O Conde de Darlan
O Conde de Darlan
Por: Cris Santos
PROLOGO

Meu nome é Allan. Allan Melarque, tenho 24 anos e sou o futuro Conde de Blackwood. Talvez seja conhecido como um herdeiro presuntivo arrogante, mas a verdade é que não me importo com os rótulos que me atribuem. Nunca dei muita importância ao amor; sempre tive alguém que me amasse incondicionalmente, sem que eu precisasse dar algo em troca.

— Quando nós veremos novamente? — a mulher questiona, envolvendo-se nos lençóis. Seus cabelos loiros e seios fartos serão eternizados em minha pintura. — Talvez amanhã, quem sabe? — ela sugere com um sorriso. A brisa da manhã entra pela janela do quarto onde passei a noite com ela, trazendo consigo o canto dos pássaros. O mês de novembro está apenas começando.

— Hm... — estico-me um pouco, toco seus lábios com a ponta do lápis e beijo seu pescoço. — Eu não sei. Não costumo dormir com a mesma pessoa por duas noites seguidas. — Respondo. Dou mais algumas pinceladas, enquanto a madame permanece sentada a beira da cama, com os olhos fixos em mim.

Foram milhares de cartas, beijos roubados, piscadelas em bailes, até que eu aceitasse o persistente pedido de madame Violeta.

— Você foi uma boa modelo. — Elogio, finalizando a pintura.

— Mas nós não dormimos — Violeta afirma. Saindo da posição atual e indo para o interior da cama. Ela virou-se de barriga para cima, percebendo que eu havia terminado o quadro. — Quero dizer, depende do que você considera “dormir com alguém”. — Ela vira-se novamente, assumindo uma posição sensual. — Meu marido está viajando. Talvez possamos nos encontrar amanhã, depois do baile? O que acha?

— Baile? — franzo o cenho, virando a pintura para que ela possa analisar.

— Sim, um baile — Violeta confirma, aproximando-se novamente até a beira da cama. — Uau, eu não sabia que meus seios eram tão bonitos assim. Você é realmente talentoso com o pincel, tanto quanto com as palavras.

— Obrigado, querida Lady Violeta Winchester. — Abro um sorriso satisfeito. — Certamente, você está correta. Não conheço ninguém tão habilidoso quanto eu em qualquer outra coisa.

— Então — ela levanta-se da cama, recolhe minhas roupas do chão e aproxima-se de mim —, Allan, sobre o baile. Você pode ir? — pergunta animada, soltando as peças de roupa sobre o meu colo e envolvendo os braços no meu pescoço. — Dizem que será benéfico para ajudar os pobres... — ela revira os olhos. Violeta jamais gostara das classes abaixo dela, ao contrário do marido, é obvio, que viajava a cada 06 meses pelo mundo para ajudar crianças indefesas. — Claro, a ideia foi do meu marido. O inútil está se sentindo culpado, pelo Clero cobrar impostos de quem não tem o que comer.

— Eu posso pensar na possibilidade, porém não vou quebrar com a minha promessa e deitar-me com você. — Passo os dedos no cabelo macio dela, depois os desço para os seios e os envolvo com minhas mãos. — Tu és deliciosa, porém eu tenho as minhas convicções.

De repente, ouvimos passos nos corredores...

— Violeta! Minha querida! Onde você está? — a voz masculina ecoa pela casa.

— Oh, Deus... Estamos perdidos! É o meu marido... — ela diz preocupada.

— Você disse que ele estava viajando. O que diabos ele está fazendo aqui? — eu questiono, irritado.

— Eu não sei... — Violeta afasta-se, indo em direção a porta e a trancando por dentro. — Talvez ele tenha decidido voltar para o Natal? Eu... Eu estou perdida! Nós estamos perdidos! Ele não vai me perdoar por mais uma traição.

— Você está perdida, não eu! — digo a ela, que me olha confusa. Levanto-me da cadeira, visto meu calção e começo a recolher meu material de pintura e colocar no embornal. — Foi uma noite maravilhosa, entretanto, dadas as circunstâncias, eu preciso partir.

— Você é mesmo um canalha, Allan Melarque! — Violeta grita, jogando as chaves do quarto em mim.

O homem começa a bater freneticamente na porta, e ouço o burburinho dos criados do outro lado, tentando acalmá-lo.

— Violeta, abra a porta! — o marido grita. — Abra ou eu irei arrombá-la! Por favor, vamos conversar!

— Boa sorte com seu marido! — digo, enfiando o restante das roupas no embornal e correndo em direção à janela.

E assim, no exato momento em que o marido finalmente consegue arrombar a porta, lanço-me pela janela com toda a elegância de um cavalheiro em fuga. Ah, o drama de ser apanhado em flagrante! Posso quase ouvir a música de uma gramola tocando ao fundo enquanto me preparo para o grande salto. Que espetáculo, não?

