Pablo Rodriguéz
O estrondo balança tudo ao meu redor, no mesmo instante em que abro os olhos, me sentando subitamente no sofá, sinto o suor escorrer lentamente pelo meu corpo, enquanto meu coração b**e acelerado.Os pesadelos permanecem constantes e dormir se tornou meu martírio.Minha cabeça está latejando e, para piorar, tem alguém quase quebrando a minha porta de tanto bater.Me levanto e tropeço na tigela com o resto de macarrão instantâneo que está no chão. A minha sala está um lixo, vejo o resto da pizza sobre a mesinha de centro da sala e garrafas de cerveja vazias em todos os cantos.Moro em um cubículo localizado no Bronx, o apartamento é horroroso, cheio de mofo e insetos, que parecem ter superpoderes e nada mata os malditos, mas é o que posso pagar, aliás, nem isso estou fazendo já que bebi todo o dinheiro do aluguel.A batida agora vem mais forte, me deixando irritado, parece que o fato de não ouvir mais pelo lado esquerdo deixou meu ouvido bom mais sensível.— Já vou, caralho! — berro, indo em direção à entrada, já pronto para mandar a merda quem estiver ali.Abro a porta em um puxão, dando de cara com os olhos Azul s de Brenda, que me fuzilam, ela está usando uma roupa branca, que me faz pensar que ela veio direto do seu estágio.Minha irmã conseguiu, com muito esforço, uma bolsa para cursar medicina, pelo menos alguém da família não vai ter um futuro de merda.— Que merda você está fazendo? Não está pagando o aluguel? — pergunta arrancando o papel que estava colado na porta e empurrando-o contra meu peito com força, passando por mim e entrando.— Aí! — reclamo, descolando o aviso impresso e lendo-o.“Aviso de despejo.”Eu esperava que isso acontecesse, mas não imaginei que seria tão rápido, foram só dois meses de atraso.— Eu realmente não acredito no que estou vendo — fala olhando ao redor, com as mãos na cabeça.O fato de ela ser baixinha faz com que Brenda fique engraçada quando está brava. Dou risada e ela vem em minha direção, acertando um murro no meu peito, ela tem um soco dolorido então esfrego o local.— Pablo, o que eu faço com você? — pergunta.— Não sou problema seu! — respondo, perdendo a paciência.— Porra! Pablo, você é meu irmão, é claro que é problema meu — responde.— O que você faz aqui?Ela vira de costas, olhando ao redor.— Meu Deus, Pablo, olha só isso aqui, está um lixo — fala, se abaixando e pegando a caixa de pizza que tinha acabado de pisar. — São seis horas da tarde e, pelo visto, você estava dormindo, não acredito.— Não me respondeu ainda. — Cruzo os braços.— Aqui está fedendo — Tampa o nariz e vem em minha direção —, meu Deus, você está fedendo! — Reviro os olhos e respiro fundo.— Veio na minha casa para me ofender?— Vim para ver que merda você estava fazendo, já que passei no seu trabalho e adivinha só? Você não trabalha mais lá.Trabalhava na oficina de um velho conhecido do meu pai, até fui bem no começo, mas faltar no trabalho por estar de ressaca ou ir trabalhar bêbado fez com que eu fosse demitido e, no fundo, isso não me afeta mais, então dou de ombros.— Qual seu problema?— Você sabe muito bem o meu problema! — grito.— Pablo, já faz seis anos — responde, me olhando fixamente.— Seis anos no inferno! — torno a gritar, a fazendo encolher. Que tipo de homem eu me tornei? — Me desculpa. Você sabe que não quero que se meta na minha vida.— É claro que vou me meter, você é meu irmão e eu amo você — fala, me fazendo baixar a guarda.— Eu sei — respondo.— Pablo, você está prestes a ser despejado, não conseguiu ficar nem um mês no emprego e agora a vovó...Sinto meu sangue gelar.— O que tem a vovó? — pergunto alarmado.