∆ ×
A carruagem passava lentamente pela floresta. Todos os guardas presentes estavam tensos, levando aquele ouro para o rei. Seus olhos treinados percorriam o lugar todo à medida em que avançavam. Sabiam da fama que aquela floresta tinha e esperava que a ideia do rei desse certo desta vez. — Será mesmo que ele é um espírito? — o jovem guarda indagou, tentando disfarçar o nervosismo na voz. — O único espírito que vai ter aqui vai ser o seu se não calar a boca — respondeu o outro soldado, mais à frente disse. Eles continuaram andando, atentos a qualquer movimento suspeito. Estavam em um total de dez homens, os guardas mais fortes e habilidosos do reino; não podiam falhar com o rei. Ouviram o barulho de um piado que parecia de coruja, e pararam assustados. — O que foi isso? Ouviram outro barulho; eram assobios que ecoavam por toda a floresta. Os guardas olharam para todos os lados, ouvindo, desta vez, sons de passos e vultos passando por várias partes. — Eles estão aqui! — exclamou o jovem. Ouviram outro assobio bem próximo a eles. As espadas se ergueram, ficando em posição de ataque, enquanto procuravam por todos os lados. Ouviram novamente o assovio. — Aqui em cima! — a voz rouca e abafada veio diretamente de cima da carruagem. Os olhos dos soldados se arregalaram em espanto e surpresa. Pela primeira vez, viram o mascarado que estava fazendo algazarra em todo o reino. O desenho que faziam dele não era nada comparado ao que viam agora. Ele era muito mais intimidante do que aquilo. Como diziam, era impossível descobrir quem era o homem por trás da máscara, e o fato de ele usar um capuz não ajudava muito. O arqueiro segurava sua arma com a mão direita e tinha uma espada presa à cintura, mas o que eles queriam saber era como aquele homem havia ido parar ali em cima sem que eles vissem. Quando olharam, o cocheiro estava caído no chão. Ouviram a risada do homem mascarado. Ele fez um movimento com as mãos e todos ergueram a espada na direção dele. — Calma, eu pensei que nós pudéssemos conversar sobre essa situação. — Ele cruzou os braços e sua voz era carregada de um sarcasmo arrogante. — Sabe como é, mas vai ser o seguinte: vocês me dão o ouro aqui e podem voltar ao serviço de vocês. Está vendo como é simple?! — Seu desgraçado, filho da… — Opa! Ofender a mãe é jogo sujo. — Desça daí e lute como homem, seu covarde! — O outro guarda rosnou. Keenan olhou para todos eles e um deles chamou sua atenção. O rapaz parecia não ter mais de 18 anos; com certeza era o mais novo entre eles. Deu um sorriso torto. — Está bem, já que insistem. — Ele deu um giro no ar e caiu no chão; em um piscar de olhos, já estava lutando e atirando flechas em todos eles. O rei dos ladrões era tão rápido que quase nenhum deles teve a chance de revidar. Enquanto lutavam, seus homens já estavam retirando o ouro de toda a carruagem. Ele lutava bravamente, desviando dos golpes com a espada e desarmando alguns facilmente. Deu golpes para desmaiá-los, tendo que ferir alguns. O último ainda estava no chão; era o garoto novo. Ele se aproximou, e o menino ergueu as mãos. — Por favor, não me machuque! — o garoto exclamou em desespero. Ele parou e fitou o menino por um instante. — Está tudo bem, filho — sua voz foi gentil. — Apenas dê minhas condolências ao rei pelo ouro, e caia fora disso, rapaz, ou vai acabar sendo morto. — avisou, reparando que nos olhos do garoto havia um pouco de admiração. Em um movimento rápido, tirou da aljava uma flecha e sorriu, estendendo-a para o menino, que aceitou e ficou admirando. Quando o jovem ia se preparar para agradecer, o arqueiro havia sumido no ar. Ele era mesmo um fantasma, como diziam. × ∆ × Keenan mirou a flecha em direção à janela da penúltima casa. A sacola com as moedas de ouro não foi afetadas. Atirou a flecha, acertando o ponto certinho. Já era de madrugada e, amanhã, quando aquela família acordasse, seriam um pouco mais felizes. Seu coração se apertou ao saber que acabavam de ter um bebê e não tinham dinheiro para se alimentar. Sorriu e se virou, pulando entre os telhados, indo para a última casa, a que fazia seu coração se aquecer. Olhou para a