhos umedecerem sem motivo.— Vamos, Penélope! — Lucas a chamou, puxando-a para a realidade.Penélope hesitou entre ficar ou sair, entre Diego e Lucas, seu passado e seu presente. Inspirou fundo e tomou a decisão correta para seu futuro.~*~Empurrando a comida para o canto do prato, Penélope forçava-se a apreciar o jantar com o namorado, porém, enquanto seu corpo estava no elegante restaurante, seus pensamentos estavam em Diego, relembrando a decepção dele quando se negou a conversar. O instinto de proteção, adquirido duramente após anos de rejeição e desconfiança, era maior que a curiosidade.Pousou o garfo e a faca, a ironia da situação acabando de vez com sua fome. Anos atrás ela pedira para conversarem e ele não quise
Sozinho após a partida de Enrique, Diego pegou uma garrafa de conhaque no barzinho e subiu as escadas, no entanto, no lugar de ir para seu quarto, foi na direção contrária. Andou devagar até o dormitório que o falecido irmão dividia com a esposa.Ao entrar surpreende-se ao encontra-lo do mesmo jeito de anos atrás. Móveis e jogo de cama perfeitamente limpos e arrumados, como se o cômodo não estivesse abandonado e a qualquer instante Luiz e a mulher fossem ocupa-lo.Viu um retrato de sua família sobre a estante e o pegou. Sentou no chão, ao pé da cama, destampou a garrafa e bebeu direto do gargalo. Com a garganta ardendo observou a fotografia. Seus pais lado a lado, ele e Luiz em cada ponta. A família que os Teixeira destruiu.Seu olhar recaiu sobre a imagem séria de Luiz, a saudade abatendo-o e o fazendo dar outro longo gole. Se Luiz estivesse vivo o ajudaria a expulsar os Teixeira e acabar com a ideia de casamento.Casar com Penélope...Seu pai estava maluco, só isso explicava o pedid
— Eu... Muito diferente do que Diego imaginou, Penélope ficou pálida e com os olhos arregalados. Tranquilizou-se ao supor ser a surpresa. — Diga sim e me faça o homem mais feliz do mundo. — Sorriu sedutor. — Sou um grande partido. — Eu... preciso pensar... — Pensar?! Em sua confusão Diego afrouxou o abraço e Penélope fugiu de seus braços. — Também te amo Diego. Muito. Mas tudo está rápido demais. Preciso de um tempo — justificou apressadamente vestindo o short que resgatou de perto do guarda-roupa. — Podemos esperar que se forme antes de casarmos — ofereceu, acreditando que o empecilho fosse o curso da namorada. — Podemos falar disso depois? — pediu sem olha-lo. Ela se concentrou em se arrumar, ignorando o silêncio pesado envolvendo ambos. ~*~ Horas depois de deixar a namorada na frente da pensão decadente que Penélope preferia em vez de seu loft, Diego remoía o ocorrido. Sua concentração era nula e remexia-se na cadeira, aborrecido tanto com o atraso de seu pai quanto pela