— Ela está doente, Pablo, e o que temos mal está dando para os remédios, você saberia disso se fosse nos visitar.Eu não consigo sequer encará-los, eu sou uma vergonha, não quero que eles vejam a merda de homem que me tornei.— O que ela tem? — questiono, sentindo um gosto amargo na boca.— Enfisema pulmonar e, com a diabetes, tudo fica muito pior. — E agora eu me sinto um merda ainda maior ao saber que eles não estão bem e eu só estou desgraçando minha vida. — Eu ia te pedir ajuda, mas parece que você precisa mais do que nós. — Olha mais uma vez ao redor com as lágrimas escorrendo em seu rosto e eu me sinto horrível, mais ainda, se é que isso é possível. — Me dói tanto ver você assim — a voz de Brenda está embargada.Eu perdi Clarice porque estava longe quando ela mais precisou de mim e eu não posso cometer esse erro mais uma vez, mesmo me sentindo um grande merda eu preciso tentar.— Eu vou conseguir um emprego, vou dar um jeito — falo indo até ela e segurando seus ombros.Por muito tempo eu não tinha tanta convicção em algo, as únicas pessoas que me restam precisam de mim.— Volta para casa, Pablo, por favor — pede, me abraçando.— Eu vou dar um jeito — respondo, correspondendo ao abraço.Espero Brenda se acalmar, tentando organizar meus pensamentos, talvez eu deva voltar para a casa dos meus avós, afinal, eu estou prestes a ser despejado, mas isso significa que eu tenho que ficar longe do álcool.Brenda está falando com alguém no telefone enquanto eu tento dar um jeito na sala, e ela tinha razão, está fedendo.— Pablo! — Brenda grita me assustando, fazendo que eu derrube o saco com o lixo no chão.— Hey, eu ainda tenho um ouvido bom, garota — respondo e ela ri, balançando a cabeça em negativa.— Idiota, acho que consegui um emprego para você, mas tem uma condição. — É claro que tem. — Você vai morar com a gente! — Sabia que era isso que ela diria.— Ok!— Isso é um sim?— Entenda como quiser. Onde é o emprego? Como conseguiu isso tão rápido? — pergunto desconfiado.— A irmã de uma amiga trabalha em uma empresa de contratação e conseguiu te encaixar em uma vaga.— Sei.— Pablo, pelo amor de Deus, você precisa ficar nesse emprego, é uma boa grana e vai trabalhar com pessoas exigentes — me adverte.— Isso não está me cheirando bem — verbalizo meus pensamentos.— É um ótimo trabalho, ela vai te passar tudo por telefone. Seu número ainda é aquele? Você nunca atende...— Não tenho telefone — respondo com a verdade, perdi meu celular há uma semana, enquanto estava chapado.— Meu Deus, como você não tem um telefone?— Perdi.— E diz isso na maior naturalidade?Dou de ombros.— Que trabalho é esse? O que tenho que fazer? — pergunto.— Você vai ser motorista de alguma dondoca, vou pedir para Alisson me mandar tudo, mas agora arruma suas coisas para sairmos desse chiqueiro — intima.Eu tentaria dar uma chance para esse trabalho, mas se alguma riquinha tentasse me fazer de capacho eu daria o fora e arrumaria outra coisa.Preciso dar um jeito na minha vida, ou pelo menos tentar, não é por mim, mas por quem ainda se importa comigo.Alicia PamukEu vivia em um looping infinito de “e se”...E se eu tivesse ficado naquela boate?E se eu não tivesse obrigado Aslan a ir para casa?E se eu não estivesse dirigindo?E se eu não fosse uma chata que não sabe o que é se divertir?Ver o corpo do meu irmão sem vida, em meio aos destroços do seu carro naquela noite, virou uma chave na minha cabeça e arrancou um pedaço do meu coração. A culpa me atormentaria enquanto eu vivesse, então me tornei a Alicia que Aslan gostaria de ter como irmã, alguém que ele admiraria.Aprendi a viver a vida da maneira que ele estava acostumado e isso foi como um anestésico para a minha dor.Abri mão da faculdade de medicina para me dedicar integralmente à Pamuk, passei a viver os sonhos do meu irmão, porque os meus morreram naquela maldita noite.O silêncio ecoa pelo meu quarto enquanto eu termino minha maquiagem. Tenho minha própria linha de cosméticos, milhões de seguidores no Instagram e sou figura carimbada em todos os eventos badalados de
