DURA SOBRIEDADESonhos perturbadores povoaram o sono de Túlio a noite toda. Como a dias ele não dormia bem, ainda que bêbado e se sentindo muito mal e cansado, dormiu pelo menos umas duas horas daquela vez. Foi tão real ter amado Cloe novamente. Sentir sua pele em suas mãos, sentir os beijos dela, a resposta dela. Antes de abrir os olhos para uma dor de cabeça monstra, pois ele já a sentia espreitar, por trás de seus olhos eram só dor e secura. A cabeça latejava e tonteava. Imaginava que ao abrir os olhos e os colocasse em foco, a dor explodiria. Por que estava fazendo isso a si mesmo? Pensava desanimado.A boca estava amarga, a garganta tão seca que lhe dava a impressão de que a língua tinha dobrado de tamanho e pousava grossa e pegajosa em sua boca. Foi mesmo sonho? Eles estavam bem de novo, Cloe e ele? Ela o havia perdoado por ser um maldito insensível? O perdoara por tantas crueldades que ele vinha fazendo a ela? A sensação em seu corpo era a de que fizeram amor horas atrás e só i
Olhando para suas roupas jogadas no chão, ele as vestiu rapidamente, encontrou seu celular no bolso da calça, foi ao banheiro com o celular no ouvido, já tendo discado, enquanto aliviava a bexiga, a ligação se completou:“ Boy?”“ Fredo, venha à casa de sua filha.”“ Ela está bem?” – A voz do pai da garota estava trêmula e fraca.“ Acho que ainda respira, procure ser rápido!”Fez mais uma ligação rápida, que por sorte também foi atendida rápida por Flora:“ Pois não, Túlio.”“ Vou enviar um endereço para vocês, peça ao Zaquim que venha dar uma olhada.”‘ Ok, poderei ser eu, ele está…”“ Não! A não ser que entenda de ressuscitação, terá que ser um médico.”“ Entendi, já estamos indo.”Ele desligou o celular e enviou o endereço, saiu da casa e voltou, não para sua casa, mas ligou para Gringo enquanto caminhava pela rua. Estava de volta, voltou à gangue e aos seus trabalhos. — Oi, chefe. Vamos fazer um tour pelas adjacências? – Perguntou Gringo assim que o viu.— Chame os outros e por t
UM POUQUINHO DE COLO— Está, fia, jamais esconderia de você se algo acontecesse a ele. Tenha sempre isso em mente. Sei o quanto ama meu neto, aquele cabeça dura que não a merece, sei o quanto o ama e está sofrendo, então jamais ia deixar que não soubesse se fosse o contrário.Cloe desabou. As lágrimas reprimidas na presença da senhora, caíram livrementes.— Ele me merece sim, Layla, eu o amo e ele me ama.— Amor não basta, meu bem. Quem nos ama também pode nos ferir e às vezes tem o poder de nos magoar mais do que os que nos odeiam! Sei que dessa vez ele a magoou demais e está confusa, não é? Não fique, minha querida. Não fique confusa, não se culpe porque você é boa demais, não tem culpa de nada e é uma pessoa maravilhosamente boa. Foi assim que Cloe soube que ela fora estuprada. Os olhos vermelhos e encharcados miravam os aquosos olhos da velha senhora.— Você…— Soube. Sim, eu soube, meu bem e juro para você que se houvesse uma forma de trocar de lugar com você, eu trocaria em um
A VIDA, ANTES E DEPOIS.Mas Cloe não queria falar sobre sua vida de antes, isso lhe causava angústia ainda hoje e mesmo estando um pouco bêbada, Milla percebeu a hesitação da amiga.— Esquece isso, e pelo amor dos deuses, me dê um pedacinho dessa carne, esse cheiro está me matando!Cloe ficou agradecida pela amiga ter mudado de assunto, abriu a porta do forno, retirou a forma para colocar as batatas, fazia como tinha aprendido com Layla, colocou-a na bancada da pia e cortou um generoso pedaço para a amiga que degustou gemendo e deu um pedacinho também para Formiga que pulava ensandecida pedindo. Milla se despediu dela e foi para sua casa com a promessa de voltar no dia seguinte. Eram vinte horas e nem sinal de Túlio. Às vinte e duas horas chegaram e ainda nada dele. A carne esfriou e ela estava sentada à mesa esperando-o e pensando que isso era sim uma vidinha bem “normal”. Milla estava errada ao dizer que ele não tinha mais uma vida normal. Ali estava ela, após passar um dia todo p
