Em um mundo onde a magia era tão natural quanto o ar que nos rodeia, reinavam três irmãos: Gallag, Wintanag e Luxord.
Os Senhores da Verdade, como eram conhecidos, acabaram por assistir o prosperar de seu povo ser apagado pelo grande poder da tão pouco conhecida entidade nomeada de Abismo, um ser incorpóreo e, ao mesmo tempo, dono de seu próprio mundo. Ou mundos. A força se alimentava de lugares com magia, devorando toda a potência da terra a deixando definhar até que restasse somente um vácuo, um vazio. O reino cheio de vida passou a murchar, o desespero se tornou o elemento que regia os seres espirituais impossibilitados de fugir das trevas que assolavam as terras que um dia foram feitas do puro poder mágico.
Gallag, o mais velho dos três reis, descobriu uma terra imaculada, um lugar onde o Abismo ainda não havia chegado. A grande Cylch era encantadora aos olhos de qualquer um que a avistasse, abastada pela belíssima criação que transbordava esperança para o povo do desesperado rei espiritual. Até mesmo o modo como as ondas fluíam por aquele espaço era fabuloso, não havia presente melhor para dar a seus súditos do que um novo mundo repleto de vida e esperanças.
A única diferença visível desta terra recém-descoberta para o lar dos espíritos em colapso era a existência de uma raça completamente intrigante: humanos.
Seres que não conheciam as naturezas da magia, viviam em paz e ainda não haviam sido corrompidos pela tal.
O grande rei então alertou com alegria aos irmãos sobre seu grande achado coberto pelas nuvens. Wintanag logo protestou, pois pensava que os humanos seriam um problema para adaptação de seus filhos sobre a terra, enquanto Luxord acreditava que os espíritos e os humanos poderiam conviver em harmonia. Entretanto, Gallag já tinha visões, com sua solução, para o impasse com a raça humana: dizimá-la.
Assim, veio o primeiro tremor.
A partir de uma fenda aberta no céu, desceram à Cylch, Gallag e seus filhos, corrompidos pela força daquela criatura gerada pelas trevas mais profundas. Assim, teve início o processo de purificação da terra.
Os humanos, que nem ao menos conheciam a arte do combate, foram subjugados pela grande força dos espíritos, quais nomearam estas criaturas fantásticas como hud, e não enxergavam outra escolha a esconder-se longe da vista destes seres, no subterrâneo e em cavernas.
Com isso, veio o segundo tremor.
Wintanag não tardou a seguir seu irmão mais velho e consigo trouxe todo o povo de seu reino, preenchendo a vasta terra com as mais diversas raças de hud, as quais possuíam suas próprias formas, tribos e vontades.
Quando traçou seu caminho até a grande Cylch, Wintanag também fora corrompido pelas trevas do Abismo e se aliou ao irmão na missão de aniquilar a raça humana, porém, a força que usavam contra aqueles que agora estavam longe de seu alcance, se voltou para o próprio povo.
Então, veio o terceiro tremor.
Luxord, o mais novo dos três Senhores da Verdade, materializou-se na terra junto de seus quatro filhos: Ostara, Litha, Samhain e Yule. O grande e justo rei estendeu a mão para seus súditos que sofriam e abraçou os humanos como se também fossem parte de seu povo. Para eles, ensinou-lhes a como se defender e a arte da magia, que àquela altura, se alastrava pelo ar.
Os humanos batizaram o rei como “Senhor da Luz”, aquele que seria responsável por lhes dar novamente a liberdade.
Profundamente grato ele marchou ao lado de humanos e hud até o campo de batalha junto de seus filhos, determinado a vencer seus dois irmãos e as criaturas que também aceitaram o Abismo.
O combate perdurou por mil noites e mil e um dias.
Ao final, Luxord se encontrava encurralado junto de sua descendência e seus seguidores. Como em um movimento desesperado e lotado de sofrimento, o Senhor da Luz usou sua essência para transformar a alma de seus filhos nas quatro armas mais poderosas que já foram banhadas pelo Sol, espadas que foram dadas aos quatro humanos cuja lealdade se mostrara inabalável com o propósito de unificar o poder dos homens e hud em um só ideal.
Então, portando as filhas de Luxord, os guerreiros foram capazes de enfrentar Gallag e Wintanag e bani-los para um lugar onde o tempo não corre, entre a profunda noite e o amanhecer. Dentro do próprio Abismo.
Luxord, que esgotou todo o poder que um dia ousou possuir, e sua essência etérea, voou ao horizonte até um local desconhecido pelas almas mortais onde pudesse se recuperar pelas próximas eras.
