Carolina Smith
Algumas pessoas dizem que a vida pode mudar de um dia para o outro. Eu costumava achar isso um exagero... até aquele dia. Tudo começou como uma manhã comum, a mesma rotina de sempre. Acordei com o som irritante do alarme, tomei um café apressado e saí para o trabalho. Nada fora do normal. Até que foi. Assim que pisei no escritório, o clima parecia estranho, pesado. Algo me dizia que aquele não seria um dia fácil. Passei direto pela recepção, tentando ignorar a sensação de que algo estava prestes a desmoronar. Não demorou muito para que eu fosse chamada à sala do gerente. Quando ouvi meu nome sendo chamado, meu estômago se revirou. — Carolina, pode entrar. — disse ele, com um sorriso tenso. A porta se fechou atrás de mim, e eu soube. Antes mesmo de ele começar a falar, eu sabia o que viria. Desculpas vagas, explicações sobre a economia e cortes orçamentários. Palavras que, por mais que tentassem suavizar o golpe, não conseguiam esconder a verdade: eu estava demitida. Saí do escritório meio anestesiada, tentando absorver o impacto. Desempregada. O que eu faria agora? Fui até a minha mesa e comecei a organizar minhas coisas, as pessoas vinham até mim em busca de passar um certo conforto, mas no momento eu só conseguia pensar no que faria da minha vida agora. Peguei a caixa com minhas coisas e me despedi de todos, ouvir frases como “Você vai conseguir algo melhor”, “Estou torcendo por você”. Será que vou conseguir algo melhor mesmo? Enquanto caminhava pelas ruas, sentindo o vento frio bater no rosto, a única coisa que pensei foi em Daniel. Eu precisava vê-lo. Ele sempre conseguia me acalmar, me fazer sentir que tudo ficaria bem. Ou, pelo menos, era assim que costumava ser. Cheguei ao apartamento dele com a esperança de que aquele dia não pudesse piorar, de que ele me daria o conforto que eu precisava. Mas o olhar que ele me deu quando abri a porta foi diferente, distante. Algo estava errado. — Carolina, precisamos conversar. Essas palavras. Tão clichês, mas carregadas de um peso que eu não estava pronta para enfrentar. Sentamos no sofá, e, enquanto ele falava sobre como as coisas entre nós não estavam mais funcionando, eu mal conseguia ouvir. Era como se tudo estivesse acontecendo em câmera lenta. Ele continuou, falando sobre precisar de espaço, sobre como éramos diferentes agora. E eu só pensava em como meu mundo estava desmoronando, peça por peça, sem que eu tivesse controle de nada. Quando ele terminou, eu não consegui reagir. Apenas me levantei, dei um sorriso forçado e saí. Não havia o que dizer. E no fundo, talvez ele estivesse certo. Nossa relação já estava apagada há meses, e só agora eu me dava conta disso. Voltei para casa sem saber muito bem o que pensar. Queria me jogar no sofá, esquecer de tudo por alguns minutos e deixar o tempo passar. Mas, ao chegar na porta do meu apartamento, encontrei um envelope preso na maçaneta. Um frio percorreu minha espinha enquanto o abria. Aviso de despejo. Claro! Porque esse dia ainda não tinha sido ruim o suficiente… Dois meses de aluguel atrasado e, agora, eu tinha uma semana para sair. Não havia mais como ignorar a situação. O emprego que eu mal conseguia manter, o relacionamento que eu insistia em arrastar... tudo estava acabando de uma vez só. Entrei no apartamento, que de repente parecia muito mais vazio, me joguei no sofá do pequeno apartamento. A carta de despejo estava ali, jogada na mesa de centro, como um lembrete cruel de que minha vida estava completamente fora de controle. Olhei para o teto, tentando imaginar como consertaria tudo, mas minha mente estava em branco. Eu estava prestes a pegar o celular para me distrair, quando ele começou a tocar. O nome na tela não era familiar. Provavelmente, mais uma dessas ligações que eu costumava ignorar, mas algo me fez atender. — Alô? — minha voz saiu mais fraca do que eu esperava. — Boa tarde, Carolina Smith? Falo da agência