— Ah, Hanna, pensando aqui , a sua amiga Ivy é uma criatura impossível! Ela sempre se interessa por todos os cavalheiros que cruzam o nosso caminho. Uma verdadeira víbora! — Sophie disse, com um tom de brincadeira, mas com um olhar preocupado.
A verdade era que Ivy tinha um comportamento inusitado para a época. Conheci-a através do meu irmão, Ryan. Ela havia estado com ele, mas logo deixou-o de lado, envolvida com outros cavalheiros, sem se prender a ninguém. Quando Ivy se ofereceu para dividir a residência comigo, eu aceitei com certo receio, mas sabia que não teria outra escolha, pois a ajuda era necessária para lidar com as despesas. Viver em uma cidade pequena como Porto do Vale, onde nasci, não oferecia muitas oportunidades para uma moça como eu, que desejava se formar em uma disciplina prática, voltada para a administração de recursos, incluindo o estudo de economia doméstica e gestão de contas de família. A única instituição de ensino mais próxima era a Academia de Lincoln, onde tanto damas quanto cavalheiros se formavam para seguir carreiras de tutoria ou educação. O curso que eu fazia envolvia, entre outras matérias, o aprendizado de como administrar as finanças de uma casa e equilibrar orçamentos, uma habilidade essencial para qualquer pessoa que desejasse uma vida mais independente e bem organizada. Assim, a oferta de Ivy para dividirmos uma casa de campo na cidade de Lincoln foi um alívio. Com as escolas na cidade já bastante concorridas, a possibilidade de encontrar um lugar para viver ali se mostrava cada vez mais difícil. As famílias das senhoras e dos cavalheiros que frequentavam a academia também passavam por desafios semelhantes. A ideia de dividir uma residência parecia ser a solução prática para que nós duas pudéssemos continuar nossos estudos sem o fardo de depender de nossos pais ou tutores para as despesas. A verdade era que Sophie não gostava nada de Ivy, e eu sabia disso. Elas tinham uma história complicada, e, mesmo sem querer, isso refletia nas nossas saídas. Ivy sempre foi muito impulsiva, e seus flertes com os rapazes não tinham limites, o que a fazia ser vista por muitas pessoas como fútil e volúvel. Para Sophie, que valorizava a amizade e a lealdade, esse comportamento a incomodava profundamente. Eu mesma, embora não tenha gostado das atitudes de Ivy desde o início, fui mais cautelosa. Nunca consegui confiar nela completamente, sabia que a presença dela no meu círculo de amigos nunca seria fácil. Ela sempre agia de forma irreverente, como se não houvesse regras, o que fazia com que eu me sentisse desconfortável, especialmente quando ela se aproximava dos mesmos rapazes que eu começava a me interessar. Como se isso não fosse o suficiente, era óbvio que Ivy tinha um efeito peculiar sobre Sophie: sua natureza despreocupada e um tanto egoísta a fazia se distanciar ainda mais de Ivy, o que tornava nossas interações ainda mais tensas. Apesar de toda a animosidade que Sophie nutria em relação a Ivy, algo me dizia que, mesmo contra sua vontade, ela aceitaria ir ao chá com ela e comigo. Talvez fosse por conta da nossa amizade de longa data ou por não querer me deixar enfrentar aquela situação sozinha. Sophie sempre demonstrou um cuidado sincero por mim, e, apesar de sua antipatia por Ivy, sabia que ela jamais me deixaria em apuros, especialmente quando se tratava de algo que, no fundo, eu mesma não sabia bem o que esperar. Embora Sophie tivesse aceitado ir ao chá, eu sabia que a tarde com Ivy não seria tão simples quanto um agradável encontro social. As duas tinham suas diferenças, e a tensão entre elas, embora disfarçada de brincadeiras, era palpável. Mas, por agora, o que importava era que tínhamos, ao menos, a promessa de uma tarde de risadas e histórias divertidas. Não importava que o chá se tornasse mais uma batalha de olhares e risos disfarçados. Com Sophie ao meu lado, eu sabia que a diversão seria garantida, mesmo com as inseguranças que, por um momento, se escondiam atrás de um sorriso. Aos poucos, fui percebendo o tipo de pessoa que Ivy realmente era. Sempre em busca de diversão sem compromisso, ela sabia como conquistar a atenção dos homens. Ivy era linda, alta, com cabelos longos e dourados, olhos verdes que pareciam