Pablo RodriguézVoltar a morar com os meus avós é nostálgico, mesmo com as mudanças que eles fizeram no tempo em que fiquei longe, tudo ainda cheira como na minha juventude, me causando um nó na garganta.No entanto, busco me apegar à alegria dos meus avós por eu estar ali, eles me receberam sem nenhum questionamento, como se eu não tivesse ficado todo esse tempo afastado deles, e isso faz com que eu me sinta ainda pior, sabendo o quanto eu fui cruel ao me afastar das pessoas que sempre cuidaram de mim e não tem culpa alguma da minha desgraça.Agora estou determinado a não deixar de lado as únicas pessoas que ainda me restam, talvez eu estivesse na rua uma hora dessas se Brenda não tivesse me trazido de volta.Estou de frente para o espelho do meu quarto da adolescência, tentando fazer a droga de um nó de gravata decente por insistência de Brenda, segundo ela, tenho que estar impecável para me apresentar no meu primeiro dia.Em toda minha vida nunca imaginei que terminaria como motori
Alicia PamukNão tenho o costume de acordar atrasada, mas a noite mal dormida cobrou seu preço. Há anos que não durmo tão bem como deveria graças aos pesadelos que insistem em me levar novamente para o pior dia da minha vida, e a insônia é algo que eu já me acostumei, mas o problema é o que ela causa no meu corpo no dia seguinte, sendo que o mal humor faz parte do pacote.E claro que hoje não seria diferente. O fato de ignorar a terapia também contribuí para o meu descontrole emocional. Depois de anos falando sobre meus sentimentos para Ginny, minha psicóloga, resolvi parar por conta própria no momento que as sessões começaram a fazer com que eu deixasse a culpa que eu carregava pela morte de Aslan para trás e, por mais que pareça loucura, eu não quero me livrar dela.— A senhorita tem certeza que não quer comer nada? — Maria pergunta, estalando os dedos na frente do meu rosto.— Tenho, Maria , não estou com fome — respondo, conferindo o celular.— Nem o suco verde? — pergunta, faze
Pablo RodriguézQuase atropelar um adolescente não era algo que eu planejava para o meu primeiro dia de trabalho, já não bastava eu custar a dirigir o bendito do carro que mais parecia uma nave espacial e, ainda por cima, ter que lidar com essa mulher, que aparentemente não gostou nem um pouco de eu não ter aberto a porta do carro para ela entrar assim que a vi.Me lembro das palavras de Pietro, tendo a confirmação que ela não é uma pessoa fácil de agradar e nem um pouco simpática. Está óbvio que ela é o tipo de mulher que ama ver as pessoas lambendo o chão que ela pisa e não, eu não seria esse tipo de idiota. Mesmo precisando do dinheiro que esse trabalho me paga, eu não vou me sujeitar a ser capacho do projeto de Barbie de nariz empinado, e que nariz bonito, a filha da mãe é um espetáculo, senti até mesmo um frio na barriga quando vi seus olhos Azuis hipnotizantes, mas aparentemente a beleza surreal que ela ostenta não se assemelha ao que ela é por dentro.O que tem de errado com