de intercâmbio Alliance. Você tem um momento para conversar? Por um segundo, fiquei em silêncio, sem saber como responder. Intercâmbio? O que eles querem comigo? — Sim, sou eu... Pode falar. — Estamos entrando em contato para informá-la que você foi selecionada para uma bolsa de estudos em Paris. O curso é de gastronomia, e a vaga inclui todos os custos pagos, inclusive a acomodação no campus da faculdade, durante três meses. Minha respiração ficou presa na garganta. Paris? Era algum tipo de brincadeira? — Desculpe, acho que... tem algum engano. — Gaguejei. — Eu não me inscrevi em nenhum programa de intercâmbio recentemente. A mulher do outro lado da linha soltou uma risadinha suave. — Na verdade, você se inscreveu sim, alguns anos atrás. Parece que a bolsa acabou de ser liberada, e, ao revisarmos os arquivos, seu perfil foi selecionado. Temos aqui sua inscrição para um curso de gastronomia, e vemos que mencionou seu sonho de estudar em Paris. Paris. Meu coração disparou. Como eu poderia ter esquecido? Quando era mais jovem, eu vivia falando sobre isso. O sonho de estudar gastronomia na França, de andar pelas ruas de Paris, me perder em cada café, provar cada prato típico. Por anos, esse desejo foi o que me motivou. Fiz cursos, devorei livros de culinária e até aprendi francês por conta própria. Hoje, eu falava a língua com fluência, mas com o tempo, o sonho foi sendo engolido pelas dificuldades da vida. E agora, do nada, essa chance estava bem diante de mim. — Você ainda está aí, Carolina? — Sim, estou! — respondi, me endireitando no sofá. — É só... isso parece bom demais para ser verdade. — Entendo que seja inesperado. Você terá três meses de curso em uma das melhores faculdades de gastronomia de Paris, com tudo pago. A única coisa que precisa fazer é organizar a sua viagem. Nós cuidaremos do restante. Por um segundo, me permiti imaginar. O aroma dos pães quentinhos pelas padarias, o sabor dos vinhos... as luzes da cidade à noite. E, acima de tudo, a chance de recomeçar. Um novo começo, uma oportunidade que eu jamais imaginei que voltaria a ter. — Então... eu não pagaria nada? Nem a moradia? — Nada. A bolsa cobre todas as suas despesas. Você vai morar no campus, que fica bem no centro da cidade. E o curso é intensivo, três meses que podem mudar a sua vida. Três meses. Exatamente o tempo que eu precisava para me afastar do caos que minha vida tinha se tornado e, talvez, encontrar algo novo. Era como se o destino estivesse me oferecendo uma saída, uma chance para recomeçar. Eu sabia que o sonho de estudar gastronomia em Paris sempre esteve lá, quieto, escondido sob as camadas de frustração e das lutas diárias. Desde criança, sonhava em viver aquele mundo. Não só aprender a arte de cozinhar, mas viver a cultura, a tradição, tudo o que Paris tinha a oferecer. De fato, aprendi francês aos poucos, quando ainda era uma adolescente cheia de esperanças. Passei anos praticando e, de tanto estudar, me tornei fluente, esperando que, um dia, essa habilidade me levasse para a França. E agora... agora era real. — Então, Carolina, podemos contar com sua resposta? Olhei em volta. O apartamento vazio. A carta de despejo. O fim do meu relacionamento. Aquele dia havia me tirado tudo, mas talvez fosse porque algo muito maior estava por vir. — Sim! — respondi, sentindo um sorriso tímido se formar em meus lábios. — Eu aceito. — Ótimo! Vamos enviar todos os detalhes por e-mail. Você tem um mês para se organizar. Nos falamos em breve! Desliguei o telefone e fiquei ali, sentada no sofá, segurando o celular com força. Paris. Eu iria para Paris. Finalmente, aquele sonho, o que parecia tão distante, estava ao meu alcance. Deixei a cabeça cair para trás, ainda incrédula. Uma nova vida estava prestes a começar.Carolina Smith No dia seguinte à notícia que mudaria completamente minha vida, a ficha ainda não havia caído por completo. Estava em Paris – não literalmente, mas tão perto que já podia imaginar. Após um dia inteiro de devaneios sobre a cidade que tanto sonhei, sabia que era hora de contar aos meus pais sobre a mudança repentina nos meus planos. Eles mereciam saber.Respirei fundo e disquei o número da minha mãe. Não tinha falado nada sobre o que aconteceu no último dia, então essa seria uma conversa longa.