O som abafado dos saltos de Elena ecoava pelo corredor vazio, ressoando contra as paredes frias e mal iluminadas de seu prédio. Era tarde, e como de costume, o ambiente sombrio sempre a deixava com uma sensação desconfortável, como se estivesse sendo observada. Não era paranoia — ela sabia que havia algo de errado, também não era o cansaço depois de ter uma prova pela manhã e uma apresentação pela tarde, mas não conseguia identificar o quê. Os corredores do edifício pareciam compridos demais à noite, as sombras dançavam de maneira estranha, e o barulho do vento que passava pelas janelas abertas gerava um sussurro constante, quase como uma voz longínqua. Era inquietante.
Ela apertou o casaco ao redor de seu corpo enquanto avançava, sentindo um calafrio subir pela espinha. "Sempre alerta", pensou consigo mesma. Essa frase havia se tornado seu mantra desde que se mudara para aquele apartamento. A vida parecia ter tomado um rumo estranho desde então. Não era apenas o prédio escuro e decadente, nem a sensação de solidão. Era algo mais profundo, uma sensação de que sua própria história estava se revelando de forma lenta e dolorosa. Ao entrar no apartamento, o som da porta fechando ecoou mais alto do que o habitual, e Elena rapidamente trancou todas as trancas. O silêncio a envolveu como um manto pesado. Deixando a bolsa na mesa, ela se jogou no sofá, exausta. O dia tinha sido longo, mas os pensamentos de Elena estavam muito distantes para que ela pudesse realmente descansar. Fechou os olhos, mas as memórias começaram a emergir. Três anos haviam se passado desde que recebeu aquela carta. A carta que mudara tudo. Ela ainda se lembrava claramente do momento em que encontrou o envelope misterioso, enfiado no meio das páginas de um caderno que usava na faculdade. Na época, aos 21 anos, ela não deu muita importância — a vida estava cheia de pequenos mistérios, mas aquilo parecia inofensivo. "Talvez um erro", pensou inicialmente. Mas, quando abriu o envelope, uma única frase a marcou de maneira indelével: "Mesmo que diga que estou morto, bambina, sempre estive vivo." A caligrafia era firme, quase familiar, e aquelas palavras imediatamente fizeram sua mente correr para o passado. Ela foi criada por sua mãe, uma mulher forte e solitária, que sempre lhe dissera que seu pai havia morrido antes de ela nascer. Elena aceitara essa história por anos, sem questionar. Mas agora, com aquelas poucas palavras, toda a estrutura de sua vida parecia vacilar. — "Sempre estive vivo?" — sussurrou para si mesma naquela noite, segurando a carta com as mãos trêmulas. Ela não sabia o que pensar. O envelope não tinha remetente, e não havia nenhum indício claro de quem poderia ter enviado aquilo. No entanto, o tom da mensagem era pessoal demais para ser um engano. Quem mais chamaria Elena de bambina? Era um apelido carinhoso, que ela apenas ouvira nos sussurros da infância, em raras memórias que pareciam borradas pelo tempo. Durante anos, a carta ficou guardada em uma gaveta, ignorada, mas nunca esquecida. Ela continuou sua vida — mudou de cidade, ingressou em outro curso universitário, fez novos amigos, mas aquela sombra do passado nunca a deixou completamente. O que a carta realmente significava? Era mesmo uma mensagem de seu pai? Se ele estava vivo, por que nunca a procurara antes? O silêncio sobre sua vida parecia ainda mais profundo e misterioso após aquelas palavras. E agora, com 24 anos, morando sozinha em uma cidade distante, ela sentia que estava cada vez mais próxima de respostas que não sabia se queria ouvir. Elena suspirou pesadamente no sofá, relembrando as mudanças dos últimos meses. O prédio onde vivia parecia estranho, quase como se escondesse segredos em cada canto. Os vizinhos raramente se falavam, e os poucos que ela conhecia pareciam sempre distantes. Havia os três irmãos italianos no andar abaixo — Mateo, Felipo e Theo. Eles se mantinham discretos, mas Elena não pôde deixar de notar como seus olhares a seguiam pelos corredores. Ela não sabia o que pensar sobre eles. Algo em sua presença a deixava inquieta. — Preciso relaxar — murmurou, passando a mão pelos cabelos soltos. A pressão de suas responsabilidades, misturada ao peso daquela carta ainda não resolvida, parecia sufocá-la. Subitamente, o som de passos no corredor do lado de fora interrompeu seus pensamentos. Eram passos firmes, ecoando pelo piso. Alguém estava caminhando lentamente, quase de forma deliberada. O som parou bem na porta de seu apartamento. Elena sentou-se ereta, sua respiração acelerando involuntariamente. "Quem está aí?" pensou. O prédio raramente tinha movimentação naquela hora. Quem estaria parado ali? Por um momento, tudo ficou em silêncio. Ouvia apenas o som de seu coração batendo forte no peito. Ela se levantou e foi até a porta, colando o ouvido à