Louis Beaumont
Não posso dizer que estou entusiasmado para essa festa. Pelo contrário. Esses eventos são uma perda de tempo, mas eles parecem sempre encontrar um motivo para uma celebração. Hoje, a desculpa é “a chegada de um novo líder”. Mal sabem eles que a única coisa que estou assumindo é uma fachada. Eu sei o que está por trás dessa festa e o que esperam de mim. Só que eu não vim aqui para agradar ninguém. Respiro fundo e entro no salão, escondendo o aborrecimento com um sorriso. Cumprimento rostos conhecidos e aperto mãos com o máximo de entusiasmo que consigo fingir. Para a maioria aqui, essa é uma noite de negócios e alianças, mas, para mim, é apenas um jogo de aparências. Enquanto caminho pelo salão, um rosto no meio da multidão me faz parar. Ela está em pé, segurando uma bandeja, e, pela primeira vez na noite, meu sorriso não é falso. Ela é... impressionante. Loira, com um coque elegante, maquiagem sutil e um vestido que parece feito para ela. A postura impecável, mas os olhos — ah, eles têm uma curiosidade quase inocente, e isso é o que mais me chama a atenção. Ela se move com graça, mas tem algo em sua expressão que mostra que ela não é daqui. Talvez uma novata, ou alguém que não pertence a esse mundo pretensioso. Seja como for, ela parece deslocada, e ao mesmo tempo absolutamente cativante. Alta, esguia, com curvas discretas, mas bem definidas. E aquele rosto... um equilíbrio perfeito entre delicadeza e força. Não deveria estar dando tanta atenção, mas não consigo evitar. Olho para ela de novo, e ela desvia o olhar rapidamente, talvez percebendo que a estou encarando. A expressão dela não demonstra interesse ou vaidade como tantas outras que conheço. Pelo contrário, parece mais um leve desconforto, algo que me faz sorrir de verdade. Dou mais alguns passos, mas mantenho minha visão periférica atenta a cada movimento dela. Não sei o que me incomoda mais, se é o fato de que ela parece não ter ideia do efeito que causa, ou se é a minha reação inesperada a ela. Algo em sua presença me intriga de uma forma que eu não esperava sentir esta noite, ainda mais em uma festa com tantos objetivos implícitos. Enquanto cumprimento outro convidado que se aproxima, minha mente continua dividida entre manter o papel que esperam de mim e a vontade incontrolável de descobrir mais sobre a garçonete loira que parece tão fora de lugar quanto eu me sinto. Obedecendo ao protocolo da noite, faço meu caminho até a mesa dos meus pais, tentando manter o ar casual. Para eles, essa festa é mais do que um simples evento social; é o início de algo muito maior. Meu pai já não disfarça a expectativa, e o olhar orgulhoso que me lança me faz lembrar que esse é o “legado” que tanto planejou. Eu deveria me sentir honrado, mas tudo o que sinto é um peso nos ombros. Sentado ao lado dele está Ryan, meu amigo de longa data e um dos poucos em quem realmente confio. Ele levanta o copo de uísque para mim e solta um sorriso malicioso. — Cara, você viu as mulheres hoje? — ele comenta com um brilho de satisfação nos olhos. — A organização caprichou. Eu rio, acenando de leve com a cabeça. — Vi, sim. Inclusive, vi uma garçonete mais cedo... Loira, vestido simples, mas bem elegante. Ryan ergue uma sobrancelha, visivelmente interessado. — Interessante. Não é comum você reparar em alguém daqui, ainda mais em uma garçonete. Dou de ombros, mantendo a expressão relaxada. — Ela tem algo... diferente. Não sei explicar, mas foi impossível não notar. Ryan me observa por um momento, provavelmente surpreso pela forma como mencionei a garota. Sou conhecido por apreciar a companhia feminina, mas raramente me refiro a alguém de forma que demonstre real interesse. Antes que ele possa responder, o anfitrião da noite — e também meu pai — é chamado ao palco. Ele se levanta com calma, ajeitando o terno com uma elegância calculada. É impressionante como ele consegue assumir o papel de empresário sério e honesto na frente de todos, enquanto esconde a verdadeira face do nosso negócio. Ele segura o microfone e lança um olhar confiante para os convidados. — Boa