Aterrissei diretamente nos arbustos, que, felizmente, amorteceram minha queda. O marido de Violeta surge à janela, mas não consegue ver meu rosto. Ele grita:

— Seu desgraçado!

— Adeus... — digo de costas, com um aceno despreocupado.

Violeta corre até a janela e grita:

— Eu pensei que você me amava!

— Eu não amo ninguém, minha querida! — grito de volta, ainda de costas, correndo seminu, apenas com as ceroulas debaixo.

Ele desce correndo pelas escadas, pega sua arma e começa a correr atrás de mim pelas ruas. Ah, a emoção de uma perseguição em 1912! Eu me esgueiro por becos e esquinas, ouvindo os passos e gritos distantes do marido furioso. Definitivamente, este dia será lembrado como uma das mais vibrantes performances da minha vida.

De repente, uma bala atinge o carrinho de um vendedor de maçãs, espalhando frutas por toda parte. Abaixo-me rapidamente, sentindo a adrenalina pulsar. Corro para um beco e olho para trás. Parece que ele me perdeu de vista ou desistiu de me matar.

Esbarrando em uma camponesa, ambos caímos ao chão. O balde de água que ela carregava derrama-se sobre nós. Por alguns minutos, encaro aqueles lindos olhos verdes. A camponesa tem um rosto bonito, exceto pelas sardas. Talvez esteja com fome, pois me olha com um olhar faminto. Nunca estive tão perto de um camponês e concluo que tudo o que meu pai disse era verdade.

Os olhos da jovem lançam uma expressão furiosa ao notar minha falta de vestimenta. Antes que eu pudesse me desculpar, escuto meu inimigo gritando meu nome pelas ruas. Olho para ela por mais alguns segundos e acelero em direção há alguns cavalos. Pego um despercebido, puxo as rédeas e cavalgo de volta para casa.

Ainda é cedo e noto o carro de meu pai parado ao lado dos cavalos da família. Vejo meu criado se aproximando e o chamo, curioso para saber o que está acontecendo.

— Psiu... — Assobio enquanto desço do cavalo.

— Senhor... Senhor! Meu Deus! Onde estão suas roupas? — ele se surpreende, aproximando-se de mim.

— Vou explicar depois. É meu pai? Quem chegou neste carro? — questionei, curioso.

— Sim, senhor — ele confirma —, ele está furioso! Seu pai sabe de suas aventuras com a Condessa Madeleine de Valha.

— Continue e traga minhas roupas. — Ordenei, seguindo em direção ao celeiro.

O criado foi até a mansão, pegou roupas limpas e as trouxe para mim no celeiro.

— O que disse a meu pai? — Questionei, vestindo as roupas. — Contou que eu fui ao vilarejo dos Winchester na noite passada?

— Senhor... Lady Violeta? — o criado retrucou assustado. — Violeta é casada, e o marido dela é um dos clientes de seu pai.

— Eu sei disso. Não me dê sermões! — resmungo. — O tolo não viu o meu rosto, não precisamos nos preocupar.

— Enquanto a Condessa de Valha? O seu pai está possesso! O marido dela desfez todos os acordos comerciais com a franquia de tua família.

— Ah, outro tolo! — dou risadas. — Eu nunca tive relações sexuais com a esposa dele. Ela tem cheiro de queijo podre, o máximo de afeto que tivemos, fora um beijo que eu a roubei e uma dedada que eu me arrependo de ter dado.

O criado fica incrédulo, sem saber o que responder. Adolfo está comigo desde que me entendo por pessoa; não entendo a falta de desgosto dele ao saber que me tornei um homem viril.

— Acompanha-me até a entrada, faça parecer que eu estava tratando de negócios. — Ordeno, saindo do celeiro.

Atravesso o jardim meticulosamente cuidado, os meus passos leves sobre a grama verde e macia, os olhos atentos deslizando sobre as fileiras simétricas de arbustos e as elegantes estátuas de mármore que pontuam o caminho até a mansão. Uma obra-prima arquitetônica do final do século XIX, com suas paredes de pedra calcária imponentes e janelas altas adornadas por cortinas pesadas de veludo. O telhado íngreme, com suas intricadas chaminés de tijolos, completa a aura de grandiosidade que envolve a residência.

Ao cruzar a porta da frente, Adolfo me recebe com um olhar misto de surpresa e respeito contido, enquanto entrego meu casaco e chapéu. Meu pai, sentado ao piano, um homem de postura nobre e cabelos salpicados de prata, dedilha suavemente partituras empoeiradas. É típico dele, sempre que vem à minha casa, perder-se na música do piano que um dia também pertenceu à minha mãe.

O meu pai para de tocar, permanecendo de costas.

