O Dom mascarado

D

ante estava à beira da exaustão, sua mente afiada como a lâmina do machado que empunhava, mas o seu interior continuava em frangalhos, dilacerado pela raiva e pelo descontrole que ele mesmo havia permitido. Ele olhava para o machado, uma extensão de sua própria raiva, e podia quase sentir o peso de seus próprios fracassos se refletindo no metal escuro.

O protocolo já estava em andamento, as mulheres do Egito seriam transportadas em breve, divididas em três partes, uma operação arriscada que ele não podia deixar falhar. Mas a cabeça dele estava longe disso, perdida em um emaranhado de frustração e um desejo urgente de vingança contra a incompetência de seus subordinados. Eles haviam traído sua confiança, e agora ele precisava retomar o controle, mostrar quem comandava ali.

Ele se levantou, ainda com o machado em mãos, e foi até a mesa onde deixara sua máscara. Aquele objeto, que o distanciava de sua humanidade, era o último passo antes de se transformar no que ele precisava ser: um monstro incansável, uma força impiedosa que nenhum erro poderia detê-lo. Ele o colocou, sentindo a pressão da máscara negra em seu rosto como um manto de poder.

Dante respirou fundo. A adrenalina corria por suas veias. Ele estava pronto para mais um enfrentamento, mais uma ação que se exigia dele para que sua autoridade fosse reafirmada. Ele sabia que a noite seria longa, como uma eterna espera antes de se fazer justiça.

No entanto, uma coisa era clara em sua mente agora: nada mais importava. Não as mulheres que ele estava enviando, nem os parceiros insatisfeitos. O que ele queria era uma liberação, um momento para reafirmar seu domínio. Ele sairia daquela sala não apenas como o homem de negócios que era, mas como a lenda imortal de quem ninguém ousaria questionar. Quando a noite terminasse, quem ousasse falhar contra ele, pagaria.

A porta secreta se fechou atrás dele. O som da lâmina cortando o ar novamente se misturou com o pensamento de Dante, agora claro como cristal. Ele já não estava mais pensando em suas fraquezas. Ele estava em sua própria zona de poder, e era disso que ele precisava.

E quando a noite fosse embora, o Dom Dante teria, mais uma vez, mostrado que ele era o único que poderia controlar o destino, que ele era o único dono do medo e da morte que surgiam quando ele se fazia presente.

Dante ficou em choque, um sentimento que ele raramente experimentava. Seu olhar percorreu a mulher à sua frente, observando cada detalhe dela com uma intensidade quase visceral. O silêncio na sala parecia se estender por minutos enquanto ele digeria a presença de Elena. A mulher, que até agora não demonstrava medo, mas sim uma curiosidade quase desafiadora, o desconcertava de uma forma que ele não sabia explicar.

— Será que dá pra me soltar daqui? Eu tenho que ir. Preciso ver... — ela havia começado a dizer, mas a interrupção com o tapa deixou uma marca tanto em seu rosto quanto em seu espírito.

O tapa que ele lhe dera ecoou nas paredes frias da sala, mas parecia não afetá-la como ele esperava. Ela não se curvou à sua autoridade, não se entregou ao medo como todos os outros prisioneiros. Isso o intrigava ainda mais. Ele nunca havia enfrentado uma mulher que ousasse olhar para ele com os mesmos olhos desafiadores que ele costumava ver apenas em homens. Essa atitude era desconcertante para o Dom, que estava acostumado a controlar tudo e todos ao seu redor.

Elena, embora tensa, não hesitou em enfrentar Dante com um olhar determinado. Sua respiração estava ofegante pela dor do tapa, mas ela não permitiu que isso a enfraquecesse. Ela precisava manter sua compostura, pois sua vida dependia disso. Ela sabia que, ao cair nas mãos do Dom Mascarado, suas chances de sair viva eram mínimas. E ainda assim, ela sabia que não poderia se entregar sem lutar.

Dante a observava, a mente trabalhando a mil por hora. Ele não matava mulheres, não com suas próprias mãos. Sempre havia uma linha, uma regra que ele jamais cruzara, mas agora, diante dessa mulher que parecia tão diferente das outras, ele se via encurralado pela dúvida. Por que ela estava ali? Quem havia enviado uma mulher para ele, sabendo de sua regra? Ele não sabia, mas estava determinado a descobrir.

O machado em suas mãos parecia agora mais pesado do que antes. Ele se afastou de Elena, ainda tentando entender o que se passava em sua mente. O que ela estava pensando? O que ela realmente queria? E o que ele deveria fazer com ela? Cada pensamento parecia mais confuso que o anterior.

A sala estava silenciosa, a tensão no ar quase palpável. Dante finalmente olhou para o outro prisioneiro, o rapaz careca, que ainda tremia de medo, e então, sem dizer uma palavra, se virou novamente para Elena.

— Quem é você? — ele perguntou, sua voz abafada pela máscara. Ele não sabia por que, mas precisava saber.

