O dom mascarado - Love and secrets
O dom mascarado - Love and secrets
Por: Jessy navarro
Sorte para o azar

O estrondo dos tiros rasgou o ar, misturando-se aos gritos apavorados que ecoavam pela boate. O desespero tomou conta do ambiente, pessoas corriam em todas as direções, esbarrando umas nas outras, derrubando mesas e copos no chão. Luzes piscavam freneticamente, criando sombras fantasmagóricas que tornavam a cena ainda mais caótica.

No palco, Elena estava encolhida no chão, escondida atrás da mesa de DJ que, até poucos segundos atrás, vibrava ao som da sua música eletrônica. Seu coração martelava contra o peito, um tambor incessante de puro pavor. O ar cheirava a pólvora e suor. Com as mãos trêmulas, ela tentava inutilmente esconder a cabeça, como se pudesse se tornar invisível.

Então, de repente, um silêncio sepulcral tomou conta do ambiente.

Elena prendeu a respiração. O medo a consumia por completo, seus músculos estavam rígidos, incapazes de reagir. O que aconteceria agora?

O silêncio foi quebrado por passos firmes e cadenciados, ressoando no piso como se pertencessem a um predador se aproximando da presa. Eles pararam bem à sua frente.

Seus olhos, antes semicerrados, se abriram num reflexo involuntário. O que viu fez seu estômago revirar.

Diante dela, um par de sapatos masculinos de couro preto, brilhantes, engraxados com perfeição, denunciavam a presença de alguém que não pertencia ao caos ao redor. Seu olhar subiu lentamente, percorrendo as pernas cobertas por um tecido fino e caro, o caimento impecável de um terno negro.

Quando finalmente chegou ao rosto do homem, um arrepio percorreu sua espinha. Ele tinha uma barba espessa e bem aparada, os olhos eram frios como aço temperado. Mas o que mais prendeu sua atenção foi a arma que ele segurava.

O cano prateado da pistola estava apontado diretamente para ela.

Elena sentiu o mundo girar.

O que ele queria?

E, mais importante... conseguiria sair viva dali?

— Levante-se, Elena. — A ordem veio carregada de uma frieza cortante, a voz grave ecoando no espaço agora silencioso da boate.

Um arrepio percorreu a espinha dela. O medo era quase sufocante, mas obedeceu sem hesitar. Com movimentos rápidos e cautelosos, agarrou o fone preto caído ao seu lado e se levantou, sem tirar os olhos do cano da arma apontado para ela.

— Eu sou só a DJ, eu não...

— Calada. — O tom impiedoso a fez prender a respiração.

No instante seguinte, antes que pudesse pensar, Elena sentiu o mundo girar. Num movimento ágil, o homem a puxou para si, seus braços fortes a prendendo contra seu peito. O calor do corpo dele contrastava com a frieza letal de sua presença.

O coração dela martelava, a adrenalina disparando como uma corrente elétrica. Ela sabia que aquele era o momento. Se hesitasse, estaria perdida.

Respirou fundo.

Em um movimento rápido e certeiro, ergueu o pé e desferiu um pisão brutal no dele, afundando o salto com toda a força que possuía. O homem rosnou de dor, mas antes que ele pudesse reagir, Elena fechou a mão e a enfiou violentamente entre as pernas dele.

O grunhido que ele soltou foi o suficiente.

Os braços ao seu redor afrouxaram, e ela não pensou duas vezes antes de correr.

Pulou do palco sem olhar para trás, o coração ameaçando sair pela boca. Ela não precisava se perguntar por que aquele homem estava atrás dela. Sabia muito bem. E também sabia o que precisava fazer: fugir. Outra vez.

O ambiente estava pouco iluminado, o cheiro de pólvora e sangue impregnava o ar. Ela corria sem parar, desviando dos corpos espalhados pelo chão, dos cacos de vidro e destroços da boate agora devastada.

A saída estava à sua frente. Faltavam poucos passos.

Mas então, um puxão violento em seus cabelos fez seu corpo ser arrastado para trás. O impacto foi tão forte que um gemido escapou de seus lábios, seu pescoço arqueando pelo golpe inesperado.

O pânico subiu como uma maré avassaladora, mas antes que pudesse reagir, sentiu algo pesado atingindo sua cabeça.

A dor foi cortante. A visão escureceu.

E então, tudo virou escuridão.

Quatro horas antes

— Tem certeza de que é seguro? — Elena perguntou em um sussurro tenso, os olhos varrendo o beco estreito ao redor.

Ao seu lado, o rapaz que conhecera há apenas três dias manteve-se imóvel, apenas o brilho inquieto de seus olhos visível sob a sombra do capuz do moletom. Ele parecia mais um vulto do que uma pessoa real, alguém que preferia não ser visto, não ser lembrado.

— Claro que sim — respondeu ele, a voz carregada de um cinismo quase divertido. — Quem desconfiaria de você?

Elena engoliu seco. Aquilo era verdade. Quem suspeitaria da doce DJ Elena? A garota dos fones de ouvido e batidas eletrônicas, que passava as noites em festas e as manhãs dormindo para fugir da ressaca da realidade?

Ela sempre detestou drogas. Sempre. Mas a necessidade era uma fera insaciável, e o desespero tinha um jeito cruel de fazer alguém reconsiderar suas próprias regras.