noite, senhoras e senhores — começa ele, com uma voz grave e carismática. — Hoje é uma noite muito especial para nossa família e para todos os nossos parceiros. Esta festa marca o início de uma nova era, uma era de prosperidade e alianças fortes. Ele continua o discurso, mas, para os ouvidos atentos, fica claro que há mais nas palavras dele do que aparenta. Quem conhece os códigos da máfia capta os significados escondidos em cada frase, uma linguagem construída ao longo dos anos, para que, em eventos como esse, tudo soe perfeitamente legal, enquanto os avisos e promessas são distribuídos disfarçadamente. — Agradeço a cada um de vocês por sua lealdade e apoio durante todos esses anos. Nosso sucesso não seria possível sem essas relações, construídas com confiança e, é claro, com o respeito que todos aqui conhecem e valorizam. Ele faz uma pausa dramática, seu olhar passa pela multidão com uma confiança fria. — E, hoje, estou particularmente feliz, pois esta noite marca o momento em que finalmente poderei passar o bastão para a próxima geração. Os convidados aplaudem com entusiasmo, e eu percebo olhares lançados na minha direção. Ryan b**e de leve no meu ombro, me provocando. — Parece que o show é seu, irmão. Meu pai continua, agora com um sorriso que mistura satisfação e alívio. — Eu esperei muito tempo por esse momento, para poder confiar tudo o que construí ao meu filho. A partir de hoje, ele será o líder que nossa família precisa. As palmas ecoam pelo salão, mas, enquanto absorvo o peso das palavras do meu pai, sinto que não posso evitar um conflito interno. Mesmo sabendo que esse era o caminho planejado para mim desde que nasci, a sensação de estar sendo empurrado para dentro de uma armadilha nunca deixa de me incomodar. Agora, com todos os olhos voltados para mim, levanto-me e faço um leve aceno, mantendo o rosto sério. Tento ignorar as expectativas pesadas que repousam em cada olhar fixo na minha direção. Com um último olhar de aprovação, meu pai faz um gesto para que eu me junte a ele no palco. Sinto um leve peso nas pernas enquanto me levanto. Não era o tipo de atenção que eu gostava, mas isso fazia parte do jogo. Com passos firmes, subo os poucos degraus até o palco, o brilho das luzes me cegando parcialmente. Faço uma pausa, tentando reunir um pouco de ânimo para as palavras que todos esperam ouvir de mim. Seguro o microfone e olho para a multidão. Sorrio, mas é um sorriso vazio, um que só aparece por obrigação, não por escolha. — Boa noite a todos — começo, mantendo o tom controlado. — Estou honrado por cada um de vocês estar aqui hoje. Meu pai e eu sabemos o valor de cada relação, cada parceria. Sem vocês, nada disso seria possível. Minha voz soa firme, mas, internamente, só sinto uma vontade de descer dali e desaparecer. Mais uma vez, meu olhar percorre a multidão, uma tentativa de encontrar algum ponto de foco que me faça suportar o peso das expectativas. E então eu a vejo. Entre tantos rostos, um par de olhos me chama a atenção, uma expressão curiosa e calma que parece diferente do resto. É ela. A garçonete de antes, a loira que já havia captado meu interesse. Seu olhar é atento, mas sereno, como se ela estivesse me observando sem as mesmas intenções e julgamentos dos outros. Por um momento, tudo parece em silêncio ao nosso redor. Não sei como, mas o contato visual com ela faz com que eu me sinta um pouco mais... humano. Como se o peso nas minhas costas desaparecesse. Ela não desvia o olhar, e eu também não consigo. Aqueles olhos curiosos, quase inocentes, me fazem sentir como se estivesse vendo algo verdadeiro. E nesse instante, o desconforto se dissolve, a tensão do ambiente perde o sentido, e me pego sorrindo, um sorriso genuíno, que raramente dou em eventos como esse. Percebendo o silêncio, volto ao meu discurso, tentando disfarçar a pausa. — Hoje, tenho a responsabilidade de continuar o que meu pai construiu, e prometo a vocês que farei isso com o mesmo respeito e dedicação que ele sempre manteve. A multidão aplaude, mas meus olhos ainda estão fixos nela, buscando