Com suas vidas presas em espadas, os quatro irmãos buscaram trazer o equilíbrio para o novo mundo mágico no formato de Estações: períodos onde um filho da Luz se sobressaía e servia como catalizador de magia para manter as ondas espirituais em ordem e a terra com vida. Os espíritos (ou hud) que desceram dos céus e eram pacíficos foram permitidos de viver na nova terra de Cylch, assim gerando novas raças e criaturas mágicas pelos reinos que ascenderam com prosperidade após a horrenda guerra contra os que tardiamente foram batizados de Senhores das Trevas.
Os campeões escolhidos pelas espadas tiveram papel fundamental na reestruturação da humanidade. Esses guiaram os cursos da magia e controlaram as Estações através dos séculos. Uma religião em torno de Luxord foi gerada, qual aguarda ansiosamente seu retorno às terras banhadas pelo Sol. Os campeões, chamados agora de sentinelas, construíram o Santuário da Luz: um refúgio para as espadas sagradas, com brumas mágicas em sua volta, que o esconde de olhos normais, onde somente os batizados de filhos da Luz podem adentrar.
Os protetores, o exército de Luxord comandado pelos sentinelas, são criados desde pequenos dentro do Santuário, a cada renovação de ano esses serão selecionados e trazidos de vilarejos próximos que cultuam a figura do Senhor da Luz para serem treinados e protegerem seus filhos.
A cada duas gerações os sentinelas passam seu poder adiante para um próximo campeão e se entregam às cinzas, que marcam a pele do próximo defensor da vida e da criação.
Pela benção do Senhor da Luz, o Pai das Estações, o Arauto da Liberdade, Luxord.
Gale Wintamer certamente não tinha como plano ideal uma batalha catastrófica após o café da manhã. Era o dia de sua graduação como Protetor no Santuário da Luz, tudo o que precisava fazer era derrotar seu oponente, Geralt, na Arena das Estrelas. O lugar era um grande estádio dentro do Santuário em forma da Lua crescente e com um núcleo feito para, magicamente, alterar o espaço ao redor durante os combates e treinar os aprendizes em ambientes hostis. O jovem, de dezessete anos, esperava por aquela oportunidade desde que chegara ao Santuário antes dos dez. Para ele, esse era um momento grandioso. Finalmente estava pronto para cumprir seu destino de se tornar um Protetor da Criação. O Santuário da Luz era uma cidade inteira protegida pelas brumas de Niwloedd, região mais afastada ao sul de Cylch. A névoa, fruto de uma poderosa magia, ocultavam o Santuário dos olhos de qualquer criatura que não fosse um filho da Luz. Ao atravessá-las e visualizar as muralhas do lugar, a impressão que s
Olhou ao redor. Encontrou o painel a sua direita onde estavam o escudo e a espada: Dente de Dragão. Suas armas haviam sido recolhidas na noite anterior para que fossem tratadas especialmente para aquele dia, então ele planejava somente tomá-las na hora do embate com Geralt. Correu com a arma que acabara de apanhar em punhos. Acompanhado de um grito, golpeou um soldado no caminho, depois aparou o golpe de outro e contra-atacou, perfurando a cota de malha enferrujada por baixo do corpo do inimigo naquela curta dança de espadas. Enquanto continuava correndo para atravessar o campo ia repelindo ataques e às vezes devolvia o golpe sem perder o fluxo de seus apressados passos até Dente de Dragão. A poucos metros de distância foi interrompido por um oponente muito habilidoso, qual não dava brecha para um ataque direto. Gale posicionou a espada para trás, abaixo de sua cintura, uma de suas posições favoritas com espadas de duas mãos para surpreender o inimigo. O espadachim adversário tent
Gale ficou feliz de poder assistir Kyria lutar de tão perto. Ela era magnífica em combate, talvez a melhor dos quatro. A Sentinela logo o acolheu ao entrar na luta, mesmo não o conhecendo. O jovem sabia que os sentinelas possuíam tarefas mais importantes do que saber o nome dos aprendizes, mas ela era diferente, importava-se com cada soldado sob seu comando e sorriu quando apoiou suas costas nas do garoto. — Quer que eu te cubra, novato? — perguntou ela em um tom leve dada a gravidade da situação. Com a respiração pesada, a Filha do Outono usava uma armadura leve, de malha de dragão, muito rara em tons escuros como madeira de carvalho guardiano e cabelos arrepiados e cuidadosamente raspados do lado direito da cabeça da cor das folhas secas que caem das árvores antes da chegada do Inverno. Seus grandes olhos envoltos de uma pintura preta pulsavam em tons dissonantes de laranja e transmitiam inspiração ao mais infeliz e desacreditado. — S-Seria uma honra, senhora — disse o rapaz com a