penetrar a alma, e uma atitude descontraída que fazia os rapazes suspirarem. No entanto, suas atitudes começaram a me incomodar, especialmente quando ela se aproximava dos cavalheiros que eu começava a conhecer. Eu sabia que ela não tinha intenções sérias com eles, mas, mesmo assim, havia algo na forma como ela se aproximava que me fazia revirar os olhos. — Sophie, vamos aproveitar! Vamos nos divertir sem pensar em nenhum cavalheiro! Só por hoje, sem preocupação com o futuro. Vai ser ótimo, confie no meu mapa astral! — Eu sorri, jogando minha fé no poder dos astros, como se isso fosse realmente mudar a nossa noite. — Está bem, está bem. Só porque você me pediu, e porque você sempre tem esses mantras místicos para convencer as pessoas! Não consigo dizer não para você. — Sophie fez uma careta engraçada, como se estivesse sucumbindo ao poder dos astros e das minhas teorias do além. — Isso mesmo, confia nas estrelas! Elas nunca falham! — Brinquei, com um sorriso travesso, sabendo que ela não conseguiria resistir. Se eu dissesse que a Lua estava favorável para a diversão, ela provavelmente me seguiria até o fim do mundo. A verdade é que, com toda a minha superstição e crenças místicas, eu realmente acreditava que a noite poderia ser melhor com um pouco de boa energia e pensamento positivo. E se isso significava convencer Sophie a se juntar à diversão, então eu estava disposta a usar todos os truques astrológicos ao meu alcance. Hanna e Sophie chegaram ao escurecer, entrando na casa silenciosa. Subiram as escadas e encontraram Ivy no quarto, ainda com bobs no cabelo e máscara de argila no rosto, ajustando nervosamente os babados de seu vestido. Hanna não conseguiu segurar uma risada ao vê-la naquela situação, enquanto Sophie cruzou os braços, claramente tentando não comentar algo provocador. Hanna: (rindo) "Ivy, essa é a sua versão de ‘preparada para o chá’?" Ivy: (bufando, sem se virar) "Algumas de nós têm padrões. Não que todos entendam isso." Sophie: (arqueando a sobrancelha) "Ah, sim, padrões... os cavalheiros certamente estão ansiosos para ver você assim." Hanna: (tentando conter o riso) "Por favor, parem. Ivy, você está adorável... de um jeito único." Ivy lançou um olhar severo para Hanna pelo espelho, enquanto Sophie apenas deu um meio sorriso, se divertindo com a situação. Após o banho, subimos para nossos quartos para nos arrumarmos. A preparação para uma noite social era sempre um ritual divertido e cheio de pequenos caprichos. Enquanto eu me ajeitava em frente ao espelho de moldura dourada, Sophie já estava experimentando seus acessórios, como luvas de cetim e uma tiara de pérolas que realçava seus cachos negros bem modelados. — Hanna, espero que você tenha tirado aquele pó de arroz decente da gaveta. O último que você comprou parecia mais um talco de bebê. — Sophie brincou, enquanto ajeitava os grampos no coque elaborado que moldava perfeitamente seu rosto. — Oh, que exigente! Vou te mostrar como ele dá um brilho natural. — Respondi com uma risada, tentando conter a ansiedade enquanto me concentrava em ajustar a cintura do meu vestido azul de seda. Ivy entrou no quarto, impecável como sempre, vestindo um traje de cetim vermelho com mangas bufantes e um corpete decorado com rendas e pequenas flores bordadas. Seus cabelos dourados estavam cuidadosamente trançados, com algumas mechas soltas adornadas por um pente de prata. — Você está deslumbrante, Ivy. — Admiti, porque, mesmo com nossa relação conturbada, eu não podia negar sua beleza. — Você não acha que é exagero para um chá social? — Sophie questionou, ajustando sua fita de veludo ao redor do pescoço. — Querida, não há exagero quando o objetivo é ser notada. — Ivy respondeu com um sorriso confiante, lançando um olhar rápido para Sophie. Já vestida, optei por um vestido lilás com mangas de renda delicada, que deixava meus ombros cobertos, mas destacava minha postura. Amarrei meu cabelo em um coque baixo, com pequenas flores de tecido presas estrategicamente. Era simples, mas elegante, o suficiente para uma jovem como eu que preferia não chamar muita atenção. Depois de prontas, nos olhamos no espelho de corpo inteiro no quarto. — Você está divina, Hanna. — Sophie comentou, enquanto ajustava as