3: Onde o Instinto Toca Primeiro

POV CALEB

Um rosnado baixo escapou de minha garganta. Meu corpo ainda estava fraco, mas a necessidade de encontrá-la se sobrepôs à dor. Me obriguei a me mover. Cada músculo queimava. Meu peito protestou, minhas pernas tremeram.

Mas eu não poderia simplesmente ficar ali.

O piso rangeu sob meu peso quando consegui me erguer. Minha cabeça girou. Meu focinho captou um rastro fraco, e eu já estava pronto para segui-lo quando…

A porta se abriu. Lá estava ela.

Os cabelos ligeiramente desalinhados pelo vento frio. O olhar fixo em mim. O cheiro dela tomou o ar, afogando meus sentidos, preenchendo cada espaço vazio dentro de mim.

Relaxei sem perceber. Ela voltou.

— Eu trouxe frutas para você. — A voz dela era suave, mas hesitante. — Não tenho mais nada… Me desculpe.

Ela se desculpava? Apenas a observei. Comida não era o que eu queria. Mas deixei que se aproximasse, sentando-se ao meu lado, oferecendo um pedaço da fruta.

Seus dedos hesitaram antes de tocarem meu focinho. E quando finalmente tocaram… meu corpo inteiro reagiu.

O calor percorreu minha pele como eletricidade, despertando algo primitivo e perigoso dentro de mim.

Seus olhos deslizaram para minhas presas, refletindo a luz da lareira como lâminas. O medo brilhou em seu olhar por um instante. Ela sabia. Eu poderia acabar com tudo ali, arrancar sua mão, tomar o que quisesse. Ela compreendia isso.

Mas, ainda assim… continuou. E eu deixei. Ela me alimentou. E eu apenas observei.

Seus gestos eram lentos, delicados, mas determinados. Havia algo fascinante na forma como não recuava.

Por que ela fazia isso?

Ela terminou, e então seus olhos desceram para meu corpo. O cenho franziu.

— Suas ataduras… — murmurou. Havia sangue. — Eu preciso trocá-las.

Seu toque deslizou sobre minha pele. Quente. Suave. Inesperado. Minha mente dizia que eu deveria afastá-la. Mas meu corpo se recusava a obedecer.

Apenas observei enquanto suas mãos deslizavam com delicadeza, desfazendo as ataduras encharcadas de sangue para substituí-las por novas.

A sensação foi indescritível. Um calor, um arrepio. Como algo ancestral dentro de mim respondendo ao toque dela.

A noite caiu, e antes que eu percebesse, o sono me venceu. Mas quando despertei… algo estava diferente.

O ar ainda era frio, mas meu corpo estava quente.

Meus sentidos dispararam. Meu olhar encontrou a razão imediatamente. Enrica.

Seu corpo pequeno estava encolhido ao meu lado. A respiração suave. Os fios de cabelo bagunçados contra a madeira.

Mas o que me fez travar não foi isso. Foi a coberta sobre mim. A única coberta que existia ali. Ela cedeu seu próprio calor para mim.

Meu peito se contraiu com algo estranho. Um impulso primitivo gritou dentro de mim. Algo que eu não reconhecia, mas que rugia com força.

Minha mão se moveu antes que eu percebesse, puxando a coberta de volta para ela. Ela não deveria passar frio.

Foi quando vi. O colar. Minha visão estreitou.

Uma corrente de camurça desgastada pelo tempo. Um colar simples… para olhos desatentos. Mas eu sabia exatamente o que aquilo era. Um colar de Ômega.

O fecho bem preso, a camurça marcada… ela o usava há muito tempo. Para um humano comum, não significaria nada. Mas para um Alfa como eu… Aquele colar gritava segredos. 

Ele escondia um cheiro. Um cheiro que… agora escapava pelas frestas da camurça.

Minha respiração se tornou pesada. O aroma dela se infiltrava em cada célula do meu corpo.

Suave. Doce. Perigoso. 

Meu instinto rugiu. Voraz. Exigindo que eu me aproximasse. Que eu a tomasse.

