CAPÍTULO 03

DIAS ATUAIS

Nunca quis saber o valor que minha mãe conseguiu com o processo contra a família Sampaio, mas apenas com os juros desse valor minha mãe conseguiu comprar essa casa para mim e para Melissa.

Convidei Samantha para morar conosco no início, mas assim que surgiu a oportunidade, ela comprou a sua própria casa na mesma rua que a minha, e basicamente somos vizinhas, além de ser a madrinha de Melissa, minha filha.  

Incentivada pela terapeuta, quando tudo aconteceu, me matriculei em uma academia de aeróbica.  Samantha foi a primeira a me apoiar com isso, dizendo que ficaria com Melissa, enquanto eu fazia minhas aulas. No começo, não fiquei muito empolgada, sentia dores em todo o meu corpo, mas com o tempo ele se acostumou com todo o exercício.

Com as minhas excelentes notas e uma carta de recomendação do reitor da universidade, consegui uma vaga de professora em uma conceituada escola. No entanto, precisei passar por uma rigorosa entrevista.

Muitos dos alunos daquela escola eram de famílias influentes e abastadas, que valorizavam a segurança de seus filhos. Portanto, todos os funcionários presentes tiveram que passar por esse tipo de avaliação.

Fui designada como professora do primeiro ano primário, alunos entre seis e sete anos. Minha principal responsabilidade era alfabetizá-los. A diretora, inclusive, me alertou de que essa não era uma contratação comum.

O reitor da minha antiga faculdade havia fornecido excelentes referências a meu respeito, e o fato de ter concluído dois cursos pesou positivamente na minha avaliação. Isso demonstrou o quanto eu era dedicada, e a escola precisava de alguém assim para lidar com aquela turma.

A professora daquela turma precisou se ausentar devido a problemas de saúde, e sua auxiliar ainda não estava apta a assumir. Foi assim que fui contratada. O ponto maravilhoso dessa contratação, além do salário, foi que ela me ofereceu uma bolsa integral para Melissa.

No meu primeiro dia com aquela turminha, senti os olhinhos apreensivos de todos sobre mim, a professora novata, que ninguém conhecia. Decidi, então, realizar uma aula interativa com eles para me apresentar e ajudá-los a se soltar um pouco, enquanto eu os conhecia melhor.

Com a ajuda da minha auxiliar, organizamos um grande círculo com as cadeiras e então resolvi começar minha apresentação.

— Oi, meus amores, meu nome é Alice, e sou a nova professora de vocês. A tia Simone precisou se ausentar por um tempo porque ficou um pouco doente, então, por enquanto, eu vou substituí-la. Mas vou precisar da ajuda de todos vocês para podermos continuar de onde a tia Simone parou. Querem saber um segredo meu? — Nesse momento, todos aqueles olhinhos estavam curiosos e voltados para mim. — Eu adoro dar aula brincando.

Naquele momento, todos se olhavam com um sorrisinho no rosto. Eu sabia que eles estavam ali para aprender, e a escola e seus pais esperavam que eu ensinasse o que eles precisavam para isso.

No entanto, também sabia que levaria menos tempo para ensinar de forma criativa e lúdica, de modo que eles nunca esquecessem as lições. Claro que não iria permitir que aquela turminha se tornasse um pesadelo para a escola, mas também não pretendia formar robôs.

Eu precisava conhecer cada um deles, entender suas limitações e descobrir o que gostavam de fazer. Então, pedi que cada um se apresentasse, e em alguns momentos, brincava com eles.

Em apenas uma semana, já me tornei a tia favorita de meus pequeninos e conhecia alguns deles o suficiente para estabelecer certos limites e incentivar outros a serem mais interativos. No entanto, devo confessar que um deles me chamou especialmente a atenção pela forma como interagia com todos e sua facilidade de aprendizado.

Luan Castro era, sem dúvida, o elo entre todos ali. Ele era o garoto popular, não de uma maneira negativa, mas aquele que equilibrava a turma. Quanto à Melissa, que estava com quatro aninhos, sua primeira semana na escola foi difícil, mas ela se adaptou à tia e à sua turminha.

Passar meus dias com aqueles alunos estava se tornando algo muito especial para mim. Como ensinava em horário integral, muitas vezes só conseguia ir para a academia à noite e, como sempre, Samantha ficava com Melissa.