O aprendiz conseguiu ver quando as lanças acertaram dois dos arqueiros. O outro se desviou, mas caiu de cima da casa. O socorro havia chegado com força. Tratava-se dos que lutavam perto do acampamento dos aprendizes, que dominaram o terreno e começaram a avançar. Liderando o avanço vinha Hêner, a General do Exército da Luz, patente mais alta do Santuário antes dos sentinelas. Tinha cabelos loiros e uma grande armadura que Gale arriscava ser de placa de dragão, mas não tinha certeza e não perguntaria. A alta mulher trazia uma espada curta e um gigante escudo branco que mais parecia uma porta, mas era esplêndido aos olhos do jovem. Ao seu lado, vinha Gaheris empunhando Litha, com sua espessa barba e tranças amarradas para trás. O guerreiro era intimidador, trajava uma armadura vermelha que mesmo de longe dava para saber que era feita de aço lofidiano pelo brilho que emanava. Gaheris era de Lofeed, reino especializado na arte da guerra e onde os habitantes possuíam a pele mais escura, em
No escuro e pequeno quarto iluminado somente pela fraca chama de uma vela usada, Gale acordou. Os pensamentos eram confusos em sua cabeça quando tentou abrir os olhos com dificuldade e se adequar à iluminação ambiente, ou à falta dela. Não se lembrava de muitas coisas, borrões e lampejos surgiam em sua mente e eram levados pela tempestade de suas memórias. Pôs-se a sentar na cama que logo percebera não ser sua. Não sentia tanta dor, mas percebeu que o punho esquerdo estava enfaixado e suas costelas também. O pé ainda latejava como se sentisse uma ferida inexistente. A cabeça doeu com o esforço. — Ei, não se esforce tanto, garoto — disse a voz de alguém adentrando o quarto com outra vela que, dessa vez, acabara de ser acesa. Um indivíduo pálido, com os longos cabelos prateados e grandes orelhas em forma de seta se aproximou, a Luz da chama destacava seus olhos de cor dourada. Era Jörfann, um elfo da Lua. Com a vitória dos primeiros sentinelas e suas espadas forjadas com a alma dos
Com um rápido tratamento de ervas misturado ao pouco que tinha das águas do Loskjs, o rio do Vale da Lua, o elfo cinzento permitiu que o jovem fosse ajudar os outros filhos da Luz com os preparativos contra o próximo ataque e reparar o que fosse preciso. Ao sair da enfermaria, o garoto se deparou com um céu escuro e nuvens cor de ferro. Ainda não era noite, mas o Sol parecia ter sumido. Ao longe do Santuário podia se enxergar uma grande tempestade com trovões enlouquecidos que repetidamente atingiam o solo. Virando-se para o sul, um tornado devastava as plantações de Masnach, terra natal de Gale. No oeste, grandes massas de fumaça subiam aos céus escuros, aparentava ser um grande incêndio. As Estações serviam para manter o equilíbrio da natureza e o controle das ondas espirituais, sendo cada uma cuidada por um filho de Luxord. O Sentinela e a espada respectiva da Estação ganhavam mais poder e influência durante tal período de tempo. Estavam no final do Outono e Samhain havia sido qu
Nos estábulos eram criados os grandes cavalos do Santuário da Luz e unicórnios, cujo líquido gerado pelo chifre era capaz de consertar rachaduras em qualquer metal. Provavelmente era o que Polliko havia usado na armadura e o tempo na fornalha fora apenas para reforçar o equipamento. Fazia frio nas ruas da cidade, o que nunca acontecera no Santuário da Luz. O feitiço de proteção também fora afetado com a quebra do equilíbrio, logo os filhos da Luz ficariam a mercê da natureza enfurecida. Alastair estava do lado de fora do lugar limpando as asas de um pégaso negro. Ele possuía olhos prateados, a pele era branca como leite, chegando até a assustar pelo modo como suas veias ficavam expostas, e seus cabelos louros não eram cortados desde sua consagração como Sentinela há uns bons meses. O homem trajava roupas simples, como um camponês. O que o denunciava era Yule, que repousava na bainha em sua cintura. — Ah, você tem algo para mim, não é mesmo? — disse o Sentinela, simpático. — S-Sim
Todos os olhares eram direcionados a Gale, que comia sentado sozinho à mesa no pavilhão de refeições.O lugar ficava ao norte da cidade e era composto por grandes mesas e bancos enfileirados onde os protetores tinham suas refeições noturnas. Os aprendizes jantavam no acampamento, o que tornava o ambiente um pouco hostil ao seu ver. Poucos ali conheciam o garoto que mal conseguira encostar na sopa enquanto vigiado pelas sombras dos céus negros que não abrigavam nenhuma Luz.Os soldados da Legião de Tarian haviam desaparecido após a batalha, o que era extremamente suspeito. Como um exército e um animal de metal gigante poderiam sumir com tanta facilidade sem deixar rastros?A realidade ainda era difícil de aceitar. A cabeça do rapaz, que já estava confusa aquele dia, agora tinha sido virada do avesso. Os sentinelas possuem uma longevidade maior, por isso, são escolhidos a cada duas gerações de protetores no Santuário da Luz. Gale não deveria chegar assistir a uma consagração de Sentinel