Capítulo 02

Pablo Rodriguéz

Voltar a morar com os meus avós é nostálgico, mesmo com as mudanças que eles fizeram no tempo em que fiquei longe, tudo ainda cheira como na minha juventude, me causando um nó na garganta.

No entanto, busco me apegar à alegria dos meus avós por eu estar ali, eles me receberam sem nenhum questionamento, como se eu não tivesse ficado todo esse tempo afastado deles, e isso faz com que eu me sinta ainda pior, sabendo o quanto eu fui cruel ao me afastar das pessoas que sempre cuidaram de mim e não tem culpa alguma da minha desgraça.

Agora estou determinado a não deixar de lado as únicas pessoas que ainda me restam, talvez eu estivesse na rua uma hora dessas se Brenda não tivesse me trazido de volta.

Estou de frente para o espelho do meu quarto da adolescência, tentando fazer a droga de um nó de gravata decente por insistência de Brenda, segundo ela, tenho que estar impecável para me apresentar no meu primeiro dia.

Em toda minha vida nunca imaginei que terminaria como motorista de gente rica.

Richard e eu tínhamos o plano de montar uma empresa de segurança privada quando deixássemos de servir.

Quem sabe um dia eu consiga colocar a vida nos trilhos e possa viver algo que meu melhor amigo e eu sonhamos.

— Pablo, você ainda não está pronto! — Brenda entra no quarto praticamente gritando. Morar com os meus avós também é dizer adeus a minha privacidade, Brenda age como se ela fosse a irmã mais velha. — Deixa eu te ajudar com isso. — Se aproxima, indo direto na minha gravata e quase me estrangula.

— Aí, vai com calma aí — ralho.

— Pablo...

— Eu já sei e não vou estragar tudo. Sei que o vô e a vó precisam de mim. — Me adianto antes que ela venha com um sermão.

Brenda solta uma lufada de ar e me encara.

— Não quero que faça isso pelo vovô ou pela vovó, sei que eles estão felizes por você estar aqui, eu quero que faça isso por você. — Pousa a mão no meu ombro. Não consigo entender o porquê de Brenda ainda insistir tanto em mim, eu não tenho mais conserto, dois dias sem álcool e já estou enlouquecendo, a bebida era o anestésico para as feridas que eu insisto em manter abertas. — Você está com o endereço? Sabe o que fazer? — Assinto com a cabeça. — Pablo, Alicia Pamuk é uma pessoa muito importante e imagino que seja muito exigente...

— E só dirigir um carro, Brenda, qualquer um pode fazer.

— Se pensar assim vai acabar sendo demitido no primeiro dia. — Bufa, visivelmente irritada.

Não sei quem é a tal dondoca para quem vou dirigir, e não faço questão nenhuma de saber.

— Vou dar o meu melhor, zangada. — Me aproximo, apertando seu nariz e recebendo um tapa no braço.

— Só faça o que ela pedir. O salário é bom, você mesmo viu. — O salário era o melhor que eu receberia desde que tinha voltado do Oriente Médio, ao menos eu vou poder ajudar meus avós e tirar um pouco da responsabilidade das costas de Brenda. — Só tente, ok? Você precisa melhorar, nós queremos ver você seguindo em frente.

— Eu vou ser o melhor chofer que essa dondoca já teve, escreve aí — falo e olho o meu reflexo no espelho mais uma vez e, tirando as olheiras evidentes, a minha aparência não é das piores.

— Deveria ter tirado a barba, Pablo.

— Você não acha que tá pedindo demais?

Brenda gargalha.

— Não custa nada tentar. Vem — Puxa meu braço —, pedi um táxi para levar você.

— Sabe que eu posso pegar o metrô...

— E correr o risco de chegar atrasado? Quem sabe se você ficar no emprego não consegue um desconto na nova linha de maquiagem da Pamuk. — Volto a rir.

Talvez estar perto de Brenda e dos meus avós seja exatamente o que eu preciso nesse momento.

Manhattan não é um lugar para pessoas como eu.

E agora, olhando aquela quantidade de prédios, um mais luxuoso do que o outro, eu tenho plena certeza que meu lugar não é aqui, mas eu preciso fazer dar certo, não por mim, mas por quem eu amo.