Minhas presas pressionaram contra meus lábios. Meus músculos se contraíram. Isso não podia estar acontecendo.

Meu corpo se inclinou para frente, movido por algo que eu não podia controlar. O lobo dentro de mim despertava. Feroz. Faminto. Possessivo.

Eu precisava sair dali. Me afastei bruscamente, quase tropeçando. A distância era necessária. 

O ar frio ardeu em meus pulmões, enquanto eu lutava contra algo que eu não entendia, mas que queria me consumir.

O desejo latejava dentro de mim, pulsante e perigoso. Nunca havia sentido algo assim antes. Algo tão profundo, tão avassalador. E isso me aterrorizava.

Eu tinha que partir. A decisão deveria ter sido simples. Racional. Mas não era.

Porque ao olhar para ela ali, dormindo, vulnerável, com o cheiro dela grudado na minha pele…

Uma única certeza se cravou dentro de mim. Se eu partisse agora… jamais conseguiria esquecê-la.

Mas eu precisava voltar para Vartheos. Meu reino me chamava, minha alcateia esperava. Eu não pertencia àquele lugar, e cada minuto que passava ali era uma afronta ao que eu conhecia como ordem. 

Mas por que era tão difícil simplesmente me virar e ir embora?

Algo me prendia. Um peso no peito. Uma força invisível que se recusava a ser ignorada. Eu não queria nomear aquilo. Mas ele estava ali, me ancorando naquela cabana.

Naquele cheiro. O cheiro dela. Minha mandíbula travou. Aquilo era irracional. Eu nunca havia sentido tristeza ao deixar algo para trás.

Minha mente gritava que ela não era minha, mas meu corpo queimava com uma verdade primitiva. Meu lobo discordava. Meu instinto exigia que eu garantisse que ninguém jamais a tocaria em minha ausência.

E então, um pensamento me atingiu como um soco no estômago.

Ela poderia já ter um alfa. Alguém que a reivindicasse.

O fogo em minhas veias se acendeu, abrasador, insuportável. O simples pensamento de outro macho tocando-a, respirando o cheiro dela, reivindicando-a…

Minha respiração ficou pesada. Minha visão turvou em vermelho. Se isso fosse verdade, eu o mataria.

Rosnei, os músculos tensos com uma fúria que não deveria estar ali. Eu não era um alfa jovem e impulsivo, dominado por emoções. Eu era um rei. Meu dever era comandar, não me perder em algo tão insignificante quanto uma mulher.

Mas meu corpo discordava.

Eu não podia partir sem garantir que ela estaria protegida. Sem deixar claro para qualquer um que se atrevesse a cruzar este território que ela já estava marcada.

Me aproximei da entrada da cabana, erguendo a perna e impregnando minha essência ali. o Mijo quente respingou o suficiente para deixar meu cheiro na madeira do lado de fora.

Um aviso silencioso, uma sentença invisível. Ela não podia ver, mas qualquer alfa sentiria.

Mas não bastava. Eu precisava de mais.

Girei sobre minhas patas e pressionei meu corpo contra a madeira, esfregando cada centímetro de mim contra as paredes externas da cabana.

Meu lobo rugiu, satisfeito. Meu cheiro agora estava nela. No abrigo dela. No único espaço que era só dela.

Cada célula do meu corpo vibrou com satisfação. Minha presença estava ali. Minha sombra pairava sobre ela.

Ela ainda não sabia. Mas qualquer um que ousasse cruzar este território sentiria a ameaça no ar.

Dei um passo para trás, inspirando fundo. A cabana estava impregnada com meu cheiro. Nenhum alfa ousaria se aproximar sem hesitar.

Era irracional, mas eu me sentia melhor. Sem olhar para trás, corri para a escuridão da floresta. Meu destino era Vartheos. Meu dever me chamava.

Mas enquanto eu me afastava, o cheiro dela ainda estava em mim. E uma certeza se cravou em minha mente. 

Eu voltaria. E não sabia dizer se isso era uma promessa ou uma ameaça.

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