madeira para ouvir melhor. O silêncio persistia. Talvez estivesse apenas imaginando coisas. Porém, antes que pudesse se afastar, algo deslizou por baixo da porta. Um novo envelope. Ela congelou, encarando o papel amarelado à sua frente. A visão do envelope fez seu estômago revirar. Tremendo, ela se agachou e pegou o objeto, sentindo o peso das memórias que a invadiam mais uma vez. Era idêntico ao primeiro envelope que havia recebido anos atrás. Ela sabia que deveria abrir. Mas o que poderia estar escrito dessa vez? Seria mais uma mensagem enigmática? Ou talvez, finalmente, alguma resposta? Respirando fundo, ela rasgou a borda do envelope e puxou o pedaço de papel lá dentro. As palavras, novamente escritas na mesma caligrafia firme, fizeram seu coração parar por um instante: "As sombras estão mais próximas do que você pensa. Cuidado em quem confia." Ela sentiu um arrepio correr por todo o seu corpo. Olhou ao redor, sentindo-se ainda mais isolada naquele apartamento sombrio. O que tudo aquilo significava? Quem estava enviando essas cartas? E por que agora, depois de tantos anos, o mistério parecia estar se intensificando? Antes que pudesse processar, o som de passos novamente ecoou pelo corredor, mas dessa vez, se afastando. Elena sabia que algo grande estava prestes a acontecer. As sombras de seu passado finalmente estavam começando a se revelar, e ela não tinha ideia de quem era amigo ou inimigo. Mas uma coisa era certa: ela precisava de respostas. E estava disposta a ir até o fim para encontrá-las, mesmo que isso a levasse direto ao coração de um mistério que poderia mudar sua vida para sempre.Elena não conseguia tirar as palavras da carta da cabeça. "As sombras estão mais próximas do que você pensa. Cuidado em quem confia." Aquilo parecia um aviso claro, mas a quem estava direcionado? Para sua vida pessoal? Seus poucos amigos na faculdade? Ou talvez, e mais perturbador, para os três irmãos que moravam no andar de baixo? De qualquer maneira, Elena sabia que não podia ignorar aquela mensagem. Sentia que cada detalhe ao seu redor estava repleto de segredos, e era como se o passado estivesse à espreita, pronto para explodir.Era uma manhã fria e cinzenta, e Elena decidiu ir para a faculdade mais cedo do que de costume. Talvez um pouco de ar fresco a ajudasse a organizar seus pensamentos. Saiu de casa com passos rápidos, como se estivesse tentando fugir do próprio apartamento, daquelas paredes que pareciam sufocá-la com memórias e incertezas.À medida que caminhava pelos corredores escuros do prédio, sua mente vagava. Estava inquieta, incapaz de afastar a sensação de que estava
Elena estava inquieta desde o encontro com Theo e Felipo. Eles pareciam sempre saber mais do que ela mesma suspeitava que eles soubessem. As palavras que Theo havia pronunciado, combinadas com o sorriso enigmático de Felipo, deixaram claro que algo estava acontecendo. Ela não conseguia afastar a sensação de que aqueles três irmãos tinham alguma conexão com as cartas que vinha recebendo, até porque bambina era italiano.Naquela noite, Elena não conseguiu dormir direito. A cada som no prédio, a cada ruído vindo do corredor, seu corpo se enrijecia. Sentia-se cercada por sombras, como se o próprio prédio estivesse se fechando ao seu redor. Pela primeira vez, ela considerou a ideia de que talvez estivesse mesmo em perigo. Mas quem poderia estar por trás disso? E por quê?Na manhã seguinte, aproveitando que não teria aula naquele dia durante a tarde, Elena decidiu que precisava investigar. Era impossível continuar vivendo naquela névoa de mistério sem tentar encontrar respostas. Se os irmão
O silêncio pairava pesado no ar. Elena sentia cada batida do seu coração ressoando em seus ouvidos, enquanto Mateo a observava do outro lado da sala. O mistério envolvendo os irmãos italianos parecia, de repente, estar prestes a se desdobrar. E, embora quisesse respostas, o medo de ouvir a verdade a fazia hesitar.— O que você quer dizer com "algo muito maior"? — Elena perguntou, sua voz carregada de incerteza.Mateo se inclinou para frente, seus cotovelos apoiados nos joelhos, como se estivesse escolhendo cuidadosamente as palavras que diria a seguir.— Há muito tempo, sua..quer dizer a nossa, família foi envolvida em algo perigoso — começou ele, sua voz baixa e grave. — Mais especificamente, seu pai. E quando ele desapareceu da sua vida, não foi por acaso.Elena se endireitou no sofá, sentindo uma onda de adrenalina percorrer seu corpo. O que Mateo sabia sobre seu pai? Ela tinha sido criada pela mãe, que sempre lhe dissera que ele estava morto. Contudo, a carta misteriosa que recebe