Desde o incidente com Lucca, não me envolvi com mais nenhum homem. Aquele idiota havia me marcado profundamente, mesmo que eu tivesse superado aquele dia. “Superado” não era a palavra certa, de acordo com minha terapeuta. 

Ela dizia que eu só poderia usar essa palavra quando estivesse envolvida com outra pessoa e não sentisse mais medo. Eu não sabia se isso um dia aconteceria. Confesso que gostaria de esquecer aquele idiota, mas olhar para Melissa me fazia lembrar constantemente dele, mas nunca me arrependi de ter tido minha filha.  

Hoje em especial, cinco anos depois do dia mais humilhante em minha vida, confesso que não estava muito animada para ir para a academia. Mas não era justo que algo que aconteceu há tanto tempo ainda interferisse em minha rotina. Dessa forma, após deixar Melissa com Samantha, segui com minha rotina. 

Após quase duas horas, saí da academia e me distraí com o celular, não observando os três homens mal-encarados que viam em minha direção. A rua estava completamente deserta e, quando os percebi, já era tarde demais para retornar. No entanto, ainda assim tentei.

Fiz de conta que havia esquecido algo, e mudei minha direção. No entanto, isso não adiantou muito. Senti quando um deles segurou meu braço, o que me assustou bastante.

— Por que a pressa, gatinha? — Ele perguntou.

A rua estava quase completamente deserta, dessa forma eles se aproximaram ainda mais de mim, mas não deixavam de observar ao redor, além de me avaliarem como se eu fosse uma mercadoria.

— Que tal um pouco de diversão, fofinha? Tenho certeza de que você vai se divertir com nós três. — O outro falou, sorrindo.

— Por favor, me deixem passar. Tenho que ir para casa. — Disse e tentei passar por eles. Mas novamente tive meu braço segurado com uma certa violência por um deles.

Naquele momento, senti todo o meu corpo arrepiar de medo. Não queria acreditar que aquilo estava acontecendo, mas não permitiria que eles fizessem qualquer coisa comigo sem tentar me livrar primeiro, então comecei a me debater.

— Ela é arisca, mas quando passar por nós três, tenho certeza de que ficará mansinha. Aposto que você vai gostar do que tenho guardado na calça, belezinha.

Ele tentou me beijar à força, enquanto o outro se aproximava de mim por trás, alisando meu corpo. Isso só me fez debater ainda mais, temendo pela minha vida.

O alívio surgiu quando escutei a voz de outra pessoa exigindo que eles me soltassem. Ao olhar para a direção de onde a voz vinha, verifiquei se tratar de um dos integrantes da equipe de crossfit da academia.

Nunca o vi antes, provavelmente frequentamos a academia em horários diferentes. Mas aquele homem era realmente o tipo de homem que não passava despercebido.

Alto, corpo definido como um atleta, tinha uma voz tranquila e ameaçadora ao mesmo tempo, com uma barba por fazer e os olhos verdes mais lindo que eu já tinha visto.

No entanto, para meu desespero, o cara que me segurava não apresentou nem um pouco de medo, e simplesmente mandou meu defensor continuar seu caminho. Aquele homem mais uma vez se fez ouvir, apontando para o grupo do lado oposto da rua. 

Foi apenas nesse momento que aqueles idiotas perceberam estarem em desvantagem, soltando meu braço e dando um passo atrás, erguendo as mãos como se dissesse que não queriam confusão.

Meu defensor colocou a mão em minha cintura, fazendo-me atravessar a avenida até seu grupo, enquanto aqueles idiotas continuaram observando o nosso grupo se distanciar.

— Nós vamos te levar até a academia. Lá, você decide o que quer fazer. — Aquele homem disse.

Seguimos para a academia em completo silêncio. Se aquele homem não tivesse intervindo, aqueles idiotas me arrastariam para algum local e só Deus sabe o que me aconteceria. Talvez virasse parte de uma estatística. 

Ao chegar à academia, informei que não desejava esperar pela viatura de polícia. Fui diretamente para o vestiário. Precisava me livrar do toque imundo daqueles canalhas e da sensação incômoda do medo que se escondia por trás da minha fachada de garota forte.

 Nada parecia mais eficaz do que um banho de chuveiro, onde poderia deixar as lágrimas que eu segurava com tanto afinco, finalmente encontrarem seu caminho.

Embaixo do chuveiro, remoía o medo que senti daquele encontro inesperado. Pensei em minha filha e isso fez meu coração ficar ainda mais apertado.

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