dobras da saia de seu vestido em um tom de esmeralda que realçava seus olhos escuros. — E você parece uma princesa! — Respondi, admirando-a com sinceridade. Ivy sorriu ao fundo, observando-nos como se fosse a matriarca de um grupo que ela considerava indispensável. — Estamos prontas? — Ivy perguntou, pegando sua pequena bolsa de mão de couro e ajustando suas luvas brancas. — Sim. — Respondi, enquanto Sophie e eu nos entreolhávamos, já prevendo que a noite seria memorável, de uma forma ou de outra.Ivy, como sempre, estava determinada a transformar a noite em um evento cheio de emoção e, como ela dizia com um sorriso travesso, "aventuras que desafiariam as convenções". Eu, por outro lado, só queria desfrutar de uma noite tranquila de chá e boas risadas, longe de complicações.Chegamos à sala de chá, um lugar frequentado por jovens damas e cavalheiros da cidade, onde conversas educadas e música de salão preenchiam o ambiente. As cadeiras estofadas e as porcelanas finas contrastavam com a agitação que eu sabia que Ivy carregava em seu coração.— Três xícaras de chá de jasmim, por favor. — Ivy pediu, dirigindo um sorriso encantador ao garçom, um jovem de aparência respeitável.— Meninas, lembrem-se, esta deve ser uma noite tranquila. Nada de aventuras hoje. — Sophie disse com um olhar sério, mas sempre gentil.— Oh, não se preocupe, Sophie. Estamos aqui para relaxar e desfrutar de um bom chá. — Respondi, tentando alinhar minha disposição com a dela.No entanto, Ivy parecia inquieta
Aquela voz grave e profunda me fez estremecer da cabeça aos pés. Olhei lentamente para o audaz cavalheiro à minha frente, que parecia estar convencido demais, acusando-me de estar procurando por ele? Ora, na verdade, estava, mas ele não deveria ter a audácia de perceber isso.Quando meus olhos se encontraram com os dele, quase duvidei de meus próprios sentidos.— Senhor Hyun Choi?— Olá outra vez, senhorita desastrada.Que impertinente! Ele estava a me seguir? Seria o destino que o colocava em meu caminho? Não sabia, mas uma vontade repentina de me levantar e fugir dele tomou conta de mim. Contudo, a quantidade de licor em meu sistema só me fez soltar uma gargalhada diante do "Oláoutra vez , senhorita desastrada". Dei-lhe um leve empurrão no ombro e, pela primeira vez, vi seu sorriso completo, tão encantador, tão perfeito... Ah, licor.Ele ficou ali, observando-me com um olhar travesso, mordendo o lábio. De repente, tive a irresistível vontade de morder aquele lábio. Será que o licor
— Ora, Ivy, o que está a fazer? — disse eu, encarando-a enquanto ela sorria com aquele ar travesso.— Sua atrevida, já está na hora de regressarmos a casa!Ela tomou minha mão e começou a puxar-me sem cerimônia. Olhei para trás e vi o senhor Hyun permanecendo imóvel, fitando-me com uma expressão impossível de decifrar.Quem Ivy pensa que é para interromper um momento tão mágico, tão intenso, tão maravilhoso? Agora, sinto um aperto no peito, quase como se fosse chorar. Céus, não devo estar em meu juízo perfeito!— Amiga, diga-me que estou a delirar! Você beijou o senhor Hyun! — exclamou Sophie, visivelmente escandalizada com a cena que acabara de presenciar.Eu apenas esbocei um sorriso débil, ainda sentindo os efeitos do vinho que havíamos tomado. Contudo, no fundo, eu queria chorar. Fiz um pequeno bico, olhando para elas com ar de desalento.— Perdoe-me, minha querida. — disse Sophie, ajeitando a luva de renda como quem tenta disfarçar a situação. — Desejava que nos divertíssemos mai
Salão de Reuniões do Lorde HarringtonEntramos eu e Sophie, claramente ansiosa, retorcendo o lenço entre os dedos, acompanhadas de outros três jovens de distintas salas , exceto o Gregory que já estava lá. O ambiente era austero, decorado com cortinas de veludo verde e um imponente relógio de pêndulo que marcava cada segundo de nossa expectativa.— Senhores, por favor, tomem seus lugares. — anunciou o mordomo com voz firme e postura impecável, indicando as cadeiras dispostas ao redor da longa mesa de mogno.Ele abriu um pergaminho e começou a leitura dos nomes:— Heitor Lee.— Sophie Will.— Claire Leblanc.— Gregory Rodrigues.— Hanna Young.Meu coração acelerou quando ouvi meu nome, e Sophie apertou minha mão por baixo da mesa.O Lorde Harrington, um homem de meia-idade com cabelos grisalhos perfeitamente alinhados, se levantou com uma postura imponente. Sua voz ecoou pelo salão:— Meus parabéns aos presentes. Vocês foram cuidadosamente selecionados pelo prestigiado senhor Hyun Cho