entender por que, por um breve instante, ela foi capaz de me fazer sentir diferente. Termino o discurso com um aceno e desço do palco, sentindo que algo naquela noite mudou.Carolina Smith Depois do discurso dele, eu me peguei pensando demais naquilo. O jeito como Louis me olhou... não era só um olhar de quem analisa uma pessoa no meio de uma multidão. Havia algo ali, uma intensidade que fez um friozinho percorrer minha espinha. Confesso que não esperava, e muito menos conseguia entender por que estava me sentindo tão... inquieta.Balancei a cabeça, tentando tirar aquilo da mente. Logo Camille apareceu ao meu lado, com um olhar sério.— Carolina, preciso que vá até a cozinha buscar algumas bandejas de petiscos. Temos várias mesas para servir — disse ela, me apressando.— Claro! Já estou indo.Segui até a cozinha, coloquei as bandejas nas mãos e respirei fundo antes de voltar para o salão. O evento estava em pleno vapor, as pessoas pareciam cada vez mais à vontade, conversando, rindo e enchendo os copos. Fui de mesa em mesa, oferecendo as entradas, e de vez em quando recebia um elogio pela aparência ou um sorriso simpático. Apesar de tudo, o trabalho era
Carolina Smith Sábado de manhã em Paris. Acordei com o sol já brilhando forte lá fora, iluminando o quarto de um jeito que só um dia quente prometia fazer. Depois do evento de ontem, com toda aquela correria e tensão, hoje eu só queria um tempo para mim, passear pela cidade e me sentir realmente aqui, de verdade, como se Paris fosse minha.Levantei-me e fui direto para o banho, sentindo a água morna relaxar meus músculos cansados. Lavei o cabelo com calma, aproveitando o momento de paz e tentando afastar as lembranças da noite passada, principalmente, de certo sorriso cafajeste que insistia em aparecer na minha mente. Saí do banho e me sequei devagar, escolhendo um vestido leve e fresco que combinava perfeitamente com o clima quente lá fora. Era uma peça confortável, solta, com um tom de azul suave que me deixava ainda mais animada para o dia.Coloquei alguns acessórios delicados e deixei o cabelo solto, ainda com aquele aroma refrescante de shampoo. Olhei no espelho e sorri, gostand
Carolina Smith Depois de uma manhã cheia de compras e passeios, caminhamos pelas ruas, aproveitando o charme de Paris e rindo das nossas próprias piadas. O calor estava leve, e o clima perfeito para um almoço em um dos muitos bistrôs da cidade. Jenifer me levou a um restaurante bem famoso, daqueles que tem sempre uma fila de espera e onde as pessoas fazem questão de ser vistas, mas com um toque despretensioso que a tornava ainda mais especial.Quando entramos, o lugar estava elegante e cheio de energia. Jenifer falou animadamente sobre o menu, enquanto eu olhava ao redor, maravilhada. O ambiente era moderno, mas com aquele charme parisiense clássico, e as mesas de fora eram perfeitas para o tipo de dia que estávamos tendo. Foi então que, ao passar pelo salão principal, eu reconheci uma silhueta familiar — Louis.Ele estava em uma mesa no canto, bem no centro do restaurante, com um homem ao seu lado, e um sorriso genuíno no rosto, parecia bem próximo do homem que estava com ele, e ele
Carolina SmithA animação estava estampada no rosto de Jenifer enquanto ela vasculhava o guarda-roupa, tentando escolher um vestido que combinasse com o tema do luau. Já eu, sentada na cama dela com uma toalha enrolada nos cabelos ainda molhados do banho, não conseguia evitar um sorriso. Era bom sentir isso de novo. Amizade, cumplicidade. Fazia tempo que eu não tinha uma amiga tão próxima, e Jenifer parecia determinada a compensar os anos de distância.— O que acha desse? — perguntou ela, segurando um vestido leve, branco, com detalhes em renda.— Perfeito para você — respondi. — É fresco e combina com o tema da festa.Jenifer sorriu satisfeita e o colocou sobre a cama antes de voltar para a busca, agora em uma pilha de acessórios. Enquanto ela se concentrava, eu me levantei para abrir a bolsa que havia trazido e tirei meu vestido. Era simples, mas bonito: em um tom de azul-claro, com alças finas e o comprimento ideal para uma festa descontraída. Ao prová-lo, percebi que havia feito a
