POV ENRICACerta noite, enquanto tomávamos chá no gazebo ao sul do jardim — um dos meus lugares preferidos por causa das lanternas e do cheiro de flores —, Oliver apareceu, claramente agitado.— Alicia — ele chamou, com pressa — preciso de uma das suas poções. Pro Samuel.— O quê? O que houve? — Alicia se levantou num pulo.— Tremores de novo. Suor frio. Ele não quer admitir, mas tá piorando. Um dos meus homens que está com ele na linha de frente me mandou um relatório hoje. Achei que estivesse exagerando… mas agora tenho certeza.— Por que não me chamou antes? — ela já se levantava e eu a segui.Antes que ele pudesse responder, uma voz firme e carregada soou atrás dele:— Porque ele sabia que eu descobriria.A figura imponente do conselheiro Magnus surgiu por entre as sombras, o olhar diretamente sobre nós.— Conselheiro — dissemos, quase em uníssono.Mas seus olhos estavam em mim. Senti meu corpo enrijecer. Não havia raiva naquele olhar… mas havia peso. Julgamento. Como se ele soube
POV ALICIAA dor veio primeiro. Um latejar profundo, insistente, que fazia o mundo girar mesmo com os olhos fechados. Alicia tentou se mover, mas os músculos pareciam feitos de pedra, e a cabeça… parecia prestes a explodir.— Alicia. Alicia, olha pra mim — a voz era familiar, desesperada. Uma das poucas que ela reconheceria mesmo nas profundezas do inferno.Forçou os olhos a se abrirem. Tudo estava embaçado. Luz demais. Sons demais. E então, o rosto dele surgiu. Oliver. A testa suada, os olhos arregalados, o peito subindo e descendo com a respiração descompassada.— Graças à Lua — ele murmurou, segurando a mão dela com firmeza. — Achei que…— O que… — a voz dela saiu rouca, quase sem som. — O que aconteceu?Oliver hesitou por um segundo, como se pesar cada palavra.— O castelo foi atacado. Alguém infiltrado… eles vieram atrás da Enrica. Quando soube, corri pra onde estavam e te encontrei desacordada. Sangue… Alicia, você tava com sangue na cabeça. Eu… eu pensei que fosse tarde demais.
POV ENRICAO vento cortante soprava contra a cabana, uivando como uma entidade raivosa, mas foi outro som que me despertou no meio da noite. Um uivo, longo e carregado de um sofrimento que eu não sabia nomear. Não era apenas um chamado ou um aviso, era um lamento profundo, um grito de dor rasgando a escuridão.Sentei-me na cama, ofegante. Meu coração martelava forte contra o peito, a sensação de inquietação se espalhando por minhas veias como veneno. A lareira ainda crepitava, lançando sombras trêmulas contra as paredes de madeira. Mas o calor não era suficiente para abafar o arrepio que se arrastou pela minha pele.Outro uivo ecoou, mais fraco dessa vez, como se a própria noite estivesse engolindo sua força. Engoli em seco. Algo estava errado.Levantei-me sem hesitação, puxando um casaco grosso e calçando minhas botas. O medo sussurrava para eu ignorar aquele chamado, mas a curiosidade sempre foi um veneno que corriam em minhas veias. E eu precisava ver com meus próprios olhos o que e
POV ENRICAAproveitei o momento para agir. A luz tremulante da lareira iluminava os ferimentos abertos em seu pelo negro, o sangue escorrendo em filetes espessos. Precisava cuidar disso antes que a infecção fizesse seu trabalho.Peguei minha caixa de primeiros socorros, os dedos ágeis trabalhando com a familiaridade de anos lidando com agulhas e tecidos. Não era muito diferente.Ajoelhei-me ao lado dele e passei os dedos com cuidado sobre sua pele quente, identificando as flechas alojadas em seu corpo. Ambas exigiriam precisão para serem removidas sem causar mais danos.Respirei fundo e agarrei a haste da flecha do ombro, sentindo a rigidez da madeira sob meus dedos.— Isso vai doer…Ele dormia, mas sua respiração se alterou quando comecei a puxar. O som da carne se rasgando sob a pressão da retirada me fez prender o ar, mas continuei. Um último puxão, e a flecha deslizou para fora, trazendo consigo um fluxo quente de sangue.Imediatamente pressionei um pano limpo contra o ferimento. O