Ela o olhou, como se calculasse suas palavras antes de responder. O olhar que ela lhe lançou era algo que ele nunca havia visto antes, uma mistura de desafios e uma curiosidade insustentável.

— Eu sou alguém que vai te fazer pagar por todos os seus pecados... Dom Mascarado. — Sua voz era firme, mas também carregada de uma raiva que o surpreendeu.

Dante sorriu sob a máscara. Esse jogo estava apenas começando. Uma mulher ousada, como ele nunca imaginara, em suas mãos, poderia ser mais interessante do que qualquer prisioneiro que ele tivesse enfrentado. Ela, sem saber, poderia se tornar uma peça crucial em um jogo que ele ainda estava para entender.

Agora, ele sabia que precisaria descobrir mais sobre ela, mais do que apenas uma prisioneira. Algo em Elena o fazia sentir que ela era diferente. Ele não tinha certeza do que isso significava, mas estava disposto a explorar.

Ao ouvir a forma que a loira falou com o Dom Mascarado, o rapaz riu baixo, mas seu gesto não passou despercebido pelo Dom, que com um movimento, ergueu seu machado e golpeou o homem, fazendo sua cabeça se separar de seu corpo e rolar pelo chão da sala escura.

Dante sentiu a raiva e a frustração borbulharem dentro de si enquanto observava Elena, que agora entendera a gravidade da situação e começou a chorar e implorar por sua vida. O sangue do rapaz caído aos seus pés parecia agora manchar não apenas sua roupa, mas também sua alma. Ele se preparava para terminar o que começara, para concluir aquele ato com a mesma frieza com que sempre lidava com seus inimigos. Mas, naquele momento, algo o impediu.

Com o machado no alto, pronto para acertar a mulher a sua frente, seu olhar ficou fixo no dela. Ela não estava mais desafiando-o, nem olhando-o com curiosidade. Agora, ela era uma mulher aterrorizada, chorando por sua vida, implorando por misericórdia. Era algo que Dante não sabia como lidar. Ele nunca havia mostrado piedade, nunca vacilara com ninguém, especialmente com prisioneiros. Mas com Elena, algo em seu interior o fazia hesitar, o fazia questionar se o que estava prestes a fazer era mesmo o que ele queria.

A raiva ainda o consumia, mas a dúvida o dominava de maneira desconcertante. A cena do rapaz caído, a cabeça rolando no chão, o grito desesperado de Elena, tudo aquilo parecia estar misturando seus sentidos, turvando sua mente. Ele não conseguia entender o porquê de sua hesitação.

Foi quando ele gritou o nome de Demétrio, seu secretário, tentando restaurar alguma ordem naquele caos. Seu corpo ainda tenso, pronto para tomar uma atitude, mas sua mente em completo descontrole. A voz de Demétrio, trêmula, chegou aos seus ouvidos.

Dante ficou paralisado, ainda incapaz de mover um músculo. Ele queria gritar, queria mostrar sua autoridade, mas algo o prendia, algo que ele não podia explicar. Ele nunca deixara que ninguém duvidasse de sua autoridade, mas naquele instante, era ele quem se via perdido, incapaz de agir como sempre fizera.

Demétrio, aquele homem submisso, estava claramente hesitando. Dante sabia o motivo: ninguém jamais tinha estado na sua sala secreta, ninguém além de Firmino. Ele havia construído essa imagem de implacabilidade ao longo dos anos, uma imagem que agora parecia desmoronar diante de seus próprios olhos.

"Por que estou hesitando?", ele se perguntava, enquanto seu olhar ainda estava fixo em Elena. Seus pensamentos estavam tumultuados, a mente dividida entre o que sempre fizera e o que sentia agora. Ele se sentia fora de controle, algo que nunca experimentara. A raiva ainda o consumia, mas algo mais parecia estar surgindo ali, algo que ele não queria enfrentar.

— Leve-a de volta para a cela, agora. — Ele finalmente disse, sua voz soando mais fria do que nunca, embora, dentro de si, houvesse um turbilhão.

Demétrio, que não ousava questionar, finalmente se moveu, puxando Elena pelos braços com firmeza, mas de forma cautelosa, como se temesse que qualquer movimento errado pudesse resultar na ira do próprio Dom. A porta se fechou atrás dele, e a sala ficou em um silêncio pesado.

Dante, agora sozinho, olhou para o machado, ainda manchado de sangue, e sentiu um nó em seu estômago. Ele não estava mais tão certo de que a decisão que tomara havia sido a correta. Algo estava mudando dentro dele, e ele não sabia o que fazer com isso.

A noite estava longe de acabar, mas agora, mais do que nunca, Dante sabia que algo dentro de seu império estava começando a ruir. Algo que ele não poderia controlar.

Dante então passou novamente pela porta secreta escondida sob a prateleira de livros e se dirigiu ao banheiro, onde, encarou o espelho uma vez mais. Quem era ele, de fato? O homem atrás da máscara, o homem que tomava decisões sem questionar? Ou havia algo mais por trás daquela fachada de implacabilidade?

A resposta, ele ainda não sabia.

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