Carolina Smith Depois de dançar por um bom tempo e terminar minha bebida, percebi que precisava ir ao banheiro. Avisei Jenifer, que acenou distraída, entretida demais conversando com alguém que havia acabado de conhecer.O caminho até o banheiro era um pouco afastado, e as luzes mais baixas da área davam um ar mais reservado ao ambiente. Estava quase alcançando a porta quando senti uma presença atrás de mim. Antes que eu pudesse me virar completamente, ouvi uma voz baixa e rouca que já reconhecia:— Fugindo da festa ou só precisando de um momento longe de toda aquela agitação?Eu me virei, e lá estava ele. Louis Beaumont, com aquele sorriso meio inclinado que fazia meu estômago dar voltas. Ele estava próximo, talvez mais perto do que o necessário, e seu olhar, como sempre, parecia me ler completamente.— Acho que não devo explicações para você, devo? — retruquei, tentando soar confiante, mas sentindo minha voz trair a leve ansiedade que a proximidade dele causava.Ele arqueou uma sob
Carolina Smith O sol já iluminava o apartamento de Jenifer quando acordei, a cabeça ainda um pouco pesada da noite anterior, mas nada que uma xícara de café não resolvesse. Espreguicei-me e me levantei, indo até a cozinha. O cheiro de café recém-passado tomou conta do ambiente, e Jenifer estava lá, com o cabelo bagunçado e uma camiseta longa, mexendo distraidamente em uma panela. — Bom dia, festeira! — ela brincou, virando-se para mim com um sorriso. — Bom dia — respondi, sentando-me em uma das cadeiras ao redor da mesa. — Parece que você acordou animada. Ela deu uma risadinha enquanto colocava uma xícara de café na minha frente. — Eu diria o mesmo de você, depois da noite que teve. Senti minhas bochechas ficarem quentes e peguei a xícara para disfarçar. Jenifer sentou-se à minha frente, claramente esperando que eu contasse tudo. — Tá, tá bom — comecei, suspirando. — Eu meio que beijei Louis de novo. Os olhos dela se arregalaram, mas não parecia surpresa, apenas curiosa. — De
Carolina Smith Depois de três horas intensas de aula de confeitaria, saí da escola com as mãos ainda cheirando a baunilha e açúcar. Peguei o metrô em direção ao bistrô onde trabalho, na esperança de que o ritmo acelerado do restaurante me ajudasse a desligar um pouco a mente. As últimas noites tinham sido um turbilhão de emoções e dúvidas, mas eu estava decidida a focar no que realmente importava: meu curso, meu trabalho e meu sonho de me tornar chef. Cheguei ao bistrô com tempo suficiente para um rápido almoço antes de começar o turno. Enquanto mordiscava um pedaço de quiche, me forcei a não pensar nele. Louis. A lembrança dos beijos na festa ainda queimava minha pele, mas as palavras de Jenifer ecoavam como um alerta. Ele era o tipo de homem que eu sempre prometi evitar, e estava disposta a manter minha promessa. Coloquei o avental, amarrei o cabelo e comecei meu turno. O restaurante estava movimentado como sempre, cheio de turistas, estudantes e locais. Entre pedidos apressados
Carolina SmithDepois de uma semana evitando qualquer pensamento sobre Louis, comecei a acreditar que, talvez, o universo tivesse finalmente decidido me dar um pouco de paz. Minha rotina estava cada vez mais focada no curso e nos pequenos momentos de distração que eu conseguia encontrar, como andar pelas ruas de Paris ou explorar as lojas próximas ao meu alojamento.Naquela tarde, decidi entrar em uma pequena loja de antiguidades. As vitrines exibiam peças únicas, e eu não resisti ao charme do lugar. O sino da porta tocou suavemente quando entrei, e um cheiro leve de madeira antiga e livros velhos tomou conta do ambiente.Passei pelas prateleiras, admirando os detalhes de cada item exposto. Estava tão absorta no ambiente que quase não notei a figura alta entrando na loja.— Não sabia que você gostava de lugares assim, Carolina.Meu corpo travou antes mesmo de me virar. Eu reconheceria aquela voz em qualquer lugar. Lentamente, virei-me e lá estava ele: Louis, de terno impecável, parado