POV CALEBUm rosnado baixo escapou de minha garganta. Meu corpo ainda estava fraco, mas a necessidade de encontrá-la se sobrepôs à dor. Me obriguei a me mover. Cada músculo queimava. Meu peito protestou, minhas pernas tremeram.Mas eu não poderia simplesmente ficar ali.O piso rangeu sob meu peso quando consegui me erguer. Minha cabeça girou. Meu focinho captou um rastro fraco, e eu já estava pronto para segui-lo quando…A porta se abriu. Lá estava ela.Os cabelos ligeiramente desalinhados pelo vento frio. O olhar fixo em mim. O cheiro dela tomou o ar, afogando meus sentidos, preenchendo cada espaço vazio dentro de mim.Relaxei sem perceber. Ela voltou.— Eu trouxe frutas para você. — A voz dela era suave, mas hesitante. — Não tenho mais nada… Me desculpe.Ela se desculpava? Apenas a observei. Comida não era o que eu queria. Mas deixei que se aproximasse, sentando-se ao meu lado, oferecendo um pedaço da fruta.Seus dedos hesitaram antes de tocarem meu focinho. E quando finalmente tocar
POV CALEBO castelo surgiu no horizonte como uma sentinela silenciosa, um farol sombrio na vastidão gelada de Vartheos. As torres perfuravam o céu acinzentado, e as bandeiras negras tremulavam com o vento cortante, carregando o brasão do reino como um aviso.Eu deveria me sentir em casa. Mas não me sentia.Cada pedra, cada sombra naquele castelo deveria me ser familiar. Mas agora, parecia estranho. Como se eu fosse um estrangeiro em minha própria terra.O frio me recebeu como um golpe de lâmina quando pisei dentro dos portões. Meu corpo protestou contra a transformação, músculos enrijecidos queimando com a dor da mudança abrupta. Minha pele nua se arrepiou, e o vento cortante me lembrou de que eu ainda estava ferido, exausto e marcado pela batalha.Um dos guardas hesitou antes de retirar seu próprio manto e me estender, sem dizer uma palavra. Peguei a peça de roupa e a vesti rapidamente, cobrindo os cortes e hematomas que ainda latejavam. Meu corpo pulsava de dor, mas aparecer diante d
POV CALEB— Você quer que eu me case por obrigação? — minha voz saiu baixa, mas carregada de fúria contida. — Nenhuma fêmea real aceitaria um Alfa como eu.Amelia estreitou os olhos.— E por que não aceitaria?Soltei uma risada amarga.— Porque metade do reino me teme e a outra metade sussurra que eu sou um predador de ômegas. — Cruzei os braços, sentindo a irritação queimando dentro de mim. — Você sabe disso. Você sabe o que dizem sobre mim.— Rumores — Amelia rebateu, sua voz carregada de impaciência. — Palavras de covardes que falam demais e sabem de menos.— Mas que se espalham como veneno. — Passei a mão pelo rosto, exausto. — Você acha que alguma família real me entregaria uma de suas filhas para ser minha Luna, sabendo o que sussurram pelos corredores? Sabendo que eu perdi o controle mais vezes do que deveria?Minha mãe me estudou em silêncio por um longo momento antes de soltar um suspiro cansado.— Vá descansar, Caleb. — Sua voz perdeu um pouco da rigidez, embora sua expressão
POV CALEBMeus deveres como príncipe exigiam minha atenção, e eu tentava, com todas as forças, me convencer de que nada havia mudado. Mas era mentira. Os salões do castelo fervilhavam com a movimentação costumeira, conselheiros discutindo alianças, soldados marchando pelos corredores de pedra, ecos de ordens e estratégias que deveriam ser minha prioridade. Mas não eram. Minha mente estava em outro lugar. Com ela.A lembrança de seu cheiro ainda pairava ao meu redor, insistente como um veneno que não podia ser expelido. O vazio deixado por sua ausência se espalhava dentro de mim como uma ferida aberta. Eu não deveria sentir isso. Eu odiava sentir isso.— Você está estranho, Caleb. — Samuel quebrou o silêncio ao meu lado, cruzando os braços enquanto me analisava com o olhar atento. — Desaparece por quatro dias, volta cheio de ferimentos e agora age como se estivesse possuído. O que diabos aconteceu?— Foi um vacilo — murmurei, sem vontade de prolongar o assunto. — Vacilo? — Oli