Pego o pequeno pedaço de papel amassado no meu bolso, confirmando que estou no lugar certo, e olho para cima, sem conseguir ver o topo do prédio, que é o mais luxuoso de todo o conglomerado, sem dúvida alguma.

Respiro fundo e me esforço ao máximo para parecer simpático ao entrar no hall, o cheiro de almíscar invade meu olfato e a decoração extremamente clara do lugar poderia me cegar.

— Posso ajudá-lo, senhor? — Um homem, na faixa de quarenta anos, vestindo um terno muito bem cortado, se aproxima.

— Bom dia, eu vim pela agência... — Estou mais nervoso do que esperava. — Vou ser o motorista de Alicia Pam...

— Da senhorita Pamuk! — Sorri e me estende a mão, quebrando a tensão do ambiente. — Sou Roger, eles me avisaram que viria.

— Pablo.

— Muito prazer, vou levá-lo até a garagem, aonde irá encontrar o carro da senhorita. — Faz sinal para que eu o siga.

Ele passa por dois homens com roupas iguais as dele atrás de uma espécie de balcão, que me cumprimentam com um aceno de cabeça em sinal de saudação.

Não posso negar que estou nervoso, pois a cada passo que dou um arrepio me toma, talvez pela pressão que foi colocada sobre mim.

— Espero que o senhor tenha mais sorte...

— Pablo, pode me chamar de Pablo — afirmo, ficando desconfortável quando se refere a mim com formalidade.

— Espero que tenha mais sorte do que os últimos rapazes que trabalharam para a senhorita Pamuk. — Dá um sorriso amarelo antes de abrir a porta que sinaliza que chegamos à garagem.

A maneira como ele falou deu a entender que muitos motoristas já passaram pela minha posição.

Pietro atravessa a porta e eu faço o mesmo, o lugar é igual a uma loja de carros de luxo, nem se eu nascesse de novo conseguiria comprar um dos veículos que estão aqui.

— Essa é sua. — Me entrega um aparelho pequeno, que examino para ver do que se trata, parece uma espécie de controle. — É a chave do carro da senhorita Pamuk, aquele ali. — Aponta na direção de um SUV da Mercedes, que eu nem me arrisco a chutar qual é o modelo.

— Uau! — balbucio.

— Espero que você fique com o trabalho! — Sorri.

— Também espero.

— A senhorita Pamuk é um pouco difícil, mas é uma boa pessoa — fala de forma cortes.

Agora eu tenho uma certeza, essa tal Alicia Pamuk deve ser o demônio.

— Acredito que a agência tenha lhe dito que o senhor deve estar aqui todo dia nesse mesmo horário. Você pode tirar o carro e esperar por ela em frente ao prédio, acredito que ela irá te passar a agenda e os locais que o senhor deverá levá-la. — Dou um sorriso amarelo. — Bom, preciso voltar. Boa sorte, Pablo, espero vê-lo amanhã. — Estende a mão e eu prontamente a aperto, como forma de agradecê-lo.

Ele é um homem simpático e gentil.

Entro no carro e sinto a cabeça doer até conseguir ligar o bendito, tem um bom tempo que não dirijo e é uma péssima ideia voltar agora, com um carro como esse.

— Aonde você foi me meter, Brenda?

Por que alguém compra um carro como esse se não vai dirigir?

Com uma certa dificuldade, saio da garagem e estaciono em frente ao prédio, depois de uma luta interna, na qual eu me questionava se esperava a minha chefe dentro ou fora do carro, acabo optando por esperar do lado de fora.

O sol está começando a esquentar e eu só queria um cigarro para relaxar. Olho o relógio no meu pulso, balançando a perna em uma ansiedade que há algum tempo não sentia.

Volto o olhar na direção do prédio no momento que uma mulher, que parece ter vindo de um filme da Barbie, sai pela porta.

Meus olhos insistem em seguir cada movimento da estranha, que usa uma espécie de terninho na cor preta, que desenha seu corpo e contrasta com sua pele alva e seus cabelos dourados, casando com seus movimentos graciosos.

Não consigo prestar muita atenção em seu rosto, que está praticamente coberto por um enorme óculos de sol, mas algo me diz que suas feições não me decepcionariam.

Não presto muita atenção nas mulheres desde que perdi a que possuía meu coração, mas não vou negar que a loira que caminha com imponência e leveza chamou minha atenção.

— Não é possível — balbucio ao ver que a mulher está vindo em minha direção.

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