A Sophie veio me buscar e, nossa, como ela estava linda.— Você veio para causar uma boa impressão, não é? — comentei, analisando-a da cabeça aos pés.— Nem me fale. E você? Está deslumbrante como sempre.Sorri, olhando rapidamente para mim mesma. Eu usava um vestido preto de corte simples, mas elegante, com detalhes em renda que valorizavam a cintura. Havia combinado com um sapato de salto baixo, pois sabia que o dia seria longo. Hoje começaríamos uma nova etapa, e cada um de nós seria alocado em uma área específica dentro da Companhia Choi.O caminho até lá foi repleto de conversas animadas com Sophie. Mas, à medida que nos aproximávamos, meu coração começou a disparar — não apenas pela importância do momento, mas pela expectativa de reencontrar o senhor Hyun.Chegamos à entrada principal, e a grandiosidade da Companhia Choi já era evidente. As paredes de pedra cinza estavam impecáveis, e os vitrais coloridos davam ao edifício um ar majestoso. Uma senhora de postura impecável, vesti
Ele me apresentou formalmente aos meus colegas de trabalho, incluindo meu líder direto, o jovem e cortês senhor Gustavo. Com seu tom impecavelmente profissional, o senhor Hyun descreveu as responsabilidades que eu teria como estagiária e detalhou os processos com uma clareza que demonstrava domínio absoluto de tudo o que ocorria ali. Enquanto caminhávamos pela imponente sala de marketing, os sons de canetas rabiscando e folhas sendo folheadas ecoavam suavemente, complementando a atmosfera dinâmica do ambiente onde eu começaria a trabalhar.Quando concluímos o tour, ele pegou delicadamente minha mão enluvada, seus dedos exercendo uma pressão sutil, mas firme. Seu olhar, intenso e profundo, encontrou o meu, fazendo meu coração disparar com um misto de nervosismo e curiosidade. Era como se, naquele momento, apenas nós dois estivéssemos ali.— Agora é com você, Gustavo.A voz dele soou autoritária e precisa, como se não houvesse espaço para réplica. Sem sequer olhar para o senhor Gustavo,
Ao sair da empresa, notei que os corredores e o pátio estavam quase desertos. A maioria dos funcionários já havia partido, e o silêncio da noite começava a tomar conta do ambiente. O vento fresco da noite sussurrava através das árvores, balançando suavemente as folhas sob a luz amarelada dos postes de gás. Por um momento, hesitei ao passar pela entrada principal, dando uma última olhada em direção ao gabinete do senhor Hyun. Mas ele não estava mais lá.Respirei fundo, ajustando o tecido do meu vestido antes de seguir em direção à carruagem que me aguardava. A carruagem me levaria ao centro da cidade, onde eu buscaria minha montaria na oficina. O senhor Wicks, o responsável pela manutenção do meu cavalo, sempre fazia questão de manter tudo em perfeito estado. Confiante de que tudo estaria em ordem, minha preocupação diminuiu, e caminhei em direção à saída. Contudo, antes que eu pudesse seguir adiante, um grito ecoou pelo pátio quase vazio, fazendo-me sobressaltar.- Hanna !Virei-me ra
Cheguei em casa mais cedo do que o esperado, mesmo após uma breve passagem pela oficina. Ao atravessar a rua e enfim chegar em casa, sentia uma mistura de alívio e cansaço. O dia fora exaustivo, mas, ao menos, o primeiro passo em minha nova posição estava dado. Ainda assim, algo me incomodava: precisava contar a Ivy sobre meu novo trabalho e como isso alteraria nossa rotina. Na confeitaria onde trabalhava antes, meus horários eram mais flexíveis, mas agora, na Companhia Choi, precisaria de ordem e silêncio para estudar os materiais que o senhor Gustavo havia me recomendado , mas pelo menos chegaria mais cedo que quando estava trabalhando meio período no café.Assim que destranquei a porta e entrei na sala, fui recebida por uma cena tão inesperada que deixei cair minha bolsa no chão e precisei cobrir os olhos.— Ahhhh! Mas o que está acontecendo aqui?! — exclamei, em estado de choque.À minha frente, Ivy estava completamente nua, com o cabelo desgrenhado e as bochechas coradas, enquant