janela e a lamparina ainda estava acessa, significava que sua mãe ainda estava acordada. Sorrindo, mirou a flecha em um dos cantos da parede. Ele atirou e acertou de primeira. Observou Gweneth se assustar e olhar para a janela de cima de outra casa. Caramba! Se ela soubesse que era ele, iria ganhar um belo puxão de orelha. Mesmo que já tivesse idade para construir sua própria família, sabia que para aquela mulher ele sempre seria apenas um garotinho. Quando saiu de casa, já era um rapaz e seu corpo estava mudando. Com muita luta, ele teve que deixar Gweneth para viver na floresta. Claro que ocasionalmente a visitava rapidamente, mas ela sempre lhe perguntava sobre o trabalho, e ele apenas desconversava, dizendo que trabalhava como ferreiro em outro reino. E quando ia embora, sua mãe ainda insistia para que ficasse, mas aquele não era o seu lugar. Não mais! Ele agora pertencia à floresta, contudo, isso não significava que não sentiria uma saudade enorme daquela mulher. Talvez amanhã fizesse uma visitinha a ela; estava com muitas saudades. Keenan a observou vir até a janela, fez uma reverência respeitosa e pulou entre os telhados, indo de volta em direção à floresta. O pessoal já devia estar comemorando. Tudo havia dado certo; toda aldeia tinha comida e dinheiro, e, por mais incrível que pareça, ele próprio não se importa com aquilo tudo, sempre ficava com uma porcentagem menor que a do povo, pois era o suficiente, já que vivia sozinho. Assim que chegou na aldeia da floresta, foi direto para casa e escutou de longe o barulho da festa ainda rolando: música, conversa e bebida. Tomou um banho rápido, colocou roupas confortáveis e saiu na direção da fogueira. — Eis que surge o homem! — Dino disse, enrolando um pouco a língua. Ele estava tão bêbado que mal se aguentava em pé. O vigia da aldeia era um homem estranho e não tinha nenhuma namorada. Deu uma pequena risada e apenas balançou a cabeça, servindo-se de um pouco de cerveja. Levantou o copo para seus companheiros de lutas, observando as mulheres de alguns sentadas em seus colos. — Parabéns senhores! Mais uma etapa concluída para a nossa conquista. — Eles gritaram em resposta, erguendo os seus copos também, sorrindo e bebendo a cerveja. Olhou para o lado e viu Sinan aos beijos com uma morena. Balançou a cabeça e riu; parecia que todos estavam se divertindo. Outra mulher chegou perto, mas ele se adiantou, balançando a cabeça, como se mandasse o recado ''hoje não, docinho''. Sexo não era um dos seus planos para aquela noite. Keenan se afastou e sentou-se de frente para a fogueira. Tocou no bolso novamente, sentindo algo dentro, franzindo a testa, e tirou o objeto para fora; era um paninho vermelho. Suas sobrancelhas se ergueram; ele havia se esquecido completamente de que o pano estava em sua calça. Apertou com força nas mãos e olhou para o fogo. Um brilho raivoso tomou conta de seus olhos. Tentou saber notícias de Annabeth por quatro anos seguidos desde que ela foi embora, e o xerife sempre falava meias-palavras que soavama "fique longe da minha filha'' ou ''ela está muito bem e não se lembra mais de você''. Com o passar dos anos, realmente acreditou naquilo. Sua ruivinha não iria mais voltar e nem nunca mais soube dela. Estendeu o pano para o fogo e, por um momento, pensou em jogá-lo nas chamas. No entanto, algo dentro dele não o deixava fazer isso; se irritou e colocou o pano de volta no bolso. Fez um pequeno esforço para se lembrar do rosto dela, mas não recordava muita coisa. Afinal, tinham se passado sete anos, ela deveria estar com uns vinte anos. A única coisa que não conseguia esquecer eram dos cabelos de fogo. Aquilo era impossível de se esquecer nunca encontrou uma menina com o cabelo tão lindo quanto os da sua pequena. Sua pequena? — Para o inferno! — Ele disse irritado, nem sabia ao menos por que estava pensando naquilo; fazia anos que nem se lembrava dela. Tomou a cerveja e soube que realmente precisava de sexo. Olhou para a mulher loira, a mesma com quem passara a noite anterior, levantou-se e sorriu malicioso, indo até ela. — Mudança de plano, docinho, vamos nos divertir. A mulher pulou no