DJ por paixão, sobrevivente por obrigação. O dinheiro das festas mal pagava sua comida, quem dirá um aluguel.

Sem dizer mais nada, ela enfiou o pequeno pacote no bolso da jaqueta jeans e deu um leve aceno com a cabeça antes de se afastar, saindo daquele beco fétido e úmido.

Seus passos eram rápidos, mas controlados, como se quisesse desaparecer sem chamar atenção. A cidade estava viva, pulsando sob as luzes artificiais dos postes e letreiros. O fluxo de pessoas na calçada era um disfarce perfeito para quem não queria ser visto.

Ela achava que aquilo seria simples. Mas nada na sua vida era simples.

E, ela nem podia imaginar que em poucas horas, estaria correndo para salvar a própria vida.

Uma hora antes

O som da música eletrônica pulsava no ar como uma corrente elétrica, vibrando através dos corpos suados e eufóricos na pista de dança. A cada batida, um frenesi crescia entre os frequentadores da boate.

No comando de tudo, Elena deslizava os dedos habilidosos sobre os equipamentos, guiando cada transição com precisão cirúrgica. Ela estava imersa no ritmo, sentindo a música como uma extensão de si mesma.

No auge da performance, retirou o fone do ouvido esquerdo, permitindo-se ouvir a euforia do público. Os gritos misturavam-se à batida intensa, formando um turbilhão de energia viciante.

A música que tocava era exclusiva daquele lugar, daquele momento. Ali, todas as sextas e sábados, ela era a responsável por abrir a noite com seus sets eletrizantes.

Depois de quarenta minutos ininterruptos, Elena finalmente fez uma pausa. Deixando os equipamentos para trás, caminhou direto para o bar, onde Oliver, o barman, já a esperava com um copo de água gelada.

Ela pegou o copo e bebeu em goles longos e desesperados, como se tivesse acabado de atravessar um deserto.

— A casa está cheia hoje — comentou Oliver com um sorriso maroto. — Estão aqui por sua causa.

Elena revirou os olhos, divertida.

— Deixa de besteira, Oliver. Você viaja demais.

Ele inclinou-se sobre o balcão, entregando-lhe uma bala embrulhada.

— Você se subestima. Ouço muita coisa por aqui... Sei que estão cogitando te colocar como atração principal.

Ela parou no meio do movimento de desembrulhar a bala.

— Eu... O quê?

A surpresa foi tamanha que ela quase se engasgou.

Oliver riu, observando-a com um brilho divertido nos olhos. Mas havia algo mais ali. Admiração. Um pouco de orgulho. E talvez algo mais profundo que ela não quis decifrar naquele momento.

— Eu ouvi que...

— Oi, você é a Elena?

A nova voz a fez girar nos calcanhares.

O desconhecido que agora estava diante dela tinha um olhar intenso, penetrante demais para alguém que fazia uma pergunta tão simples.

E foi naquele momento, naquele pequeno segundo de hesitação, que algo dentro dela gritou em alerta.

O rapaz de camiseta vermelha interrompeu a conversa com um simples movimento, fazendo com que os olhares de Elena e Oliver se voltassem para ele.

— Sim, você é? — Elena perguntou, já ajustando seu comportamento. Estava pronta para mais um fã entusiasta ou, talvez, alguém apenas querendo flertar.

Mas o rapaz não parecia interessado em conversa fiada. Aproximou-se com um olhar fixo e uma expressão séria, e então cochichou, baixo o suficiente para que apenas ela ouvisse:

— Me disseram para te procurar. Você, é... Você tem um presentinho?

O tom de sua voz, quase um sussurro, fez com que Elena se endireitasse. Ela imediatamente se lembrou do que estava carregando em seu bolso — o pacotinho com os pinos de pó.

Ela não hesitou. A necessidade falava mais alto.

— Ah, sim. Vem comigo.

Com um movimento ágil, Elena se afastou do bar e guiou o rapaz até um canto mais discreto, onde rapidamente fez a troca: o pacote por uma quantia considerável de dinheiro. O rapaz pegou a droga com um sorriso satisfeito e se afastou, indo direto para o banheiro masculino.

Por um momento, Elena achou que tudo estava sob controle. Mas logo percebeu que a notícia de que ela estava com aquilo começava a se espalhar. Em questão de minutos, parecia que as pessoas estavam literalmente farejando a oportunidade.

Elena foi rapidamente cercada por um mar de rostos ansiosos, olhos vidrados pela promessa do "presentinho". Ela não teve tempo de processar, e o que parecia ser uma venda pequena se transformou em uma enxurrada de pedidos.

O último pino foi entregue com a mesma rapidez com que a multidão se formava ao seu redor. Com o coração disparado e o pânico começando a tomar conta, ela fez o que parecia ser a única coisa sensata: correu para o palco.

Ali, ela sabia, estaria segura. Ou pelo menos, pensava que sim.

Voltar ao comando das batidas era como uma válvula de escape, mas a calma foi temporária. Vinte minutos depois, quando o ritmo da música atingia seu auge, um som estridente cortou o ar — tiros.

O caos se instalou rapidamente. O que deveria ser uma noite de vibração e euforia se transformou no início de um pesadelo.

E o pior ainda estava por vir.

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