— Oi, filha! Que surpresa boa, como você está? — Minha mãe atendeu com a animação de sempre, sem fazer ideia da bomba que estava prestes a receber.— Oi, mãe. Eu... estou bem agora, mas tenho algumas novidades para te contar. Senta, porque é muita coisa.— Ah, meu Deus, o que houve?Suspirei. — Fui demitida do meu emprego anteontem, terminei com o Daniel e ainda fui despejada do apartamento.Do outro lado da linha, o silêncio foi imediato. Minha mãe, sempre tão prestativa e protet
Carolina Smith Acordei com o sol entrando pela janela, iluminando meu quarto de uma forma que parecia mágica. Era o dia da minha viagem para Paris. O tempo passou tão rápido que mal consegui acreditar que finalmente estava prestes a embarcar. A adrenalina misturada com uma pitada de nervosismo me acompanhou enquanto eu me vestia. Escolhi uma roupa confortável: um jeans leve, uma blusa branca e uma jaqueta de couro que eu sabia que daria um toque europeu ao meu visual.Chegando ao aeroporto, a atmosfera estava repleta de movimentação. O som das malas sendo arrastadas, os anúncios das partidas e chegadas, e o cheiro de café fresco deixavam tudo mais emocionante. Meus pais estavam ao meu lado, com sorrisos nervosos. Eu podia ver o orgulho nos olhos deles, mas também um toque de preocupação.— Mãe, está tudo bem — eu disse, tentando confortá-la. — Eu vou ficar bem.— Eu sei, querida. É só que, você sabe, é uma nova fase, e estamos tão felizes por você — ela me abraçou com força, e eu sen
Louis BeaumontMeus passos ecoavam pelo piso de mármore enquanto eu avançava em direção ao elevador, cada batida dos sapatos refletia o peso que sentia no peito. Ao entrar, me deparei com Alexandre, que estava casualmente encostado em um canto, segurando uma pasta. Ele me olhou de soslaio, os lábios se curvando em um sorriso de provocação.— Que cara é essa? Parece até que caiu da cama essa noite — meu amigo riu, mas o som logo morreu quando cruzei seu olhar. Frio. A tensão entre nós tornou-se palpável.— Se eu fosse você, ficaria quieto até que eu saísse deste elevador — murmurei, a voz carregada de ameaça. Alexandre levantou as mãos em rendição, o sorriso se desvanecendo, como se finalmente tivesse entendido a gravidade do momento.Eu sentia a veia na minha testa latejar, como um tambor que ecoava na minha cabeça, aumentando o desconforto. Meu pai havia me ligado poucos minutos antes, com uma notícia que eu preferia nunca ter recebido. Na próxima semana, ele me anunciaria como o nov
Carolina SmithHoje faz exatamente uma semana desde que cheguei em Paris, e, apesar de todas as mudanças e dos imprevistos que caíram no meu colo, eu estava gostando do rumo que as coisas estavam tomando. A rotina ainda era novidade: manhãs de aulas intensas de gastronomia, tardes no trabalho para garantir minha permanência aqui e, à noite, a chance de caminhar pela cidade como se eu fosse parte dela.Hoje não era diferente, saí da faculdade e fui direto para o restaurante, pronta para mais uma tarde de correria. Assim que cheguei, notei que o ambiente estava mais agitado que o normal. Os chefs conversavam rápido, os garçons entravam e saíam da cozinha em um ritmo frenético, e senti que algo importante estava para acontecer.— Carolina! — chamou minha chefe, Camille, ao me ver.Ela era uma mulher elegante, com uma postura firme, mas um jeito direto e justo de tratar a equipe. Sorri ao me aproximar, mas percebi pela expressão dela que tinha algo a mais ali.— Hoje à noite teremos um gr