— Onde esteve? Com qual cadela passou a noite? — ele pergunta ríspido, foleando as partituras.

— Que deplorável, meu pai. — Digo cinicamente, quase rindo da situação— Não me acuse sem provas, eu estava cuidando de alguns negócios em Paris. Adolfo, que está entre nós, como prova viva, poderá confirmar o que estou lhe dizendo.

— Mesmo? — o velho ri—Então, por que meus criados te viram correndo quase nu pelas ruas?

Como a notícia tinha se espalhado tão facilmente?

— Você deve ter me confundido com outro homem. Eu nunca me rebaixaria a isso; não sou um vagabundo para vagar pelas ruas.

— Não minta para mim! — meu pai aperta os punhos contra as teclas do piano e vira-se de frente para mim. Aproximo-me dele, enfio as mãos nos bolsos e sento-me na poltrona ao lado do piano. — Você era meu filho. Eu o vi nascer— o velho diz, encarando-me com desprezo e ódio.

— Como assim, era? — franzo o cenho, desdenhando. — Quer dizer que não sou mais seu filho?

— Desde que tomou parte de sua herança, só me deu desgosto— meu pai levanta-se do banquinho, andando em círculos pela sala. — Decidi que, se não der um jeito em sua vida, vou abandoná-lo! O título de Conde passará a ser do homem que desposar sua irmã.

— Você não pode fazer isso!!! —exclamo. — Não depois que deu minha parte! Isso é impossível! Eu sou o seu único filho homem!

— Não, não é impossível! — o velho se exalta. Continua andando freneticamente, passando as mãos nos poucos cabelos que ainda o restam e suando como um porco. — Meu filho, se você ao menos estivesse casado... Talvez ainda tivesse uma reputação.

— Você sabe que nunca me casarei! — digo impacientemente. — Sempre soube disso. Não venha acusar-me com netos! Você tem minha irmã, por que não a casa com algum homem e a obriga lhe dar netos gordinhos, feios e horrorosos como ela?

— Sua irmã tem apenas quatorze anos! Ela é uma menina; as rédeas dela mal desceram. Você sabe o quanto isso é difícil para ela? Ter um irmão com a reputação que você tem? — Ele caminha em minha direção, toca no paletó próximo ao coração e suspira fundo. — Allan, eu estou morrendo.

— Todos nós vamos morrer um dia...

— Não! — ele interrompe. — Eu soube na semana passada, o meu coração está à beira do fim. — Lamentou-se, olhando para o teto. — Os médicos me dão no máximo um ano de vida ou dois.

— Maldição! — Eu explodo — Se está mesmo à beira da morte, por que me deserdar? Eu tenho todas as qualificações para ser o próximo Conde!

— Não, você não as tem! Você é impetuoso, covarde e cruel!

— Ah, e com quem o senhor acha que eu aprendi a ser assim? — retruco sarcasticamente. — Você nunca foi um pai presente ou me ensinou sobre moralidade.

— Vou te fazer uma proposta, meu pai diz.

— Quer dizer, uma aposta? O que quer apostar? — cruzo os braços. Apostas são comuns em nossa família.

— Aposto todo o meu dinheiro, bens e título que você não consegue ficar um ano casado; Papai pronúncia.

Dou risadas altas.

— Então, para herdar todos os bens, eu teria que apenas me casar durante um ano? E depois, poderei devolvê-la? Você está brincando, não está? Isso não pode ser uma aposta.

— Sim, acredite. É uma aposta, na verdade, uma promessa. Estou falando de todo o meu dinheiro, incluindo todos os meus negócios da Inglaterra a Paris. — Ele responde, caminha até a mesa de centro e pega um charuto.

— Você está escondendo algo nisso tudo...

— Eu lhe prometo que lhe darei tudo, porém, terá que se casar com uma dama abaixo da sua classe social. Além disso, não poderá trai-la sexualmente. Não tolerarei murmulhos sobre sua conduta e, ao menor sinal de deslealdade, transferirei o título de Conde para o seu primo, Bernardo, até que sua irmã tenha 16 anos e possa ser desposada.

— Quer que eu me case com uma pobretona? — retruco, irritado.

— Sim e, como eu duvido que você seja capaz, não há razão para estar tão zangado. Além disso, o título da dama não se classifica como pobre, existe várias damas dotadas, filhas de comerciantes de classe média. 

— Eu vou aceitar. Entretanto, se eu perder? O que pretende?

— O que eu tenho pensado há muito tempo: deserdar você! Vou pedir aos meus servos que providenciem a papelada. Irei trazer toda a documentação amanhã. — Papai ergueu a mão para selar a aposta.

— Marcarei minha assinatura com sangue! — Fiz o mesmo, depois levando a mão direita para o peito.

O silêncio nos rodeia e eu penso no que havia feito. Essa é a aposta da minha vida.

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