colo dele, enlaçando as pernas em sua cintura, enquanto ele a carregava para sua casa. Chega de pensar em cabelos ruivos! Pensou. E realmente aquilo funcionou por um momento durante o tempo que esteve com a loira, até que uma mulher de cabelos ruivos e completamente linda invadiu seus sonhos.Annabeth reprimiu a vontade de olhar pela janela pela trigésima vez. A carruagem avançava cada vez mais, e, da última vez que colocara a cabeça para fora, a estrada da floresta de Forwood ainda era visível. Ela estava ciente do que ocorria naquele lugar e sabia do risco que corria, mas não era exatamente isso que a deixava extremamente ansiosa — finalmente retornava para casa após longos seis anos.Mordendo os lábios, pensou em como fora sua vida longe de sua aldeia natal.Vivera com os tios e teve uma excelente educação, tornara-se uma dama; no entanto, também se tornou uma mulher forte, decidida, inteligente e prática. Aprendeu várias outras coisas na aldeia de seus tios. Mas, nem por um segundo, esquecia-se de sua vida na aldeia natal, e seu desejo de voltar para casa continuara vivo por todos esses anos.Seus pais a visitavam poucas vezes e se comunicavam por pergaminhos. Sentia falta da família e — principalmente — falta dele, seu melhor amigo de infância.Seu Keenan.Deu uma ris
Keenan bateu na porta da casa e aguardou. Quando ela se abriu, uma senhora morena apareceu e, ao vê-lo, seus olhos se encheram de alegria. Ela abraçou o corpo grande e forte do filho. Um sorriso carinhoso surgiu no rosto dele, que beijou a cabeça da mãe e a envolveu com seus braços.— Ah, meu Deus! Quer me matar do coração? Não me deixe sem notícias, garoto! Não importa a sua idade, se sumir desse jeito, vou dar uns tapas nessa sua bunda grande — reclamou, olhando nos olhos escuros do filho, fazendo-o sorrir de lado. — Nossa, você parece cada vez mais forte — disse, apertando um braço musculoso e duro. Seu menino havia se tornado um homem. — O que você anda comendo, garoto?Ele soltou uma risada baixa e gostosa, adentrou a casa abaixando a cabeça ao passar pela porta e observou o ambiente ao redor. Tudo continuava igual: uma pequena sala, a cozinha ao lado e um corredor que levava aos quartos. Inspirou profundamente, sentindo o cheiro de sopa no ar.— Não acredito! — exclamou, com os
— Mãe, vou dar uma volta pela cidade! — Annabeth avisou, apressando-se para sair da mansão.O dia estava agradável, apesar do céu escuro e carregado de nuvens sombrias. Ao entrar no vilarejo, ela observou tudo ao redor. Os preços do mercado haviam aumentado, e as pessoas trabalhavam sem ânimo, com expressões cansadas.Em várias partes do vilarejo, estavam pendurados cartazes com a foto do tal "Rei dos Ladrões", oferecendo uma generosa recompensa para quem o entregasse. Ela se aproximou de um dos cartazes e o analisou: a imagem mostrava o homem com capuz e máscara, cobrindo grande parte do rosto.— Legal, não é mesmo? — uma voz infantil disse, surpreendendo-a. Ao seu lado, estava um pequeno garoto. — Tomara que ninguém o pegue — sussurrou ele, lançando um olhar cuidadoso ao redor.— É mesmo?— Sim, ele é o nosso herói — suspirou o menino, com olhos escuros cheios de admiração. — Quando eu crescer, quero ser igual a ele. — A criança olhou para o cartaz, e Annabeth percebeu o brilho de a
Não! Aquela era a Anna? A sua Aninha estava de volta?Keenan ainda estava olhando para a mulher, totalmente sem ação. Aquela era uma surpresa e tanto. Apesar do assombro em seu rosto, nada se comparava à tempestade que se formava dentro dele. Era uma explosão de sentimentos: alegria, raiva, saudade, e havia algo maior, mais quente, que fazia seu coração disparar — um sentimento que ele não conseguiu identificar. Seus olhos ainda estavam conectados aos dela. Tentou abrir a boca, mas não saiu nenhum som.Os olhos azuis dela o encaravam com curiosidade, mas quando seus homens começaram a se aproximar, Annabeth desviou o olhar e ergueu a capa rapidamente, saindo correndo pela floresta, deixando a espada no chão e indo em disparada para a aldeia de Forwood.— Vamos atrás dela, antes que ela chegue na entrada da aldeia! — um dos rapazes gritou.— Não! — A voz dele soou como um trovão. — Ninguém vai atrás dela, deixem-na ir. — Keenan pegou a espada dela. Sua sorte era que ele usava luvas, as