Elena mal conseguia respirar. As palavras dos irmãos italianos ecoavam em sua mente, repetindo-se como um mantra de confusão e desespero. Ela sentia o peso de uma responsabilidade que nunca havia pedido ou imaginado carregar. Seu pai, um homem ausente, aparentemente a havia deixado no centro de uma tempestade perigosa. E agora, esses três estranhos, que de repente eram seus meio-irmãos, esperavam que ela confiasse neles. Mas poderia?A sala estava tomada por um silêncio tenso após a última declaração de Mateo. Os três irmãos a observavam, esperando uma reação. Mas o que eles esperavam? Que ela simplesmente aceitasse essa loucura e seguisse em frente?— Eu... não sei o que dizer — confessou Elena, sua voz mais fraca do que gostaria. — Isso é muito para processar. Primeiro, vocês dizem que meu pai está vivo, depois que ele era parte de uma organização criminosa, e agora eu sou a chave para algo que ele deixou para trás? Vocês percebem o quão insano isso soa?Mateo suspirou, passando a m
Elena não conseguia tirar os olhos dos irmãos enquanto eles examinavam a carta. Era como se o papel amarelado guardasse segredos que somente eles pudessem desvendar. A sensação de estar à mercê de algo maior do que podia compreender era esmagadora. Por mais que tentasse, não conseguia entender como sua vida havia se tornado esse emaranhado de mistérios e perigos. Tudo o que sabia era que nada mais seria como antes.Mateo, Felipo e Theo trocavam palavras rápidas em italiano, suas vozes baixas, mas carregadas de tensão e urgência. O que quer que tivessem descoberto, não seria simples. Elena se levantou e começou a andar pela sala, a ansiedade pulsando em seu corpo. Ela olhava para a janela, observando a noite cair lá fora, o silêncio do prédio só aumentando sua inquietação. Tudo parecia tão normal, tão calmo. Mas dentro de si, ela sabia que estava mergulhada em um abismo desconhecido.— Vocês já conseguiram descobrir alguma coisa? — Ela quebrou o silêncio com a voz tensa.Felipo olhou
O ar estava pesado na sala. Elena olhava para a carta, agora decifrada em parte, com o coração batendo mais forte. "Onset", o início, o ponto de partida. Seu pai havia deixado uma trilha, um enigma para ela resolver, mas a que custo? Ela estava se enredando em algo que mal compreendia, e os três irmãos, por mais que tentassem ser honestos, mantinham uma aura de mistério ao redor deles.— Então, como seguimos daqui? — Elena quebrou o silêncio, tentando não demonstrar o turbilhão de emoções que passava por sua mente.— Sabemos que "Onset" é uma pista — disse Mateo, pensativo. — Mas precisamos entender o que ele quis dizer com isso. Pode ser um lugar, um evento, ou algo que está prestes a acontecer. Temos que buscar mais pistas nas outras partes da carta.Felipo, que tinha se concentrado na carta, levantou o olhar.— Não se trata apenas do que está na carta. Também precisamos considerar o que está fora dela. Papai usava metáforas em seus escritos, e a frase "O som da noite se esconde nas
A adrenalina pulsava nas veias de Elena enquanto ela, Theo, Mateo e Felipo se afastavam rapidamente do prédio. O vento da noite fria chicoteava seu rosto, mas sua mente estava muito ocupada com o pavor crescente para sentir o frio. Eles não tinham tempo a perder. Cada passo parecia ecoar no silêncio da cidade, e a sensação de que seriam alcançados não a deixava.— Temos um carro esperando — sussurrou Theo, sem parar de andar a tirando do mar de profundos pensamentos. — Mas temos que ser rápidos.Elena tentou manter a calma, mas a sensação de que algo estava terrivelmente errado a consumia. Seu telefone ainda pesava em seu bolso, as palavras da misteriosa ligação reverberando em sua mente: "Não confie em ninguém." Ela olhou para os três irmãos à sua frente, e a dúvida começou a surgir em seu coração novamente. Como ela poderia confiar neles, quando todo o seu mundo estava desmoronando em volta?Não saber quem os seguia deixava tudo pior na confusão de pensamentos que Elena estava tendo
O silêncio após o anúncio de Lorenzo parecia congelar o ar. Elena olhou em volta, o coração disparado, enquanto os dois carros pretos bloqueavam qualquer possível rota de fuga. As ruas de Roma, que até então haviam sido um cenário histórico e imponente, um sonho que Elena pensava que seria perfeito, agora pareciam uma prisão sem saída. Mateo, no banco da frente, fechou os olhos por um breve momento, claramente frustrado com a situação. Theo ao lado de Elena, permaneceu em alerta, com os olhos fixos nos carros à frente. Felipo, que até então parecia o mais calmo, estava com os punhos cerrados, pronto para o que viesse.— Não podemos ficar aqui — disse Mateo, com a voz dura, quebrando o silêncio. — Eles não vão hesitar em nos arrastar para fora e acabar com isso.Lorenzo assentiu. — Não temos escolha a não ser lutar. Vou tirar vocês daqui, mas será complicado.Antes que Lorenzo pudesse continuar, as portas dos dois carros pretos se abriram simultaneamente. Vários homens, todos vestind