Pablo RodriguézEstava quase cochilando tamanho o meu tédio, mas o que eu estava esperando, eu era motorista de uma riquinha mimada e claro que não teria emoção alguma nisso. Se bem que aguentar alguém arrogante como ela aparentemente não é a coisa mais fácil do mundo. Me levanto da poltrona e começo a andar ao redor, olhando a decoração horrorosa do lugar, nunca entendi o mal gosto dos ricos.Até aonde eu sei, Pamuk é uma fabricante de cosméticos ou algo do tipo, com filiais pelo mundo todo. Sei pelo que Brenda me falou, afinal, eu odeio mídia e redes sociais, mas minha irmã está um tanto deslumbrada pelo meu novo martírio, quer dizer, emprego. Acho que ela sequer imagina que minha adorável chefe respira arrogância.E não seria eu a dizer a ela, Brenda é um dos motivos pelo qual eu ainda insistiria nesse trabalho, talvez esteja na hora de tentar ser um irmão e um neto de verdade, mesmo sendo difícil, eu preciso recuperar um pedacinho de quem eu fui um dia.— Oi. — Dou um salto, m
Alicia PamukNão consigo entender o porquê de eu ainda estar tentando manter esse motorista, depois de ser nítida a sua incompetência, talvez eu esteja seguindo o conselho de Donna e sendo mais tolerante com as pessoas, mas não vou dar mais nenhuma chance caso ele cometa qualquer outro erro. Ainda mais com ele sendo tão debochado. Reviro os olhos lembrando da expressão enigmática no rosto do meu novo motorista, algo que ao mesmo tempo que irrita, me deixa curiosa.Eu só posso estar ficando maluca.O que alguém como ele pode ter de interessante? Me recuso a aceitar que ele é um homem bonito, ele só não é feio, é um homem comum usando um terno horroroso, que eu espero que vá para o lixo assim que Simon trouxer um novo depois de tirar suas medidas. — Pablo Rivera Rodriguéz — balbucio, olhando sua ficha sobre a minha mesa.A foto pequena deixa em evidência os círculos escuross ao redor de seus olhos Azuis.Os trabalhos anteriores foram todos temporários, todos braçais, o que talvez ex
Pablo RodriguézO celular, que agora é mais um instrumento, com certeza custou um salário-mínimo. Se eles dão um celular como esse para um motorista, com toda certeza estão nadando em dinheiro. O que é de se esperar, se tratando de uma das melhores empresas de cosméticos dos Estados Unidos.Ouço os passos de Mili vindo do corredor, o som que o salto do coturno faz ao bater no chão é inconfundível. O seu modo de vestir é um pouco peculiar, comparado ao da sua chefe, enquanto Mili parece uma e-girl, nossa chefe poderia ter saído de um desfile de moda de alta costura, não que eu preste atenção nisso. Ficar na presença da garota faz tudo ser menos tedioso, ela não para de falar um segundo sequer, e tem assunto para tudo quanto é pauta. Eu já sabia quantos membros tinha sua família, como era o seu relacionamento com a namorada, seus filmes favoritos e mais uma porrada de coisas a seu respeito. O que não me incomodava, estava sendo divertido, seu bom humor e seu falatório talvez seja o
Alicia Pamuk Não sou uma chefe ruim, me preocupo com o bem-estar dos meus funcionários, todos recebem benefícios além de um salário mais do que justo, sei a importância da mão de obra de cada um deles, seja na produção, no marketing ou em vendas.Sou exigente porque preciso ser, já decepcionei meus pais o suficiente e a Pamuk é a maior lembrança de Aslan. — Entra, Alicia, e não repare na bagunça — fala abrindo a porta do seu Audi Q8.Ela tira duas pelúcias do banco para que eu me sente. Donna se casou com vinte e três anos, quando terminava a faculdade de Relações Internacionais, com Hyon Yoon. Ele era um recém-chegado nos Estados Unidos, vindo da Coreia Sul, e se conheceram durante seu estágio em uma grande empresa de tecnologia. Há três anos tiveram um casal de gêmeos, que conseguiram anular minha aversão por crianças, eu sou completamente apaixonada por Kahi e Jon ho. Hyon e Donna são meu casal preferido, sempre irei admirar o relacionamento dos dois, mas não desejo algo assim