Keenan sentiu a neblina fria tocar seu rosto, talvez aquilo ajudasse a acalmar seus pensamentos e trouxesse o sono. Hoje, seu alter ego estava em repouso; ele não tinha disposição para assumir outra identidade, ou corria o risco de cometer um deslize — e nenhuma daquelas pessoas merecia sofrer com um erro.Sua mente fervilhava, incapaz de escapar dos pensamentos sobre o que acontecera mais cedo. Por que Annabeth arriscara tanto, aventurando-se naquela estrada com um disfarce? Não que a escolha tivesse sido insensata; ela sempre fora esperta, talvez o disfarce fosse mesmo para proteger sua identidade. Ainda assim, o perigo era real.Por que, afinal, Annabeth havia retornado depois de ele ter se convencido de que isso jamais aconteceria?Era até tolice pensar tanto nela, ainda mais depois de todo o tempo que passara sem respostas às cartas que lhe escrevera. Mas lá estava ele, perturbado, preso à lembrança de sua amiga de infância, e incapaz de afastá-la dos pensamentos.Um som frustrad
Ao amanhecer, Keenan precisava descarregar sua raiva em algo. Passara o restante da noite no campo de treinamento, e, quando finalmente adormeceu, foi atormentado por sonhos com Annabeth: aqueles lábios carnudos e vermelhos, os olhos azuis brilhantes que o deixavam sem ar. Todos os seus instintos masculinos se acenderam, o desejo por ela quase insuportável ao acordar. Ele ansiava por tê-la, desejando desesperadamente tê-la em sua cama.Soltando um grito abafado, Keenan disparou flechas seguidas contra o alvo, até que o boneco de feno se desfez no chão.— Pode começar a falar. — A voz de Sinan soou firme atrás dele.— Me recuso a me sentir assim. — Keenan atirou mais uma flecha, sem nem olhar para o alvo, acertando em cheio.— Por isso estou pedindo: comece a falar. — Sinan insistiu.Keenan respirou fundo, olhando para o céu nublado. — Ela era minha melhor amiga de infância… é a filha do xerife.O amigo ficou em silêncio por alguns instantes, digerindo a revelação. — A mulher ruiva da
Annabeth tentou formular uma frase, mas sua voz sumiu. O homem diante dela era alto, lindo demais para ser verdade — uma beleza quase criminosa. Ela se esforçava para não deixar transparecer o nervosismo, embora suas mãos tremessem. O olhar dele continuava feroz e quente, cada vez mais intrigante.— Quem diria, senhorita Annabeth Riley, por aqui — ele disse com um sorriso de lado, charmoso. — Até apertaria sua mão, mas estou todo sujo — levantou as mãos sujas.Ao ouvir a voz grave de Keenan pela primeira vez, um arrepio percorreu seu corpo. A mente dela foi direto para um lado tentadoramente pecaminoso; não se importaria nem um pouco em se sujar com ele.— Você sabe que nunca me importei com isso — retrucou, estendendo a mão, esperando pelo contato dos dedos dele. Na verdade, queria mais que um aperto de mão; queria senti-lo, abraçá-lo, a respiração dele contra a dela.Sem escolha, ele apertou a mão dela, e um calor subiu pelos corpos dos dois, causando uma eletricidade excitante. Mas
Keenan parou na esquina da mansão do xerife e olhou para a garota.— Está entregue — disse, virando-se para sair.— Pensei que você ficaria feliz quando me visse.O som da voz embargada dela o pegou desprevenido. Ele se virou na direção dela, e o olhar dela o desarmou.— Annabeth… — suspirou derrotado, fechando os olhos com força. Quando os abriu, confessou: — Você não respondeu nenhuma das minhas cartas. Eu me esforcei bastante para conseguir escrevê-las.— Espera… Suas cartas?! — questionou, atônita.— Sim… Escrevi cartas para você, mandei para sua mãe. Eu não sabia o endereço do lugar onde estava. Mas, pelo jeito, ela não gosta de mim, assim como seu pai.— O quê? — exclamou, com a boca aberta. — Eu não recebi nenhuma carta, Keenan.— Por que não estou surpreso com isso? — Ele deu uma risada sarcástica. — Suponho que você tem muito o que conversar com seus pais.— Não posso acreditar que eles fizeram isso comigo — a ruiva balançou a cabeça, indignada. — Keenan, eu não recebi carta