Louis Beaumont Não posso dizer que estou entusiasmado para essa festa. Pelo contrário. Esses eventos são uma perda de tempo, mas eles parecem sempre encontrar um motivo para uma celebração. Hoje, a desculpa é “a chegada de um novo líder”. Mal sabem eles que a única coisa que estou assumindo é uma fachada. Eu sei o que está por trás dessa festa e o que esperam de mim. Só que eu não vim aqui para agradar ninguém.Respiro fundo e entro no salão, escondendo o aborrecimento com um sorriso. Cumprimento rostos conhecidos e aperto mãos com o máximo de entusiasmo que consigo fingir. Para a maioria aqui, essa é uma noite de negócios e alianças, mas, para mim, é apenas um jogo de aparências.Enquanto caminho pelo salão, um rosto no meio da multidão me faz parar. Ela está em pé, segurando uma bandeja, e, pela primeira vez na noite, meu sorriso não é falso. Ela é... impressionante. Loira, com um coque elegante, maquiagem sutil e um vestido que parece feito para ela. A postura impecável, mas os ol
Carolina Smith Depois do discurso dele, eu me peguei pensando demais naquilo. O jeito como Louis me olhou... não era só um olhar de quem analisa uma pessoa no meio de uma multidão. Havia algo ali, uma intensidade que fez um friozinho percorrer minha espinha. Confesso que não esperava, e muito menos conseguia entender por que estava me sentindo tão... inquieta.Balancei a cabeça, tentando tirar aquilo da mente. Logo Camille apareceu ao meu lado, com um olhar sério.— Carolina, preciso que vá até a cozinha buscar algumas bandejas de petiscos. Temos várias mesas para servir — disse ela, me apressando.— Claro! Já estou indo.Segui até a cozinha, coloquei as bandejas nas mãos e respirei fundo antes de voltar para o salão. O evento estava em pleno vapor, as pessoas pareciam cada vez mais à vontade, conversando, rindo e enchendo os copos. Fui de mesa em mesa, oferecendo as entradas, e de vez em quando recebia um elogio pela aparência ou um sorriso simpático. Apesar de tudo, o trabalho era
Carolina Smith Sábado de manhã em Paris. Acordei com o sol já brilhando forte lá fora, iluminando o quarto de um jeito que só um dia quente prometia fazer. Depois do evento de ontem, com toda aquela correria e tensão, hoje eu só queria um tempo para mim, passear pela cidade e me sentir realmente aqui, de verdade, como se Paris fosse minha.Levantei-me e fui direto para o banho, sentindo a água morna relaxar meus músculos cansados. Lavei o cabelo com calma, aproveitando o momento de paz e tentando afastar as lembranças da noite passada, principalmente, de certo sorriso cafajeste que insistia em aparecer na minha mente. Saí do banho e me sequei devagar, escolhendo um vestido leve e fresco que combinava perfeitamente com o clima quente lá fora. Era uma peça confortável, solta, com um tom de azul suave que me deixava ainda mais animada para o dia.Coloquei alguns acessórios delicados e deixei o cabelo solto, ainda com aquele aroma refrescante de shampoo. Olhei no espelho e sorri, gostand
Carolina Smith Depois de uma manhã cheia de compras e passeios, caminhamos pelas ruas, aproveitando o charme de Paris e rindo das nossas próprias piadas. O calor estava leve, e o clima perfeito para um almoço em um dos muitos bistrôs da cidade. Jenifer me levou a um restaurante bem famoso, daqueles que tem sempre uma fila de espera e onde as pessoas fazem questão de ser vistas, mas com um toque despretensioso que a tornava ainda mais especial.Quando entramos, o lugar estava elegante e cheio de energia. Jenifer falou animadamente sobre o menu, enquanto eu olhava ao redor, maravilhada. O ambiente era moderno, mas com aquele charme parisiense clássico, e as mesas de fora eram perfeitas para o tipo de dia que estávamos tendo. Foi então que, ao passar pelo salão principal, eu reconheci uma silhueta familiar — Louis.Ele estava em uma mesa no canto, bem no centro do restaurante, com um homem ao seu lado, e um sorriso genuíno no rosto, parecia bem próximo do homem que estava com ele, e ele