PAIXÃO POR DORAMAS. Cloe não ficou muito tempo no escritório que se encontravam sempre. Na própria comunidade havia o que chamavam de escritório, que era onde Sopapo, Canibal, Gringo, Túlio e ela decidiam coisas. Poucas pessoas tinham acesso ao lugar. Muitos iam ali para os procurarem, mas a maioria sempre ligava para Gringo quando queria maracar alguma coisa, pedir algo ou tirar alguma dúvida acerca da gangue. Antes de morarem juntos, Cloe e Túlio, era a casa deles que servia como o “escritório”, agora era ali que se encontravam.Pela expressão de todos ali, ela soube que Túlio estivera ali. Ela não tocou no nome dele, falou o que precisava e saiu dali.Foi para a casa de Milla e lhe contou que estivera no escritório.— Ele estava lá?— Não, creio que tinha acabado de sair, a julgar pela cara dos meninos.— Dê um tempo, amiga.— É só o que tenho feito, Milla. E aí, alguma notícia de Shay?— Ah, sim, ela está bem já, Flora disse que não precisou ser hospitalizada. O doutor Zaquim viu
— Não entendo como podem gostar de histórias tão clichês. – Ele se defendeu, deu mais um beijo em sua garota e se foi.— Como anda se satisfazendo ultimamente? – perguntou Milla, se deitando em seu colchonete no chão ao lado da cama de Cloe. Tinha deixado um ali especialmente pra as noites que ali dormia.— Como assim? Sabe que tenho dinheiro, né, que tenho meus ganhos e não dependo de homem para me sustentar.— Não estou falando disso, sua boboca, estou falando sexualmente. Sem Túlio aqui, como tem feito para se satisfazer? Só a academia não libera a dopamina necessária. Cloe gargalhou antes de responder:— Vibrador, minha filha, vibrador. Hoje mesmo já usei, se quer mesmo saber.— Não preciso de detalhes, obrigada. Garota esperta você.— A gente vai alternando entre o vibrador e os dedos, né.— Ah, por favor, não me diga que está neste moment…— Não! Claro que não, sua doida. Só quando estou sozinha. Me respeite!— É bom mesmo. Me respeite você, quando eu estiver aqui, sossegue es
ESTILHAÇADASentaram-se em um banco da praça, Shay cruzou uma perna sobre a outra e antes que abrisse a boca, Cloe lhe perguntou:— Por que está vestida assim?— Assim como, igual a você, como se vestia antes de parecer essa aberração?Ela começou pegando pesado. Cloe sentiu o golpe e viu que não era imaginação sua a garota estar vestida assim, travestida dela.— Não me pareço uma aberração.— Não? Sério que não ache que esteja parecendo uma aberração há anos? Não se olha no espelho, garota?— Por que me persegue, por que sempre me perseguiu, por que mandou Milla bater em mim aquela vez, o que tem contra mim?— Nossa, está na fase do porquê? Quantos porquês em uma única pergunta?— Me responda então só uma das perguntas, creio que vai abarcar bem o que desejo saber, qualquer que seja a que escolher responder. – As duas falavam baixo, olhavam para o chafariz sem vê-lo de fato, lado a lado, não se miravam, apenas conversavam em voz baixa.— Túlio.— Era o que eu imaginava. Por que não i
Estava tão desnorteada que não sabia para que lado era sua casa. Entrou na primeira rua que lhe apareceu à frente e foi andando. O choro pedia passagem, ela queria se curvar sobre os joelhos e gritar. Gritar até perder as forças, cair e morrer. Ficou surpresa de saber que um zumbido que ouvia vinha dela mesmo. Um assobio lhe subia pela garganta, grosso e amargo e ela se ajoelhou na beirada da calçada e deixou o vômito fluir. Nem sabia que tinha comido tanto, mas vomitou ao ponto de achar que seu estômago estava virando do avesso. — Está tudo bem, moça? – Uma pessoa sem rosto lhe perguntou e ela não conseguiu identificá-la como homem ou mulher. Seus olhos ardiam e deviam estar vermelho de tanta força tinha feito para vomitar. Sua barriga doía, os músculos doíam. Ela chacoalhou a cabeça em concordância, sua voz não sairia nem que sua vida dependesse disso. Precisava chegar em casa. Não fazia ideia de em que rua estava, se estava longe ou perto de sua casa e só percebeu que estava ind